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Amados irmãos, amadas irmãs,

uma multidão seguia a Jesus. Quanto mais sinais ele realizava, mais pessoas ele ajuntava ao redor de si. Jesus estava se tornando um pregador famoso não por causa das palavras que anunciava, mas por causa dos sinais que realizava. Muita gente estava ao redor de Jesus. Se fosse nos dias de hoje, certamente Jesus teria milhões de seguidores em seu Instagram, várias solicitações de amizade no Facebook e milhões de inscritos em seu canal no youtube.

Um pouco antes do texto que ouvimos, Jesus havia realizado um grande sinal. No início do capítulo 6 de João, Jesus realizou a grande multiplicação de pães e peixes após atravessar o Mar da Galileia (cf. João 6.1-15). Jesus atravessou para o outro lado do mar com a intenção de descansar, quando é surpreendido por uma multidão faminta. No final das contas, os cinco pães e os dois peixes ofertados por um menino foram multiplicados de tal forma que toda a multidão se alimentou e ainda sobrou comida. As pessoas ficaram maravilhadas, ao ponto de dizerem: “ – Este é verdadeiramente profeta que devia vir ao mundo”. (João 6.14). Interessante que Jesus precisa realizar um grande sinal para que acreditem nele. Porém, “Jesus ficou sabendo que estavam para vir com a intenção de fazê-lo rei à força. Então ele se retirou outra vez, sozinho, para o monte.” (João 6.15). A multidão estava ansiosa por tornar aquele homem alguém famoso e aclamá-lo como Rei. Entretanto, Jesus decide fugir da fama, retirando-se para um monte. A atitude de Jesus é bem diferente daquela de muitos pregadores de hoje que quanto mais sinais acreditam realizar, mais famosos querem se tornar.

No final daquele dia, os discípulos se lançam ao mar quando acontece uma grave tempestade. Os discípulos ficam apavorados. Então, Jesus anda sobre o mar e lhes diz: “ – Sou eu. Não tenham medo!” (João 6.20). Então o barco se encheu de alegria e eles puderam chegar ao seu destino com tranquilidade. Este era mais um grande sinal que Jesus havia realizado entre o povo. Quem não gostaria de seguir um homem com tanto poder? Aqueles sinais realizados por Jesus deixavam a todos de boca aberta.

A multidão possuía uma grande expectativa quanto a Jesus. Se aquele homem poderia realizar todas essas coisas, o que lhe seria impossível? O que Jesus não poderia realizar? O povo poderia tudo se estivesse alinhado com Jesus. E, inclusive, derrubar o opressor governo de Roma seria algo extremamente fácil para Jesus. No fim das contas, a multidão seguia a um Jesus criado em suas expectativas, mas não o Jesus Cristo da realidade que fora, de fato, enviado pelo Pai dos céus.

É por isso que Jesus faz o seu discurso sobre o pão da vida. O pão – além de ser um alimento básico – é um alimento muito importante na história do povo de Deus. No Antigo Testamento, o pão é chamado de maná. O maná foi a principal refeição dos israelitas durante a sua peregrinação no deserto rumo à terra prometida. Nos diz Êxodo 16.35: “E os filhos de Israel comeram maná durante quarenta anos, até que entraram em terra habitada. Comeram maná até que chegaram aos limites da terra de Canaã.” Assim que os filhos de Israel colheram os frutos do seu próprio trabalho, o Maná cessou, conforme Josué 5.12: “Um dia depois de terem comido do produto da terra, o maná cessou, e os filhos de Israel não mais o tiveram; mas, naquele ano, comeram do que foi colhido na terra de Canaã.” Assim, o maná se tornou o símbolo da provisão de Deus. É Deus quem sustenta o seu povo e mantém toda a Criação. Em toda a Bíblia, o pão será sempre a lembrança de que tudo o que possuímos vem do Senhor. Por isso, pão não é apenas o “pão literal”, mas tudo o que temos. Martinho Lutero fala disso no Catecismo Menor ao dizer que “o pão nosso de cada dia” é

Tudo que se refere ao sustento e às necessidades da vida, como por exemplo: comida, bebida, roupa, calçado, lar, meio de vida, dinheiro e bens, marido e esposa íntegros, filhos íntegros, empregados íntegros, patrões íntegros e fiéis, bom governo, bom tempo, paz, saúde, disciplina, honra, amigos leais, bons vizinhos e coisas semelhantes.1

O povo de Deus conhecia muito bem a importância e o significado do pão em sua história. O pão significava o próprio cuidado e era manifestação visível do amor e do cuidado de Deus que sustenta o seu povo, especialmente os mais necessitados como os órfãos, os estrangeiros e as viúvas que poderiam livremente colher dos cereais que sobravam nos campos após a colheita.

Porém, Jesus agora usa o pão para falar do que é central em sua vida e em seu ministério: ele é próprio o pão que desce dos céus. Se os israelitas recebiam diariamente o maná que descia do céu em seus quarenta anos de peregrinação, Jesus é o pão enviado pelo Pai que garante a vida eterna. Porém, isso a multidão não queria ouvir. Queriam ver os sinais e prodígios maravilhosos que Jesus podia fazer, mas não queriam crer em Jesus como Senhor e Salvador.

Aquela multidão não tinha dificuldade em aceitar a humanidade de Jesus ao vê-lo como libertador, como exemplo, como um revolucionário, assim por diante; Jesus percebeu isso. Por isso, o próprio Jesus diz à multidão: “ – Em verdade, em verdade lhes digo que vocês estão me procurando não porque viram sinais, mas porque comeram os pães e ficaram satisfeitos.” (João 6.26). Aquela multidão seguia a Jesus porque estavam de barriga cheia e queiram continuar assim. Pensavam não precisarem de mais nada! O cristianismo para eles seria apenas uma instituição social que alimenta famintos. Só! Mais nada!

Além disso, queriam ser como Jesus. A multidão lhe pergunta: “ – Que faremos para realizar as obras de Deus?” (João 6.28). Nas suas mentes, Jesus era um mágico. Para fazerem igual a ele, bastava aprenderem o truque. Mas então vem a resposta inesperada de Jesus: “ A obra de Deus é esta: que vocês creiam naquele que ele enviou.” (João 6.27). Jesus fala de crer! A conversa fica um pouco mais séria! Mas (como diria Silvio Santos) o povo só acreditaria, vendo! Por isso, dizem a Jesus: “ – Que sinal o senhor fará para que vejamos e creiamos no senhor? O que o senhor pode fazer? Nossos pais comeram o maná no deserto, como está escrito: “Deu-lhes a comer o pão do céu”. (João 6.30-31). Ou seja: “dá-nos uma garantia que continuaremos sendo sustentados por ti e então creremos. Mostra-nos que continuarás a realizar os sinais que nós queremos e então seguiremos a ti. Realize todas as nossas vontades e então serás o nosso messias”, pensava a multidão.

Jesus responde que não foi Moisés quem deu pão ao povo no deserto, mas o próprio Deus (cf. João 6.32). Então Jesus anuncia: “Porque o pão de Deus é o que desce do céu e dá vida ao mundo.” (João 6.33). A multidão com os olhos famintos por grandes sinais, diz: “ – Senhor, dê-nos sempre desse pão”. Era tudo o que queriam. Queriam aquilo que lhes enchesse a barriga; queriam usar a Jesus para terem tudo o que desejavam; queriam que Jesus apenas fizesse as suas vontades pessoais; Jesus não seria o Salvador, mas o “gênio da lâmpada” na qual você esfrega e tem direito a fazer alguns pedidos.

Então, Jesus responde: “ – Eu sou o pão da vida. Quem vem a mim jamais terá fome, e quem crê em mim jamais terá sede”. (João 6.35). Isso eles não queriam ouvir! Por isso, os judeus começam a murmurar entre si (cf. João 6.41). No fim das contas, o povo queria comida, mas não queria a verdade. Com apenas uma pregação, Jesus perdeu toda a multidão que o seguia por não satisfazer seus desejos e suas cobiças pessoais. Jesus não realiza o que as pessoas querem, mas diz o que elas precisam. Ele mesmo é o pão que desce do céu para a salvação de todo aquele que crê em sua obra e o confessa como único e suficiente Senhor e Salvador de suas vidas. Esta era a verdade. Porém, a verdade pode doer nos ouvidos. Agostinho, um dos pais da igreja, diz sobre a verdade: “Amam-na quando ela brilha, e a odeiam quando ela os repreende”2. Neste caso, a verdade os repreendeu.

Por isso, Jesus diz: “Eu sou o pão da vida. Os pais de vocês comeram o maná no deserto e morreram. Este é o pão que desce do céu, para que todo o que dele comer, não pereça. Eu sou o pão vivo que desceu do céu; se alguém comer deste pão, viverá eternamente. E o pão que eu darei pela vida do mundo é a minha carne.” (João 6.48-51). Os judeus supervalorizavam aquele pão que manteve seu povo vivo durante a peregrinação no deserto. Entretanto, aquele pão não lhes trouxe vida eterna. Jesus, porém, agora é o próprio pão enviado por Deus para ser amassado e assado na cruz para conceder perdão e salvação a todos os que creem em suas promessas.

Amados irmãos, amadas irmãs,

não devemos nos preocupar apenas com as coisas deste mundo. A fé cristã não nega o mundo. Porém, nosso alvo é a eternidade. Este alvo é que não podemos perder nem esquecer.

Talvez também nós queiramos Jesus apenas quando ele possui algo a nos oferecer, sem deixar que ele habite e transforme as nossas vidas; talvez queiramos apenas os benefícios de Jesus, mas não o Jesus de fato; talvez enxerguemos Jesus apenas como um grande exemplo a ser seguido. Se este for o caso, o amor a Jesus é substituído por uma mera idolatria a Jesus; talvez queiramos as suas curas e milagres, mas não o perdão dos nossos pecados.

Amados e amadas, muitos querem o pão, mas não querem Jesus; muitos querem os benefícios da fé cristã, mas não querem ouvir a Palavra de Deus; muitos querem participar da comunidade e ter direito aos ofícios, as não querem um compromisso real e verdadeiro com o Senhor; muitos querem que Jesus seja o “gênio da lâmpada”, mas não o verdadeiro e único Jesus Cristo que morreu na cruz para nos salvar de nossos pecados e que ressuscitou ao terceiro dia; muitos querem reduzir Jesus a um mero homem que passou pela terra, mas negam a sua natureza divina. O grande problema é que não existe Jesus pela metade. Ou nós cremos nele como Deus-homem, ou não cremos em Jesus algum.

Muitas pessoas têm pertencido a igreja ou procurado o sentido da sua vida onde é pregado e anunciado aquilo que agrada aos seus ouvidos. Hoje, existe até algo que está sendo chamado de “cristianismo coach” onde os pregadores não fazem nada a não ser inflar o ego das pessoas com mensagens positivas; outros templos estão cheios de pessoas que são enganadas por uma falsa impressão de realização de curas milagrosas; outros seguem ao Jesus que é visto apenas como um revolucionário que passou por esse mundo. O problema é que quando Jesus lhes diz “Eu sou o pão da vida. Quem vem a mim jamais terá fome, e quem crê em mim jamais terá sede”, os ouvidos se fecham à mensagem.

Que Jesus estamos seguindo? O da Bíblia ou dos nossos desejos? Naquele dia, Jesus perdeu a multidão. A mensagem de Jesus não estava errada! O que estavam erradas eram as intenções dos corações dos ouvintes que apenas queriam se beneficiar de Jesus sem um compromisso de fé com ele!

O convite de Jesus a nós hoje é que não aceitemos apenas aquilo que enche a nossa barriga, mas também aquilo que garante a vida eterna! Esta é a mensagem! E, como Jesus, prefiro uma igreja com poucas pessoas ouvindo a mensagem central do Evangelho do que multidões enchendo templos que prometem mensagens positivas, curas ou milagres.

Deus nos ajude a deixarmos Jesus ocupar o centro das nossas vidas! Quem nele crer, terá a vida eterna. Amém!


11º DOMINGO APÓS PENTECOSTES | VERDE | TEMPO COMUM | ANO B

08 de Agosto de 2021


P. William Felipe Zacarias


1 LUTERO, Martim. Catecismo Menor. 16. ed. São Leopoldo: Sinodal, 2011. p. 14.

2 AGOSTINHO, Aurélio. Confissões. São Paulo: Paulus, 1997. p. 210.