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No domingo, 6 de fevereiro, preguei sobre o texto de Miquéias 6.1-8 onde considero o último versículo como um dos que mais claramente coloca a estratégia de Deus para a vida da humanidade – praticar a justiça, ter compaixão pela dor alheia e viver sem soberba.

Disse, para começar, que não há nenhuma forma de vida digna sem que Jesus ocupe o seu centro. Não há justiça, não há verdade, não há bênção na vida sem que Jesus seja o Senhor. Disse que, se Jesus ainda não foi convidado para ocupar o lugar central na vida, esta é a chance graciosa de fazê-lo, porque Ele nos ama e quer o bem da nossa vida.

Porém há o outro lado da moeda. Como as pessoas ao nosso lado podem ter uma vida digna? Qual a estratégia que o povo cristão deveria seguir para que a sociedade toda fosse beneficiada com as bênçãos de Deus? Qual é a estratégia da vida com Deus e com o próximo?

O profeta Miquéias fala, abre sua boca, denunciando o cenário de injustiças contra as pessoas pobres decorrente do afastamento do povo de seu Deus. Afastar-se de Deus traz prejuízos para a própria pessoa e para o próximo. Afastar-se de Deus é a causa primária de toda forma de injustiça.

Disse ainda que, muitas vezes, como acontecia nos dias de Miquéias, a estratégia da justiça e da misericórdia é substituída por uma invenção engenhosa: a tapeação litúrgica. A liturgia se torna vazia quando não motiva para a transformação. Miquéias admoesta que Deus não se agrada das vãs repetições, dos milhares de carneiros, ladainhas, oferendas, simbologias, se tudo isso não levar a um compromisso com o próximo de maneira concreta e amorosa.

Para a reflexão nesta página do portal luteranos, quero pensar um pouco adiante.

Como Igreja, temos desenvolvido um grande programa de planejamento estratégico. Entendo que o grande professor de estratégia na Bíblia é o Neemias. Pois bem! Buscamos estratégias de crescimento – chegamos à estratégia missionária. Buscamos estratégias de inserção social e política e esbarramos na nossa identidade esquizofrênica. Fazemos planejamentos estratégicos que, no entanto, acabam nos aprisionando em repetições do óbvio. Na maioria das vezes nossa estratégia nos atrela ao tradicional sem nos dar condições de cultivar a criatividade e sem termos uma imagem clara da necessidade alheia.

Nossas matrizes de avaliação estão, muitas vezes, demasiadamente distantes do que o povo anseia e precisa. Como alguém disse: Temos especialistas alienados no campo, mas gênios nos gabinetes. Tenho a impressão de que as supervalorizadas considerações políticas eclesiásticas afetam endemicamente o planejamento estratégico da Igreja.

Ter uma estratégia é obviamente importante e imprescindível para que a Igreja alcance seu objetivo ou faça sua missão. Mas devemos romper o pragmatismo político, litúrgico e estratégico, SEM ROMPER COM A CLAREZA E OBJETIVIDADE DENOMINACIONAL LUTERANA.

Proponho que nós, ieclbeianos, quebremos alguns gessos que ainda tiram nossa mobilidade.

Os autores Kim e Mauborgne lançam algumas ideias em seu livro A Estratégia do Oceano Azul (Campus, 19ª impressão, 2005) que, acredito, possam nos ajudar a romper com a mesmice e ir ao encontro das necessidades alheias.

Numa análise objetiva do jeito de ser da nossa Igreja (que é formada por pessoas), encontraremos muitas – a maioria – pessoas conformadas. Elas imitam aquilo que outras tem feito no decorrer dos anos, sem questionar e sem agregar alguma transformação em sua vida pessoal quanto aos valores cristãos.

Embora em menor número, temos também as pessoas despertadas. São pessoas migrantes que procuram – e encontram – motivação e desafios para ir além da mesmice. São pessoas que cansam do institucional ou cansam até dos valores altamente espiritualizados. Estes valores espiritualizantes também podem ser – e são – uma tapeação litúrgica. Pessoas que rompem o conformismo para se transformar em agentes estratégicos no reino de Deus são justamente estas despertadas. São pessoas que querem ir adiante.

Enfim, as pessoas transformadas, que ainda são poucas. Transformadas. Este sempre será um conceito transitório e é composto pelas pessoas pioneiras, que estão à frente da maioria das outras pessoas, estão na vanguarda. Digo transitório porque sempre estamos em reforma, em mudanças. Porém são pessoas que abraçam a causa porque compreenderam que ser pessoa cristã é representar e vivenciar o senhorio de Jesus Cristo neste mundo. Pessoas transformadas têm em si elementos criativos que buscam motivação além dos números e estatísticas. Sua motivação é espiritual e ético que promove um comprometimento pessoal. A motivação é o elemento fundante da ação destas pessoas e esta não vêm de barganha e análises rigorosas de estratégias. Como já dissemos, é resultado de uma motivação espiritual que leva a um comprometimento voluntário e autêntico.

Pessoas transformadas em nossa Igreja veem além dos seus próprios muros. Vão além da demanda existente. São pessoas de visão. Assim rompem com planejamentos estratégicos pré-estabelecidos. São pessoas que aprofundam seus conhecimentos cristãos e alcançam um contingente de pessoas que nada sabem da vida cristã, ou estão, no máximo, conformadas.

Assim sendo, a missão deixa de ser estratégia planejada e deixa de ser número, e passa a ser anúncio e vivência de uma vida transformada por Jesus Cristo. Quando Jesus volta ao centro – sem esquecer da ação trinitária de Deus – então a estratégia da vida com Deus e com o próximo, a partir da Igreja, se estabelece definitivamente. Assim me parece.

Podemos ensaiar um caminho de transição. Podemos avançar. Podemos ir além, sem perder o foco em Jesus, praticando a justiça, tendo compaixão pela dor alheia e vivendo sem soberba.