Às vezes tenho a impressão que o tema HIV/AIDS, no Brasil, não assusta mais tanto como outrora. Isso é inquietante pois a doença permanece sem cura e, em muitas regiões continua crescente o número de novos casos. A morte provocada pela doença, o sofrimento das pessoas e a luta pela sobrevivência parecem ser uma realidade um pouco mais distante da brasileira. Talvez porque, ultimamente os meios de comunicação nos conduzam a associar sofrimento e HIV/AIDS somente à população de países africanos, nos quais a epidemia de HIV/AIDS cresce em ritmo acelerado, atingindo em alguns países 40% da população adulta.
Aqui no Brasil, de fato, o sistema público de saúde tem conseguido garantir tratamento digno e acessível a todas as pessoas que dele necessitam. Não podemos nunca esquecer que o acesso ao tratamento indistinto a todas as pessoas tem um alto custo, pago por toda a sociedade. Os programas de prevenção se espalham pelo país, fazendo um trabalho por vezes silencioso, mas sempre constante, difundindo a idéia da prevenção na cabeça das pessoas. Todas as ações de prevenção, e a possibilidade de acesso ao tratamento estendida a todas as pessoas fizeram com que o Brasil fosse reconhecido mundialmente pela qualidade e seriedade no tratamento e prevenção a HIV/AIDS.
No entanto, embora tenhamos observado avanços consideráveis, há um setor da sociedade que até hoje pouco se posicionou abertamente sobre o tema. Estou falando das Igrejas. É bem possível que as ações de prevenção e o nível de consciência das pessoas estivessem mais desenvolvidas se as igrejas tivessem ousado quebrar o silêncio, assumir e reconhecer que desempenham um importante papel na difusão de informações e na constituição de redes de solidariedade em favor das pessoas que sofrem com a doença.
Não é por acaso que agora a nossa igreja toma uma iniciativa, já reivindicada há anos. Quebrar o Silêncio – Restaurar a Dignidade será o tema do 1.º Encontro planejado pela nossa igreja para discutir o tema HIV/AIDS nos dias 29.08 a 02.09. Ainda que silenciemos a respeito, a HIV/AIDS está presente no silêncio perturbador e constrangedor dispensado ao tema. Quebrar o silêncio e restaurar a dignidade. O primeiro passo para quebrar o silêncio está sendo dado. Restaurar a dignidade é o passo seguinte, que exige tempo e disposição para ser dado. O tema HIV/AIDS ainda é tratado como tabu, enquanto pessoas sofrem com preconceito, discriminação, solidão, isolamento. Isso tudo existe porque pessoas mal informadas ainda discriminam e isolam pessoas com o HIV/AIDS.
A lepra era um mal muito temido antigamente. Nos tempos bíblicos, as pessoas com lepra eram reunidas e obrigadas a morar longe das cidades, para que a doença não se espalhasse pela população. Jesus, pelo contrário, não discriminou nem fugiu das pessoas com a doença, fingindo não vê-las. Ele tocou o leproso (Mc 1.40-45) e o curou. Assim também somos convidados a agir. Tocar, abraçar, considerar e respeitar muito contribuem para que haja cura, para que as pessoas com HIV/AIDS se sintam cada vez mais parte desta sociedade. Não precisamos conhecer alguém para então agir. Cada pessoa é uma formadora de opinião em potencial. Sobre todos os temas podemos e devemos contribuir para que o silêncio seja quebrado, abrindo caminhos para que a dignidade seja restaurada, através do nosso serviço como pessoas cristãs e como Igreja de Jesus Cristo.
Fernando Henn