Restaurados
Proclamar Libertação – Volume 43
Prédica: Jeremias 33.14-16
Leituras: Lucas 21.25-36 e 1 Tessalonicenses 3.9-13
Autoria: Marivete Zanoni Kunz
Data Litúrgica: 1º Domingo de Advento
Data da Pregação: 02 de dezembro de 2018
1. Introdução
Jeremias atuou no Reino do Sul, durante o reinado de Josias (626 a.C.), até o início do cativeiro babilônico. Possivelmente morreu no Egito, após a terceira intervenção do Império Babilônico em Jerusalém (587 a.C.), quando Gedalias foi colocado como governador no lugar de Zedequias, que foi levado para a Babilônia com algumas pessoas. Durante sua atuação havia um declínio na área política, moral e religiosa. Por isso houve o cativeiro e o exílio babilônico (Jr 22.22; 48.7).
O Império Babilônico dominava o mundo quando Jeremias profetizava. Embora os textos bíblicos mostrem que nesse contexto o Egito se fazia presente e até parecia ter força para dar suporte ao Reino do Sul contra o Império Babilônico, Jeremias orientava o povo a aceitar o jugo que vinha dos babilônios, pois isso seria ação do Senhor. Durante sua atuação, Jeremias trouxe palavras envoltas de juízo. Por isso não foi benquisto em seu meio, mas considerado um traidor. Tanto os nobres como os reis, e até mesmo o povo, buscavam matá-lo.
Percebe-se que o profeta atuou num período difícil, pois as reformas e mudanças de Josias tinham terminado e o exílio era iminente. Embora envolvido nesse cenário tenso, no capítulo 33 Jeremias apresenta promessas de restauração para Israel. Esse texto está inserido num bloco que traz consolação ao povo, sendo por isso chamado de “livro das consolações”. Assim, esse capítulo e o contexto apresentam uma linda mensagem de restauração, bem como a esperança de um reinado da linhagem davídica. Jeremias 33.14-16 destaca o renovo que viria para a nação de Israel.
O texto auxiliar de Lucas 21.25-36 fala dos sinais que haverá quando o Filho do Homem vier; o texto de Tessalonicenses 3.9-13 destaca o anseio de Paulo em ir para Tessalônica, bem como o desejo de que haja amor de uns para com os outros, lembrando a vinda do Messias. Sendo assim, há uma relação de todos os textos com questões ligadas ao futuro, bem como com a vinda do Messias.
2. Exegese
V. 14 – Neste versículo destaca-se a expressão eis que vêm dias, que aparece em outras partes do livro, como no capítulo 23, onde essa fórmula introduz questões do período messiânico. A ênfase tem ligação com a liderança real, mas também sacerdotal a partir da aliança com Davi. O termo “eis” no hebraico é descrito por uma exclamação, a saber, hinnēh, que em alguns casos enfatiza a proximidade de algo. Nos textos proféticos ela é utilizada para afirmar algo que Deus fará. Nesse sentido, o termo mostra aquilo que está prestes a acontecer.
V. 15 – Há um destaque para o termo renovo. Esse também é um título messiânico que aparece em outros livros, como Zacarias 3.8; 6.12. O termo renovo no hebraico é tsemah, e também significa broto. Esse broto foi levantado para reinar no lugar de Davi. O capítulo 33 “harmoniza a promessa do tsemah com as promessas feitas anteriormente por Deus a Abraão, Isaque, Jacó, os sacerdotes levitas e Davi” (Harris, 1998, p. 1.415-1.416). Neste versículo os termos juízo e justiça também são atributos messiânicos. Aqui há menção à aliança davídica, e essa é importante, pois serve para identificar a continuidade da aliança feita a Abraão em Gênesis 15.5 e 22.17. Tal promessa mostra que o Senhor continua junto com seu povo. Essa parte do texto repete o que está em Jeremias 23.5, ou seja, a promessa da renovação de uma linhagem real e de um rei que governará com justiça.
V. 16 – Este versículo mostra que Jerusalém será novamente habitada. É importante lembrar que há diferentes pensamentos entre os estudiosos sobre como a questão dessa promessa deve ser interpretada, se em sentido literal ou espiritual. Isso é importante, porque essa cidade será uma verdadeira testemunha daquilo que Deus fizer. Para Wiersbe, tais promessas terão seu cumprimento no reino vindouro. Ainda é bom observar a relação deste versículo com o texto de Jeremias 23.6, no qual o profeta afirma que haverá um rei que governará com justiça, cujo nome é o “Senhor, Justiça Nossa”. Interessante é que o profeta afirma que o nome de Jerusalém será o mesmo, por isso Jerusalém se chamará Cidade Santa. Para a expressão “Senhor, justiça nossa”, o texto hebraico apresenta o termo tsdeqnu’. O termo justiça, a partir da raiz hebraica tsdq, pode descrever aspectos que envolvem tanto questões éticas como forenses ou teocráticas. Na parte ética há relação com a conduta de “uns para com os outros”. O aspecto forense diz respeito à igualdade para todos diante da lei. Já o aspecto teocrático envolve a nação de Israel com a aliança e a obediência ao Senhor. Nos livros proféticos, a justiça indica um intenso clamor.
3. Meditação: Restaurados
Jeremias 33 repete o que já foi apresentado no capítulo 31, ou seja, revelações dos momentos finais do cerco da cidade de Jerusalém. Anuncia as coisas que o Senhor fez e a restauração e a purificação que ocorreria. No início, o profeta fala das grandes coisas que o Senhor fará (33.7), ou seja, o povo seria “edificado” como no princípio, antes de Jerusalém ser destruída e ser levado ao cativeiro na Babilônia. Em 33.11 há o anúncio da restauração da sorte do povo, o que nesse contexto significa restaurar a terra do povo. Os horrores do passado seriam agora esquecidos e se ouviria uma voz de alegria e gozo: Neste lugar, do qual dizeis que está deserto, sem homens nem animais, nas cidades de Judá, e nas ruas de Jerusalém […] (v. 11).
Jeremias mostra que Jerusalém, após ser destruída, seria renovada e restaurada. A ênfase é de paz, quando os rebanhos podem encontrar descanso (33.12) e, além disso, os reis da linhagem de Davi, os sacerdotes e os levitas não mais estejam deserdados. Mas por que isso aconteceria agora? Em seguida observamos alguns motivos.
Porque Deus é justo e cumpre suas promessas: Jeremias fala que Jerusalém será renovada e restaurada devido à justiça e fidelidade de Deus no cumprimento de suas promessas, independentemente do tempo em que essas tenham sido feitas. A aliança davídica ocorreu com a promessa de que haveria um rei justo. Salomão é considerado como aquele que cumpriu tal promessa de forma parcial, pois não foi um rei justo com um reinado eterno: isso se cumpriu em Cristo, o Messias da linhagem davídica.
Jeremias 33.14 tem relação com 23.5-6. Ambos falam da aliança com Davi, a qual está declarada em 2 Samuel 7.8-16. Na aliança há uma fórmula característica para introduzir predições messiânicas, a saber: Eis que vêm dias. Nesse contexto isso é muito significativo, pois traz esperança de mudança diante das atrocidades e revela a proximidade do que ocorreria. O cumprimento das promessas que o Senhor traz ao seu povo é ilustrado quando o texto (Jr 33.17-22) faz referência a alianças anteriores que não foram quebradas, a saber: a aliança davídica, conforme 2 Samuel; o sacerdócio, a lei natural instituída por Deus em Gênesis 8.22.
Embora muitos não tenham crido em Jeremias, ele mostrou que haveria um futuro quando Jerusalém seria habitada e todos lembrariam que o Senhor era sua justiça. Parte dessa promessa cumpriu-se quando o povo retornou do cativeiro com o decreto de Ciro, em 538 a.C. Ainda há a certeza de que se o Senhor prometeu e algo ainda não aconteceu, isso se realizará. Tal certeza pode ser observada na própria história do povo com Deus, pois desde que saíram do Egito ele sempre se mostrou justo e fiel em tais cumprimentos.
Ainda que em alguns momentos possa parecer estranho crer naquilo que o Senhor diz que fará para seus filhos aqui ou na eternidade, um dia tais promessas serão cumpridas. A realidade vindoura não pode ser esquecida, pois enquanto a realidade terrena é passageira, há uma que será eterna e, ao final, ali seu povo será justificado.
Finalmente, o Senhor ainda é aquele que faz justiça. Justiça é o anseio do coração do ser humano. Jeremias disse que o nome da cidade seria: o Senhor é nossa Justiça! Que alegria o povo pode ter diante de tal promessa! Há a esperança de manifestação de justiça, ainda que nos últimos dias, independente de qual seja sua forma de interpretar esses últimos dias. As promessas anunciadas pelo profeta ainda servem para encorajar o povo de Deus e ajudam a lembrar que todas elas, relacionadas ao fim dos tempos ou não, se cumprirão.
Porque Deus salva e dá paz: A imagem de paz que esse texto traz é maravilhosa! Depois de tanto sofrimento, angústia e saudades, novamente em Jerusalém o povo encontraria tranquilidade. Essa não era uma paz qualquer, mas a paz capaz de fazer um rebanho repousar em local de doces pastagens. Essa paz seria agora encontrada não só em Jerusalém, mas nas planícies e nas montanhas, nas colinas e nas cidades ao redor de Jerusalém, nas cidades do sul ou em qualquer lugar. Agora se ouviriam vozes de gozo e alegria (v. 11). Não importa o que havia ocorrido, se as casas foram derrubadas e muitos haviam morrido, a promessa é que tudo seria transformado para a glória do Senhor, a qual as nações veriam.
Em Jeremias 33.14-16 há um grande contraste entre aquilo que o povo vivia e aquilo que o profeta transmitia, ou seja, a proclamação era que no futuro haveria restauração, bondade e alegria, e não condenação. Isso seria algo tão real, que sua visualização seria manifesta na fertilidade da terra. Os lugares desertos seriam habitados com animais que teriam pastos para repousar (v. 12-13). Jeremias mostrou que Deus é aquele que transforma situações, salva e devolve a paz.
Conclusão: Sim, Deus é poderoso e pode restaurar tudo. O profeta diz que, embora Jerusalém estivesse acabada, sem vida, uma desolação, o povo deveria ter esperança, pois ali ainda haveria alegria devido àquilo que o Senhor faria. As bênçãos que o povo receberia se estenderiam pela Terra Prometida e, assim, haveria paz e restauração. Embora Jeremias tenha vivido um período de muito sofrimento, ele trouxe ao povo uma palavra de ânimo, encorajamento e esperança, pois as coisas mudariam a partir da linhagem de Davi.
Mesmo que o povo não tivesse esperança, pois seria entregue ao Império Babilônico, o profeta trouxe uma mensagem revigoradora em meio a tanto sofrimento e desilusão. Por isso, se você é filho ou filha de Deus e tem andado sem esperança, lembre-se: há um Deus restaurador, que no decorrer da história tem sido fiel e cumpre suas promessas. Tanto o texto de Jeremias como o de Lucas e de Tessalonicenses trazem o desafio de olhar para o futuro e para o Deus que controla o futuro e tem promessas para seu povo. Esse Deus trouxe uma grande promessa para seus filhos e suas filhas. Ela diz respeito a questões que vão além da realidade atual: alcança e atinge o mundo vindouro.
O Deus do povo de Israel pode restaurar a sorte (Jr 33.26) de seus filhos e suas filhas, de forma que ainda é possível crer e investir em coisas eternas e do mundo vindouro. Assim como o profeta anunciou que Deus novamente faria grandes coisas, de forma que a natureza testemunharia, hoje você é convidado a observar e crer nesse Deus que faz coisas inimagináveis. Como pessoas cristãs, somos desafiadas a meditar na sua Palavra e crer nas suas promessas, pois ele cumpriu a promessa feita através de Jeremias para seu povo e esse voltou a Jerusalém após o cativeiro babilônico. Suas promessas referentes à sua volta e à eternidade certamente se cumprirão.
4. Imagens para a prédica
Extraímos aqui uma mensagem do livro Coletânea de Ilustrações, do autor Natanael de Barros de Almeida. Ela mostra que é preciso ter coragem para confiar. Confiar é fundamental para chegar ao alvo final. A partir do texto exposto, compreende-se que o alvo sempre será as promessas futuras, mas também há uma promessa de restauração e mudança para o tempo presente. Só consegue receber os benefícios da promessa aquele que consegue crer.
“O grande ganhador de almas, Moody, um dia, ofereceu seu relógio de
ouro aos meninos de sua classe bíblica. Desconfiados, recusaram o presente. Finalmente,
um garotinho de seis anos estendeu a mão, pegou o relógio e disse:
– Muito obrigado!
Sem um momento de hesitação, Moody respondeu:
– Não há de quê. E espero que ele seja tão fiel em marcar as horas para
você como foi para mim!
Os outros meninos ficaram espantados:
– O senhor vai mesmo deixar que ele fique com o relógio?
– Como não? – respondeu Moody. – Eu lho dei, porque creu na minha
oferta. É dele porque teve fé em mim.
Como o relógio que Moody ofereceu aos meninos, as vestes brancas podem pertencer-nos pelo simples fato de crermos nas promessas de Deus e estendermos a mão, aceitando-a pela fé. Jesus, através de sua morte, se encarrega de nosso passado tão repleto de pecados e erros. Cabe a nós confessar e crer. Jesus afiança a sua erradicação. No instante em que nós cumprirmos a nossa parte, Jesus cumpre a dEle. Todas as providências foram tomadas por Deus, a fim de apagar o nosso passado pecaminoso (1Jo 1.9). Este é, na verdade, um ‘pensamento precioso’.”
Deus é um grande amigo. Nele você pode confiar. A Bíblia apresenta muitas promessas. Podemos acreditar no cumprimento de sua palavra.
5. Subsídios litúrgicos
Diante do contexto exposto e da dificuldade que o povo tinha para crer na promessa de que haveria a restauração dos cativos, o texto que segue pode servir de auxílio e encorajamento para a alma cansada. A palavra de Deus acha-se repleta de auxílios e esperança para a pessoa cristã, e o Deus que faz promessas é capaz de cumpri-las.
Não tenha medo, pois há uma promessa: Quando passares pelas águas, eu serei contigo; quando pelos rios, eles não te submergirão; quando passares pelo fogo, não te queimarás, nem a chama arderá em ti (Is 43.2). Guardemos firme a confissão da esperança, sem vacilar, pois quem fez a promessa é fiel (Hb 10.23).
Bibliografia
WIERSBE, Warren W. Comentário Bíblico Expositivo: Antigo Testamento. Santo André: Geográfica, 2006. v. 4.
HARRIS, R. L.; ARCHER Jr., G. L.; WALTKE, B. K. Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1998.
Proclamar libertação é uma coleção que existe desde 1976 como fruto do testemunho e da colaboração ecumênica. Cada volume traz estudos e reflexões sobre passagens bíblicas. O trabalho exegético, a meditação e os subsídios litúrgicos são auxílios para a preparação do culto, de estudos bíblicos e de outras celebrações. Publicado pela Editora Sinodal, com apoio da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB).