Prédica: I Timóteo 1.12-17
Leituras: Salmo 51.1-12 e Lucas 15.1-10
Autor: Roberto Ervino Zwetsch
Data Litúrgica: 17º Domingo após Pentecostes
Data da Pregação: 26/9/2004
Proclamar Libertação – Volume: XXIX
Tema:
A misericórdia de Cristo é para gente pecadora
1. Introdução
O texto para a prédica deste domingo é exemplar. Apresenta com tintas carregadas a grandeza da misericórdia e do amor de Deus em Cristo e a distância que separa a bondade e a longanimidade de Cristo da miséria e do pecado humano. E, não obstante, Cristo Jesus veio justamente para salvar pecadores, dos quais Paulo se dizia o primeiro.
Dois outros colegas já escreveram sobre esse texto. Sugiro a quem puder que dê uma olhada no vol. 3 do PL, auxílio escrito por Klaus van der Grijp, e no vol. 17, escrito por Marcos Bechert, pois cada qual enfatiza diferentes aspectos e propõe uma atualização particular, que pode ser muito útil.
Como nos relacionar com o trecho da carta que temos pela frente? Como imaginamos o destinatário das cartas que levam seu nome? Que idéia nós fazemos de Paulo, o apóstolo, a quem se atribui o conteúdo das duas cartas a Timóteo e outra a Tito, as quais no passado receberam o adjetivo de cartas pastorais? Que imagem nos vem da igreja na qual Timóteo servia como responsável pela preservação do evangelho de Deus, a sã doutrina?
Timóteo é filho de uma mulher cristã, Eunice, e de um pai pagão. Timóteo foi educado na fé por sua avó Lóide e por sua mãe de maneira exemplar (2 Tm 1.5) e desde jovem convidado por Paulo para acompanhá-lo no ministério do Evangelho. Ele esteve com Paulo na viagem a Jerusalém e o acompanhou no cativeiro em Roma nos anos 61-63 (1 Ts 3.2-6).
A leitura integral da carta nos aproxima de uma realidade bem diferente daquela que, por exemplo, transpira nas primeiras cartas de Paulo. Aqui já nos deparamos com uma igreja que começa a ser dirigida segundo padrões estabelecidos. Há uma organização em marcha com funções bem delineadas: bispos, presbíteros, diaconisas e diáconos, e até uma possível ordem das viúvas (cap. 5-6). Esta última talvez se reporte ao importante papel que, naquelas primeiras décadas da Igreja cristã, era desempenhado pelas mulheres, jovens ou já de mais idade. Elsa Tamez levanta a hipótese de que o termo genérico utilizado para viúvas (gr. chera, significa mulher sem marido) possa designar também mulheres descasadas que pertenciam à comunidade e prestavam serviços nela. Temos, então, o início de uma hierarquia de cunho patriarcal e verticalista, bem aos moldes da sociedade greco-romana da época. Tal estruturação veio a influenciar bastante o desenvolvimento posterior da Igreja do 2º século e gradativamente isolar a liderança feminina.
Tamez acrescenta que essa comunidade parece fortemente influenciada por gente rica, especialmente mulheres ricas, gente que gosta de ser honrada, o que o autor da carta não vê com bons olhos (2.8s; 3.1s; 5.1; 5.3; 5.11). A ordem hierárquica da comunidade já apresenta um bom desenvolvimento, pois prevê inúmeros cargos e inclusive salário para presbíteros, bispos, diáconos e diaconisas (3.1s; 3.8s; 5.17s).
1 Timóteo expõe, na forma de uma orientação autorizada pela figura exemplar do apóstolo, ordens específicas de como deve ser uma vida cristã em boa consciência, detendo-se, de modo especial, nos papéis de líderes e na ordem interna das comunidades. O outro tema dominante é a verdadeira doutrina, a fé sem falsidade ou hipocrisia.
1 Timóteo enfoca alguns problemas bem concretos que se manifestavam nessa comunidade, possivelmente no início do 2º século (não há certeza se se trata de Éfeso ou Roma). Havia nela problemas em relação à vida eclesiástica, mas principalmente uma luta dura contra certos ensinamentos que poderiam desviar a comunidade do Evangelho recebido por meio de Paulo e do próprio Timóteo. Timóteo foi um dos mais próximos e fiéis colaboradores de Paulo, aqui qualificado de verdadeiro filho na fé (1.1) . O cap. 1 adianta que a carta tem o objetivo de exortar, admoestar. Tais exortações se dirigem contra outra doutrina, que se constitui de fábulas e genealogias fúteis, divulgadas por pessoas que se consideram mestres da lei. A polêmica é dirigida contra pessoas ou um grupo de pessoas que estariam desviando a comunidade da fé verdadeira, sem hipocrisia. Fé esta alicerçada em duas atitudes fundamentais: o amor que procede de um coração puro e a boa consciência (1.5).
Percebe-se assim que já muito cedo houve nas comunidades cristãs primitivas a preocupação com a teologia correta (ortodoxia). As cartas pastorais são um bom exemplo de teologia contextual, ainda que num contexto patriarcal e visando um tipo de inculturação conservadora, que evita contestar o status quo. Ocorre que as comunidades cristãs após a época paulina se defrontam com um difícil período de transição da era apostólica para a era pós-apostólica. A expectativa escatológica da volta de Cristo fica adiada e parece cada vez mais distante. A Igreja precisa aprender a conviver com a sociedade civil da qual faz parte. Por isso, uma das recomendações do autor de 1 Timóteo é a boa convivência da comunidade com as demais pessoas da sociedade, até mesmo na relação com as autoridades (2.1-3).
O autor, expoente da escola paulina, dirige-se a Timóteo, fiel colaborador do apóstolo. Mas um exame mais minucioso demonstra que a carta ultrapassa o estilo pessoal para se tornar uma carta com instruções precisas e preciosas sobre a vida da Igreja, a conduta dos líderes e contra as heresias que a assediavam. Lohse afirma que tais outras doutrinas provêm de círculos gnósticos de provável origem judaica (especialmente por causa dos recorrentes argumentos em favor da pureza), mas que apresentam uma singular combinação de legalismo judaico com especulações gnósticas (1 Tm 6.29; Tt 1.14): este grupo se vangloria de possuir conhecimento superior, defende uma vida ascética (são contra o casamento), proíbe comer certos alimentos, tudo para que o espírito não fique manchado com matéria terrena. A ressurreição já se realizou, de modo que a pessoa de posse do espírito já está acima das implicações da vida terrena (p. 103).
Não temos como verificar até que ponto a polêmica descrita corresponde mesmo aos fatos. De qualquer forma, o conteúdo da carta nos alerta para alguns pontos essenciais do credo cristão. E entre estes, o texto previsto para esta ocasião ressalta a misericórdia de Deus em Cristo em contraste com a incapacidade, a ignorância e o pecado humano, que afastam de Deus.
Para tanto, o apóstolo Paulo é uma figura exemplar, pois nele encontramos um modelo de vocação, vida de fé e autoridade evangélica.
2. A eficácia da graça de Deus
v. 12 – Paulo expressa sua gratidão inestimável a Cristo Jesus, que lhe deu força, que o considerou fiel, chamando-o para o ministério da pregação. Ele não conhecia Jesus nem a força do Evangelho, a sua dynamis, o seu poder de transformação e salvação. Ele, o menor dos apóstolos, foi surpreendido por graça imerecida. Essa experiência fundante de um novo ser que o abarca por inteiro será o tema dos próximos versículos. Mas, para contrastar com outras atitudes em relação ao conteúdo da fé e sua pregação, Paulo inicia seu argumento com a oração: Sou grato para com aquele…
A teologia cristã é um grande desafio em todos os tempos. Cabe às pessoas que prestam o serviço de orientar comunidades e igrejas o duro trabalho da reflexão, que aprofunda o conhecimento da fé, uma fé que recebemos de Deus em Cristo e que amadurece na experiência e na convivência com outras pessoas, a começar pela comunidade, estendendo-se para a vida em sociedade. No entanto, a teologia não é um exercício meramente profissional (também o é, claro, e exige para tanto preparo e ousadia). O que enfatizo aqui é o seguinte: Paulo demonstra que a boa teologia começa com a gratidão pelo que Deus fez por nós em Cristo. Foi Deus quem nos vocacionou ao ministério. Mais ainda, é Deus quem chama cada pessoa cristã para viver e caminhar o caminho da fé, que salva pecadores, que liberta das falsas doutrinas, que ensina a amar de coração puro e servir com alegria, que inclusive prepara a pessoa com uma boa consciência para a convivência em sociedade. A teologia cristã começa com a oração.
v. 13 – Paulo não faz segredo de seu passado. O texto aqui até mesmo exagera em relação ao que ele já havia escrito em outras cartas (1 Co 9; Gl 1.10s). Aqui Paulo assume a condição de blasfemo, perseguidor e insolente diante da Igreja de Deus. E afirma que assim procedeu por total ignorância e incredulidade. Diante desse passado, sobressai a misericórdia de Deus. O autor trabalha com a idéia do contraste. Quanto mais pecador, mais brilha o amor divino nessa pessoa, que de perseguidor se torna servidor da e na Igreja de Cristo. E esta mudança radical precisa ser reafirmada uma e outra vez. Para que fique bem evidente do que é capaz o amor de Deus.
v. 14 – Aqui a misericórdia anteriormente mencionada encontra sua fonte: é o transbordamento da graça que Paulo recebe por meio de Jesus Cristo, nosso Senhor, por meio da fé e do amor que nele se manifestam de forma cabal e sem paralelo na história. O tema da graça é central na teologia paulina. Esta é uma das razões porque esse escrito pertence à sua escola, embora o autor vá além e trate diferentemente outros temas, como a questão da importância da Lei (1.9). Que a graça transborde na vida de Paulo é uma outra forma de descrever a sua conversão, palavra que não encontramos em Paulo, mas que pode ser utilizada para fins de compreensão da mudança pela qual passou ao encontrar-se com Cristo (cf. o episódio da estrada de Damasco, At 9.1s). Essa linguagem é interessante ainda mais porque ajuda a perceber a intensidade do que passa no coração e na vida de quem é atingido pela graça de Deus. A graça pode ser experimentada no silêncio e na paz de quem busca a paz, mas em certos casos implica vivenciar algo de extraordinário, que o autor descreve como sendo um transbordamento, quase um êxtase, que só a fé pode proporcionar. Por exemplo, quando alguém, após terrível doença, vê-se novamente livre do mal e disposto a recomeçar sua vida. Normalmente, essa pessoa, se foi despertada para a fé, dirá: Foi Deus que me tirou da morte para a vida, que me curou de todo mal, no corpo e na alma. Por isto sou-lhe muito grato.
v. 15 – Chegamos ao centro da perícope. O autor revela aqui provavelmente uma fórmula que já se tornara corrente nas comunidades cristãs. Havia muitos ditos de Jesus e dos apóstolos que corriam de boca em boca pelas comunidades. Este aqui citado é um deles. O autor reafirma a fidelidade desse credo que a tradição já comprovou: Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores (cf. os ditos dos evangelhos: Lc 5.32; 19.10; Mc 2.17). Toda a obra de Cristo é resumida numa frase. E que frase temos pela frente! Cristo Jesus não veio para salvar justos, gente piedosa, santa, irrepreensível, seguidora da lei e dos preceitos. Ele veio para salvar gente pecadora. E novamente o autor chega ao exagero, pois agrega: dos quais eu sou o principal.
A piedade cristã é uma boa prática, pois prepara as pessoas para viverem com amor e respeito a partir da fé em Cristo. Mas ela se torna perniciosa quando serve para diferenciar e diminuir os fracos na fé e vangloriar-se diante das outras pessoas ou de Deus mesmo. Frente a tais pessoas, que com soberba se mostravam mestres da lei (1.7), fazendo-se conhecedores dos mistérios complicados da lei de Deus, Paulo julga importante mostrar que a humildade, a honestidade e a transparência diante de Deus são o melhor caminho.
O autor não vê necessidade de expor o que vem a ser o pecado. Possivelmente porque já trouxera alguns exemplos concretos nos v. 9 e 10. Mas ali encontramos apenas atitudes que, no final das contas, são frutos do pecado. O pecado mesmo é não reconhecer a misericórdia de Deus. Justamente aquela que nos salva.
v. 16 – Paulo volta a enfatizar a razão de sua gratidão e de seu chamamento para o caminho da fé e o ministério da pregação: sendo pecador, foi por essa razão que nele se manifestou sobremaneira a misericórdia divina, para que nele, o principal pecador, se evidenciasse quão completa é a bondade de Jesus Cristo. Foi tal transformação que fez dele o protótipo, o modelo para quem quer que venha a crer depois dele. Neste verso, pode-se mais uma vez perceber que a linguagem é paulina, mas já com um desdobramento posterior, que serve tanto para admoestar os novos líderes que vão surgindo nas comunidades quanto para ensinar o que significa assumir e viver segundo a sã doutrina. A fé cristã começa a tornar-se não só fruto de experiência, mas uma expressão doutrinária na forma de um credo, que é passado às novas gerações cristãs.
v. 17 – Assim como começou, a perícope termina, isto é, com uma doxologia que possivelmente tem origem na incipiente liturgia que já se faz presente no culto das comunidades cristãs (outro exemplo aparece no final da carta, 6.15s). A linguagem revela influência da filosofia helenista, mas tenta traduzir expressões típicas das atribuições de Deus conforme o Antigo Testamento: Deus é rei eterno, imortal, invisível, Deus único. A este Deus e só a ele, o pai de Jesus Cristo, cabem honra e glória pelos séculos dos séculos. Amém.
3. Rumo à prédica
Assim como na passagem do 1º para o 2º século, a Igreja primitiva vivia um momento de transição, grandes debates e busca por novos referenciais que a ajudassem a encontrar o rumo para a caminhada da fé no contexto do Império Romano; também nós vivemos tempos de imensos desafios neste início do século XXI.
O texto de 1 Timóteo nos aponta uma orientação segura em meio às incertezas de toda ordem. Diante de nossas deficiências tanto pessoais como comunitárias, dos equívocos e disputas que atrapalham a vida da comunidade e de toda a Igreja, o autor apresenta a imagem do apóstolo Paulo como figura exemplar, como protótipo da vocação ao ministério e de uma vida de fé consagrada à causa do Evangelho.
Paulo aqui é fonte de tradições, exemplo de conversão e consagração, alicerce para a sã doutrina, não por sua própria razão ou força (como diria Lutero), mas pela misericórdia e graça que lhe foi concedida em Jesus Cristo, que o chamou para uma nova caminhada de fé e vida.
Paulo é o típico pecador alçado a modelo para que melhor brilhem a misericórdia e a força do amor de Deus em Cristo Jesus. Ele é exemplo da eficácia da graça. Pois, de blasfemo e perseguidor, torna-se principal arauto e protótipo para quem deseja viver a fé que conduz à vida eterna (1.16).
Nos dias que correm, é verdadeiramente urgente encontrarmos novamente exemplos de vida e fé que convençam, em primeiro lugar, a nós próprios como obreiras e obreiros que lidam cotidianamente com comunidades e pessoas as mais diferentes (penso em todos os atuais ministérios que existem na IECLB). Em segundo lugar, carecemos de modelos de vida de fé que entusiasmem a comunidade, que desafiem as pessoas que participam dos cultos e das demais atividades características da vida eclesial. Em terceiro lugar, precisamos ser confrontados com pessoas convencidas de que vale a pena seguir fielmente o caminho de Cristo, aquele que veio ao mundo para salvar gente pecadora.
Quem poderia servir de exemplo para nós hoje em dia? Fica difícil apontar nomes, pois podemos nos equivocar. Mas não me esquivo de lembrar personagens conhecidas por seu testemunho e até martírio da Igreja cristã do século XX, como Dietrich Bonhoeffer, Martin Luther King Jr., dom Oscar Arnulfo Romero, Dorothee Sölle, Rigoberta Menchú, o guarani Marçal de Souza Tupã-y e os nossos saudosos Breno Schumann (pastor da IECLB, falecido aos 34 anos em 1973, num acidente automobilístico junto com sua esposa Mariane) e José Rude Walzburger (falecido aos 42 anos após grave doença). Sem dúvida, é um risco que precisamos correr, pois nunca como hoje em dia tornou-se tão urgente encontrarmos exemplos de vida que apontem para o Evangelho da graça e da misericórdia de Deus – o Evangelho que transforma gente insolente e insensata em colaboradores do ministério da vida nova, que liberta e salva.
Na prédica valeria a pena partir do exemplo de Paulo. Mas arrisco sugerir que cada qual busque encontrar na comunidade alguma história de vida que possa servir de espelho para aquilo que no texto aparece como transbordamento da graça de Deus. Uma história exemplar. Não é necessário mencionar nomes. Talvez até seja prudente não identificar a situação. Importante é apontar para o fato inestimável: a graça de Deus é capaz de transformar pecadores renitentes em seguidores de primeira linha do Evangelho do amor e da graça de Deus. E tais exemplos nos ajudam a crer com mais firmeza e a chamar outras pessoas para caminharem conosco. Eis aí, igualmente, a dimensão missionária que não pode faltar na prédica.
Uma última idéia seria enfocar todo o tema da vida exemplar cristã no contexto da oração e da doxologia, do louvor e da exaltação do autor e consumador da fé, o Deus invisível e único a quem cabem, em última instância, toda a honra e toda a glória por cada pecador que se arrepende e muda de vida. A vida cristã começa e termina com a profunda gratidão pelo amor de Deus para com sua criação, para com cada um de nós. Esta gratidão é uma experiência indescritível e altamente mobilizadora. É por gratidão que nos dispomos a seguir Jesus. É por gratidão que assumimos o risco de viver em fidelidade ao Evangelho da graça que liberta. É por gratidão que nos colocamos à disposição para lutas sociais com boa consciência e forte senso de cidadania ativa. Pois sabemos e cremos que Cristo Jesus veio não para confirmar justos e santos, mas antes para salvar gente pecadora, chamando tais pessoas para uma vida nova que se manifesta em solidariedade e compromisso com os outros.
Em tal caminhada de vida não cabem a mentira, o homicídio, a desforra, a insolência, a luxúria, a arrogância, a desfaçatez, a impiedade, a incredulidade, a rebeldia, a impunidade, a ganância. Antes, uma vida segundo o Evangelho implica traduzir em atos e gestos a própria misericórdia com que fomos agraciados por Deus em Cristo Jesus. Como dizia Lutero, a fé que crê faz as boas obras. Nesse sentido, abre-se um campo enorme para a concretização de ações misericordiosas que exemplifiquem para as demais pessoas a força da graça de Deus que age em nós. Quer dizer, a fé não está pronta, mas ela nos convida à criatividade e ao exercício de assumir os riscos que sua prática provoca e exige. Importa saber e confiar naquela palavra fiel e digna de toda aceitação: que Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores.
4. As leituras
Salmo 51.1-12 – Este salmo é muito conhecido no contexto da confissão de pecados. Remonta a um episódio da vida de Davi, que, reconhecendo sua indignidade, busca na confissão e na entrega a Deus a redenção de sua iniqüidade, a possibilidade de mudar de vida e reencontrar a alegria de viver, que atinge ossos e medula. A consciência do próprio pecado não deve ser motivo para tristeza e desânimo, antes é o caminho para redescobrir a maravilhosa graça de Deus, que purifica e lava a alma de todo mal, pois Deus olha para nós não segundo os nossos muitos pecados, mas de acordo com sua incomensurável bondade e misericórdia. Este amor cria em nós um coração puro e um espírito inabalável.
Lucas 15.1-10 – O Evangelho para este dia combina com as demais leituras, pois mostra Jesus como aquele que convive e aceita em sua companhia justamente pessoas de má fama, gente pecadora, desafiando a ortodoxia da época, pois até mesmo come com essas pessoas. A conhecida parábola da ovelha perdida ensina que, na ótica do amor divino, vale a pena buscar a ovelha desgarrada, pois nesta atitude do pastor amoroso sobressai a paixão de Deus pelas pessoas, sobretudo por aquelas que estão mais afastadas dele. Quando uma pessoa perdida nos emaranhados de uma vida sem sentido encontra o amor de Deus, há júbilo no céu e na terra. A alegria dessa experiência extraordinária é tamanha, que deveria transbordar para o conjunto da comunidade (o resto do rebanho de pessoas justas). Onde isto acontece, é necessário festejar, como fez a mulher que achou a moeda perdida. Deus festeja conosco toda vez que uma pessoa pecadora se arrepende e muda de vida. Não há por que temer deixar-se transbordar de alegria quando alguém na comunidade redescobre a graça e o amor de Deus. Isto precisa ser comemorado e confirmado na assembléia da comunidade.
5. Subsídios litúrgicos
Confissão de pecados – Ó Deus da Vida, confessamos a ti que não somos exemplos de vida e de fé como tu esperas de nós. Com freqüência, nosso egoísmo e altivez mais prejudicam do que ajudam a demonstrar o teu amor por todas as pessoas. Ajuda-nos a reconsiderar nossas atitudes fundamentais. Ajuda-nos a rever nossos equívocos e manias de querer ser melhores do que os outros. Ajuda-nos a buscar em outros irmãos e irmãs na fé exemplos que nos permitam reencontrar o caminho de uma fé autêntica, de uma vida exemplar em amor e solidariedade para com as pessoas que cruzam os nossos caminhos e para com aquelas a quem tu nos envias como testemunhas fiéis. Por Jesus Cristo, nosso Senhor, na unidade do Espírito Santo. Amém.
Oração da coleta – Ó Deus de amor e misericórdia, é bom reunirmo-nos neste dia como uma pequena parte do teu povo neste mundo. Agradecemos-te porque nos revelaste um amor sem medida em teu Filho Jesus Cristo. Tu não olhas para os nossos muitos pecados, mas nos acolhes como filhas e filhos do coração. Tem piedade de nós, aceita-nos em nossas fraquezas, angústias e temores, para que mudemos de vida. Enche-nos de esperança, de fé e do amor solidário, que se arrisca a colocar sinais do teu reino de justiça onde vivemos e lutamos. Que a palavra prevista para hoje nos anime na caminhada cristã. Por Jesus Cristo, teu filho, na unidade do Espírito Santo. Amém.
Sugestões de hinos – HPD vol. 1 – 148; HPD vol. 1 – 241; HPD vol. 2 – 341; HPD vol. 2 – 409; HPD vol. 2 – 325; HPD vol. 2 – 381; OPC – 64.
Bibliografia
KARRIS, Robert J. The pastoral epistles. Wilmington, Delaware: Michael Glazier, 1984 (New Testament Message 17).
LOHSE, Eduard. Introdução ao Novo Testamento. Trad. Werner Fuchs. São Leopoldo: Sinodal, 1974.
TAMEZ, Elsa. 1 Timóteo e Tiago diante dos ricos, das mulheres e das disputas teológicas. Concilium, 294, 2002. p. 51-60.
Proclamar Libertação 29
Editora Sinodal e Escola Superior de Teologia