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 Prédica: Jonas 3.1-5 (6-9) 10
Leituras: Marcos 1.14-20 e 1 Coríntios 7.29-31
Autor: Vera Maria Immich
Data Litúrgica: 3º. Domingo após Epifania
Data da Pregação: 22/01/2006
Proclamar Libertação – Volume: XXXI

Tema do Culto: Aprender com Jonas que é impossível fugir de Deus; aprender com Nínive que sempre é possível arrepender-se e reconstruir nossas vidas e louvar a misericórdia de Deus.

1. Observações preliminares

Gerhard von Rad esclarece que todo o livro de Jonas perdeu considerável destaque e credibilidade quando o ser humano começou a duvidar de que alguém realmente pudesse ser tragado por um peixe gigante e ser devolvido com vida após três dias. No entanto, ele considera esse fato um acontecimento secundário, que não deveria ofuscar o brilho e a força de todo o livro.

O livro de Jonas, segundo von Rad, não deve ser lido literalmente, mas como um relato de caráter fortemente didático e com acentos diferentes de uma narração histórica. Fala de um homem, profeta, que vivia em uma época e lugar distantes de nossos dias e que recebeu uma ordem de Deus e não a obedeceu.

2. Leituras bíblicas

O evangelho de Mc 1.14-20 é bastante apropriado, pois fala do chama- do ao discipulado de Simão e André, Tiago e João, os pescadores. Aqui encontramos um seguimento sem questionamento e, provavelmente, sem conhecimento do tamanho da missão que abraçavam e da impossibilidade de retorno e arrependimento. Mostra-nos pescadores que confiam suas vi- das cegamente a um mestre.

O texto de 1 Co 7.29-31 fala-nos que o tempo se abrevia e que todos devem preparar-se para os tempos de tribulação. Chama para renegar as coisas passageiras do mundo e ficar com aquilo que é o mais importante. Jonas também enfrentava tempos de tribulação.

3. Contexto

O livro de Jonas tem caráter autobiográfico. Relata as circunstâncias em que ele, contra sua vontade, é enviado por Deus a Nínive, cidade fora de Israel, capital da Assíria. Ele deve anunciar a Nínive que eles têm 40 dias para arrepender-se de seus pecados e que depois disso toda a cidade será destruída.
Nínive era uma cidade pecadora, e Deus a havia condenado à destruição. Jonas sabe da complexidade de sua tarefa. Sabe que gozarão dele, ou ainda pior, se vierem a se arrepender, é bem provável que o Senhor use de sua grande bondade e misericórdia e os perdoe, o que seria ainda mais desgastante sob o ponto de vista pessoal. Portanto, ele inicia uma fuga corajosa e destemida.

Jonas é comparado a vários profetas do AT, que também se negaram a cumprir o chamado do Senhor, como Moisés, Elias, Jeremias e outros. Mas ele é considerado o que com maior tenacidade manteve sua recusa. Ao invés de seguir caminho para o Oriente, onde ficava Nínive, ele embarca em um navio rumo a Társis, no ocidente, a fim de escapar da “presença do Senhor”.

4. Localização do texto e reflexão

O texto de Jn 3.1-5 encontra-se após a desobediência de Jonas, sua fuga em um navio a Társis e os fortes ventos dos mares que fazem os marinheiros lançarem sorte para saber por que estavam sendo atacados por aquela tempestade. Eles acreditavam que o Deus de alguém estava castigando todos pela desobediência de uma pessoa.

Jonas então percebe que é impossível esconder-se de Deus. Ao joga- rem as sortes, essa recaiu sobre Jonas. Ele então percebe que é o próprio Senhor que está se comunicando por intermédio das sortes. Ele confessa, ali na tempestade, àqueles marinheiros que o enchem de perguntas: “Sou hebreu e temo ao Senhor, o Deus do céu, que fez o mar e a terra.” (1.9)

Então ele é lançado ao mar, conforme o proposto antes de jogarem as sortes. Antes, porém, também eles passam a interceder ao Deus de Jonas, reconhecendo que Ele tem força e poder e pode fazê-los perecer (1.14 e 1.16). Mas o Senhor, que não deixa seus projetos inconclusos, havia preparado para ele uma morada no ventre de um grande peixe durante três dias e três noites.

Lá naquela morada diferente, Jonas reencontra-se com Deus e clama por ele. No abismo existencial em que ele se encontra, manifesta sua fé no poder de Deus e seu lamento por talvez não voltar a ver o Templo Santo do Senhor. Jonas é devolvido à terra por ordem do Senhor, que imediatamente lhe renova a ordem de ir a Nínive proclamar contra ela a mensagem que o Senhor lhe mandara.

Agora inicia o nosso texto. A palavra do Senhor vem a Jonas pela segunda vez. O Senhor diz: “Dispõe-te”. Somente essa palavra já permite uma bela atualização. Deus espera disposição no cumprimento de suas ordens. Não é possível anunciar sem convicção e de má vontade. São necessários firmeza e disposição. Dessa vez, Jonas não foge e não discute a ordem do Senhor; apenas obedece.

Ninive era uma cidade muito importante aos olhos do Senhor e bastante grande para os padrões da época. Eram necessários três dias para percorrê-la. Jonas o fez em um dia e diz: “Ainda quarenta dias e Nínive será subvertida” (3.4). Acontece aquilo que certamente é o desejo do Senhor e o temor de Jonas, relatado no capítulo 3.5, que diz: “Os ninivitas creram em Deus, e proclamaram um jejum, e vestiram-se de panos de saco desde o maior até o menor”.

5. Indicações para a pregação

O acento teológico não se encontra no fato de Jonas ter sido engolido por um peixe gigante e ter sido devolvido após três dias. Embora o pregador possa explorar vários aspectos relacionados à clausura providencial de Jonas e seu benefício para a vida conturbada de nosso personagem. Também não considero didaticamente apropriado, para os nossos dias, fazer de conta que não está escrito na Bíblia, quando, na verdade, o inconsciente de nossos membros está habitado pela fantástica história de Jonas.

Ao que tudo indica, é uma história de forte apelo didático e que nos permite várias abordagens do que seria esse peixe que engoliu Jonas. Observamos em todo o AT que, quando Deus escolhe uma pessoa para servi-lo, não aceita evasivas, negativas ou fugas.

Ele, Deus, acompanhou o fugitivo Jonas, providenciando-lhe uma clausura, que no texto aparece caracterizado como a barriga de um peixe gigante. Esse local, afastado do mundo, oferece a Jonas tempo para repensar seu relacionamento com Deus, a sua vida. É lá na clausura que Jonas clama a seu Deus. Ele descreve sua situação angustiante, de abismo, de soli- dão (distante do Senhor) e de desolação em que ele se encontra (2.1-9). O Senhor ouve-o e sua solidão tem fim. Deus revela-se livrando-o de suas tristezas e angústias, ouvindo seu clamor.

Após livrá-lo, Deus retoma seu plano, que havia sido interrompido pela desobediência de Jonas. Deus demonstra uma grande paciência e perseverança. Demonstra de forma muito concreta que ele deseja nosso auxílio para concretizar sua intenção salvífica a toda a humanidade. Ele mostra claramente que a salvação não pertence somente a Israel. Ele, o Deus que criou os céus, a terra e os mares, não faz distinção entre um e outro ser humano. O seu amor é universal e preferencialmente aos afastados de seu amor.

Jonas então obedeceu e foi a Nínive. Pregou com muita convicção. Ele, um profeta estrangeiro, consegue chamá-los à consciência e fazê-los ver suas vidas de pecado. Todos, diz o texto, do menor ao maior, são chamados a arrepender-se de seus caminhos errados, jejuar e vestir-se com sacos, em um sinal de profunda humildade. Inclusive os animais jejuarão e serão cobertos com sacos. Até o rei de Nínive veste-se com um saco e adere ao movimento de conversão, para talvez alcançar a misericórdia do Senhor. Não parece simples barganha, pois há o reconhecimento do pecado e o reconhecimento da condenação.

O v. 5 inicia com o sucesso da campanha de Jonas e do projeto de Deus. Deus não desejava destruí-los. Ele desejava que cressem nele e mudassem seu caminho: “Os ninivitas creram em Deus, e proclamaram um jejum, e vestiram-se de panos de saco, desde o maior até o menor” (3.5).

Após compreender a missão de Jonas e sua relutância à obediência, o pregador poderá levar a comunidade a identificar-se uma vez com o próprio Jonas. Também nós fugimos da presença do Senhor, isolando-nos do convívio comunitário e, muitas vezes, produzindo uma grande solidão, angústia e até falta de sentido na vida, em nosso trabalho e em nossa família. Também nós fugimos das tarefas que Deus coloca diante de nós.

Embora seja fácil condenar Jonas por sua recusa em servir ao Senhor, sob o risco de perder seu prestígio de profeta e de cidadão hebreu, se sua profecia não se cumprir, devido à imensa benignidade do Senhor e seus propósitos de salvação e não de condenação, é possível compreender sua relutância. Jonas conhece bem o Senhor e sabe que é arriscado profetizar em seu nome.

Também nós temos mais facilidades para testemunhar o poder de Deus ao transformar nossas vidas positivamente e ao nos encher de orgulho por servir a um Deus poderoso. Também preferimos não comentar nossos desvios do caminho do Senhor e suas consequências em nossas vidas. Ou, então, aquelas coisas que não compreendemos porque temos que nos sujeitar. Assim como Jonas, gostaríamos de nos esconder no ventre de um peixe e de lá somente sair depois das chuvas e tempestades.

O texto de nossa pregação enaltece sobremaneira o valor do anúncio profético e seu alcance missionário. Da mesma forma, ensina-nos que sempre é possível recomeçar nosso relacionamento com Deus desde que haja reconhecimento de nossas falhas e sincero arrependimento. Também enaltece o grande amor e a enorme misericórdia de Deus, que não deseja a nossa condenação, mas a nossa redenção. “Viu Deus o que fizeram, como se converteram de seu mau caminho; e Deus se arrependeu do mal que tinha dito lhes faria e não fez.”

6. Subsídios litúrgicos

Pessoalmente estou tentada a desafiar o grupo de liturgia para encenar não somente o texto, mas todo o livro de Jonas, dando ênfase à parte delimitada para a nossa pregação. As orações devem aproximar-se do tema da pregação para dar um fio vermelho coeso ao culto.

Esta música, de Lulu Santos, poderá ser usada na acolhida da comunidade.


Como uma onda
(Lulu Santos e Nelson Motta)

Nada do que foi será
De novo do jeito que já foi um dia Tudo passa, tudo sempre passará. A vida vem em ondas como o mar Num indo e vindo infinito.
Tudo o que se vê,
Não é igual ao que a gente viu
Há um segundo
Tudo muda o tempo todo no mundo
Não adianta fingir,
Nem mentir para si mesmo, Agora há tanta vida lá fora Aqui dentro,
Sempre,
Como uma onda no mar, Como uma onda no mar, Como uma onda no mar.

Bibliografia

VON RAD, G. Teologia do Antigo Testamento, volume 2, reimpressão da 1ª edição, 1974, Associação de Seminários Teológicos Evangélicos, 1986.