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O inverno tinha sido rigoroso naquele ano, e nossas roupas e calçados estavam bem gastos. Consertei e remendei-os, ficando cada vez mais desanimada. O poço estava secando, e nossa velha casinha tinha bastante buracos por onde entrava o vento gelado que nos fazia arrepiar.

O tempo passava e parece que minha fé ia se enfraquecendo à medida que enfrentava as dificuldades.

Meu esposo viajava com freqüência para pregar e dar assistência em outros vilarejos; eu ficava com nossos filhos, procurando transmitir‑lhes uma fé genuína em Jesus Cristo. Sempre ouvira que devíamos confiar nas promessas de Deus e pensava que esta era uma lição para ser aprendida uma vez por todas. Esta não era a primeira vez que passávamos por necessidades e em outras ocasiões pudera experimentar que o Senhor é fortaleza, libertador, socorro bem presente. Agora, entretanto, minhas orações eram constantes murmurações, seguidas de pedido de perdão.

Como era difícil oferecer apenas pão duro e chá sem açúcar para minha família! Ver as crianças sem alimentação adequada me fazia doer o coração. Os meninos eram saudáveis, mas a caçula, nossa pequena Rute, estava doente e não tínhamos recursos para lhe oferecer algo melhor. O fim do ano se aproximava e com ele o Natal. Nossas crianças manifestavam suas preferências, e Rute insistia em ganhar uma boneca grande. Ela não queria mais bonecas de pano feitas em casa e orava todos os dias, colocando diante de Deus o seu desejo, com uma fé que me constrangia.

Eu não queria desapontar meus filhos, mas achava impossível ganharem presentes naquele Natal! Gostaria muito de satisfazê‑los, mas achava que Deus se esquecera de nós. Nada falei para meu marido que continuava trabalhando arduamente e me parecia sempre disposto. Não queria importuná‑lo e procurei tornar a vida agradável para ele e as crianças.

Naquele memorável dia, véspera de Natal, Jaime foi chamado à casa de um doente que morava um pouco longe. Separei um pedaço de pão que seria o seu almoço ‑ não tínhamos mais nada ‑ e tentei despedi‑lo com uma promessa bíblica, mas as palavras morreram em meus lábios antes que eu pudesse dizer qualquer coisa.

Que dia difícil aquele! As criança tagarelavam a respeito do Natal e me apressei em colocá‑las na cama para não ouvir mais sobre o assunto. A oração de Rutinha naquela noite não foi diferente das anteriores; confiante ela pediu a Deus o seu presente e os de seus irmãos, dizendo‑me antes de deitar:

‑ Tenho certeza, mamãe, que Deus vai mandar.

No silêncio da noite, chorei amargamente. Não queria ver o desapontamento de nossos filhos!

Logo depois Jaime chegou bastante cansado. Sua aparência não era boa; as roupas envelhecidas tornavam‑no um pobre coitado e pensei: Eu não trataria nem um animal desta forma, quanto mais um servo dedicado; como Deus tem sido cruel.

Com este pensamento horrível fui buscar uma xícara de chá para meu marido que estampava o sofrimento em seu rosto. Desejei morrer para encontrar-me com Deus e lhe dizer que suas promessas não eram verdadeiras.

Foi então que bateram a nossa porta, e Jaime correu para abri‑la. Era o sr. Isaías, que, entregando‑nos alguns pacotes, ia dizendo:

‑ Minha mulher mandou estas coisas para vocês e, como esta caixa chegou à tardinha, resolvi trazer tudo agora. Espero que lhes seja útil ainda hoje. Ao lado de Jaime fiquei perplexa com o que via! Com dificuldade agradecemos ao sr. Isaías, que logo saiu.

Nos pacotes havia carne, frutas, doces, café, leite, bolachas… e tudo o que faltava em nossa despensa! A grande caixa era de madeira, e Jaime começou a abri‑la com cuidado; ela estava repleta!

Nossos olhos contemplavam aquelas dádivas, mas não ousávamos dizer nada. Estávamos envergonhados por termos duvidado do cuidado de nosso Pai Celestial. Ele sabia de nossas necessidades, testando‑nos por um tempo e nós… Não podíamos tocar em nada antes de confessarmos ao nosso amável Senhor o nosso pecado. Só então fiquei sabendo que meu marido também estivera vacilando na fé e ajoelhados oramos, confessando e recebendo o perdão. Meu coração estava quebrantado e entre lágrimas pude visualizar a doce presença do Senhor Jesus a me dizer: Filha! As lágrimas de arrependimento foram se transformando em lágrimas de alegria, e toda a escuridão de minha alma se dissipou, dando lugar a sentimentos de louvor. Passamos, então, a agradecer ao nosso Pai, louvando‑o por sua fidelidade e seu amor.

Agora podíamos verificar o conteúdo da caixa, e a cada peça exclamávamos admirados, pois havia exatamente o que precisávamos: cobertores, casacos, roupas prontas, tecidos, meias, calçados… Todos nós recebemos as peças com algumas promessas como: Porque eu, o Senhor teu Deus, te tomo pela tua mão direita, e te digo: Não temas, que eu te ajudo (Isaías 41.13); dentro de uma luva: Que formosos são sobre os montes os pés do que anuncia as boas novas… (Isaías 52.7); no calçado de meu marido: Não te espantes diante deles, porque o Senhor teu Deus está no meio de ti, Deus é grande e temível (Dt 7.21).

Algumas caixas menores estavam bem no centro da maior; eram para nossos filhos; e continuamos retirando livros, agulhas, linhas, botões e dinheiro também! Parecia que estávamos cavando numa mina de tesouros e não cansávamos de louvar a Deus! Terminamos exaustos, mas regozijando! Preparei um lanche, saboreando daquelas provisões! Mal esperávamos pela manhã para compartilharmos com nossos filhos. As crianças pularam de alegria com seus presentes; era exatamente o que desejavam! Rute abraçou sua boneca e, calada, dirigiu‑se para o quarto. Quando voltou disse:

‑ Eu sabia que ela chegaria, mas eu queria agradecer a Deus. Não está certo, mamãe?

Aquele dia de Natal marcou a vida de nossa família que se reuniu para agradecer a Deus e escrever à Igreja que nos mandou a caixa. Fomos grandemente enriquecidos com tal experiência.

As dificuldades não terminaram, mas a lembrança daquele Natal nos tem ajudado a enfrentar cada situação com a certeza de que nosso Pai não falha.

 
Oh! provai e vede que o Senhor é bom…
aos que buscam o Senhor bem nenhum lhes faltará.
(Sl 34.8a, 10b)

 

Extraído de Permanecem a Fé, a Esperança e o Amor
Roteiro de Trabalho da OASE – 1993

(Adaptado de O Evangelista da Criança, 4° trimestre ‑ 1957)

Um forte abraço e um abençoado Natal
Klaus Dieter Wirth, pastor