Proclamar Libertação – Volume 45
Prédica: João 6.35,41-51
Leituras: 1 Reis 19.4-8 e Efésios 4.25 – 5.2
Autoria: André Martin
Data Litúrgica: 11° Domingo após Pentecostes
Data da Pregação: 08/08/2021
Para este final de semana, em que também temos a comemoração do Dia dos Pais, o texto bíblico de João 6.35,41-51, que nos inspira à reflexão, traz vários aspectos importantes para a nossa vida de fé. Mas, uma vez lendo e comparando nossa perícope proposta com as demais leituras bíblicas (1Rs 19.4-8 e Ef 4.25 – 5.2), salta-nos aos olhos o agir de Deus, dando pão, dando condições ao povo. Em 1 Reis, Deus age, interfere na situação do profeta Elias e com pão o sacia, dando-lhe forças para seguir seu caminho até o monte Sinai. Em João, texto da pregação, o agir de Deus traz o pão da vida, Jesus Cristo, ao alcance de todas as pessoas. Quem o recebe e dele se alimenta pela fé tem a vida eterna. Por fim, o texto de Efésios nos mostra todo um rol de como vivem as pessoas que se alimentam com o pão da vida e em fé o recebem.
O texto tem como contexto o milagre da multiplicação dos pães e peixes no início do capítulo 6. Jesus saciou a fome física da multidão, e por isso ela o segue e continua pedindo por sinais. Jesus mesmo afirma, no v. 26, que o povo o está procurando não pelos sinais, mas pelo pão com o qual ele os fartara. A multidão pede mais um sinal, demonstrando que o anseio dela é pão, pois evoca a lembrança de que Moisés providenciara maná para o povo na travessia do deserto. Jesus, então, dá um passo adiante na sua explanação e fala de um outro tipo de pão, um pão que também desceu do céu, mas, ao contrário do maná, sacia para sempre! Ansiosos por esse pão, o povo pede para que Jesus, assim como Moisés, lhe dê sempre desse pão. Jesus então dá a conhecer sobre qual pão ele está falando.
Vale ressalta que não encontramos grandes diferenças de tradução que mereçam ser ressaltadas. Qualquer das traduções no português servirá como uma boa base. Também não diferem da tradução de Martim Lutero na Bíblia em alemão. Analisaremos o texto por pequenos blocos de versículos.
V. 35 – O versículo inicia com Jesus dizendo: Eu sou […]. No versículo anterior, as pessoas pedem a Jesus desse pão do qual ele estava falando. Neste caso, Jesus é enfático e diz: “Eu sou”. Jesus usa esta expressão “Eu sou” em outros momentos de seu ensinamento também.
Werner de Boor atenta para esse recurso do idioma grego de acentuar o “Eu” como forma de mostrar que ante as muitas opções de pão que talvez se colocassem diante do povo, Jesus detém a exclusividade. Também que Jesus não busca falar de forma abstrata ao povo. Ele quer reafirmar que o pão da vida existe e que é ele. O pão da vida não pode ser recebido de outra forma a não ser em Cristo (BOOR, 1977, p. 199).
V. 41 a 42 – Estes versículos fazem uma ponte com o v. 35, pois demonstram a reação das pessoas quando Jesus se declara como sendo o pão da vida que desceu do céu. A incredulidade toma conta. Os contemporâneos de Jesus não conseguem perceber nele, Jesus, filho de José e Maria, que eles conhecem, o pão da vida descido do céu. Por isso a murmuração contra a afirmação de Jesus. Como ele ousa afirmar que desceu do céu se conhecem o pai e a mãe dele?
V. 43 e 44 – Aqui o “murmurar” da multidão volta à tona. Se o maná acompanhou o povo de Israel na travessia do deserto, o “murmurar” também fez parte dessa travessia. E Jesus se confronta com o murmúrio da multidão ante as suas palavras. Jesus reafirma que somente pode vir a ele aquele a quem Deus trouxer.
V. 45 e 46 – Jesus mostra de que forma as pessoas vem a ele, lançando mão daquilo que os profetas já ensinaram (conforme Isaías 54.13 – Observação constante na Bíblia em Língua Alemã, tradução de Lutero). Jesus reafirma que aquelas pessoas que, da parte de Deus, tem ouvido e aprendido, essas vêm a ele. Os ensinamentos de Deus, dados a partir dos profetas, levam a Jesus Cristo.
V. 47 – Aqui novamente vem uma expressão muito conhecida e usada por Jesus para denotar a importância das palavras que virão: Em verdade, em verdade, vos digo, e aqui a fé é colocada em evidência. Quem crê em Jesus tem a vida eterna. Quem, pela fé, recebe Jesus como o pão da vida tem a vida eterna.
V. 48 a 50 – Aqui Jesus novamente remete à murmuração da multidão reunida. Jesus remete à lembrança do maná do deserto. O povo não estava satisfeito com o pão distribuído por Jesus na multiplicação. Eles querem maná. O pão que Jesus distribuiu matou a fome momentânea. A multidão quer mais. Ela quer o maná, que garantiu a subsistência do povo na travessia do deserto por anos a fio. A multidão quer um sustento mais duradouro. Então Jesus retoma e diz ser ele mais do que a multidão esperava. Ele é o pão da vida. O maná do deserto garantiu sustento por décadas, mas não evitou a morte. Jesus é o pão que desce do céu, assim como o maná, mas quem dele comer não mais perecerá, não mais deixará de viver.
V. 51 – Aqui novamente Jesus inicia com a expressão “Eu sou”. Faz referência a ele mesmo como o pão que procede de Deus, mas ressalta que aquela pessoa que dele comer terá a vida eterna. E Jesus termina o versículo indicando que a sua carne é o pão que ele dará pela vida do mundo.
Dia dos Pais! Penso que não há como fugir de incluir essa data em nossas celebrações. Em muitas comunidades há homenagens. Não queremos colocar a figura paterna como provedora exclusiva do pão, mas é um gancho que poderemos fazer.
Afinal de contas, o que é o pão em nossos dias? Pão é alimento milenar. Símbolo de sustento. No texto do Antigo Testamento, o pão é dado pelo próprio Deus ao profeta Elias, dá forças para a caminhada. O pão físico, o alimento nutricional revigora. Quantas vezes nosso próprio corpo já não pediu pão? E como sentimos quando o pão, sintetizando o alimento, falta. Fome não é algo fácil para lidar, embora muitos pais precisam lidar com a própria fome e com a fome de filhos e filhas sem, muitas vezes, encontrar quem lhes dê uma fatia sequer do famoso alimento.
Jesus se apresenta como o pão da vida, o pão vivo que desceu dos céus. Claro que Jesus está atento para a fome física e, inclusive, aplaca a fome da multidão no milagre da multiplicação dos pães e peixes. Jesus não está alheio às necessidades físicas das pessoas. Mas Jesus dá um passo adiante, abre os olhos daqueles que o seguem e se apresenta como o pão que desceu do céu. Um pão que aplaca a fome e não deixa mais morrer. Encontrar o pão da vida em Cristo Jesus é fruto do conhecimento de Deus. Quem experimenta desse pão da vida tem sua existência transformada e viverá para sempre.
O pão físico nos dá forças para seguir vivendo. Jesus, o pão da vida, nos dá forças não apenas para viver, mas para viver de acordo com os propósitos de Deus, viver de acordo com o que o texto de Efésios nos traz. O pão da vida nos dá forças para vivenciar sinais do reino de Deus já agora e nos leva a viver no reino de Deus na plenitude da eternidade. Comer do pão da vida nos dá forças para continuar divulgando que o pão físico precisa ser concedido a todas as pessoas. Ele nos dá forças para afirmar que o pão físico não pode ser subtraído de outras pessoas.
Deus nos dá o pão da vida, Jesus Cristo, para que vivamos conforme nos é relatado em Efésios. Deus nos dá o pão da vida para que, ao cansarmos, nos restabeleçamos tal qual o profeta Elias em 1 Reis. Como um Pai amoroso que é, Deus quer que todos os seus filhos e as suas filhas experimentem do pão da vida.
Que sejamos todos e todas ensinados por Deus para que, em meio a tantas ofertas de pão, ofertas de sustento, ofertas de alento, escutemos a enfática voz de Cristo ecoando ainda hoje e nos orientando: Eu sou o pão da vida, quem vem a mim jamais terá fome e quem crê em mim jamais terá sede. Se as orientações de Efésios 4. 25 – 5.2 não estiverem sendo vivenciadas, a cristandade não está se alimentando de Cristo, o pão da vida.
• Lembrar que pão é tudo o que está relacionado ao nosso sustento, conforme
explicação dada por Martim Lutero.
• Talvez possamos fazer a pergunta aos pais presentes na celebração: “Como vocês se sentiriam se não pudessem dar o pão de cada dia a seus filhos e suas filhas, à família?
• Por que o pão, ainda hoje, continua não fazendo parte da realidade de muitas pessoas mundo afora e também perto de nós?
Culto Eucarístico, com especial ênfase ao Cristo que diz: “Eu sou o pão da vida”.
Durante a distribuição da Ceia, sugiro cantar: LCI 279 – Comam do Pão, bebam do Cálice.
A exemplo dos Dez Mandamentos, podemos fazer uma adaptação. Lanço uma sugestão:
1. Jesus Cristo diz: “Eu sou o pão da vida”, por isso honra e serve somente a Deus, pois ele te dá segurança.
2. Jesus Cristo diz: “Eu sou o pão da vida”, por isso lembra de orar e agradecer a Deus, pois ele te dá sustento.
3. Jesus Cristo diz: “Eu sou o pão da vida”, por isso tira tempo para te abastecer de Deus, pois só assim sentirás a plena realização.
4. Jesus Cristo diz: “Eu sou o pão da vida”, por isso te abastece desse pão para que haja pleno convívio entre as gerações.
5. Jesus Cristo diz: “Eu sou o pão da vida”, por isso te abastece desse pão para que haja pleno respeito por todas as formas de vida e a morte não encontre espaço.
6. Jesus Cristo diz: “Eu sou o pão da vida”, por isso te abastece desse pão para que o amor e o respeito sejam abundantes nos relacionamentos.
7. Jesus Cristo diz: “Eu sou o pão da vida”, por isso te abastece desse pão para que haja respeito e igualdade de oportunidade tanto na produção quanto na partilha de tudo que nos dá sustento.
8. Jesus Cristo diz: “Eu sou o pão da vida”, por isso te abastece desse pão para que encontres ânimo em relatar toas as coisas boas que tens vivido.
9. Jesus Cristo diz: “Eu sou o pão da vida”, por isso te abastece desse pão para que percebas que Deus te dá o suficiente para viver.
10. Jesus Cristo diz: “Eu sou o pão da vida”; ele te convida e por ti se entrega!
BOOR, Werner de. Das Evangelium des Johannes, 1 Teil, Kapitel 1 bis 10. In: Wuppertaler Studienbibel. 5. ed. Darmstadt: R. Brockhaus Verlag Wuppertal, 1977.
WALDECK, Thomas. In: Homiletische Monatshefte. 82. Jahrgang. Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 2007.
WEIGEL, Edgar. In: Homiletische Monatshefte. 76. Jahrgang. Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 2001.
Proclamar libertação é uma coleção que existe desde 1976 como fruto do testemunho e da colaboração ecumênica. Cada volume traz estudos e reflexões sobre passagens bíblicas. O trabalho exegético, a meditação e os subsídios litúrgicos são auxílios para a preparação do culto, de estudos bíblicos e de outras celebrações. Publicado pela Editora Sinodal, com apoio da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB).