Proclamar Libertação – Volume 34
Prédica: Hebreus 4.14-16; 5.7-9
Leituras: Oseias 5.15b-6.6 e Lucas 23.33-49
Autora: Ana Isa Reis
Data Litúrgica: Sexta-feira da Paixão
Data da Pregação: 02/04/2010
1. Introdução
O presente recurso homilético destina-se à celebração da Sexta-feira da Paixão. Esse dia integra o Tríduo Pascal, que são as celebrações dos três dias que formam uma unidade: a Quinta-feira da Paixão, a Sexta-feira da Paixão e a Vigília Pascal (no Sábado Santo), culminando na Festa da Vida, a Páscoa, no domingo. Etéria ou Egéria, possivelmente uma monja, registrou sua visita à Terra Santa e descreveu a liturgia dos dias da Páscoa jerosolimita do século IV. É a partir especialmente desse escrito que temos informações como os dias da Páscoa eram celebrados.
Olhando a partir da unidade que o Tríduo Pascal forma, especialmente a partir do relato de Hipólito, sabemos que a Sexta-feira da Paixão é um dia de jejum. O jejum iniciava na Quinta-feira da Paixão, após a Eucaristia, e era quebrado somente com a Eucaristia da Vigília Pascal (apenas às mulheres grávidas, que não se sentiam bem, era dada a possibilidade de quebrar o jejum, observando-o apenas no sábado). A prática de não celebrar a Eucaristia na Sexta-feira da Paixão é muito antiga, visto que a Ceia é a refeição das pessoas cristãs e reatualiza toda a obra salvadora de Jesus, também sua ressurreição e ascensão. O destaque da Sexta-feira da Paixão deve estar na reatualização das últimas horas de vida de Jesus, nos fatos que ali aconteceram, especialmente sua morte na cruz. Sugere-se que o culto da Sexta-feira da Paixão seja celebrado num clima de silêncio e meditação, sem perder de vista a ressurreição.
Nesse dia, muitas pessoas vêm ao culto. Muitas delas porque, em virtude do trabalho excessivo ao redor da Páscoa (aspecto comercial), só conseguem vir ao culto na Sexta-feira da Paixão por ser feriado. Há aquelas pessoas que vêm ao culto mais por uma questão de “tradicionalismo”, porque acreditam que, assim, cumprirão suas “obrigações religiosas”. Nesse sentido, o texto de Oseias deixa claro que Deus quer que as pessoas o amem de todo o coração e não lhe ofereçam sacrifícios como forma de cumprir uma exigência ritualista, mas que nada tem a ver com a vida, o amor e a obediência a Deus.
A Sexta-feira da Paixão quer ser um momento de parada e reflexão sobre o abandono, o sofrimento e a morte de Jesus – e também um momento para olharmos nossa vida, para as vezes que somos iguais àqueles que condenaram Jesus à morte, para as vezes que também experimentamos o sofrimento. À luz de Hebreus, a Sexta-feira da Paixão convida-nos a reatualizar os acontecimentos da vida, morte e ressurreição de Jesus, reconhecendo que Jesus é verdadeiramente ser humano e verdadeiramente Deus e que Ele, como Filho de Deus, é o Sumo Sacerdote e o próprio sacrifício.
A Carta aos Hebreus, assim chamada pela tradição da igreja, tem mais uma característica de tratado teológico. Apenas seu final tem um aspecto de carta (13.18-25). Não temos informações muito claras e precisas a respeito desse tratado. Há pesquisadores que dizem que o tratado teria sido escrito a uma comunidade de judeus cristãos. Há outros que defendem que foi escrito a um grupo de cristãos que estava enfrentando perseguição. E há quem defenda que foi escrito não a uma situação específica de uma comunidade, mas para a igreja cristã em geral. Quanto à datação, também não é possível datá-lo com exatidão. A maioria dos pesquisadores defende que ela foi escrita no período entre 80 a 96 d.C. durante a perseguição de Domiciano. O autor é desconhecido, mas é alguém possuidor de uma formação aprimorada. Em seu tratado, o autor tenta assegurar a lealdade de seus leitores a Cristo, afirmando que Cristo é superior a tudo: à antiga revelação (1.1-3), aos anjos (1.4-2.18), a Moisés (3.1-19), a Josué (4.1-13) e ao sacerdócio do
Antigo Testamento (4.14-10.31).
2. Exegese
2.1 – Estrutura do Tratado aos Hebreus e da perícope
– Hb 1.1-6.20: Preparação do tema central: teses fundamentais:
1.1-14: O Cristo preexistente e encarnado é promovido a Filho de Deus
2.1-14: Exortação para escutar a palavra
2.5-18: O Cristo humilhado e morto é promovido a sacerdote celestial
3.1-6: Exortação à fidelidade
3.7-4.13: Midraxe sobre o Salmo 95: o povo peregrino e a promessa de descanso
4.14-16: Exortação à confissão de culpa
5.1-10: O Filho de Deus como Sumo Sacerdote
5.11-6.20: Ponte para a parte principal: exortação aos ouvintes e as características da palavra a ser proferida
– Hb 7.1-10.18: O tema principal: o sacerdócio do Filho
– Hb 10.19-13.17: Consequências para a fé
– Hb 13.18-25: Recomendações finais
2.2 – Observações exegéticas acerca dos versículos da perícope
Cap. 4:
V. 14 – O tratado de Hebreus é o único documento (teologicamente orientado do NT) que apresenta o título “Jesus” sem nenhum adorno, sem cognomes. É provável que a intenção do autor tenha sido lembrar que foi na humanidade, na mortalidade que o Filho de Deus trouxe a salvação. Jesus é o Filho de Deus e nosso Sumo Sacerdote. Para os judeus, o Sumo Sacerdote era o intermediário entre o ser humano e Deus. Uma vez por ano, o Sumo Sacerdote entrava no Santo dos Santos. No Templo havia o átrio dos gentios, o átrio das mulheres, o átrio dos homens, o santuário dos sacerdotes (Lugar Santo) e o Lugar Santíssimo ou Santo dos Santos, lugar mais sagrado da presença de Deus, onde somente o Sumo Sacerdote podia entrar, depois de cumprida uma série de purificações e exigências. Nesse Santo dos Santos estavam a arca da aliança e as tábuas da lei. Junto ao Santo dos Santos havia o Lugar Santo, que era a parte da Tenda da Presença de Deus e do Templo, em que ficavam a mesa dos pães oferecidos a Deus, o candelabro e o altar sobre o qual os sacerdotes ofereciam incenso todos os dias. O Santo dos Santos era separado do Lugar Santo por um véu (ou cortina), que, segundo o relato bíblico, rasgou-se quando Jesus morreu para oferecer um sacrifício a Deus. Hebreus confirma que, agora, Jesus é o Sumo Sacerdote, ou seja, através de sua vida, morte e ressurreição ele fez o sacrifício final e decisivo, sendo, além de Sumo Sacerdote, também a vítima desse sacrifício, firmando nova aliança. Antes, o sacrifício feito pelos Sumos Sacerdotes era constantemente repetido, por ser impotente para expulsar o pecado. Hebreus diz que, pela oblação do próprio sangue, Jesus penetrou uma vez por todas no Santo dos Santos, tornando-se o grande e verdadeiro Sumo Sacerdote, permanecendo como tal para sempre.
V. 15 – O termo grego para compadecer-se é sumpatheo, que significa “mostrar simpatia por”, “simpatizar com”, dando a ideia de sentir e compreender nossas fraquezas. Jesus, verdadeiro ser humano e verdadeiro Deus, sabe muito bem o que é sofrer. Jesus pode entender quando as pessoas sofrem, quando têm medo, quando estão angustiadas; afinal, ele também experimentou o temor, a tristeza, a tentação, o temor da morte, a traição, a injustiça e a própria morte. Ou seja, Jesus conhece a realidade humana porque também foi humano, contudo, sem pecado. Para Champlin, a impecabilidade de Cristo deve significar mais do que a rejeição de atos pecaminosos; Jesus nunca favoreceu a atitude do pecado; não pecou em seus desejos e em seus motivos, muito menos em suas ações. Jesus mesmo, segundo Champlin, deixou claro que o pecado reside nos desejos e motivos dos homens, e não apenas em atos pecaminosos. Para Champlin, a verdadeira natureza humana é impecável; a natureza humana pervertida é que peca e por isso necessita de redenção. Sua impecabilidade também fez com que Jesus, como Sumo Sacerdote, não precisasse oferecer sacrifício por si mesmo.
V. 16 – É um convite para que a pessoa se achegue confiadamente ao trono da graça. Naquela época, o povo conhecia o trono do imperador, que matava cristãos, que impunha tributos, leis rígidas e um modo de vida condizente com aquilo que o imperador julgasse que um “súdito” deveria ter. Aqui, o trono é de outro alguém. É daquele que penetrou os céus, lembrando da ascensão, mas que antes sofreu, morreu morte de cruz, ressuscitou e é o Sumo Sacerdote. No “trono” está quem tem poder. Hebreus diz que é Jesus quem tem poder. O trono de Deus é da graça, da misericórdia, da vida. Ao nos achegarmos ao trono da graça, receberemos misericórdia, ou seja, perdão dos pecados, ajuda em nossas enfermidades e sofrimentos, renovação diária, coragem e o necessário para a vida. Essa aproximação, continua Hebreus, nos trará o socorro no momento oportuno: uma expressão indefinida que pode envolver vários significados, mas que garante que a pessoa não estará abandonada.
Cap. 5:
V. 7 – O tratado dos Hebreus combate o docetismo, uma das primeiras heresias a aparecer na igreja cristã e que afirmava que Jesus não era, realmente, um homem, mas fingia ser. O tratado dos Hebreus é um dos livros que melhor descreve a humanidade e também ensina que Jesus é divino. Nesse versículo, fica clara a humanidade de Jesus e também sua reação frente à morte iminente. Jesus sabia que, através de suas ações, ele poderia ser condenado à morte; afinal, suas atitudes questionavam ferozmente o poder religioso, político e econômico da época. E diante desses poderes, o desfecho era a morte ou a prisão de seus opositores. Mas, frente à morte, Jesus orou para ser libertado, dirigiu-se a Deus com clamor, lágrimas, orações e súplicas. Quem de nós não faria o mesmo? Quando a morte se aproxima, o ser humano grita desesperadamente por Deus; afinal, ninguém quer morrer. Nesse versículo, segundo os pesquisadores, Hebreus faz referência direta ao que Jesus experimentou no Getsêmani e que os evangelhos relatam. Hebreus diz que Jesus foi ouvido por Deus; seu clamor não chegou a ouvidos surdos.
V. 8 – Apesar de ser Filho de Deus, Jesus, verdadeiro ser humano e verdadeiro Deus, sofreu, aprendeu a obediência, morreu, mas ressuscitou.
V. 9 – Nesse versículo, o autor menciona que Jesus foi aperfeiçoado. Segundo Champlin, significa que Jesus aprendeu a participar das virtudes espirituais de Deus, venceu em todas as provações por que passou, foi aperfeiçoado no decurso do cumprimento de sua missão terrena, foi metafisicamente transformado, de tal modo a tornar-se o Deus-homem e, portanto, o Sumo Sacerdote. Para Ladd, como homem sem pecado, Jesus tinha que aprender a completa confiança e dependência de Deus. Esse Jesus, levado à perfeição, tornou-se aitios, do grego, “causa” ou “fonte” da salvação eterna aos que o obedecem. Conforme o dicionário Aurélio, obedecer significa: sujeitar-se à vontade de outrem; estar sujeito; não resistir, ceder; cumprir; executar ordens. Ou seja, as pessoas que desejam tal salvação precisam assumir o compromisso de, assim como Jesus, ser obedientes a Deus.
3. Meditação
A Sexta-feira da Paixão faz-nos refletir sobre a morte. Especialmente sobre a morte de Jesus e todo o horror que ele experimentou. Refletindo sobre a morte, precisamos concluir que ninguém quer morrer, nem mesmo o suicida. A morte corta as relações entre as pessoas, rompendo a possibilidade das pessoas voltarem a se encontrar em seus espaços de convívio (seja em casa, na escola, no trabalho, na igreja), provoca um sentimento de perda dolorosa, lança as pessoas no abandono. A morte sempre significa despedida, angústia e luto. Mesmo que todos nós saibamos que a morte é a única certeza que temos de algo que vai nos acontecer, cada um de nós, na hora em que ela se aproxima, é tomado por um sentimento de impotência, angústia e dor. O próprio Jesus também experimentou esse sentimento, também clamou, chorou, orou, suplicou. Em sua humanidade, Jesus sabe muito bem o que significa estar diante da morte. Jesus experimentou alegrias, sim, também festa e convívio justo e fraterno. Contudo, ele também experimentou sofrimento, abandono, tristeza, traição e injustiça, sabe o que é morrer. Saber que Jesus entende o sofrimento humano traz consolo e ânimo. Quando, especialmente na Sexta-feira da Paixão, falamos dos sofrimentos de Cristo e de sua morte, que também as pessoas que passam por sofrimentos possam ter a certeza de que Jesus sabe o que elas estão passando e que ele sabe porque também passou por isso, se é que não sofreu ainda mais horrores. Ou seja, Jesus é o Sumo Sacerdote que se compadece com o sofrimento do seu povo, que tem compaixão, que se coloca ao lado daqueles que sofrem, que choram, que suplicam. Jesus vai ao nosso lado nos pedaços difíceis do caminho de nossa vida ou nos carrega no seu colo. Jesus não nos abandona em meio aos sofrimentos. Ele nos ouve, nos toma em seus braços e ali nos consola e anima. Também Jesus não esteve abandonado, ainda que tenha sentido e até dito que se sentia abandonado por Deus (“Meu Deus, meu Deus, por que me desamparaste?” Mc 15.34). Mas sabemos que Deus não abandonou seu Filho, antes ressuscitou Jesus, que vive e reina com ele e com o Espírito Santo.
As orações que dirigimos a Deus, assim como a de Jesus, chegam aos ouvidos atentos de Deus. Precisamos lembrar que, mesmo quando nossas orações não são atendidas, elas são ouvidas por Deus. Deus inclina seu ouvido e ouve a aflição do seu povo, assim como fez com Jesus. Hebreus diz que Jesus foi ouvido. Não foi ouvido sendo libertado da morte de cruz, mas foi ouvido recebendo forças para poder dizer: “Pai, nas tuas mãos entrego o meu Espírito” (Lc 23.46). Muitas vezes, pedimos que Deus nos livre do sofrimento, mas ao invés disso ganhamos força e ânimo para enfrentar o sofrimento.
Como Sumo Sacerdote, Jesus livra-nos, sempre de novo, de ter que fazer sacrifícios a fim de aplacar a ira de Deus. Na Sexta-feira da Paixão, vemos pessoas que se autoflagelam, que se sacrificam em prol de Cristo. Ora, como Sumo Sacerdote, Jesus realizou o sacrifício único e perfeito, oferecendo-se a si mesmo como sacrifício. Isso nos liberta de ter que matar animais ou nos colocar no lugar de Cristo. O sacrifício de Jesus tem validade eterna. Não temos que repeti-lo. A Sexta-feira da Paixão reatualiza o sacrifício de Jesus também para nós hoje. Ou seja, ao celebrarmos sempre de novo a Sexta-feira da Paixão, estamos rememorando o ato salvífico de Deus em Jesus Cristo, reiterando-o e revivendo-o, tornando-o presente e atuante em nossa vida. A vida, morte e ressurreição de Jesus continuam com o mesmo valor ainda hoje e também para cada pessoa em sua época.
A Sexta-feira da Paixão, no entanto, não é um ato fúnebre. Ela rememora os acontecimentos finais da vida de Jesus, sua morte na cruz e seu sepultamento, mas lança o olhar para a ressurreição. A morte continua, sim, a última inimiga a ser vencida, mas já não tem mais a última palavra. Jesus venceu-a com sua morte e ressurreição. Hoje, a partir de Jesus, como pessoas cristãs, cremos na promessa da ressurreição para a vida eterna. E também podemos ter a certeza de que nossa pessoa querida falecida não está jogada à própria sorte ou abandonada. A morte não nos lança ao nada, e sim nos braços de Deus. Como diz Paulo: “nem a morte e nem a vida, (…), nem nada pode nos separar do amor de Deus que é nosso por meio de Cristo Jesus” (Rm 8.38ss). Tudo o que vem com a morte já foi experimentado por Jesus. Que a venceu.
O texto de Hebreus destaca Jesus como o Sumo Sacerdote, que é fonte de salvação para todas as pessoas que o obedecem. Ou seja, o compromisso que nós temos é de ser obedientes a Deus. Ou seja, deixar “Deus ser Deus” e nós sermos “os seres humanos que Deus quer que sejamos”. Somos chamados a ser obedientes ao senhorio de Deus, que nos quer dar o melhor para a vida. Colocando-nos sob a obediência de Deus, tornamo-nos livres; os mandamentos de Deus são orientações para que se viva uma vida boa, feliz, digna e justa para todos. Essa obediência não é por coação ou imposição. Mas é uma obediência em amor, sabendo que Deus nos preenche com o necessário para a vida. Confiantes nele, deixamo-nos em suas mãos, cumprindo com aquilo que Ele nos chama a cumprir, ou seja, amando a Ele e ao próximo como a nós mesmos.
4. Imagens para a prédica
A cruz poderia ser usada em sua dualidade: cruz rude e de morte, e cruz que trouxe vida nova e salvação. Explicando: a Sexta-feira da Paixão fala de Jesus e, a partir do texto de Hebreus, que ele é o Sumo Sacerdote, verdadeiro ser humano e verdadeiro Deus. Mas quem foi Jesus? Pode-se contar sobre Jesus: seu nascimento no madeiro da manjedoura, nascido de mulher, sua trajetória junto ao povo, as emoções vividas (alegria, festa, tristeza, abandono, incredulidade em relação a Ele, tentação, traição), sua morte de cruz, sinal de horror, de julgamento, mas que se converteu em cruz vazia, que vence a morte, que traz nova vida e salvação. A vida, morte e ressurreição de Jesus qualificaram-no como Sumo Sacerdote, onde acontece, de uma vez por todas, o sacrifício único e perfeito, sendo Jesus o próprio sacrifício. A cruz lembra-nos da solidariedade de Deus, que ouve Jesus, que converte a dor e o horror da Sexta-feira da Paixão na alegria da Páscoa. A cruz lembra de Jesus, que se coloca ao lado das pessoas que sofrem, que também experimentam a cruz. A cruz lembra que também nós, muitas vezes, somos aqueles que crucificam, que praticam o horror que traz a morte. A cruz lembra-nos do compromisso que temos em ser obedientes a Deus, a seguir os passos de Jesus, a amar a Deus acima de todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos (pensando nas duas dimensões da cruz: verticalmente – com Deus, e horizontalmente – com o próximo).
5. Subsídios litúrgicos
Questões litúrgicas:
Sugere-se que o sino não soe no início e nem no final da celebração. Em algumas comunidades, no entanto, o sino é tocado às 15h, o que é sugerido que seja mantido. É sugerido que não haja introito musical e nem solo instrumental nesse dia. O evangelho não é aclamado com “Aleluia”, e nem é entoado o “Glória a Deus nas alturas”. Sugere-se usar o menorá (candelabro de sete velas), cujas velas podem ser apagadas durante a celebração (veja sugestões no livro “Tríduo Pascal”, na bibliografia). Nesse dia, pode-se convidar a comunidade a ajoelhar-se durante a oração (para tal, seria interessante prever pequenos travesseiros, visto que nossos templos não dispõem de genuflexórios). Em algumas comunidades, a celebração da Sexta-feira da Paixão dá-se através de procissão ou através da encenação da Paixão de Cristo. No Proclamar Libertação volume 24, o auxílio homilético escrito por Silvia Genz traz uma sugestão de programa para a Semana da Páscoa. Os conteúdos da Sexta-feira da Paixão inspiram diversas moldagens litúrgicas.
Livro Tríduo Pascal (ver na bibliografia): esse livro, de Sissi Georg, contém sugestões litúrgicas para a celebração da Sexta-feira da Paixão (p. 40-59,
101-108).
Símbolo: Se for possível, cada pessoa poderia receber uma cruz (essa pode ser confeccionada com dois palitos de picolé, ou ser de crochê, ou de papel cartão ou de outro material). Essa cruz poderia ser entregue logo à entrada, na recepção, ou mesmo durante a prédica (onde também as pessoas poderiam ser convidadas a se dirigir até onde as cruzes estiverem [poderia ser aos pés da cruz ou mesmo junto à pia batismal ou à mesa da comunhão] num gesto de compromisso), ou no envio, ou logo após a liturgia da contemplação da cruz.
Confissão de pecados: que se tenha um momento de silêncio para confissão individual e depois o/a liturgo/a dirige a confissão comunitária.
Misericordioso Deus, confessamos que, assim como tua comunidade, pecamos em palavras, ações e omissões. Achegamo-nos confiantemente ao teu trono, Senhor, sabedores da tua graça, da tua piedade, da tua disposição para perdoar. Em Jesus, o Sumo Sacerdote, que carregou a cruz que não era sua, foram depositados os nossos pecados, a nossa culpa. Confessamos, Senhor, que não somos obedientes a ti, desconfiando de ti e do teu amor. Perdoa-nos, ó Deus, quando não somos solidários àqueles que sofrem. Ajuda-nos a perceber quando imputamos dor a alguém, quando crucificamos alguém. Ajuda-nos a sempre de novo pedir perdão e voltar aos caminhos de teu amor. Por isso nós te pedimos, a ti que és Senhor sobre a vida e a morte, Senhor da esperança e da ressurreição: perdoa os nossos pecados e ajuda-nos a seguir os teus caminhos de amor e justiça. Por Jesus Cristo. Amém.
Absolvição:
Antes de tudo e de todos está o amor de Deus. Deus ouve vossa confissão sincera e perdoa os pecados, chamando a andar em novidade de vida. Anuncio o perdão dos pecados em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Amém.
Oração do dia:
Deus da graça e misericórdia, que vieste até nós em Jesus Cristo, verdadeiro ser humano e verdadeiro Deus, agradecemos-te porque Jesus é nosso Sumo Sacerdote. Agradecemos-te, Senhor, por teu imenso amor revelado em Jesus Cristo, que levou sobre si a nossa culpa, experimentando morte de cruz e nos reconciliando contigo. Rogamos, Senhor, que teu Espírito nos ajude a ser obedientes a ti, a assumir o compromisso de viver sob teu senhorio, amando a ti sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos. Pedimos-te que esta celebração nos ajude a refletir sobre os acontecimentos da Sexta-feira da Paixão, lançando nosso olhar para a cruz de Cristo. Por Jesus Cristo que morreu, mas ressuscitou e que vive e reina contigo e com o Espírito Santo. Amém.
Oração geral da igreja:
Na Sexta-feira da Paixão, a oração geral da igreja ganha destaque especial. Pode-se formular as intercessões através de preces em que a comunidade intercede em silêncio sobre o motivo apresentado ou canta um refrão. Dentre as preces menciona-se: pela igreja em todo o mundo, pelos obreiros e obreiras e lideranças das comunidades, por aquelas pessoas que se preparam para o Batismo e pela comunidade das pessoas cristãs, pelos grupos humanos que não reconhecem Jesus como o Filho de Deus, o Sumo Sacerdote, pelas lideranças públicas, pelos grupos de sofrem (enfermos, enlutados, injustiçados, “crucificados”, desempregados…).
Sugestão de hinos:
Hinos do Povo de Deus – vol. 1 – n° 50 (Nossos corações pertencem); Hinos do Povo de Deus – vol. 1 – n° 48 (Ó meu Jesus, que mal tu cometeste); Hinos do Povo de Deus – vol. 1 – n° 46 (Agradecemos-te, Jesus); Hinos do Povo de Deus – vol. 1 – n° 53 (Ó fronte ensaguentada); Hinos do Povo de Deus – vol. 1 – n° 54 (Cristo, quero meditar); Hinos do Povo de Deus – vol. 1 – n° 174 (Por tua mão me guia); Hinos do Povo de Deus – vol. 1 – n° 216 (Segura na mão de Deus); Hinos do Povo de Deus – vol. 2 – n° 473 (Em tua presença); Hinos do Povo de Deus – vol. 2 – n° 316 (Semente de libertação).
Liturgia da contemplação da cruz:
L. Neste momento, vamos receber a cruz de Jesus, que será trazida em procissão. Por três vezes a cruz será apresentada à comunidade. E, nas três vezes, a comunidade responde, dizendo em conjunto: “Vamos contemplá-la”.
L. (na primeira parada no caminho, destapa a parte superior da cruz e diz) Eis aqui a cruz que dá a vida. Dela pendeu a salvação do mundo. Vamos contemplá-la.
C. Vamos contemplá-la.
L. (parada no meio do corredor, destapa o braço direito e diz) Eis aqui a cruz que dá a vida. Dela pendeu a salvação do mundo. Vamos contemplá-la.
C. Vamos contemplá-la.
L. (na frente do altar, retira todo o pano e diz) Eis aqui a cruz que dá a vida. Dela pendeu a salvação do mundo. Vamos contemplá-la.
C. Vamos contemplá-la.
L. Tenhamos um tempo de silêncio e reflitamos sobre o mistério do Salvador crucificado, o mistério da salvação. Enquanto contemplamos a cruz, ouçamos os lamentos de nosso Senhor.
Lamentos do Senhor:
L. Que te fiz, ó povo meu? Que te fiz, meus escolhidos? Onde falhei, em que foi que te faltei? Fiz-te sair do Egito, com maná te alimentei; dei-te uma boa terra, com fartura, leite e mel, e tu preparaste para mim, teu rei, esta cruz, rude e cruel. Dei-te uma bela vinha, água doce, o que precisaste, e foste amargo comigo até o fim. Dos teus perseguidores te salvei, afogando-os no mar, e a mim entregas- te sem piedade aos inimigos. Dei-te água e o maná do céu enquanto peregrinavas no deserto; recebi fel e vinagre, quando na cruz eu tive sede. Dei-te terra, vitórias sobre povos inimigos; recebi açoites, bofetadas no rosto e uma coroa de espinhos. Dei-te prosperidade, filhos, companhia; deste-me a cruz, e ali me abandonaste. Onde foi que te faltei?
[breve silêncio]
Bibliografia
CHAMPLIN, R. N. O Novo Testamento interpretado versículo por versículo. São Paulo: Milenium, 1986.
EST/Depto Bíblico. Roteiro para a Leitura da Bíblia. 2. ed. São Leopoldo: Sinodal, 1996. (p. 92-93)
GENZ, Silvia B. Auxílio homilético sobre Hebreus 4.14-16, 5.7-9. In: Proclamar Libertação V. 24. São Leopoldo: Sinodal, 1998. (p. 133-138)
GEORG, Sissi. Tríduo Pascal. São Leopoldo: Sinodal, 2001. (Estudos de Liturgia, 1). LADD, George Eldon. Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Hagnos, 2001. (p. 529-542)
MUELLER, Enio. Padeceu sob Pôncio Pilatos. In: ALTMANN, Walter (Org.). Nossa fé e suas razões. São Leopoldo: Sinodal, 2003. (p. 90-103)
VON ALLMEN, J.J. Vocabulário Bíblico. São Paulo: ASTE, 2001. (p. 516-530)
Proclamar libertação é uma coleção que existe desde 1976 como fruto do testemunho e da colaboração ecumênica. Cada volume traz estudos e reflexões sobre passagens bíblicas. O trabalho exegético, a meditação e os subsídios litúrgicos são auxílios para a preparação do culto, de estudos bíblicos e de outras celebrações. Publicado pela Editora Sinodal, com apoio da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB).