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Prédica: Lucas 12.42-48
Autor: Renato Luiz Becker
Data Litúrgica: Último Domingo do Ano Eclesiástico
Data da Pregação: 22/11/1987
Proclamar Libertação – Volume: XII
 

l – Num pequeno enfoque do todo digo que

Lucas pertenceu à segunda geração dos cristãos (escreveu o evangelho em 90 d.C.). Sua mente estava aberta para periodizar a história de Jesus em três momentos, ou seja: a lei; a atividade de Jesus; a Igreja. Na leitura do seu escrito detecto que o plano salvífico de Deus para a humanidade está na vivência cristã do dia-a-dia.

Entendo que o autor do já referido evangelho estruturou sua obra sob cinco pilastras:

a) Nascimento e infância de Jesus (Lc 1-2).
b) Atuação de Jesus na Galiléia (Lc 3.1-9.50).
c) Viagem de Jesus para Jerusalém (Lc 9.51-19.27).
d) Ministério de Jesus em Jerusalém (Lc 19.28-21.38).
e) Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus (Lc 22-24).

O texto que me cabe trabalhar se encontra inserido no item c. Dentro dele, no contexto menor de Lc 12.1-13.9, me vem à tona a ideia de que no discipulado existem responsabilidades e privilégios para serem vivenciados. Dito isso, há espaço para me restringir à perícope proposta, ou seja, Lc 12.42-48. A tradução abaixo é do est. de Teol. Oscar Jans. Compare outras!

42. E disse o Senhor: Quem, porventura, é o fiel mordomo sábio, que colocará a senha sobre sua criadagem (para) dar no tempo oportuno o alimento?

43. Bem-aventurado aquele escravo que, vindo o seu Senhor, encontra fazendo isto.

44. Realmente digo a vós que sobre todos estará ele.

45. Se, porém, disser aquele servo em seu coração: O meu Senhor atrasa chegar e começar a espancar os servos e as servas, comer e também beber e embriagar-se.

46. Virá o Senhor daquele servo em dia que não espera e em hora que não sabe e o punirá com extrema severidade.

47. Aquele servo, porém, que tendo conhecido a vontade do seu Senhor e não tendo preparado e não tendo feito de acordo com a vontade Dele, receberá muitos açoites (subentendido).

48. Mas o que não tendo conhecido, tendo feito merecedor de açoites, receberá poucos. Mas ao que muito foi dado, muito será exigido dele, e ao que foi confiado muito, ainda mais o será exigido.

1. E percebo a praticabilidade da piedade

No versículo 42 o Senhor Jesus faz uma pergunta retórica. Com o ponto de interrogação ele retoma os conteúdos esplanados entre os versículos 35-40 (Parábola do Servo Vigilante) e os catapulta para dentro de uma melhor compreensão do assunto que se segue.

Quem é o homem?! Quem é o fiel mordomo sábio? Onde encontrar tal elemento que seja vigilante, atento, sempre disposto a agir e reagir conforme a vontade de Deus? (O evangelista Mateus [13.52] fala a respeito de um escriba versado no Reino dos Céus; o apóstolo fala em despenseiros [1 Co 4.2], fala em obreiro que não tem do que se envergonhar [2 Tm 2.15]; em 1 Pé 4.10 se lê: bons despenseiros da multiforme graça). E sobre um homem que tenha capacidade para servir, que seja humilde e que tenha autoridade sobre os demais que o Messias irá confiar o seu pessoal.

O versículo 43 diz ser feliz (selig), bem-aventurado, o peão que assim for encontrado ocupado quando do regresso do patrão.

2. E constato a esperança a purificar

O verso 44 sublinha a promessa: Deus constituirá o indivíduo que assim for encontrado com toda a autoridade. Aqui a parusia está em pauta, mas inserida em termos discretos. Afirmo assim porque entendo ser Lucas portador da ideia de que o fim do mundo virá e, com ele, a implantação do reino de Deus.

Esse pensamento depois de 60 anos já havia definhado em termos iminentes (Lc 21.8ss.). Era preciso valorizar o presente como o tempo em que a fé deveria ser aprovada (Lc 10.29ss.) na oração (Lc 18.1ss.), na perseverança, na fidelidade. A plenitude da salvação seria aguardada para o futuro.
A tensão do já agora e do ainda não do Reino por certo já faziam a cabeça do evangelista. A praticabilidade do cristianismo era possível na vivência diária sob as tentativas sempre renovadas do se fazer a vontade de Deus.

3. E denoto o imperativo da responsabilidade

Penso que os versículos 45-48 são refletores dos resultados a que os autores de irresponsabilidade cristã estão sujeitos. Na tradução do original grego a palavra açoites está subentendida. Conforme prescrevia a lei romana, nos primórdios da era cristã, qualquer execução capital deveria ter como preâmbulo o flagelo de, no mínimo, 40 açoites. Na prática esse suplício só terminava com o cansaço dos verdugos. Lucas quer dar a entender que o reino de Deus não é uma brincadeira qualquer e, nele, os irresponsáveis têm pouco ou nenhum espaço. Ele é um fato que deve ser encarado com seriedade pelos que se dizem discípulos, pelos estudiosos, pelos que têm recebido revelações do Senhor.

A verdade é que o presente está aí para ser vivido integralmente com vistas no futuro, os olhos no passado e isto, de uma forma perseverante. Se não se levar o Criador a sério, haverá penas. Elas são duras ou leves, dependendo do grau de informação.

Lucas insiste em sublinhar enfaticamente a fé em sintonia com a ação. Isso se percebe em Lc 12.47-48 onde ele faz uso de material exclusivo para se comunicar, como vimos. Desse acasalamento fé X ação nascerá o estudo, a oração, a meditação, a vivência cristã, os dons espirituais, a santificação e tudo o mais sempre a serviço.

II – O leque se abre à prédica

Sou luterano e gosto de sê-lo. No passado cheguei a assumir uma postura de pavão pelo fato de fazer parte das fileiras iceelebelianas. Recentemente, ainda quando o Brasil era movido por três más vontades (Delfin, Galvêas e Pastore), observei atentamente alguns irmãos de outras denominações. Eles se colocaram de joelhos e oraram pela política brasileira naquele final de 83, início de 84. Seu falar com Deus me tocou pelo fato de perceber que, de verdade, se tratava de um diálogo (por diálogo entendo falar na certeza de que se está sendo levado a sério e depois ouvir do mesmo modo).

Hoje, quando escrevo, já fazem 19 dias que o pacote convertedor de Cr$ em Cz$ está af. Percebo o povo alegre. Fala-se que o ministro Dilson Funaro é íntegro. Diz-se que o governador Leonel Brizola comprará terras e viverá no Brasil. Ouve-se falar em baixa nos juros internacionais. Comenta-se que finalmente o governo brasileiro está do lado do povo, e eu, me lembro das orações dos irmãos negros, mulatos, brasileiros, sem qualquer gota de sangue alemão em suas veias.

Entendo que Deus ouviu suas orações pelo país verde-amarelo. O povo está a mudar e quer a paz com o molho da justiça. Creio que Deus está interferindo na história brasileira e que essa interferência é verdade porque os retos estão a suscitar bênçãos (Pv 11.11a). A vivência do Evangelho é algo muito prático. Deus procura entre nós homens humildes que sirvam e que, ao mesmo tempo, estejam preparados. A nós pastores e líderes cabe fazer rodar a carreta da diaconia em conjugação com o manejo de uma espada profética que aponte brechas lá na frente a partir da leitura equilibrada do momento presente já marcado pelo passado.

Os dias que vivemos são o segmento de vida que Deus nos presenteou. A humanidade direcionou os seus para muitos lados, daí toda a confusão reinante, quer no meio-ambiente, na família, na política, na Igreja… Haveremos de estudar com perseverança o espaço que nos foi confiado e aí, em fidelidade, seguir nos exercitando na vivência cristã a partir de buscas contínuas, sempre sobre os lençóis da responsabilidade.

O Senhor vem, e a hora é de se preparar. Vejam: o momento mais importante do dia da criança são os instantes antes do descanso noturno. É nele que ela se avalia. É importante a presença do pai e da mãe e, quem sabe, uma oração comprometida e textual; uma história com conteúdo de fato. Observem: todos somos carentes e, não raras vezes, nos escondemos atrás de auto-suficiências aparentes. Não seria ruim um culto doméstico com a leitura da Bíblia e um compartilhar. Atentem: a História se desenrola, e Deus fez das nossas mãos canetas que se alimentam com a massa do cérebro para escrevê-la. Estamos sendo chamados a florescer e não murchar, a participar dependendo na esperança de que o Senhor vem.

Ill – Que espera subsídios litúrgicos

1. Confissão de pecados:. Ficar uns instantes em silêncio; fazer um check-up da vivência cristã a nível de pensamento com o instrumental das colocações: a) maturidade tem a ver com equilíbrio na oração, na espera e na ação. b) O Reino já é, mas ainda será total e eu posso contribuir, c) Tenho sido irresponsável lá, ali e cá… Perdão Senhor!

2. Assuntos para oração final: Orar para que Deus nos faça ficar atentos para testemunhar concretamente o cristianismo a nível individual, familiar, comunitário e social.

IV – Bibliografia

– BRAKEMEIER, G. O NT como Objeto de Pesquisa. Polígrafo, São Leopoldo.
– CHAMPLIN, R. O NT Interpretado, v. 2. São Paulo, 1980.
– COOK, G. La Bíblia, Ia. História de Ia Salvación y Ia Consumación del Reino. Boletín Teológico, n9 10-11, México, 1983, p. 105-152.
– PESQUISA mostra como aconteceu a morte de Cristo. Correio P
Riograndense. Caxias do Sul, RS, 26 mar. 1986, p. 10-11.

Editora Sinodal e Escola Superior de Teologia