O ecumenismo é fundamentalmente uma paixão; não nasce de um vago desejo das igrejas, mas do âmago da fé, e portanto é mais forte do que eventuais percalços. Essa foi uma das certezas proclamadas pelos participantes do Seminário Teológico promovido pelo Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic) em Guarulhos, São Paulo, de 1 a 3 de agosto.
A reflexão sobre o tema “Deus, em tua graça, transforma o nosso país”, inspirada na IX Assembléia do Conselho Mundial de Igrejas (CMI) – que se realizou em Porto Alegre em fevereiro deste ano –, motivou os cerca de 90 participantes do encontro, oriundos das igrejas-membro do conselho, organismos e igrejas membros fraternos, representações regionais do Conic, institutos de formação teológica e convidados.
Os participantes avaliaram o cenário ecumênico nacional e internacional, no qual constataram a existência de dificuldades e crises. “Externamente, há uma histórica oposição e fortes atitudes anti-ecumênicas; distanciamento bastante generalizado do movimento pentecostal e das igrejas independentes em franco crescimento. Internamente, o CMI enfrenta divergências de ordem teológica e prática como, por exemplo, quanto à eucaristia, à ordenação de mulheres e ao diálogo com religiões não-cristãs”, diz o documento final do seminário.
O texto reconhece também que problemas da mesma ordem são enfrentados no Brasil. “Cristalizam-se posições anti-ecumênicas no interior das igrejas-membro; há dificuldade de diálogo com os movimentos pentecostais e neopentecostais; cresce a dificuldade financeira para a realização de programas ecumênicos”. O documento registra que o Conic “solidifica sua representatividade diante da sociedade brasileira e de órgãos governamentais para tratar de questões de relevância social” e “é uma genuína manifestação da graça de Deus às igrejas brasileiras e ao movimento ecumênico”.
Para os participantes, “urge alimentar a convicção ecumênica por práticas de acolhida mútua entre as igrejas-membro”. Para isso, sugerem, “é preciso fomentar a partilha de informações; exercitar a linguagem do respeito entre as igrejas e a prática da escuta permanente; reconhecer culpas e buscar o perdão mutuamente; rever elaborações teológicas de caráter excludente ou de afirmação de superioridade, sobretudo nas formulações eclesiológicas; estimular o intercâmbio entre os organismos ecumênicos de dimensão continental”.
No seminário, as manifestações dos percalços no caminho do ecumenismo se materializaram especialmente nas discussões sobre a recente decisão da Igreja Metodista de abandonar os organismos ecumênicos que contem com a presença da Igreja Católica e de religiões não-cristãs. O bispo metodista Adriel de Souza Maia, que presidia o Conic e já havia entregue o cargo, foi substituído pelo pastor Rolf Schünemann, da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), que fica no posto até a próxima assembléia geral, em novembro.
No encontro de Guarulhos, um dos momentos mais emocionantes foi a homenagem dos participantes ao pastor metodista Western Clay Peixoto, empossado secretário-executivo do Conic em fevereiro e que, por conta da decisão de sua Igreja, deixará a função no final do mês, respeitando os prazos da legislação trabalhista.
O pastor luterano Carlos Möller disse que a diretoria do Conic, a qual representava na ocasião, acolhia com lamento e dor a decisão. “Mas temos também a certeza de que na vida passamos por situações com as quais não concordamos e não nos identificamos. Somos animados e desafiados a entender que não é ali que a vida termina, mas sim ali que a vida começa”, disse, agradecendo ao reverendo Clay por seu trabalho e desejando as bênçãos de Deus em seu futuro.
A secretaria-executiva será ocupada provisoriamente pelo padre Gabriele Cipriane, que também agradeceu o trabalho do pastor metodista. “Nas horas em que eu queria largar tudo porque estava cansado de batalhar, sempre alguma coisa acontecia que era um sinal de que era preciso continuar, porque a coisa vai dar certo”, disse, relembrando sua trajetória no movimento ecumênico. Para Cipriane, a aproximação de igrejas batistas e de novos grupos ao Conic são exemplos de sinais positivos.
O reverendo Western Clay Peixoto pediu que os participantes orassem por ele e por sua igreja, e relatou o exemplo de uma igreja metodista nos Estados Unidos que certa vez acolheu uma comunidade judaica cuja sinagoga havia desabado. “Essa convivência dura muitos anos, e o mais bonito é que ela se tornou uma importante parceria no trabalho de atendimento a milhares de pessoas na cidade”, disse. No interior desse templo, uma faixa proclama o primeiro versículo do Salmo 133: “Oh! Como é bom e agradável viverem unidos os irmãos.”
Fonte: Paulo Hebmüller – ALC