A polícia de Nampula realizou na sexta-feira, 27, uma segunda autópsia em Doraci Julita Edinger, 53 anos, assassinada em seu apartamento provavelmente no sábado, 21 de fevereiro. Essa autópsia mostrou que a irmã diaconisa luterana brasileira não sofreu violência sexual.
O pastor presidente da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), Walter Altmann, acompanhou, também na sexta-feira, em Nampula, a reconstituição do crime. A polícia não encontrou sinais de violência na porta do apartamento onde Doraci residia, inferindo que ela autorizou a entrada do assassino, ou dos assassinos, em sua residência.
Nada foi roubado do apartamento, o que descarta a hipótese de latrocínio. Doraci foi atingida por três golpes de martelo na cabeça. O traslado do corpo da irmã diaconisa deve começar hoje ou amanhã. O corpo está sendo aguardado em São Leopoldo, sede da Casa Matriz de Diaconisas, na quinta-feira. Nampula fica a 700 Km ao norte de Maputo, a capital de Moçambique.
Em São Leopoldo, Doraci será velada na capela da Casa Matriz e enterrada no campo santo junto à instituição. A decisão é da família, que participou, neste domingo, de culto em memória da irmã diaconisa na Paróquia Evangélica de Canudos, do bairro de mesmo nome, em Novo Hamburgo. A família tem-se reunido todos os finais de tarde para um momento de oração e reflexão, dirigido pelo pastor Hélio Scheidhauer Pacheco.
Carta pastoral dirigida às lideranças, comunidades e congregações da IECLB, escrita pelo presidente Altmann quando a caminho de Moçambique, informou o ocorrido e pediu, nos cultos do domingo, 29, a intercessão pela irmão Doraci, num sentido de solidariedade fraterna, mas também de agradecimento pelo serviço e testemunho evangélico que ela deu entre os pobres desse país-irmão, intercessão também pela missão da igreja nesse mundo tribulado.
Estamos chocados com o terrível acontecimento, do qual ainda não sabemos todo o alcance e todas as circunstâncias, afirmou Altmann na carta pastoral. O presidente destacou a disposição da irmã Doraci, que colocou o amor às comunidades pobres acima de sua segurança pessoal, amparada por uma esperança que não tem fim e que vem de Deus.
Doraci ingressou na irmandade Sophie Zink, mantenedora da Casa Matriz de Diaconisas, em 1980, onde deu início a um reconhecido trabalho no Lar Moriá, que abriga pessoas idosas. Em 1990, ela foi ordenada diaconisa.
A irmã passou por curso de auxiliar de enfermagem em hospital de Montenegro, e foi trabalhar em hospital em Não-Me-Toque, ambas no Rio Grande do Sul. Depois seguiu para Ariquemes, na Rondônia, onde atuou como promotora da saúde. Doraci também passou um período na Amazônia e no Mato Grosso, quando atuou junto a populações indígenas.
Numa parceria da Federação Luterana Mundial, IECLB e Igreja Luterana de Moçambique, Doraci viajou a Maputo em julho de 1998. No país mais pobre da África, que tem uma população total de 18,7 milhões, dos quais 60% são analfabetos, e uma expectativa de vida de 44 anos para os homens e 47 anos para as mulheres, a irmã Doraci dedicou-se a três campos de atuação: saúde, educação e construção de comunidade. Ela também preocupou-se com a preservação do meio ambiente.
Nos primeiros meses de trabalho, Doraci percorria 35 Km de bicicleta para prestar assistência a comunidades rurais. Em 1999, a IECLB realizou campanha do carro, juntando recursos para a aquisição de condução para a irmã em Moçambique.
Na época, ela escreveu para suas colegas da Casa Matriz: Vocês não podem imaginar as dificuldades que passo nessas viagens e o risco que corro de ser assaltada. Mas sinto que Deus está comigo e Ele não vai deixar que isso aconteça, pois faço esse trabalho com muito carinho.
Ao concluir os primeiros três anos em Moçambique, a irmã Doraci manifestou-se, pedindo a prorrogação de sua permanência no país africano para mais três anos. Gostaria de permanece aqui por mais um tempo, porque tenho muita pena das congregações. Elas sempre me cercam por todos os lados e, chorando, perguntam o que vai ser deles com a minha saída, relatou então.
E concluiu: Por mais duro que seja aqui, não posso dizer ‘não’, mas sim: ‘Deus, estou aqui e quero fazer a tua vontade, junto desse povo tão sofrido e maravilhoso. Que Deus continue nos ajudando nessa missão’.
O bispo responsável pelas relações exteriores da Igreja Evangélica da Alemanha, Rolf Koppe, enviou mensagem de condolências e de solidariedade à IECLB pela morte da irmã Doraci Edinger.
Koppe reagiu perplexo à notícia do assassinato da diaconisa brasileira. Embora não compreendamos essa morte trágica, não nos resta outra coisa do que nos dar as mãos em oração e nos entregar ao amor e à proteção de Deus, escreveu.
Em carta assinada pelo pastor primeiro-vice-presidente, Homero Severo Pinto, a IECLB pediu que o Ministério das Relações Exteriores do Brasil exija a apuração do crime. A carta foi enviada na quinta-feira, 26 de fevereiro.
Fonte: ALC