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A porta da esperança

 

Proclamar Libertação – Volume 47
Prédica
: João 10.1-10
Leituras: Atos 2.42-47 e 1 Pedro 2.19-25
Autoria: Janaina Schäfer Hasse
Data Litúrgica: 4° Domingo da Páscoa
Data da Pregação: 30/04/2023

 

1. Introdução

A perícope do 4º Domingo da Páscoa traz a revelação de Jesus Cristo como o Senhor que chama, conhece e traz vida em abundância para as suas ovelhas. Essas são orientadas a ouvir o seu pastor e a se deixar guiar por aquele que é a “porta”, a saber, o próprio Cristo, refutando o direcionamento e o pastoreio de mercenários. Os dois textos auxiliares nos remetem aos aspectos da vida de discipulado de quem entra pela verdadeira “porta” e é guiado pelo verdadeiro “pastor”.

O trecho de 1 Pedro 2.19-25 aponta para Cristo como o exemplo para seus seguidores, para a vida de discipulado. Relata a abnegação que essa vida traz e o rebanhar das ovelhas pelo pastor, que dedica cuidado em seu sacrifício.

Atos 2.42-47, que relata os primórdios da igreja cristã, fala-nos do modo de viver do rebanho do bom pastor. Como vivem as ovelhas que ouvem a sua voz e a diferença em ser guiado para um bom aprisco. Jesus veio para trazer vida em abundância, uma vida plena que nos é prometida para a eternidade, mas que também pode ser experimentada em partes, já agora, na comunhão dos santos, quando o discipulado também traz um cuidado de maneira integral pela vida do próximo.

 

2. Exegese

Durante o período da Semana da Paixão e também da Páscoa, somos aconchegados pelo texto do Evangelho de João, que fala da revelação de Jesus para os seus (13 – 17). Para este domingo, voltamos o olhar para outro bloco desse evangelho tão rico.

O texto-base da pregação faz parte do discurso de testemunho público de Jesus diante do mundo. Ou seja, após falar da encarnação da Palavra (cap. 1) e sobre o preparo do caminho para a chegada do salvador, agora João se preocupa em narrar os discursos de Jesus que o revelavam como o Salvador, cuja salvação se estende ao mundo (cap. 3). A revelação pública de Jesus inicia com o milagre nas bodas de Caná, perpassando outros milagres, curas e diálogos profundos de Jesus com pessoas diversas. Nesses primeiros capítulos já aparecem os outros “eu sou” (ego eimi) de Jesus, maneira joanina de falar da revelação do Filho de Deus.

Na sequência da revelação de Jesus como Salvador, encontramos a recusa dessa mensagem pelo mundo e até mesmo pelos seus (10.22-42; 11.45-55; 12.36-43; 18.15-18).

Apesar do primeiro título encontrado nas versões da Nova Tradução da Linguagem de Hoje ser “Jesus, o pastor verdadeiro”, a perícope se concentra na afirmação de Jesus “Eu sou a porta”, quando limitada aos v. 1-10 do capítulo 10.

A imagem do pastor perpassa todos os dez versículos, porém, se fôssemos eleger um termo principal nessa perícope, seria thyra/porta. Esse substantivo que aparece no discurso de Jesus logo no início é o mesmo usado para definir como ele se revela: Eu sou a porta! A seguir, algumas observações quanto aos versículos da perícope.

V. 1-2 – Jesus apresenta o cenário típico do contexto de criação de ovelhas: um curral, um aprisco coletivo. Não existia um sistema de estábulos como hoje. Ovelhas de diversos pastores se encontravam juntas no mesmo espaço. Nesse espaço coletivo, se alguém pula o muro, é ladrão. Afinal, qual o objetivo de entrar em um lugar senão pela porta? O portão era o único lugar por onde os que queriam apascentar as ovelhas entravam. O rebanho que está nesse curral são ovelhas, por vezes, um animal de fácil domínio. Possuem falta de iniciativa, ou seja, facilmente são levadas por um movimento maior. Neste texto a humanidade é comparada a um rebanho de ovelhas. Sozinhos e sozinhas, somos seres indefesos e influenciáveis. Por nossas próprias capacidades não conseguiríamos nos salvar dos perigos. Precisamos do pastor verdadeiro para não andarmos mais como ovelhas perdidas (Lc 15.1-7).

V. 3 – O porteiro é aquele que abre e fecha a porta. Jesus, apesar de ser aquele que abre o caminho, não resume a sua missão a essa figura. Sabemos pela continuidade do texto que ele mesmo também é o pastor verdadeiro que entra pela porta.

V. 4-5 – As ovelhas, o rebanho, conhecem a voz do seu pastor. Não apenas identificam o proprietário, mas confiam na voz daquele que as chama. São cientes de que esse que chama é quem as pode conduzir em segurança. Não se trata apenas de um sentimento de pertença, mas de saber que estão seguras. Ao reconhecer a voz do pastor verdadeiro, as ovelhas, outrora influenciáveis e de fácil domínio, tornam-se fiéis à voz daquele que verdadeiramente cuida delas e as protege.

V. 7-9 – Jesus nos diz: Eu sou a porta. E nos promete: quem entrar por ele, ou seja, passar pela única entrada, será salvo. Aqui a revelação de Jesus é uma promessa maravilhosa de salvação e sustento.

V. 10 – Os falsos líderes que vieram antes de Jesus apenas usavam as ovelhas para o “abate”. O verdadeiro pastor não! Esse quer que permaneçam com vida e alimentadas, que tenham uma vida abundante, plena e completa. O pastor verdadeiro quer uma vida em abundância, ou seja, até mais do que o esperado ou merecido para uma ovelha. A ovelha pode se sentir segura ao ser conduzida por aquele que traz salvação do caminho lógico da morte. A ovelha, além de ser salva da morte, receberá alimento e sustento.

 

3. Meditação

Jesus nos diz claramente na perícope quem nós somos e quem ele é. Nós somos ovelhas! Ele é a porta e o pastor!

 

a) Portas e vidas fechadas!

Quantas pessoas já não encontraram portas fechadas em suas vidas? Ao procurar um emprego, ao se perder em um endereço, ao errar o dia ou a hora de uma prova, ao retornar para casa depois de um desentendimento. Sim, em nosso mundo, todos os dias pessoas passam por situações assim.

Também ao olhar para nós, pessoas podem encontrar portas fechadas, sejam em nossas vidas ou mesmo em nossas comunidades. Será que em nossas comunidades isso tem acontecido? Será que pessoas têm voltado para seus lares com a impressão de encontrarem as portas fechadas?

Nós não somos as portas! E longe de nós querermos assumir esse papel que não é nosso! Pois se assim o fizermos, estaremos agindo como ladrões, salteadores ou bandidos. A porta verdadeira é uma só: Jesus Cristo! Mas, por vezes, podemos não apontar para essa porta verdadeira ou não ser uma placa de direcionamento. Ao olhar para nós, será que as pessoas conseguem ler: “Entre, a porta está aberta”?

Cristo nos chama pelo nome, e nós podemos ouvir a sua voz. A partir da vida de discipulado, somos enviados e enviadas a viver uma vida plena, a testemunhar e agir para que todas as pessoas possam olhar para a “porta da vida eterna”. Se ouvirmos os relatos de como viviam os primeiros cristãos, perceberemos que a sua vida era como uma placa escrita: “Entre, a porta está aberta”.

 

b) Portas da esperança

Quantas vezes também batemos em portas que nos trazem a esperança da salvação. Entretanto, colocamos todas as nossas expectativas em portas aqui deste mundo: dinheiro, emprego, relacionamentos, sucesso pessoal. E nada disso nos sustenta.

Somente Cristo é a porta verdadeira. Somente ele traz a vida plena, vida eterna, perdão dos pecados e salvação. Toda vez que tentarmos chegar a Deus ou conquistar uma vida com sentido por outros lugares ou por outras vozes que anunciam que são o pastor, estaremos perdidos e perdidas, estaremos dando ouvidos aos ladrões e salteadores.

 

c) Olhar para verdadeira porta e ouvir a voz

Ao olharmos para a verdadeira porta, nossas esperanças podem ser renovadas. Mesmo que durante o caminho desta vida venhamos a passar por dias difíceis ou percalços, temos a segurança e a confiança na voz do pastor verdadeiro, que nos guia.

Um pastor que está longe do seu rebanho dificilmente terá sua voz reconhecida. O conhecimento do verdadeiro pastor, da verdadeira porta, não é obra da ovelha que se achega ao aprisco ou abre a porta, mas é obra do verdadeiro pastor. Ele é quem mostra o caminho, abre a porta e faz reconhecida sua voz. Mesmo como ovelhas do pastor verdadeiro, não tomamos a iniciativa. É ele quem nos chamou e amou primeiro, e as ovelhas respondem a esse amor. A partir do momento em que nossos ouvidos forem abertos, reconheceremos aquele que sempre esteve a nos chamar. Assim, estaremos cientes que somente dele vem a nossa segurança. Enquanto estivermos surdos, seremos como todos aqueles que rejeitaram Jesus, como o Messias.

 

4. Imagens para a pregação

– Ao ouvir o texto do evangelho, veio-me nitidamente a imagem de uma família cantando em nossa comunidade, com os raios de sol das 8h30 entrando pelas vidraças das janelinhas emperradas da igreja e iluminando a sua gaita, enquanto ouvíamos: Deus é tão bom, pois abriu a porta para você passar, e a porta é Jesus… E como uma criança com muita imaginação, eu pensava no próprio Deus abrindo aquelas janelinhas. E pensava: como pode ele mesmo ser também a janela?
– Fixar logo na entrada do espaço de culto a frase: Entre, a porta está aberta!
– Outra ilustração que pode ser usada é uma comparação com o quadro “Porta da esperança”, do Programa de TV de Silvio Santos, nos anos de 1984-1996, que consistia em prestar assistência e renovar as esperanças das pessoas em seus sonhos e suas necessidades. O programa oferecia a esperança para as pessoas que estavam desanimadas.

 

5. Recursos litúrgicos

Hinos: Um só rebanho, um só pastor – LCI 578; Pelos prados e campinas – LCI 90; Que segurança, sou de Jesus – LCI 624.

 

Bibliografia

BOOR, Werner de. Evangelho de João. Curitiba: Evangélica Esperança, 2002. (Comentário Esperança).
RIENECKER, Fritz; ROGERS, Cleon. Chave Linguística do Novo Testamento Grego. São Paulo: Vida Nova, 1995.
BROWN, Colin; COENEN, Lothar. Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 2000.

 

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Proclamar libertação é uma coleção que existe desde 1976 como fruto do testemunho e da colaboração ecumênica. Cada volume traz estudos e reflexões sobre passagens bíblicas. O trabalho exegético, a meditação e os subsídios litúrgicos são auxílios para a preparação do culto, de estudos bíblicos e de outras celebrações. Publicado pela Editora Sinodal, com apoio da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB).