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Nascida em Getúlio Vargas no Rio Grande do Sul, fui estudar teologia na EST em 2002. Fiz meu estágio em Cuiabá, Mato Grosso, onde tive meu primeiro contato com uma realidade de cidade grande e com pessoas luteranas por profissão de fé. Na sequência fui para Leipzig na Alemanha, com bolsa e todo o apoio da GAW, com a motivação primeira de aprender alemão. Além de conhecer a realidade da Alemanha, poder estudar na universidade e participar de uma comunidade, convivi com estudantes de teologia de outros países que, como nós, vivem uma igreja na diáspora. Além disso, ganhei um parceiro para a vida que veio a ser meu esposo em 2008, Christoph Küstner.

Em 2007 fui designada para fazer o PPHM em Agudo, no Rio Grande do Sul. Uma comunidade bem tradicional de nossa igreja onde os grupos de OASE começavam em português e terminavam em Alemão. Fui ordenada pastora em minha cidade de origem, em 22 de março de 2009.

Fui convidada para ir até Porto Alegre conversar com Cat. Haidi e Diácona Ingrid então Secretária de Ação Comunitária. Com brilho nos olhos, Diác. Ingrid apresentou a comunidade de São Luís. Ao sermos perguntados se aceitávamos o desafio, dissemos: Vamos para o nordeste. Espero que eu consiga demonstrar um pouquinho a mesma paixão e a mesma consciência de realidade que Ingrid tinha quando me apresentou a comunidade na qual sou pastora agora por 5 anos e 6 meses.


A cidade de São Luís

São Luís, capital do Maranhão. Terra de gente alegre, valente e temente a Deus.

São Luís tem aproximadamente um milhão de habitantes. É a 4ª maior do Nordeste, com 94% de sua população residindo na área urbana. Uma cidade muito linda, com praias e belezas naturais, além de um centro histórico que é patrimônio da Unesco. Ela é a capital do Maranhão, estado que está entre os mais pobres e com os piores índices de desenvolvimentos do país. Na capital maranhense podem ser vistas e sentidas as diferenças entre as classes sociais e é espantoso como isso acontece naturalmente.


A comunidade de São Luís: constituição atual e origens

Nesse contexto cresce o desejo de uma experiência diferenciada de igreja. No ano de 2005, um policial criado em família assembleiana encontra no site da IECLB uma proposta de igreja séria e comprometida com o Evangelho, uma igreja diaconal, litúrgica e ecumênica. Era o que ele vinha buscando durante toda a sua vida. Uma igreja para viver a sua fé de forma plena e livre. Ele afirmava: não quero uma Igreja que me manda fazer isso e aquilo, mas quero viver a fé com liberdade. Nesse momento começa a história da comunidade em São Luís da qual muitas/os de vocês tomaram conhecimento ou até parte da sua constituição.

Em quase 9 anos de história, eu sou a terceira ministra e já tivemos três endereços diferentes até nos mudarmos para o nosso templo e moradia ministerial desde fevereiro deste ano. A identidade da comunidade agora pode ser vista também em seu templo e as ações que nele acontecem.


Quem somos hoje

Somos 40 pessoas membro. Temos um projeto diaconal que ensina música para uma média de 40 crianças e jovens por semestre. Somos envolvidos em dois grupos ecumênicos de discussão, o Conselho Ecumênico do Maranhão, constituído no último ano, e na Fraternidade Teológica Latino Americana.

Somos parte da Região Missionária Luterana Nordeste e Belém e do Sínodo Espírito Santo a Belém. Como Região Missionária, temos um Planejamento Estratégico que nos possibilita reunir-nos semestralmente. Como Sínodo, ministras e ministros são acolhidas em encontros de formação e de decisão.


Como vivemos comunidade

“A Igreja Luterana mudou minha vida! Sou uma mãe melhor e sou muito alegre de ver minha filha e meu filho participando da Igreja e se desenvolvendo como pessoas de bem através dos espaços de formação da comunidade. Também sou muito grata pelo trabalho do projeto de música que mudou a igreja”, diz Maria Ieda. Ieda também é membro da comunidade desde o início. Passou por momentos familiares bem difíceis e foi acolhida e amparada pela comunidade em amor e cuidado. A sua filha, Amanda, tem 15 anos e deseja ser pastora da IECLB. Desejo esse fortalecido no Congrenaje – Congresso Nacional da Juventude Evangélica.

Antonio, por sua vez, afirma que “A Igreja Luterana, na minha vida de fé, é tudo, pois é aqui que está a minha segunda família! Para a cidade há uma possibilidade de mostrar um testemunho diferente de Igreja Cristã. Igreja engajada com a realidade. Eu sou um privilegiado por ser parte da comunhão de pessoas cristãs que vivem a sua fé na Igreja Luterana”. Antonio é, em minha opinião, o esteio da comunidade. Com sua tranquilidade e seus contatos ele soluciona problemas, com sua humildade e delicadeza ele conquista pessoas. Tem uma família que é o esteio de sua vida. Tem uma vida de fé que é exemplo para todas as pessoas que o conhecem. Ele diz de si mesmo: “Eu sempre fui luterano, só não era da igreja até 2005.”


Por que é importante ser IECLB em São Luís?

Essa é a pergunta que norteou a minha preparação e essa apresentação. Depois de conhecer um pouco melhor a comunidade, vamos aos pontos propostos: desafios, caminhos, experiências e dificuldades de ser igreja na cidade, na cidade de São Luís.

Desafios e dificuldades: 

Pouquíssimas pessoas nos conhecem! 
•  Não contamos com a credibilidade das pessoas por nossa seriedade;
•  Não contamos com o reconhecimento de nossa história como igreja.

Somos uma comunidade pequena e com poucos recursos!
• Os parcos recursos limitam também muitas ações de divulgação e de visibilidade (retiros e outras atividades também são inviáveis);
• Por ser uma comunidade pequena, as pessoas correm o risco de ficar sobrecarregadas com muitas atividades. Apesar disso, a participação média é de 25 pessoas por culto.

Existem muitas outras igrejas em São Luís!

Caminhos e experiências:

Evangelização
Como comunidade, já aceitamos o fato de que não somos uma igreja de massas. Somos uma igreja de missão no corpo a corpo e no testemunho concreto do amor de Deus. Crescemos? Sim, mas lentamente, com responsabilidade e seriedade com a proposta do Reino de Deus que a nossa Igreja prega e vive. Para que as pessoas tenham condições de divulgar o Evangelho através da proposta da nossa Igreja investimos na Formação das pessoas membro.

Formação
Nas grandes cidades essa é uma das tarefas mais difíceis porque as pessoas não têm tempo. As distâncias e o trânsito, além dos horários de trabalho diferenciados, dificultam os encontros durante a semana à noite. A igreja nas cidades precisa encontrar alternativas a partir da realidade de cada cidade e comunidade. Ir até o local onde as pessoas estão é uma possibilidade, outra é pensar horários alternativos para as atividades. Nós temos um curso de liturgia que acontece dois domingos por mês antes do culto (que é à noite). É preciso ser flexível quando se é Igreja nas cidades.

Diaconia
Nossa fé é diaconal! O projeto de música Dons e sons, que já funciona há mais de cinco anos, contempla uma média de 40 crianças e jovens que fazem aula de violão, percussão, flauta e piano. Também temos dois corais, um de crianças e um de jovens.

Os que participam não precisam ter vínculo com a comunidade, mas a comunidade oferece atividades para esses dois públicos. O grupo de jovens tem hoje uma participação média de 12 jovens por encontro que é semanal. Desse grupo surgiu a música que foi escolhida para ser a música tema do Congrenaje desse ano: Geração JE. 

Esse projeto é motivo de orgulho e gratidão para a comunidade. Como igreja, estamos transformando vidas, descobrindo dons, elevando a autoestima, além de instrumentalizar através da música. Nem temos condições de quantificar todos os benefícios que o projeto traz para a vida dessas crianças e jovens. Vou dar dois exemplos:

Valdecir Junior, aluno do projeto desde 2009, hoje com 17 anos, toca piano, violão, flauta e percussão. Quando iniciou no projeto, ele era um aluno problema na escola. Só tirava notas ruins e dava trabalho para professores. Junior hoje é aluno do terceiro ano do Instituto Federal do Maranhão. Muito dedicado e estudioso, ainda participa de todas as atividades que a comunidade oferece e é professor de piano de 5 alunos/as do projeto de música. Ele deseja ser biólogo.

Marília, aluna do projeto há um ano, encontrou no coral de jovens um local de aceitação e espaço de partilha. Marilia tem uma deficiência que a limita no aprendizado, cantando no coral ela sabe que é igual a todas as outras meninas que estão junto dela.

Esse projeto é também instrumento de missão, pois aproxima a Igreja da realidade das famílias do bairro, além de ser um instrumento de identidade muito efetivo. Nos finais de semana, toda a vizinhança vê a criançada e a juventude com seus instrumentos nas mãos, e no corpo a camiseta do projeto com o símbolo da IECLB. Semestralmente fazemos apresentações envolvendo a comunidade, além das apresentações que fazemos em outros espaços divulgando o nome da Igreja.

Comunhão
Os momentos de comunhão são preciosos e precisam ser criados. Eles são fundamentais para a vida em comunidade. Vocês podem imaginar que por ser uma comunidade nordestina ela é diferente em alguns aspectos e atividades. Vou dar alguns exemplos: não temos OASE e sim Grupo de Mulheres que se reúne uma vez ao mês; ao invés do Kerb, a gente tem a festa junina o que não muda é o fato de comermos muito.

Liturgia
As celebrações são um pouco diferentes do que em uma comunidade bem tradicional do sul do país. A liturgia é a oficial da IECLB, a linguagem, porém, é contextualizada. As pessoas da comunidade se apropriaram da liturgia de tal forma que ela faz parte do seu jeito de celebrar. A pregação é sempre aberta, mesmo que eu não abra, alguém vai levantar a mão no meio e dar sua contribuição. A oração geral já vem preparada de casa, cada pessoa traz o seu motivo de graça ou de intercessão. Isso é muito bonito e marcante, porque as pessoas compartilham sua vida.

Isso tudo sem falar da música. Usamos os HPD, mais o segundo do que o primeiro. Incorporamos os ritmos regionais aprendidos nas aulas. Quem acompanha os hinos é uma parte desse grupo que toca e canta. Temos, no entanto, a clareza de que o canto é comunitário. O grupo ajuda nesse processo, não faz show. E os ritmos são naturalmente criados durante os ensaios que são semanais, porque quem faz a música são os próprios jovens que aprendem durante as aulas. Cantamos nossos hinos, nossa Teologia, ainda que com ritmos adaptados. Inculturação!

 

Como IECLB, nós temos um grande potencial teológico especialmente para as grandes cidades, onde há falta de comunhão, de interesse pela vida da outra pessoa. Há um sem número de propostas de igrejas em que a individualidade se sobressai. As pessoas sequer conhecem quem senta ao seu lado durante a celebração. Nós temos algo lindo que precisa ser pregado e celebrado. Não é fácil e não é rápido, mas é nossa atribuição como igreja de Cristo no Brasil.

Nas grandes cidades nós somos uma em meio a mil outras propostas que são muito parecidas entre si, mudando tão somente o perfil de quem lidera a comunidade. Apesar disso, somos de uma riqueza e clareza teológica que precisam chegar até as Iedas e os Antonios.

A nossa identidade como igreja não está na cor da nossa pele, somos Igreja no Brasil e a diversidade de nosso povo e de nossa cultura também estão em nossas comunidades. Essa é nossa riqueza como igreja e também essa é nossa responsabilidade. Ser Igreja de Cristo no Brasil com tudo o que isso implica.

Quero aproveitar essa oportunidade para em nome de toda a comunidade agradecer a vocês pelo apoio que nos foi generosamente concedido para a construção de nosso templo. Somos uma comunidade cheia de gratidão, alegria e esperança.