Prédica: Miquéias 5.1-4a
Autor: Günter K. F. Wehrmann
Data Litúrgica: Natal
Data da Pregação: 25/12/1986
Proclamar Libertação – Volume: XII
Tema: Natal
Obs.: O presente auxílio homilético segue os passos indicados no Exercício Homilético – vide p. 91 . O objetivo é exercitar os respectivos passos, a fim de que o leitor possa assimilá-los. O autor ficaria grato por eventuais comentários e estímulos.
Passo 1: Contemplação pessoal
1.1 — Primeiras impressões: A menor cidadezinha desse pequeno povo, ameaçada e oprimida pela superpotência Assíria, não é esquecida por Deus. Ele fala de maneira confortante a seu povo. Anuncia que justamente naquela cidadezinha Belém, insignificante e por isso esquecida por todos, nascerá o novo regente. Esse porá fim ao sofrimento do povo, e então haverá paz. Esse texto transpira esperança, ânimo e força para aguentar.
1.2 – Ver e perceber o externo do texto: Quem fala? Fala o próprio Deus através do profeta.
Quem é o destinatário? A cidadezinha Belém. Comparada com as capitais Jerusalém e Samaria, ela é insignificante e, por isso, marginalizada. Como tal ela representa toda uma situação de marginalização e insignificância do povo de Judá e Israel, ameaçado e oprimido pela superpotência da Assíria. Estabeleço uma ponte para uma cidadezinha rural ou vila qualquer do interior do Brasil, ou, quem sabe, penso naquelas famílias sem-terra, acampadas na Fazenda Annoni. Tão marginalizado é o endereçado, mas agora é lembrado por Deus.
O que está escrito (linha de pensamento)? Justamente naquela cidadezinha da margem, Belém, nascerá o novo regente. Ele será diferente; pois suas origens são desde os tempos antigos (v. 1).
V. 2: Ele os entregará – será que isso significa que ele os deixa sofrer até determinado tempo, até a hora do nascimento desse regente? Aliás, essa figura do parto é muito significativa: ela me faz lembrar de Jo 16.21, onde o sofrimento do tempo de pré-parto perde sua importância diante da alegria do tempo pós-parto. O nascimento desse regente trará alegria para o povo sofrido. Isso está exposto pela figura do voltar (para casa). Esse regente fará voltar os irmãos restantes, os dispersos, os desalojados. Voltar para casa – que figura profunda! Ela expressa o fim do desenraizamento, o fim da migração, o fim da saudade. Quem vive longe do seus familiares e longe de sua terra natal, sente a profundeza dessa esperança!
V. 3: Esse regente será diferente dos que se conheciam até agora. Ele não vacilará diante do jogo de interesses político-econômicos, não se venderá às poderosas superpotências; mas se manterá firme na preocupação com o bem-estar de seu povo. A figura do apascentar expressa essa preocupação. Porém, essa figura, tantas vezes já abusada, entrou em descrédito por causa de tantos mercenários que se enriqueciam às custas do povo, assegurando sua roubalheira com o poderio de exércitos. Porém, esse regente que virá será diferente – ele apascentará na força do Senhor, na majestade do nome do Senhor. Ele sujeitar-se-á totalmente a Deus e nessa sujeição estará sua autoridade, liberdade e força para promover o bem-estar do povo sofrido e explorado. Por isso, ele não necessitará de armas e exércitos (Mq 4.3), mas fará o desarmamento total, transformará espadas em relhas de arado. Então, esse povo terá terra para plantar e se sustentar, sem que outros roubem a colheita; então, esse povo terá terra e casa para morar sossegadamente, sem que outros venham invadi-la ou arrombá-la. Essa figura do habitat seguro é bem concreta e atual. Assim, esse regente promoverá vida boa para todos, especialmente para os que menos a têm (aquela gente de Belém e aqueles irmãos dispersos).
Esse reinado não passará desapercebido diante das nações, mas será visto e reconhecido e o regente será engrandecido em todo o mundo.
V. 4a: Por isso, esse regente será a paz. Assim está claro que paz não é apenas um sentimento interior, mas é bem concreta; é voltar para casa, é desarmamento, é terra para plantar e morar sossegadamente, é vida boa, promovida pelo novo regente. Por isso, ele mesmo é a paz!
1.3 – Ver e perceber o interno do texto: Qual é o Evangelho? À primeira vista, todo o texto parece ser Evangelho. Deus vê a cidadezinha marginalizada e os dispersos, longe de sua terra natal. Deus vê o sofrimento de seu povo ameaçado. Deus vê todos aqueles que sofrem ameaça, marginalização e opressão; ele vê também a mim que sofre saudades dos familiares em terra distante. Deus mesmo porá fim a todo e qualquer sofrimento, quando lá, na margem, nascer o novo regente. Contrário a qualquer experiência e expectativa humanas, a salvação virá da margem. Esse novo regente será o verdadeiro pastor; unificará o povo separado e disperso; promoverá terra e moradia segura para todos; fará com que as armas da morte sejam transformadas em relhas de arado (isto é, instrumentos para produção de alimentos). Todos terão nele paz concreta e completa.
Conforme o texto, o novo regente ainda não nasceu, mas está por vir; por conseguinte, o sofrimento atual é passageiro. E depois de o regente ter nascido, a alegria pela paz será tão grande que não mais haverá lembrança do sofrimento passado. Sabemos que esse novo regente nasceu no Natal, lá em Belém. Com ele irrompeu o Reino da Paz. Pois ele promoveu aceitação, justiça e paz, principalmente para os pequenos, fracos e marginalizados. Isso o levou à morte na cruz. Mas Deus o ressuscitou. Assim, a vida já teve uma vez a vitória sobre o poder da morte. Sabemos também que, desde a Páscoa, a vida terá definitivamente a última palavra sobre a morte – isso dar-se-á no segundo e definitivo Natal, quando Cristo voltar.
Qual é a Lei? À luz desse Evangelho, reconheço que, muitas vezes, vivo como se ainda não tivesse havido Natal, como se o rei da Paz ainda não tivesse vindo. Lembro de minha inércia e indisposição para perdoar a esposa, as filhas e os colegas; muitas vezes uso minha capacidade de argumentação para me auto-justificar e acusar os outros; muitas vezes acomodo-me com a situação de marginalização de pequenos e fracos, com a situação de guerra camuflada ou aberta, seja na família, no lugar de trabalho, na igreja, no país e no mundo. Sim, à luz desse Evangelho, reconheço quão distante vivo dessa nova realidade de paz que, desde o Natal, irrompeu em nosso mundo.
Esse reconhecimento de culpa leva-me de volta para Cristo. Ele me aceita e perdoa. Ele me liberta do conformisrno com a falta de paz, na minha vida familiar, profissional e social.
Qual é o Imperativo? À luz desse Evangelho, sinto-me impelido a ser instrumento de paz que Deus quer promover, hoje já, em forma de sinais concretos e visíveis. Cristo mesmo quer desarmar o meu espírito, a fim de que eu saiba dar o primeiro passo para a reconciliação com meus familiares e colegas de trabalho. Ele me quer libertar do medo diante da opinião pública, assim que eu saiba denunciar corajosamente a institucionalização da marginalização, da não-vida e guerra, tanto na igreja quanto na sociedade. Ele me quer usar como instrumento facilitador, assim que a comunidade reconheça e assuma o seu papel de pacificadora, a nível familiar, social e político. Ele quer que, em conjunto, lutemos pela Reforma Agrária, pela Constituinte e pelo desarmamento em nosso país.
1.4 – Resumo em frases provisórias:
Todo o texto parece ter o intuito de animar e fortalecer o povo ameaçado e sofrido. Faz isso pelo anúncio do novo regente que nascerá na margem insignificante. Esse erguerá o reino da paz, promovendo a volta dos dispersos, a habitação segura e apascentando (governando) o povo na força do Senhor (sem poderio armamentista). Esse Evangelho implica Lei, ou seja, a denúncia de todo e qualquer tipo de poder armamentista e marginalização. Ao mesmo tempo, esse Evangelho implica Imperativo, ou seja, o comprometimento com a luta pela paz, a nível familiar, comunitário e sócio-político.
Passo 2:
Labor exegético
2.1 – Esclarecimentos exegético-históricos:
2.1.1-Texto:
v. 1: Mas tu, Belém Éfrata (1),
pequena (insignificante) entre os clãs (2) de Judá,
de ti sairá (3) para mim
aquele que reinará (4) em Israel.
Suas origens são de tempos antigos,
de dias imemoráveis.
v. 2: Por isso ele (o Senhor) os entregará (5)
até o tempo em que a parturiente dará à luz. Então, o restante de seus irmãos voltará para os filhos de Israel (6).
v. 3: Ele estará ali e apascentará (o seu rebanho (7)) na força do Senhor, na majestade (8) do nome do Senhor, seu Deus. E eles se estabelecerão (seguros) (9). Sim, agora ele se tornará grande (10) até os confins da terra.
v. 4a: E este será paz (11)!
Notas esclarecedoras ref. à tradução:
1. Segundo Wolff (p. 103) e Maillot (p. 115), trata-se da aldeia de Belém de Judá, terra natal de Davi, 7-9 km ao Sul de Jerusalém, mas não da aldeia de Belém Zebulon.
2. A tradução literal seria os milhares de Judá – aqui isso designa o clã, grupo intermediário entre família e tribo (cf. Maillot, p. 116 e Wolff, p. 116). Isso fundamenta a tese de que o termo pequena deve ser entendido numericamente como insignificante para fins militares. LXX lê não é a menor (leitura adotada em Mt 2.6); mas isso me parece ser já uma interpretação posterior.
3. Conforme Gesenius, o verbo sair pode designar também uma concepção ou um nascimento (Gn 17.6).
4. Assim traduz Wolff (Mit Micha reden, p. 103). Outras traduções ou são por demais complicadas ou dão margem a assimilações indesejadas (como p. ex. na Bíblia de Jerusalém: será dominador em Israel).
5. Cf. Almeida! Wolff (p. 117) interpreta no sentido de entregar nas mãos dos inimigos – isso significa que Javé os deixa ainda sofrer sob o poder dos inimigos até que nasça o novo regente da paz. A Bíblia de Jerusalém traduz abandonará que, embora forçando um pouco o original, vai na mesma direção. Maillot (p. 115) traduz libertará o que, a meu ver, está fora de cogitação; com isso toda a sua tradução do v. 2 fica dúbia.
6. Restante de seus irmãos certamente se refere ao novo Israel (os reinos do Norte e do Sul reunificados).
7. Trata-se de um acréscimo de LXX – muito bom para a melhor compreensão. Maillot (p. 115) traduz governará o que na intenção está correto, mas é uma pena em termos homiléticos, visto que perde a figura do apascentar que define o tipo de governar.
8. Pode ser traduzido também por grandeza. A Bíblia de Jerusalém traduz por glória o que não confere com o original.
9. Trata-se de estabelecer moradia segura.
10. Isto é, sua fama crescerá.
11. Almeida, baseado em LXX e T, lê será a nossa paz (cf. Ef 2.14) o que já é muita interpretação; seria melhor ler ou Este promoverá paz (cf. Wolff, p. 101) ou E eis, será a paz (cf. Maillot, p. 124).
2.1.2 – Forma:
O livro de Miquéias, em sua forma definitiva, reflete diferentes épocas e situações; nem todas coincidem com o tempo de atuação do profeta (725-701). O oráculo contra Samaria (Mq 1.2ss.) deve ser anterior à destruição, ocorrida em 721. O oráculo contra o Sião (Mq 3.9ss.) provavelmente aponta para 701, época em que os assírios sitiaram Jerusalém; mas certamente ele foi relido antes da catástrofe de 587. Porém, segundo A. Weiser'(p. 229), a liturgia profética (Mq 7.8-20), que supõe a destruição de Jerusalém, aponta para o tempo pós-exílico. Com isso já fica claro que a forma literária do livro é bastante complexa e complicada.
Wolff (p. 104-110) mostra que nossa perícope faz parte de um bloco maior (4.9 – 5.5); trata-se de uma coleção de 3 ditos de agora (Jetzt-Sprüche). Esses ditos iniciam cada vez (4.9; 4.11; 4.14; 5.3b?) com a exclamação agora!; segue uma descrição da situação de necessidade e ameaça; segue um (ou mais) imperativo e uma promessa de salvação/libertação. Os primeiros dois ditos se referem a Sião (Jerusalém), da mesma forma o início do terceiro (4.14); descreve a situação de ameaça e sofrimento de Sião. Porém, 5.1 se dirige a Belém, cidadezinha insignificante em termos políticos e militares. Mas justamente lá, na margem, há de nascer o novo regente que libertará da Assíria (5.5). Assim sendo, se pode pensar que esse terceiro dito também aponte para a situação de 701. Porém, Wolff vê no texto diversos encaixes literários que até apontam para a época pós-exílica (p. 110).
Não temos condições de esclarecer satisfatória e exaustivamente a questão literária. O que nos interessa com vistas à prédica é o seguinte:
– A delimitação da perícope deveria abarcar 4.14 – 5.5. Porém, para fins homiléticos a delimitação (5.1-4a) nos parece possível, desde que se tenha em mente o todo da perícope.
– Já a forma evidencia que o nosso texto fala para dentro de uma situação de extrema ameaça interna e externa; ele objetiva consolar e fortificar o povo sofredor, com o anúncio do nascimento de um novo regente que salvará/libertará seu povo. O v. 2 (conforme Wolff, p. 117) é um acréscimo posterior, com a finalidade de explicar ao povo sofredor (de 587) a demora da vinda do novo regente. Nesse sentido, o nosso texto não usa o termo Messias, nem o termo rei, embora o conteúdo tenha caráter messiânico – isso talvez para não suscitar novas desilusões.
– Ainda nos chama a atenção o fato de que o nosso texto é a única profecia messiânica que indica a origem do Messias como sendo Belém Éfrata (e não a capital!), terra natal de Davi.
– Finalmente importa destacar que o nosso texto tem caráter litúrgico (cf. Wolff, p. 110).
2.1.3 – Lugar
Já a partir da forma vimos que não é tão fácil especificar o tempo exato em que cada dito foi proferido originalmente; pode ter sido por volta de 722, de 701, ou até por volta de 587, dependendo do texto, respectivamente da releitura do mesmo. O nosso texto pode estar ligado somente às duas últimas datas. Elas têm muitas características em comum; até se pode dizer que 701 é um prelúdio da grande catástrofe de 587.
A situação sócio-política é desesperadora. Os ricos poderosos exploram os pobres e fracos, roubando os seus campos e as suas casas (2.1 ss.). O rei (com seus funcionários), já há muito tempo, deixou de ser o pastor que serve ao povo (aliás, nunca o foi satisfatoriamente – nem Davi!); pelo contrário, explorava o povo. O palácio e exército tinham que ser pagos com o suor do povo; por isso, Miquéias sonha com a transformação de espadas em relhas de arado, ou seja, com o desarmamento em benefício da produção de pão (4.3). Os reinos do Norte e do Sul já perderam sua autonomia e se tornaram vassalos da Assíria e, quem sabe, muitos já tenham sido deportados para o exílio.
A situação religiosa é calamitosa. Javé, já há muito tempo, havia deixado de ser Senhor na vida dos chefes e sacerdotes. A injustiça social era sancionada e legitimada religiosamente. A falsa profecia andava solta.
Em meio a essa situação, Miquéias tinha a árdua e ingrata tarefa de anunciar o juízo de Javé, tanto contra Israel quanto contra Judá (cap. 1). Mas chama nossa atenção que esse juízo é dirigido principalmente contra os líderes políticos e religiosos de Israel e Judá (3.1). Esse juízo implica a destruição de Samaria (1.6), a destruição de Jerusalém (3.12) e o exílio babilônico (4.10); implica também o imperativo de praticar justiça e amar a misericórdia (6.8).
O juízo parece ser tão duro e irreversível que somente resta esperar que nos últimos dias (4.1 ss.) Javé mesmo reerguerá o Sião. Então, Javé mesmo fará nascer um novo regente que apascentará o povo; fará voltar os dispersos e promoverá terra e moradia seguras; será esse regente (e não os coronéis que o povo desejaria escolher) pelo qual Javé libertará seu povo do jugo dos inimigos opressores e ocupadores (5.1-5).
Com isso passemos a enfocar mais de perto a palavra de nossa perícope, ou seja, seu conteúdo teológico.
2.1.4-Palavra:
Considerando o que vimos sob o item Forma e, considerando a necessidade de estabelecer uma ponte direta entre o Evangelho, contido em 5.1-4a, e a situação para dentro da qual se dirige esse Evangelho, parece-nos indispensável enfocar também um pouco Mq 4.14; pois, ali começa o terceiro dito de agora.
Mq 4.14: Como já vimos, refere-se a Sião. Começa com um imperativo cuja tradução é dúbia em alguns aspectos (cf. Maillot, p. 110-113 e Wolff, p. 102s. e 105s.), fato que vamos desconsiderar agora. Interessa-nos, porém, que Sião, capital fortemente armada, está cercada pelos inimigos e o rei (juiz de Israel) sofre uma terrível humilhação (batem em sua face com uma vara ou o próprio cetro). A tal ponto chegou a ameaça externa! O próprio rei e seu exército estão chegando ao fim. Da capital, símbolo do poder político, religioso e bélico, não mais se pode esperar absolutamente nada. Os líderes não mais têm poder de explorar o povo, nem poder de assegurar seus próprios privilégios, nem poder de se defender contra os inimigos estrangeiros. Com isso, a situação do povo, já oprimido pelos próprios governantes, torna-se pior ainda; pois, agora ele passa a ser explorado e pisado também pelo poder estrangeiro. Portanto, humanamente falando, agora realmente tudo está perdido por causa da transgressão de Jacó e dos pecados da casa de Israel {1.5), principalmente por causa dos chefes da casa de Jacó e magistrados da casa de Israel (3.1; 3.9ss.) que exploravam e oprimiam o povo.
Essa situação de sofrimento e ameaça interna e externa devemos ter em mente, ao lermos a promessa messiânica que segue!
Mq 5.1:0 mas, no início da frase, expressa o contraste entre a situação desesperadora e a mensagem de esperança que o profeta deve anunciar em nome de Javé. O endereçado não é Jerusalém, residência da dinastia de Davi, mas o destinatário, é Belém Éfrata, cidadezinha natal de Davi, cujo pai, Jessé, era membro do clã Éfrata (1 Sm 17.12). Pois, a dinastia de Jerusalém está prestes a findar, ou já findou. O profeta parece aludir para a antiga liturgia que profetizava a vinda de um novo rei (Is 11.1), mas evita esse termo desgastado; fala, porém, em aquele que reinará em Israel e logo explica sua origem (v. 1 b) e seu jeito de reinar (v. 2b ss.) para que não possam surgir mal-entendidos. Lá de Belém, já esquecida e ignorada – tão insignificante ela era em termos sócio-políticos e militares – deverá sair (surgir, nascer) o novo regente salvador e libertador. Parece que Javé tem uma preferência pelo insignificante e pequeno para conduzir sua história salvífica. Ele escolhe de um clã insignificante o Gideão (Jz 6.15); escolhe Davi, o pequeno (= o mais novo) entre os irmãos (1 Sm 16.11-13); conforme Is 60.22, o mais pequeno virá a ser mil, e o menino a ser uma nação forte. Em nosso texto, fala-se do lugar insignificante, do qual ninguém espera coisa grande, mas do qual sairá o novo regente. Novamente Javé inicia sua obra messiânica no lugar não-glorioso, em meio a gente pequena (cf. Wolff, p. 116). Suas origens remontam ao efrateu Jessé, a tempos antigos, a dias dos quais não mais se tem lembrança (não é de se admirar que o evangelista João até pensa na pré-existência do logos (Jo 1.1ss.). (…) de ti sairá para mim – isso significa que o novo regente não reinará para si mesmo e em benefício próprio, mas sim, reinará para Javé, em responsabilidade diante dele e conforme a vontade dele. É óbvio que isso redundará também em salvação, libertação e bem-estar do povo.
Mq 5,2: A vinda desse libertador, tantas vezes celebrada antecipadamente desde Isaías, está demorando. Em última análise, não importa muito para a prédica, se pensamos na situação de 701 ou 587 – em último caso o desespero seria ainda mais radicalizado. Sensibilizado com tamanho sofrimento, provocado pelo pecado de todo o povo (mas principalmente pelos chefes), e comprometido com a santidade de Javé, o profeta constata que Javé mesmo permitiu essa calamidade e a continua permitindo até o prazo definido. O verbo NATAN significa entregar nas mãos dos inimigos. Com isso é expressa a dureza do juízo (lei) que já vimos de outra forma em 4.14. O profeta não omite essa dureza, mas a enfrenta. Porém, enfoca essa realidade com o intuito de dar forças para aguentar. Por isso, usa a conhecida figura do parto. Antes da parturiente dar à luz, ela sofre; mas o fim do sofrimento é previsível, está próximo (e isso ainda mais, quando as contrações já aumentam de ritmo!). Após ter dado à luz, a parturiente nem mais se lembrará dç sofrimento de antes – tão grande é a alegria de ter dado à luz a um (a) filho (a). É muito provável que o profeta esteja lembrando Is 7.14, onde se trata também de uma parturiente, de um tempo de espera e também de um resto que voltará (Is 7.3). Com o nascimento termina o tempo de sofrimento e lamentação e inicia o tempo de libertação e alegria.
É óbvio que desse tempo de libertação fará parte a volta dos irmãos dispersos (ou exilados), a fim de que se realize a reunificação das famílias, dos clãs e do povo (Israel e Judá). Então, a escravidão e exploração terminaram. A saudade pela casa e família e pelo aconchego, a saudade pela paz terminou – chegou a sua finalidade. Quem vive longe de sua terra natal e de seus familiares, sabe imaginar o que isso significa!
Mq 5.3: Então, ele (o novo regente) apascentará o seu rebanho. No antigo Oriente, a figura do pastor de ovelhas era bem conhecida por todos, pois fazia parte da experiência cotidiana do povo. Essa figura foi utilizada para denominar a tarefa do bom regente, que era: conduzir, proteger e alimentar o seu povo. Já os antigos juizes tinham recebido de Javé a tarefa de apascentar seu povo (2 Sm 7.7); o mesmo era dito de Davi; em Jr 23.1-4 fala-se, pela primeira vez, do vindouro regente que será o bom pastor sobre Israel; do vindouro descendente de Davi, como único pastor para apascentar o povo, fala-se também em Ez 34.23 – esse será instituído por Javé. Nessa linha de pregação de Ezequiel (que deve ser situada após 587) está o nosso texto (cf. Wolff, p. 118).
Esse novo regente apascentará na força do Senhor, ou seja, Javé mesmo o instituirá ern seu cargo e o equipará com seu poder (confere-lhe Bevollmächtigung); ele apascentará na majestade do nome do Senhor, seu Deus – isto é, reinará em responsabilidade diante de Deus, ou seja, em plena conformidade com a vontade de Deus. Conduzindo, protegendo e alimentando o povo, esse regente se sujeita à majestade de seu Deus.
Esse regente vislumbrado se tornará grande, já agora. Eis, o mistério do futuro, presente no agora. Esse regente crescerá em fama, importância e reconhecimento, como cabe ao regente universal. Até os confins da terra (mais uma formulação típica para a época exílica e pós-exílica) esse regente exercerá seu ministério pastoral que abarca todas as nações. Ele garantirá, pela força de Javé, que todos se possam estabelecer, ter moradia para morar e terra para dela tirar o sustento. Ninguém precisará ter medo de assaltadores ou exploradores. Todos poderão viver seguros por causa desse regente, instituído e equipado com poder por Javé. (Esses pensamentos se baseiam parcialmente em Wolff, p. 119).
Mq 5.4a: Por isso, o novo regente, será paz; paz de maneira bem concreta e existencial (como acima descrito). Essa mesma ideia é continuada no v. 5b onde é dito que esse regente salvará/libertará da Assíria. Wolff mostra que não é incomum denominar de Assíria o conquistador estrangeiro mesmo sendo em época babilônica ou persa.
2.1.5 – Intenção:
O profeta, sensibilizado com tamanho sofrimento do povo, quer que esse reconheça, em meio a toda essa desgraça, a mão bondosa de Javé. Quer que o povo perceba o juízo de Deus como estando prestes a terminar e se transformar em libertação que Deus vai promover, através do novo regente de Belém. Quer que o povo perceba o mistério divino que se mostra na pequenez e insignificância de Belém Éfrata. Quer que o povo aguente mais um pouco, até o regente nascer. Quer que o povo, desiludido com tantos reis mercenários e com tantas promessas falsas de paz, coloque toda a sua esperança nesse novo regente que será o bom pastor e a paz em pessoa; ele será diferente de todos os reis que se conhecia. Ele apascentará como Deus quer; fará voltar os dispersos; unificará famílias, clãs e o povo; promoverá terra e casa segura para todos; ele será grande e reconhecido a nível universal. Por isso, ele será a paz personificada. Se o povo se deixar fascinar por essa visão, ele terá forças para aguentar as dores do parto até que esse reino de paz venha; terá forças para resistir a toda falsa profecia de paz, baseada em negociações interesseiras; terá forças para enxergar, apesar da realidade triste e desesperadora, o futuro de Deus. Assim, o povo não mais se deixará enganar ou persuadir por lobos vestidos com pelo de ovelha.
Ao celebrar essa liturgia de esperança, o povo sofrido e pisado já pode experimentar um antegozo da libertação e paz.
2.1.6 – Crivo pelo Novo Testamento
Em Mt 2.6, é citado parcialmente o texto de Mq 5.1a: E tu, Belém Éfrata, terra de Judá, de modo algum és o menor entre os clãs de Judá. Chama atenção que o evangelista Mateus já inverte o texto original que afirmava que Belém de fato era pequena. Com essa interpretação, ele sublinha o cumprimento da promessa de Miquéias; pois, com o nascimento de Jesus, o Messias já saiu de Belém. Mateus prima em provar que em Jesus as promessas do AT se cumprem.
Em Lc 2.7, a pequenez do lugar do nascimento é ainda mais radicalizada pelo fato de Jesus nascer num estábulo (em meio a animais e esterco).
Em Jo 10, Jesus é testemunhado como o Bom Pastor que dá a vida pelas ovelhas, e sua missão é resumida no promover vida em abundância para todos (Jo 10.10).
Em Ef 2.14, o autor afirma que Jesus Cristo é a nossa paz (observe-se no verbo o tempo de presente!).
Finalmente convém eliminar um mal-entendido em relação ao conceito de paz no NT. Vimos que paz no AT abarca todas as esferas e necessidades da vida, as individuais e coletivas, as espirituais e materiais e também as sócio-políticas. Mas há quem pense que paz no NT se refira apenas à esfera individual e espiritual. Isso, porém, não confere com o testemunho do NT. Lembremos, p. ex., que Jesus, além de perdoar pecados, curou doentes, saciou famintos e também denunciou estruturas e leis injustas e opressoras (Mt 23.14, 23). Em última análise, justamente essa concreticidade no promover a paz foi o motivo de escândalo que o levou à morte na cruz.
2.2 – Resumo teológico
2.2.1 – Intenção:
Através do anúncio da vinda do Messias da Paz, o profeta quer que Deus fortaleça a fé e a esperança de seu povo sofrido, abalado e desesperado. Meu pequeno povo sofrido, aguente mais um pouco! O Messias da Paz já vai nascer!
2.2.2 – Querigma:
De Belém Éfrata, da margem da qual, humanamente falando, não pode vir salvação/libertação, justamente de lá Deus fará sair o Messias da Paz. Antes de ele nascer, o povo ainda sofre as dores de parto. Mas depois do parto não mais haverá lembrança do sofrimento anterior. Pois, ele (o Messias) fará voltar os irmãos dispersos (ou exilados), reunificando famílias, clãs e o povo; apascentará em responsabilidade e autoridade o seu povo e fará com que todos tenham casa e terra para viver segura e dignamente. Ele será a paz em pessoa e por isso respeitado e reconhecido por todos e em todos os lugares do mundo. Com Jesus Cristo, o Messias, o Reino da Paz já irrompeu de forma concreta.
2.2.3 – Proprium:
Comparando com outros textos messiânicos (p. ex. Is 7.14; 9.1-7; 11.1-10), essa promessa é a única que menciona a origem do Messias: cidadezinha insignificante Belém Éfrata; identifica o sofrimento como permitido por Javé, mas o interpreta como tempo de breve espera, tempo de pré-parto. (Com outros textos, o nosso concretiza o Reino da Paz pelo voltar para casa, pelo estabelecer-se e pela figura do apascentar).
Passo 3: Reflexão homilética
3.1 – Definição das demais leituras bíblicas:
a) Salmo de intróito: SI 96 (o povo entoa um cântico novo porque o Senhor reina), (ou palavra de intróito: Jo 1.14a).
b) Epístola: Tt 3.4-7 (a comunidade entoa a doxologia porque no Batismo Deus nos ofereceu salvação e justificação).
c) Evangelho: Lc 2.15-20 (os marginalizados pastores do campo são os primeiros que recebem a Boa Nova natalina, enxergam o Salvador e se tornam suas testemunhas).
3.2 – Reflexão homilética:
Obs.: Nesse passo importa ser específico e concreto! Por isso não viso a uma comunidade fictícia ou padrão, mas a comunidade que atual-mente melhor conheço por fazer parte dela. Refiro-me à Escola Superior de Teologia (EST) da IECLB.
3.2.1 – A situação da comunidade-alvo, à luz do texto e evento litúrgico:
a) Quem são os ouvintes? São estudantes brasileiros (as) e estrangeiros (as) – desde novatos até formandos. São professores (as) brasileiros (as) e estrangeiros (as) – teólogos e não-teólogos. Todos esses provêm dos mais diferentes contextos do Brasil ou do exterior. São funcionários (as). Além disso, são pessoas amigas da redondeza da EST, situada no Morro do Espelho, em São Leopoldo/RS.
Para que vivem e trabalham? Quase todos os ouvintes estudam, trabalham e ensinam, a fim de facilitar o preparo de pessoas para o ministério catequético e do ministério pastoral, nos multiformes contextos de trabalho da IECLB (e fora dela).
Com que se alegram, sofrem e lutam? Alegram-se com a beleza da natureza no Morro do Espelho, com os sinais de integração e comunhão que porventura experimentem na EST. Sofrem e lutam com as exigências acadêmicas, com as absolutizações e polarizações de posicionamentos teológicos, com a desconfiança e o desamor que se instalam entre corpo discente e corpo docente. Muitos anseiam por sinais concretos de paz e justiça em nossa sociedade brasileira e latino-americana (p. ex. em termos de Reforma Agrária, distribuição mais justa da renda e Constituinte).
b) Ouvintes X texto X evento litúrgico: Os ouvintes esperam ouvir uma mensagem de esperança, paz e amor (como todo mundo o espera nesse dia de Natal). Ao ouvirem o texto de Miquéias, provavelmente muitos não captarão a dimensão de escândalo de que o Messias virá da margem; pois, durante séculos, a manjedoura foi por demais enfeitada e romantizada.
Justamente no Natal, muitos carregam consigo a ansiedade e saudade por mais comunhão fraterna na família, no convívio da EST, na IECLB; sentem-se frustrados porque, apesar do pacote econômico de 28/02/86, os poucos grandes e poderosos continuam a se impor sobre os muitos pequenos e fracos. O medo de uma catástrofe nuclear paira no ar (desde Chernobyl). Sonhamos com o desarmamento e uma ordem socio-político-econômica mais justa a nível mundial.
Alguns, especialmente os estrangeiros, sofrem saudades de seus familiares e sua terra natal. Um casal perdeu, nesse ano, uma filhinha e um estudante perdeu sua mãe; o respectivo lugar desses entes-queridos está vazio, nesse Natal – isso faz sangrar novamente feridas recém cicatrizadas.
Tudo isso abarca perguntas teológico-sistemáticas que precisam ser decodificadas e respondidas; isso tentaremos no item 3.2.2.
c) Interpretação exemplar: Por causa da delimitação de espaço disponível, restringimo-nos a algumas considerações básicas, sem entrar em detalhes, como: interpretações exemplares na literatura, arte, etc.
Já é lugar comum pensar na comercialização do Natal que a sociedade moderna de consumo promove com muita habilidade, através da propaganda comercial nos meios de comunicação de massa. Porém, é importante decodificar o clamor por paz, felicidade e amor que é expresso de maneira multiforme. É necessário desmantelar os ídolos que prometem vida feliz, mas não o cumprem; pois, não pensam em nossa felicidade, mas visam tão-somente ao próprio lucro.
Igualmente é lugar comum pensar no pinheirinho e presépio de Natal que, com suas luzes, normalmente ofuscam a verdadeira luz de Natal. Porém, não é sábio simplesmente condenar os símbolos por estarem esvaziados ou alienados; antes importa resgatar seu verdadeiro sentido, pois a fé necessita de símbolos.
Em cultos natalinos, muitas vezes, ouvimos a leitura de profecias messiânicas. Estamos acostumados a ouvir Mt 2.6, onde o escândalo da marginalidade e insignificância de Belém (características de Mq 5.1) foi eliminado. Portanto, pregar sobre Mq 5.1 ajuda a resgatar o mistério natalino que se encarna na margem da sociedade.
3.2.2 – Reflexão teológico-sistemática:
a) O movimento a partir da comunidade para o texto: Se Cristo é o Messias prometido, por que ainda tem tanta não-paz, injustiça, guerra, sofrimento e morte? Como ele promove paz hoje, já?
b) O movimento a partir do texto para a comunidade: O texto afirma que agora ainda é tempo de pré-parto. Deus ainda permite que os poderosos façam sofrer os fracos.
Mas Cristo já veio! Com ele irrompeu o Reino da Paz, em forma de sinais concretos. Marginalizados foram os primeiros que ouviram, viram e testemunharam o mistério de Natal (Lc 2). Sim, ele veio diferente do que a razão humana o esperava: nasceu pobre num estábulo (Lc 2.7); tinha comunhão com aqueles que a sociedade e a igreja marginalizavam (Lc 15.2); denunciava leis e estruturas que fabricavam e sancionavam injustiça e exploração (Mt 23). Isso escandalizava os que detinham o poder sócio-político e religioso a ponto de o crucificarem. Esse fato, por sua vez, também escandalizava os próprios discípulos dele (Lc 24.21). Assim sendo, o Messias da Paz foi rejeitado por todos.
Porém, Deus o confirmou na Páscoa. Assim Cristo venceu o poder da morte e o vencerá definitivamente, no segundo e definitivo Natal. Por isso, ele, de fato, terá a última palavra sobre o poder da morte.
Já agora ele reina. Através de pessoas, ele coloca sinais concretos de seu reino. Mas esses sinais são perceptíveis apenas aos olhos da fé. São sinais oriundos do novo e que apontam para o novo. Que sinais de Natal ele quer colocar através de nós, hoje em nosso contexto? Por exemplo: Que professores e estudantes parem de absolutizar seus posicionamentos teológicos e reconheçam e assumam sua transitoriedade. Que conscientemente cultivemos comunhão com nossos (as) irmãos (as) enlutados (as) e com os cujos familiares e terra natal estão distantes. Que professores e estudantes reconheçam, e assumam seus respectivos papéis em verdadeira parceria. Que nós como EST reconheçamos e assumamos nosso lugar na IECLB, para que, em conjunto, saibamos apoiar as lutas por Reforma Agrária e mais justiça social e paz em nosso país. Que nos unamos a movimentos nacionais e internacionais em prol do desarmamento. Que a Constituinte sirva para a promoção da paz.
Seja o que for enfocado na prédica, a questão escatológica deve ser tratada de tal forma que Natal seja experimentado em seu duplo sentido do já agora e ainda não.
3.2.3 – A prédica:
a) Intenção da prédica: A situação é de não-paz: luto; espíritos armados na EST; luta na sociedade pela Reforma Agrária; preocupação com a Constituinte; a romantização da manjedoura e a comercialização do Natal, por um lado ofuscam o verdadeiro sentido natalino e, por outro, expressam o profundo clamor por paz.
Rogo a Deus que ele, através dessa prédica, nos faça perceber o milagre natalino que irrompeu lá na margem insignificante; que a esperança no segundo e definitivo Natal nos fascine e anime na caminhada.
Rogo a Deus que ele desarme os nossos espíritos (na EST), para que surjam sinais concretos de paz no convívio da EST e para que saibamos apoiar a luta por paz na sociedade (Reforma Agrária, Constituinte).
b) O conteúdo da prédica: .A partir do proprium do texto, a prédica deve ter o caráter de animar e fortalecer a esperança no Messias da Paz (Ev.) o que não exclui a denúncia da não-paz (Lei). A prédica deve levar à percepção e colocação de sinais de paz (Imperativo).
Devo partir do evento concreto; luzes e manjedoura como sinais que expressam nossa ansiedade por paz. Deve explorar o escândalo do texto (Belém Éfrata). Deus vê e valoriza o fraco e insignificante e marginalizado, fato que questiona nosso ambicionar o que é grande. A promessa de Natal deve ter forte acento – explorarei as figuras do voltar para casa, do apascentar e estabelecer-se. O Reino da Paz universal já irrompeu e terá a última palavra, apesar das aparências contrárias. Por causa disso percebamos e coloquemos, agora já, sinais concretos de paz na família, EST e sociedade.
A questão do desarmamento, embora ligada à paz (Mq 4.3), não enfocarei para delimitar a prédica. Esse assunto poderia ser tratado melhor em outra prédica, baseada em Mq 4.1-4.
c) Estrutura da prédica:
A – Introdução:
– Enunciado principal: Natal = Apesar de todas as aparências contrárias, Deus fará com que o seu povo sofrido se alegre com a vitória da paz!
– Estamos cansados de sempre sermos desiludidos com a falsa paz (romantização e comercialização do Natal).
– Sinais de não-paz (luto; espíritos armados; a luta por terra e justiça social continua na Nova República)
– Esperamos por paz verdadeira, assim como o povo de Israel (situação original do texto) Leitura de Mq 5.1-4a (tradução própria)
B.1 – Aguente mais um pouco, meu pequeno povo sofrido, o Messias da Paz já vai nascer onde ninguém o espera!
– Ele nascerá em Belém – margem (favelas; colonos sem-terra)
– Ele fará voltar para casa – unificará o que o mundo dispersou
– Ele apascentará – saciará e garante proteção
– Ele fará o estabelecer-se – garantirá terra e moradia
B.2 – O Messias da paz que já veio
– Sinais do irrompimento do reino da Paz
– Apesar de todos o terem rejeitado, Deus o confirmou
– Ele terá a última palavra – segundo e definitivo Natal
B.3 – Sinais do Reino da Paz hoje em nosso contexto:
– Na família: que Ele me liberte para eu dar o primeiro passo para a paz;
– Na EST: que ele nos liberte para cultivarmos comunhão com os enlutados e os que sofrem saudades de familiares e terra natal distantes; que Ele nos faça reconhecer a relatividade de nossos posicionamentos teológicos e desarme nossos espíritos para ensaiarmos verdadeira parceria
– Na sociedade: que Ele nos liberte para apoiarmos a luta pela Reforma Agrária e por uma Constituinte que sirva para a paz.
C – Conclusão: – Retomada do enunciado principal
– Convite à Santa Ceia como celebração antecipatória da vitória da paz e fortalecimento para a colocação de sinais de paz hoje.
4. Subsídios litúrgicos
1. Intróito: SI 96 (leitura responsorial ou salmodia conforme Celebrações Litúrgicas – Celebremos, p. 64) ou: 1 Jo 1.14a
2. Confissão de pecados: Pai celeste, hoje queremos celebrar o nascimento de teu Filho que enviaste como Rei da paz e justiça. Porém, reconhecemos que tanta coisa nos dificulta e impede a entoar o cântico novo que tuas filhas e teus filhos deveriam entoar, a partir do Natal. Confessamos que temos falhado com o convívio fraterno na EST; confessamos que fomos insensíveis à solidão e saudade que colegas em nosso meio sofrem; reconhecemos também o quanto temos alimentado o orgulho próprio que desfez a união entre nós. Sim, Senhor, fomos infiéis nessas coisas pequenas; por isso, o nosso testemunho tinha pouca força para convencer. Perdoa-nos todos os nossos pecados e concede-nos o teu Santo Espírito; renova e liberta-nos, assim que vivamos a paz em nosso meio – por causa de Jesus Cristo, tem piedade de nós, Senhor!
3. Anúncio da graça: Assim o mensageiro de Deus anuncia aos seus que estão assustados: Não temais… (Lc 2.10s.)
4. Oração de coleta: Onipotente e eterno Deus e Pai, no Natal vieste a nós, trazendo luz onde reinava a escuridão, vencendo a injustiça pela justiça e a guerra pela paz. Faze com que hoje, através de tua Palavra e de tua Santa Ceia, experimentemos o teu poder, a fim de que surjam sinais concretos de justiça e paz, em nós e através de nós. Isso te pedimos em nome de Jesus Cristo que contigo e o Espírito Santo vive e reina eternamente. Amém.
5. Leituras bíblicas: Epístola – Tt 3.4-7; Evangelho – Lc 2.15-20.
6. Assuntos para oração de intercessão: Agradecimento pelo fortalecimento da esperança na vitória do Reino da paz e justiça. Interceder pelos que sofrem saudades de seus familiares e sua terra natal distantes; pelos enlutados; pelo convívio fraterno entre professores e estudantes; pelos líderes da IECLB a nível paroquial, distrital, regional e nacional; pelos movimentos dos sem-terra; pela Constituinte; pelos governantes a nível municipal, estadual e nacional – a fim de que surjam sinais concretos de desarmamento, justiça e paz; a intercessão emboca na perspectiva escatológica (segundo e definitivo Natal).
5. Bibliografia
– MAILLOT, A. et LELIÈVRE, A. Atualidade de Miquéias – um grande profeta menor. São Paulo, 1980.
– SCHWANTES, M. Meu Povo em Miquéias. In: Sementes. PU – Cadernos do Povo. Cunha Porã, 1978.
– WEISER, A. Einleitung in das Alte Testament. 6. ed. Gõttingen, 1966.
– WOLFF, H. W. In: Biblischer Kommentar Altes Testament. v. 14, tomo 4, Neukirchen/VIuyn, 1982.
– ____.Mit Micha reden – Prophetie einst und heute. München, 1978.
Proclamar Libertação 12
Editora Sinodal e Escola Superior de Teologia