É tentador para as igrejas ignorarem ou mesmo desistirem do que deve ser o papel de um governo. Muitos luteranos assumiram, incorretamente, que a fé apenas tem a ver com a sua vida privada, de forma completamente separada da vida política, econômica e cidadã. Algumas igrejas perderam sua voz profética e habilidade para desafiar os governos, diz o documento final produzido pela consulta organizada pela Federação Luterana Mundial (FLM) no mês de janeiro de 2004 (22 a 25), em Genebra. O encontro, promovido pelo Departamento de Estudos Teológicos da FLM, reuniu cerca de 10 representantes das igrejas luteranas da África, Alemanha, Brasil (a representação esteve a cargo da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil – IECLB), Canadá, Estados Unidos e Índia. No final da discussão, ficou claro que as igrejas também devem ser chamadas à responsabilidade.
De acordo com a pastora Dra. Karen Bloomquist, coordenadora do encontro, a discussão é nova uma vez que busca considerar – diferente de anos anteriores – as realidades políticas e a relação Igreja-Estado, dentro de um mundo globalizado. Ainda que os cristãos luteranos tenham desenvolvido perspectivas teológicas no sentido de que os governos são um meio através do qual o trabalho de Deus é realizado, isto tem acontecido em diferentes contextos e realidades, dentro de uma economia globalizada. Hoje, em muitos lugares, governos são o inimigo ou perderam sua independência, diz o documento.
As perguntas a serem respondidas são: como nós, igrejas, podemos ser mais efetivos em preparar membros para atuarem como cidadãos na vida política; como podemos nos engajar numa política pública de defesa com ou a favor dos nossos vizinhos globais; e finalmente, como nós, igrejas e sociedade civil, podemos exigir maior responsabilidade dos governos?
Os cristão não têm uma visão especial em relação a questões políticas, mas devem estar atentos para assegurar que os governos sirvam o bem comum e à criação de Deus, e não interesses particulares. A função dos governos é cuidar do bem comum e sua vocação é proteger e aumentar a qualidade de vida das pessoas, comunidades e toda a criação, defendendo e promovendo a dignidade das pessoas, a sustentabilidade ecológica, justiça econômica, integridade cultural, participação nos processos políticos e econômicos e liberdade religiosa e outras.
As igrejas devem chamar os governos à responsabilidade, prestando solidariedade crítica aos marginalizados e excluídos; nomeando itens e causas da injustiça e pobreza; apoiando esforços locais para aumentar o envolvimento e o conhecimento público de leis e políticas; promovendo novos modelos de desenvolvimento de comunidades que são participativas, sustentáveis e preocupadas com as pessoas. Fica claro, ao mesmo tempo, que o papel das igrejas é diferente do papel das organizações não-governamentais (ongs). A Igreja representa muito mais do que um partido político ou do que um grupo de interesse; suas recomendações e defesas são muito mais amplas do que a defesa de interesses próprios, confirma o documento.
Entre as recomendações finais, o documento elaborado a partir da consulta sugere que a Igreja ore regularmente pelos governos e seus integrantes, em todos os níveis, para que desempenhem sua vocação; prepare seus membros (através de sermões, liturgias, educaçào cristão etc) para cumpram a promessa feita no batismo, de buscar justiça e paz em toda a terra através de participação e possível serviço na vida pública; desempenhe funções pastorais junto a membros seus (e outros) que integram os governos; discutam com os líderes políticos e sociedade civil sobre a expetactativa em relação às igrejas e vice-e-versa; tenham clareza sobre como devem chamar o Governo à responsabilidade, dentro do seu respectivo contexto; organize claros esforços de defesa, focados em temas prioritários; participe de campanhas, alianças e redes que buscam novas políticas consistentes com as propostas anteriormente descritas (o documento em inglês Reclaiming the Vocation of Government pode ser encontrado no endereço www.lutheranworld.org.
Fonte: Susanne Buchweitz