Prédica: Lucas 15.8-10
Autor: Silvia Beatrice Genz
Data Litúrgica:
Data da Pregação: 08/05/1994
Proclamar Libertação – Volume: XIX
Tema: Dia das Mães
1. Ser mãe — ser mulher
Mãe jovem de 23 anos: Lutei, lutei para conseguir emprego. Consegui! Só que dobrou o meu trabalho. E agora que tenho nenê pequeno, triplicou o meu trabalho. Não sei quanto tempo eu agüento.
Após um período de euforia, na busca por reconhecimento e valorização profissional, uma mãe-mulher faz uma avaliação de sua situação. O sonho, o grande sonho, se tornou um pesadelo. Poderíamos concluir: as mulheres lutaram, agora conseguiram, mas não se satisfazem. Onde está o erro? Onde está o furo? É tão difícil avaliar e concluir, pois hoje marido e esposa trabalham como assalariados e passam por mais dificuldades financeiras do que antes. Como e onde se localiza o problema? Estamos enfrentando o problema do empobrecimento sempre maior de assalariados. A sociedade está organizada num sistema hierárquico de dominação, brancos sobre negros, homens sobre mulheres…
Entretanto, não basta simplesmente reconhecer a dependência com humildade. O próprio padrão de interdependência entre homem e mulher, raças e ides, tem que ser reconstruído socialmente, criando uma partilha mais eqüitativa do trabalho e dos frutos do trabalho, ao invés de transformar um lado da relação na base subjugada e empobrecida para o poder e a riqueza do outro. Em termos das relações entre homens e mulheres, isso não significa simplesmente conceder às mulheres mais acesso à cultura pública, mas converter os homens a uma participação igual nas tarefas de criação dos filhos e manutenção do lar. Uma revolução nos papéis femininos que envie as mulheres ao mundo do trabalho masculino, mas não inclua uma revolução correspondente nos papéis masculinos, deixa intocado o padrão básico de exploração patriarcal das mulheres. Elas são simplesmente sobrecarregadas de trabalho de uma nova forma, esperando-se que cumpram um dia de trabalho masculino, com baixa remuneração, e também o trabalho não-remunerado das mulheres que sustenta a vida familiar. Precisa haver uma conversão dos homens ao trabalho das mulheres… (Rosemary Ruether).
2. Mãe é ser descartável?
As mães sofrem de um dilema que consiste em perder o sentido, a validade, a necessidade em relação aos (às) filhos(as). As mães aprendem a trabalhar, servir e viver em função de seus fílhos(as); elas têm isso como único objetivo. Quando chega o momento dos(as) filho(as) se afastarem de casa, já crescidos(as), as mães perdem o sentido da existência. Estamos enfrentando a destruição da natureza devido ao pensamento de que: estragou, quebrou, envelheceu — jogou fora. Como a mãe passou a fazer parte do velho, perdeu a função.
Uma mãe com filhos de 18 e 20 anos nos falou: A minha vida está indo agora. Meu marido era jogador e bêbado, os filhos pequenos, eu trabalhei, cuidei da casa e criei os meus filhos (eram dois). Hoje, estamos sozinhos. A única coisa que quero é ver meus filhos felizes e bem-sucedidos (Nelsi, 42 anos). É isso que resta para uma mãe-mulher? Quarenta e dois anos e nada mais de novo acontece com ela? Não há mais desejo, esperança para si como pessoa, como mulher?
A situação da Nelsi é tão sensível e tão desesperadora, pois os dois filhos fazem de tudo para decepcioná-la, contrariá-la.
Aprendemos a usar o descartável e nos tornamos descartáveis. No entanto, vivemos como se fôssemos imortais.
A cultura ecofeminista precisa remoldar nossa percepção básica de nós mesmos em relação ao ciclo da vida. A sustentação de uma comunidade orgânica de vida vegetal e animal é um ciclo continuo de crescimento e desintegração. A fuga ocidental da mortalidade é uma fuga do lado desintegrativo do ciclo da vida, da aceitação de nós mesmos como parte desse processo. Fazendo de conta que podemos imortalizar-nos, almas e corpos, estamos imortalizando nosso lixo e poluindo a terra (Rosemary Ruether).
Ao conversar com essa mãe (a Nelsi), senti que ela se considera mera espectadora da vida, da vida dos filhos. Nelsi trabalha muito: Ah, quero ganhar muito dinheiro para dar uma casa aos meus filhos. Nós não temos, mas eles devem ter uma vida melhor. Quero trabalhar até aos 80, 90 anos, mas ver meus filhos bem colocados”.
Nelsi coloca toda a sua expectativa e esperança de vida projetada na vida de seus filhos. Isso não é raro. Esse jeito de pensar e de agir é muito comum nas mães por este mundo. E muitas mães sofrem tremendas desilusões e acabam vegetando, passando os dias angustiadas e abatidas.
3. Dicas sobre o texto
A parábola da dracma perdida (Lc 15.8-10) vem logo após a parábola da ovelha perdida e antes da parábola do filho pródigo. A diferença é que, na parábola da dracma perdida, a personagem central é uma mulher e o que se perdeu é de pouco valor. Conforme J. Jeremias: As dez dracmas lembram, para quem conhece a Palestina, o enfeite de cabeça, munido de moedas, das mulheres e que faz parte do dote de casamento e constitui sua posse mais preciosa e o seu dinheiro de emergência, e que nem sequer ao dormir se depõe (pp. 37).
A parábola não fala de uma mulher de grandes posses. É descrita a maneira como a mulher procura com grande cuidado e agilidade. Acende a luz, porque a casa deve ser sem janelas. Também não deve ser um chão tão liso, pois, neste caso, seria fácil encontrar a moeda. Dez dracmas representam um pequeno valor. Perdeu-se apenas uma de dez moedas; é muito pouco, mas é um décimo de tudo o que ela possui. O empenho de procurar e não perder a dracma está ligado ao ter muito pouco.
No versículo 9, é relatada a grande alegria da mulher ao encontrar a moedinha. A mulher faz uma festa para compartilhar a sua alegria com amigas e vizinhas. A alegria do achado precisa ser compartilhada. As convidadas comparecem. Podemos imaginar quem participa dessa celebração. Na grande ceia, os primeiros convidados não tinham tempo. Certamente esses também não estavam nessa festa do achado da moeda perdida. Quem se alegra com essa mulher certamente conhece o valor de achar o que estava perdido. Alegrar-se com ela é apenas alegrar-se; não se ganha nada. Alegria compartilhada ajuda outras pessoas a não desanimarem, mas encontrarem saídas.
A experiência dessa mulher que compartilha a sua alegria é para nós um convite, um chamado para reuniões com grupos de mulheres; reunir para compartilhar as alegrias e as tristezas da vida. Alegrar-se com a amiga, a vizinha. Assim como a mulher se alegrou, fez festa, reuniu um grupo quando achou a dracma perdida, Deus também se alegrará. Essa alegria ainda pode acontecer. Jesus fala: Deus se alegrará com a alteração da situação.
No v. 10, fala-se de um pecador. E, neste caso, devemos lembrar que não são relacionados pequenos ou grandes erros. Ai não reside o ponto principal. Fala-se de um pecador que se arrepende. Fala-se da alegria devido à mudança de situação. Na verdade, a dracma é de pequeno valor como moeda, mas causa uma grande alegria para a mulher que tinha pouco. Assim também é com as mudanças na vida: são pequenos passos, mas de grande valor. Isto é muito importante no entendimento da luta das mães e mulheres.
4. Meditação
— Falar da realidade da mulher hoje.
— Falar da situação das mães como mulheres. (Podem-se usar as palavras da Nelsi.)
— Relacionamento entre mães e filhos(as).
— Uma mulher se empenha em procurar uma pequena moeda de pouco valor. Para a mulher, ela tem muito valor, é de grande valor, pois faz parte do pouco que ela tem, mas que é tudo(fé). Valorizar a procura do que parece ser pouco, mas é de grande valia (lembrar da luta da mulher).
— É encontro para alegrar-se — celebração.
— A celebração, o alegrar-se com outras pessoas não dá lucro, mas traz ânimo na busca por pequenos valores, pequenos passos.
— Pequenos passos: Aqui se poderia falar de grupos de mulheres — OASE, encontros — e sobre o valor dos mesmos.
— A luta da mulher é lenta. Como a mãe vê seus filhos crescerem devagar, assim acontece com os passos na luta pela libertação e igualdade de direitos.
— O exemplo usado por Jesus alegra, anima. Lembrar da promessa de Deus no versículo 10.
5. Liturgia — culto no dia das mães
1. Saudação: Este dia de hoje é como um outro dia. Amar a nossa mãe e abraçá-la deve acontecer todos os dias. O dia de hoje serve para fazermos uma revisão de atitudes, como é o nosso relacionamento, o que podemos mudar. Hoje lembramos das mães que são agricultoras, operárias, empregadas domésticas, professoras… Mães que também já são vovós…
Realizamos este culto em nome de Deus, que é mãe carinhosa e pai bondoso, em nome de Jesus Cristo, seu filho amado, nosso Salvador; e em nome do Espírito Santo, fonte de toda a energia, vida e fé. Amém.
Assim diz a palavra de Deus: Como alguém a quem sua mãe consola, assim eu vos consolarei; e em Jerusalém vós sereis consolados.
2. Confissão de pecados: Queremos confessar os nossos erros:
— Deus da vida, perdoa-nos por vivermos sem esperança como mães e filhos(as).
— Perdão porque pensamos somente em nós e esquecemos de nossos(as) próximos(as).
— Perdão pelas brigas em nossas famílias.
Crianças pedem: Ó Deus, na tua presença e na presença de nossas mães, pedimos: Perdão, mamãe, por muitas vezes não termos ouvido e não termos aceito os teus conselhos.
— Perdão, mamãe, pelas vezes que deixamos de te valorizar como pessoa.
— Perdão, mamãe, porque não conseguimos ser os(as) filhos(as) que tu gostarias que fôssemos…
Mamães pedem: Perdão por considerar os(as) filhos(as) sem sabedoria, sem opinião. E perdão por não incluí-los(as) nas decisões familiares.
Movida por amor, a mãe quer nos conduzir à presença de Deus, para que um dia se realize em sua vida o que lemos em Hebreus 2.13: Eis aqui estou eu e os filhos que Deus me deu. Tem piedade de nós, Senhor.
3. Absolvição:O Senhor é quem te guarda. O Senhor te guardará de todo mal (Salmo 121.5 e 7).
A meditação poderá ser conforme a reflexão anterior. Sugestão: História da moeda perdida no Manual do Culto Infantil, Ano XX, 1991, p. 141, e ainda poesias e outras homenagens às mães.
4. Oração: Agradecemos pela paciência que as mães tinham e têm conosco. Agradecemos pela proteção, o amor e a compreensão. Queremos também interceder:
– pelas mães que sofrem por causa de seus(suas) filhos(as) doentes, deficientes;
– pelas mães que não puderam ter seus(suas) próprios(as) filhos(as);
– pelas mães que são exploradas pelos(as) filhos(as) incompreensíveis;
– pelas mães exploradas no trabalho do lar, da roça e em todos os lugares;
– pelas mães que lutam pelo pão, por vida digna e justa;
– lembrar das mães sem paciência, sem compreensão, doentes, abandonadas…
Finalizar os pedidos de intercessão com agradecimentos: pelos pais que repartem as tarefas da casa com as mães… que com elas repartem a responsabilidade pela educação e cuidados dos(as) filhos(as)… pelo amor… e outros.
5. Bênção: Crianças podem ser convidadas a vir ao altar e, junto com o oficiante, impor as mãos em direção à comunidade.
Que a bênção de Deus, que nos ama como uma mãe e um pai, do Seu Filho Jesus, que teve a companhia de Sua mãe em todos os momentos marcantes de Sua missão, e a força do Espírito Santo que dá coragem, força e fé, esteja com cada um e cada uma de vocês! Amém.
6. Bibliografia
SMOLIK, Josef. Hören undd Fragen. Meditationen in neuer Folge. Vol, l, Série l, Neukirchener Verlag des Erziehungsvereins, Neukirchen-Vluyn, 1978.
RUETHER, Rosemary R. Mulheres e a Dominação da Natureza, em Estudos Teológicos, Ano 32, São Leopoldo, Editora Sinodal, 1992 (n° 3).
JEREMIAS, Joachim. As parábolas de Jesus. São Paulo, Edições Paulinas, 1978.
Proclamar Libertação 19
Editora Sinodal e Escola Superior de Teologia