Prédica: Lucas 1.26-38
Leituras: II Samuel 7.8-11,16 e Romanos 16.25-27
Autor: Roberto Natal Baptista
Data Litúrgica: 4º Domingo de Advento
Data da Pregação: 22/12/2002
Proclamar Libertação – Volume: XXVIII
Tema: Advento
1. Introdução
Caro leitor e cara leitora! Talvez você tenha, como eu, todos os exemplares do PL. Quem sabe, pelo menos um volume onde haja um comentário ao nosso texto de Lucas. Consultando esses vinte e seis volumes, encontrei quatro comentários ao texto de Lucas 1.16-38. Eles estão nos volumes VI, XII, XVI e XIX e todos relacionados com o mesmo 4° Domingo de Advento. Além disso, os dois últimos volumes com a mesma tríade de textos deste nosso domingo. Todos com suas riquezas. E gostaria de animá-lo/a a buscar esses recursos, caso você deseje trabalhá-lo especificamente em uma prédica. Eu, porém, quero propor outro caminho.
Quando preparo uma reflexão, uma dinâmica ou mesmo uma celebração, gosto de lançar mão de ideias e símbolos visuais que ajudem a compreensão e a participação das pessoas nesses encontros. Muitas vezes reparto essa tarefa com grupos, seja o específico de liturgia ou não. Isto tem enriquecido os encontros e me ajuda nesta tarefa criativa. Outras vezes, estou sozinho e tenho que trabalhar solitário nesta criação. Algumas vezes, dá certo; outras, nem tanto. Assim, gostaria de repartir esse desafio com você. Estou sozinho aqui diante do computador e espero que juntos possamos criar algo para se levar adiante aos grupos. Vamos juntos nesta tarefa. Abdico do meu suposto comentário exegético (visto que já temos quatro em nossa coletânea) e caminho numa dinâmica celebrativa.
2. Estabelecendo o conteúdo
Não me xingue. Eu sei que estabelecer conteúdos deveria ser uns dos últimos passos de uma exegese. Mas, por isto mesmo, indiquei antes para os quatro comentários que já temos no PL. Talvez você ainda tenha outros além desses. E, quem sabe, você mesmo não tenha uma preparação bem pessoal destes textos para este mesmo domingo! Quero aproveitar esses conteúdos.
Eu resumiria brevemente os comentários da seguinte forma. Também tenho que pensar em leitores e leitoras que, em seu lugar de trabalho, não dispõem de quase nenhum material de consulta, mesmo que não lhes falte boa vontade.
No PL VI, Rolf Dübbers oferece algumas sugestões de conteúdo a serem abordados em uma prédica. Ressalto a sua preocupação em enfatizar o dilema e a firmeza de Maria diante do anúncio do nascimento de Jesus e a abordagem da polêmica questão deste texto visando nos nossos dias.
No PL XII, Valdemar Lückemeyer propõe três passos para a prédica. O primeiro passo está nas tantas perguntas e respostas que este nascimento de Jesus nos proporciona. Será que temos conversa do sobre isso em nossos grupos de trabalho? Um segundo passo poderia ser simplesmente ouvir a mensagem do natal sem enfrentar a questão um tanto polêmica do nascimento. E, finalmente, um terceiro seria destacar a atitude de Maria, ressaltando a sua coragem e fé.
No PL XVI, Renato Becker e Emil Sobottka fazem um interessante paralelo entre a vida de João Batista e a de Jesus. E ainda discutem a situação de Maria diante do aviso do anjo e sua inteira submissão.
No PL XIX, Augusto Kunert faz uma extensa exegese e propõe as seguintes pistas para nós. Aborda a questão do nascimento virginal de Jesus, porém, acha que devemos nos concentrar na mensagem cristocêntrica do texto. Jesus encarna Deus e é Rei.
Esse foi um rápido panorama dos nossos textos do PL. Esse breve comentário não exclui a necessidade de olhá-los mais de perto. De qualquer maneira, caso você deseje aprofundar a busca de uma exegese do texto de Lucas, aconselho a ler esses textos na íntegra.
Aproveito um dos conteúdos indicados para caminhar na proposta acima apresentada. E, não obstante a polêmica em torno do nascimento virginal e da pouca oportunidade que temos de trabalhar essa questão, afasto-me dele. Gostaria de aproveitar essa oportunidade do natal pura construir sobre algo menos polêmico. Porém, quero ressaltar duas coisas importantes: a) haverá, com certeza, outros momentos em que deveremos explorar esse tema mais controvertido com os grupos da comunidade. Espero que encontremos uma chance de fazê-lo; b) este texto bem que poderia ser comentado alguma vez por uma teóloga. Que vocês acham?! Só temos comentários de teólogos em nossos vinte e seis volumes do PL.
Enfim, vamos ao conteúdo. Quero explorar aqui o tema do Jesus que encarna Deus. É sobre esta base que queremos traçar uma dinâmica celebrativa. Ela poderia ser utilizada não apenas em cultos, mas também em encontros de espiritualidade em grupo, por exemplo, na OASE.
3. Buscando símbolos, imagens
A grande maravilha do cristianismo reside nisto: Deus encarnado em Jesus. As religiões do mundo enaltecem os seus deuses. E Deus, quase sempre, é sinônimo de distância, de inacessibilidade. Ter um Deus humano, como nós, cristãos, temos, um Deus frágil, que chora e tem fome, é a notícia mais maravilhosa que se pode dar neste advento.
Que símbolos teríamos para representar esta grandiosidade do Deus próximo a nós? Você poderia pensar em alguns?
Quero compartilhar com você uma experiência muito interessante que aconteceu comigo. Utilizamos a simbologia da vela. A vela tem sido tão explorada nesses tantos anos de cristianismo que parece impossível imaginar algum significado novo. A experiência a que me refiro surgiu num trabalho de espiritualidade num grupo de pacientes com leucemia e seus familiares, no Hospital Universitário aqui em Santa Maria. Trata-se de um grupo extremamente heterogêneo, em todos os sentidos. E, é claro, cada integrante do grupo tem a sua religiosidade.
No encontro, eu havia disposto, no centro da nossa roda, duas velas. Enquanto acendia uma, por razões que não sei definir, decidi deixar a outra apagada. Não era essa a intenção inicial. A partir dessa imagem, começamos a conversar. Perguntei ao grupo qual a diferença que eles ali notavam. As velas tinham formatos e cores diferentes. Logo, as respostas começaram por esses detalhes. Até que alguém enfatizou que uma vela estava acesa e a outra apagada. A partir dessa observação, perguntei ao grupo quando nos sentimos como a primeira vela, acesos, e quando nos sentimos como a segunda vela, apagados.
O que quero dizer-lhes é que fomos por um caminho bem especifico. Estávamos dentro de um hospital com pessoas que enfrentavam um problema grave de saúde. Por isto, vida e morte, solidariedade e indiferença, acabaram sendo enfatizadas. Para estas páginas, sugiro que busquemos ainda outros sentidos.
Vocês poderiam imaginar que tipo de vida teríamos longe ou perto do nosso Deus, o Deus da Vida, encarnado em Jesus? Será que uma vela apagada não poderia representar perfeitamente uma vida que tem tudo para produzir luz, mas que lhe falta a chama da vida que parte de Deus? Em contrapartida, uma vela acesa é como uma vida dentro do projeto deste Deus encarnado em Jesus. É a chama que nos ilumina e nos conduz na direção do próprio Deus.
Retornando ao encontro com o grupo do hospital, perguntei, em seguida, como poderíamos acender a vela apagada. Eles perceberam logo que era necessário tocar, ainda que por alguns poucos segundos, a chama acesa no pavio apagado. Só a intenção e as palavras de desejo uno conseguiriam acender a segunda vela. Era necessário um ato concreto, um toque verdadeiro.
Acredito que esses passos e outros mais podem nos levar a entendcr um pouco melhor o toque de Deus na nossa vida. Através do Jesus Homem, Deus fez mais ou menos o que nós fizemos com as velas. Acendemos a segunda com a energia da primeira, mediante uni ato concreto num tempo também bem concreto. A vela não acende se não chegarmos bem perto e se não aguardamos alguns poucos segundos até o pavio aqueça e receba o fogo da primeira.
Estes exemplos concretos podem ser explorados ainda mais por você. Eu mesmo já estou explorando outros sentidos que no grupo não apareceram.
Resta-nos agora adaptar essa experiência à realidade em que estamos. Se estivermos diante da comunidade em um culto dominical, talvez possamos usar nossa criatividade. Se o culto for em horário noturno, poderá ser até mais interessante. Poderíamos oferecer a cada pessoa uma pequena vela. Há um tipo de vela, cuja cera não escorre pelos dedos. Podemos usar duas velas grandes no altar ou numa mesa no meio da platéia. Já no início do culto, deixamos uma acesa e outra apagada. Dialogando com a comunidade durante a prédica, podemos acender a outra vela. Também podemos pedir que, pouco a pouco, cada um acenda a vela do irmão ou da irmã ao seu lado. Tudo deve iniciar a partir da grande vela do altar. Também podemos pedir que só metade da comunidade as acenda inicialmente. Seguimos a exposição e, ao acender a vela apagada do altar, pedimos que sejam acendidas também as demais velas, da mesma maneira que ocorreu com a primeira metade do grupo.
Bem, amigos e amigas. Estas são alternativas, sugestões. Foram indicadas em outras ocasiões. Contudo, tenho certeza que podem ajudar a provocar uma discussão sobre a realidade da comunidade. Quando se conversa com um grupo, dificilmente este fala de si mesmo de forma direta, em especial quando se trata de suas angústias e seus erros. Mas, quando falamos de uma canção, quando expressamos nossa opinião em relação a um símbolo, acabamos falando de nós mesmos. Por fim, tenho certeza que você vai encontrar muitas outras maneiras de trabalhar esses conteúdos e os símbolos das velas acesas e apagadas.
Desejo um bom culto, um bom encontro, uma boa reflexão.
4. Bibliografia
BECKER, Renato L.; SOBOTTKA, Emil A. Meditação sobre Lucas 1,26-38. In: Proclamar Libertação. São Leopoldo: Sinodal, 1990. v. XVI, p. 56-62.
DÜBBERS, Rolf. Meditação sobre Lucas 1,26-38. In: Proclamar Libertação. São Leopoldo: Sinodal, 1980. v. VI, p. 81-87.
KUNERT, Augusto Ernesto. Meditação sobre Lucas 1,26-38. In: Proclamar Libertação. São Leopoldo: Sinodal, 1993. v. XIX, p. 27-34.
LÜCKEMEYER, Valdemar. Meditação sobre Lucas, 1,26-38. In: Proclamar Libertação. São Leopoldo: Sinodal, 1986. v. XII, p. 109-113.
Proclamar Libertação 28
Editora Sinodal e Escola Superior de Teologia