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O amor de Deus liberta e compromete

 

Proclamar Libertação – Volume 45
Prédica: 1 João 3.16-24
Leituras: Salmo 23 e João 10.11-18
Autoria: Odair Airton Braun
Data Litúrgica: 4° Domingo da Páscoa
Data da Pregação: 25/04/2021

 

1. Introdução

Os textos indicados para este domingo apontam para Jesus Cristo como o bom pastor. Ele age com amor em favor das pessoas que se confiam aos seus cuidados. Os temas que perpassam os textos indicados são: fé, amor, cuidado e compromisso. São, portanto, temas atuais e pertinentes aos dias em que vivemos.

O Salmo 23, um dos textos mais conhecidos do Antigo Testamento, é reconhecido pela forma singela e por sua beleza de descrição de um lugar calmo, tranquilo e repleto de paz. Nele, percebe-se que somos rebanho de Deus, que zela e cuida de cada qual com esmero, amor e cuidado. Tal serenidade, tal ambiente de paz e tranquilidade precisam permear o ambiente de culto e especialmente a pregação deste domingo.

João 10.11-18, igualmente uma passagem bem conhecida, apresenta Jesus como o bom pastor em contraposição ao mercenário. O bom pastor cuida, zela e se preocupa verdadeiramente. O mercenário abandona e foge sem se importar quando diante do perigo e da ameaça. Portanto percebem-se duas posturas antagônicas: uma busca a vida e o bem-estar; a outra tem a perspectiva de autoproteção, tendo como preocupação aquilo que lhe convém e beneficia. No ano de 2020, quando a mensagem foi elaborada, vimos de autoridades públicas brasileiras postura de desconsideração com o próximo, com o mais frágil, fazendo de conta que a pandemia não era tão perigosa e letal como de fato foi. Isso pode servir de analogia entre ser o bom pastor, que age com cuidado e zelo, ou aquele que segue seu entendimento e sua ideologia sem considerar outros fatores.

1 João 3.16-24 apresenta o anúncio de que a vida é dada por Cristo/Deus. Diante de Cristo/Deus, o coração alcança a paz. A passagem enfatiza que Deus conhece, guia e conduz. De seus seguidores e suas seguidoras se requerem confiança, entrega e compromisso. Conclui-se que o amor de Deus por sua criação é imenso, exigente e libertador. Portanto a fé deve levar a agir a partir do amor.

 

2. Exegese

A passagem de 1 João 3.16-24 foi trabalhada no PL III por M. Siegle (p. 159ss), no PL 22 por R. Rieth (p. 130ss), e no PL 42 por J. Kowalska (p. 153ss). Nas abordagens podem ser encontrados aportes exegéticos. Recomendo sua leitura e consulta no processo de construção da reflexão da pregação deste domingo.

O contexto maior de 1 João 3.16-24 é formado por 1 João 2.18 a 3.24. A passagem tem como pano de fundo as dificuldades observadas nas comunidades. Essas dificuldades advinham da atuação de pessoas que traziam e propagavam falsos ensinamentos. Isso pode ser observado ao analisar a passagem de 1 João 2.18ss. O tema central de 1 João 3.16-24 é fé e amor como indicativos para a confiança em Deus e suas promessas.

1 João é escrita em forma de pregação, como carta de fortalecimento para as pequenas comunidades da Ásia Menor. Essas comunidades estavam em contexto de pluralismo religioso, que afetava, conforme acima indicado, a unidade da igreja.

O cristianismo não pode ser convertido em algo solitário e de isolamento. Seria sua morte. O povo necessita de apoio e sustento em seu caminhar na fé. Neste sentido, Deus chama, desafia e espera apoio e sustento na caminhada. Deus chama, espera e convida a comunidade para uma vida e ações de serviço frente ao contexto e ao mundo. Por isso 1 João 3.23 afirma: […] que creiamos no nome de seu Filho, Jesus Cristo, e nos amemos uns aos outros.

Resumidamente podemos entender que a passagem em tela proporciona dois ensinamentos essenciais: a) admoestar para que falsos ensinamentos não tenham espaço na comunidade cristã; b) fazer a comunidade perceber a necessidade de viver sua fé, preferencialmente em comunidade. A fé abre caminho ao amor. O amor cristão é fundamentado em Cristo. Nessa perspectiva, amor é fé vivida na concretude de cada dia e contexto.

Podemos entender que 1 João faz conexão entre o amor ao próximo e o amor de Cristo por sua criação. Cristo ama de modo incondicional, entregando-se à morte na cruz. Ele espera de nós amor incondicional pelo próximo e pela criação de Deus. Por isso devemos deixar a misericórdia de Deus conduzir em direção ao encontro com o próximo, levando-nos a abraçá-lo assim como a auxiliá-lo em suas dores e necessidades.

1 João 3.16-24 relata sobre o amor incondicional de Deus pela humanidade. Esse amor é tal que ele deu a vida de seu Filho por nós. Cristo requer e espera confiança nele, assim como espera que guardemos seu maior mandamento: amar incondicionalmente.

A carta em estudo foi organizada tendo como intuito auxiliar os membros das comunidades de então e de hoje, para que tivessem clareza daquilo que é essencial e que é pilar central da fé no cristianismo. Esse pilar, a unidade/comunhão e o amor estavam sendo desagregados. O resumo desse pilar fica evidente no Evangelho de João 3.16: Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu seu Filho Unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna. Ou seja, o amor move e renova, perdoa e reconcilia.

Os versículos 16-17 são contundentes. Cristo deu a vida por nós. Isso requer compromisso de quem o segue. O v. 17 ressalta a centralidade de olhar para o próximo e para o meio no qual estamos inseridos. Aponta para a diaconia e a disposição de servir. Isso não pode ser mera retórica. Tem que ser prática de quem se abraça com Deus e com Cristo.

O v. 18 sugere que o amor requer ações, mais do que discursos. Aponta para o cotidiano e os desafios. Isso é atual e deve ser norteador da vida, assim como da vida das comunidades.

O v. 19 aponta para Deus (diante dele). Perante Deus respondemos pelos atos, ações e omissões. Da mesma forma, o v. 19 aponta para o tranquilizar, que equivale a recompor a paz, a serenidade aos que estão angustiados e angustiadas.

O v. 20 indica que Deus conhece o íntimo do coração. Ele conhece planos e intenções. Observa-se uma contraposição entre Deus rigoroso e Deus  misericordioso. Apresenta-se a ideia de um Deus que julga. Deus traz à luz erros e descaminhos. Por isso precisamos agir e atuar para ter tranquilidade, que pode ser alcançada quando estamos ancorados na fé.

O v. 21 evidencia que o perdão vem da disposição de Deus de perdoar e renovar a aliança. Nisso reside o bálsamo para a vida. O v. 22 tem como ponto central a confiança e o ato de fazer aquilo que é agradável a Deus.

Os v. 23-24 demonstram que o amor precisa derivar da fé. Esse amor deve promover e impulsionar na direção do próximo. Guardar o mandamento do amor equivale a permanecer em Deus. Fé e amor não são concorrentes. A fé é o pano de fundo para o amor ao próximo. A fé cresce quando vivida a partir da experiência do amor recebido de Deus.

 

3. Meditação

1 João 3.16-24 surge em um contexto de desinformação e confusão causadas por práticas de ensinamentos deturpados, promovidos e alardeados por falsos ensinadores. Isso gerava descaminhos, equívocos e confusão no meio das jovens comunidades cristãs. Essa realidade é bastante comum também nos tempos atuais. Isso requer vigilância. Requer estudo da palavra de Deus, para sempre estar alinhado com seus ensinamentos que promovem vida plena digna e abundante (Jo 10.10).

Conforme referido, o pano de fundo da passagem são as falsas doutrinas propagadas por falsos ensinadores. O autor da carta pretende, com este escrito, fortalecer a comunidade a permanecer na verdadeira fé (1Jo 2.2; 3.23). Viver a fé equivale a praticar o amor. Esse amor deve ser primeiramente vivido em comunidade (1Jo 3.17ss). Essa realidade requer testemunho, observância e comprometimento para que mais pessoas tenham coragem e desejo de se espelhar em nosso agir e nas ações de nossas comunidades. Isso equivale a ser sal da terra e luz do mundo.

João afirma que sabemos, como cristãos, o que é o amor e as consequências dele decorrentes. A base do amor cristão é Jesus Cristo e sua entrega na cruz. A consequência é seguimento e requer ação de quem segue. Ouvir, dar atenção, ser solidário, colocar dons a serviço, repartir… são atitudes decorrentes do amor.A prática e a ação de Jesus são o exemplo a ser imitado. Jesus se deu a conhecer por meio de atos de amor. O maior desses atos foi a entrega para ser crucificado em favor da redenção da humanidade. Isso é presente ao alcance das nossas mãos e precisa ser testemunhado, pois dali provêm vida e esperança.

O amor é exigência de Deus para com aquele que o segue. Deve, portanto, ser uma das principais caraterísticas da pessoa cristã. Por fim, o amor é elemento fundamental para que a comunidade permaneça viva, unida e em paz. Porém sempre fica o questionamento: o que efetivamente é o amor? Como vivê-lo plenamente? Quais exemplos poderiam ser destacados de seu meio?

A exigência do amor é intensa. Às vezes pode parecer que não temos força suficiente para atender a tudo o que é decorrente desse amor. Quando esse sentimento sobrevier, deve ser recordado que Deus é maior do que as exigências, voltando seu olhar para nós com compaixão e misericórdia.

Ter fé, viver e seguir em amor requer estar disposto a amar aqueles que ainda hoje são “crucificados”: quando não recebem oportunidades, quando lhes são negadas a justiça e a solidariedade, quando não têm oportunidades iguais, quando não são ouvidos e sofrem preconceitos. Como amamos o próximo? A quem fechamos os braços? A quem deixamos de acolher em nossas comunidades? Essa contextualização é importante.

Não podem mais haver espaços e situações de falta de amor, lugares de ódio e racismo. Isso contraria a vontade de Deus, seus mandamentos. Mas, possivelmente, surge a pergunta: quem pode cumprir isso? Num primeiro momento pode parecer impossível. 1 João 3.24 dá uma resposta: quem guarda os seus mandamentos permanece em Deus, e Deus permanece nele. E nisto conheceremos que ele permanece em nós, pelo Espírito que nos deu.

 

4. Imagens para a prédica

Os textos têm como elemento visual o pastor de ovelhas e o amor. São imagens conhecidas, singelas e compreensíveis. Pode ser oportuno, para a fixação da pregação, ter presente, por meio de projeção ou lembrança do culto, a imagem do pastor de ovelhas no exercício de sua função, que em resumo demonstra amor e cuidado.

Se possível, cada participante da celebração deveria sair do culto com uma lembrança desse bom pastor que age com amor e cuidado. A imagem do bom pastor que age com amor deveria ser explorada ao longo da celebração, ressaltando que Deus, o nosso Bom Pastor, cuida, guarda e zela por nós, assim como a mãe e o pai guardam, zelam e cuidam de seus filhos e filhas. Se Deus age desse modo conosco, como retribuímos?

Na elaboração da pregação não deveria faltar a imagem da comunidade como o “bom pastor”, que age com amor no contexto em que se encontra. O pastor de ovelhas em contexto bíblico tem, basicamente, quatro funções: vigiar, guiar, providenciar bom pasto (sustento) e sentir-se responsável pelo rebanho. Neste sentido, quando 1 João 3.16-24 fala do amor, fruto do espírito de Deus, precisa ser evidenciado que esse amor não sobrevive quando sufocado. O amor necessita do próximo. Chama o outro e convida para seguir na direção do irmão e da irmã. Nesse ato o amor se torna fé posta em prática.

A pregação poderia ser desenvolvida nos seguintes pontos:

a) O amor requer vigilância.
b) O amor requer disposição de testemunhar.
c) O amor compromete com a transformação.

 

5. Subsídios litúrgicos

Saudação Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna (João 3.16). Sejam bem-vindos e bem-vindas a este encontro com Deus. Que nesta celebração possamos nos sentir na casa, no berço de Deus, permeados de amor e cuidado. Que ele derrame sua graça e bondade sobre nós e sobre toda a humanidade. Aqui nos reunimos em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Amém. Louvemos a Deus entoando o hino…

 

Confissão de pecados

Misericordioso Deus! Inclinamo-nos na tua presença. Reconhecemos que tu és nosso Bom Pastor, reconhecemos que te ocupas e zelas por nosso caminhar e viver. Ao nos inclinar em tua presença, reconhecemos que falhamos e desviamos do caminho, que trilhamos afastados de teus ensinamentos. Clamamos: perdoa, orienta, aponta o caminho. Renova tua graça sobre nosso viver. Amém.

Bênção do amor

Que Deus derrame sobre ti o seu amor.
Que ele desça suavemente sobre a tua cabeça e penetre em teu coração.
Que, inspirado e capacitado pelo Vento Santo,
tuas palavras tenham gosto de compaixão;
teus sorrisos, o perfume da paz;
teus braços, a força da solidariedade.
Que sejas um próximo para quem está perdido
e o ajudes a encontrar o caminho da salvação.
Seja como for, que nunca te falte o amor de Deus,
que vem como vento,
vem como chuva santa,
como o sol que alumia e aquenta,
trazendo nova esperança. Amém.
(Pastor Telmo Noé Emerich – Página Salmos para a Vida)

 

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Proclamar libertação é uma coleção que existe desde 1976 como fruto do testemunho e da colaboração ecumênica. Cada volume traz estudos e reflexões sobre passagens bíblicas. O trabalho exegético, a meditação e os subsídios litúrgicos são auxílios para a preparação do culto, de estudos bíblicos e de outras celebrações. Publicado pela Editora Sinodal, com apoio da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB).