Proclamar Libertação – Volume 34
Prédica: João 20.1-18
Leituras: Isaías 65.17-25 e 1 Coríntios 15.19-26 ou Atos 10.34-43
Autor: René Krüger
Data Litúrgica: Domingo da Páscoa
Data da Pregação: 04/04/2010
1. Introdução
O texto completo de João 20.1-18, previsto para a pregação no Domingo da Páscoa, contém dois relatos, cada qual com suas características e seus conteúdos sumamente densos e condensados. Como é difícil abarcar ao mesmo tempo numa prédica duas narrações tão complexas, proponho optar por uma das duas, ou seja, a de João 10.1-10 (o relato sobre os dois discípulos) ou João 20.1,11-18 (o relato sobre Maria Madalena e o encontro com o ressuscitado). Para este estudo exegético-homilético, permiti-me optar por essa segunda possibilidade, o que não impede alguém de optar pela totalidade dos versículos propostos.
Normalmente, os textos da Páscoa costumam dividir-se em dois grupos: os do “túmulo vazio” e os das aparições. Chama a atenção o fato de que a exegese normalmente fala do “túmulo vazio” (ou “sepulcro vazio”, quando na realidade se impõe falar do túmulo aberto e do corpo desaparecido). Uma olhadela nos textos pascoais dos evangelhos permite descobrir que todos põem ênfase no fato de que o corpo de Jesus já não se encontra no sepulcro, mas que o Senhor ressuscitou. Empregam, pois, a categoria dinâmica da ressurreição e não a qualificação estática do “túmulo vazio”. Essa foi introduzida por uma certa maneira de fazer exegese a partir de categorias bem mais filosóficas em vez de ater-se estritamente aos dados literários, narrativos e históricos do texto bíblico. A distorção exegética chegou ao ponto de afirmar que se trata de uma história apologética criada para dar credibilidade à proclamação da ressurreição do Crucificado. Isso é colocar o cavalo na parte traseira da carroça. Ao contrário: a proclamação da ressurreição não se poderia manter nem um só dia em Jerusalém se no túmulo se havia mantido o cadáver. Evidentemente, a manipulação do relato do túmulo é uma projeção de dificuldades modernas de certos exegetas para textos antigos, sem prestar atenção ao que implicava naquela circunstância a terminologia empregada para falar da ressurreição. Sob nenhum conceito se relacionava com meras experiências ou visões. Além disso, ninguém teria perseguido os discípulos se esses teriam proclamado somente uma fé num fantasma.
O que essa exegese “estática” também não costuma perceber é a ilação narrativa entre os relatos de paixão, morte e ressurreição, como entre a unidade sobre o túmulo e as demais unidades dentro dos capítulos pascoais dos evangelhos. Há um crescendo que vai desde a intenção de ungir um cadáver até as respectivas palavras finais dos quatro evangelhos, em que se afirmam a certeza da ressurreição de Jesus Cristo, a transformação das pessoas interventoras e os respectivos envios missionários. Isso também vale perfeitamente para João 20.1-18. Aqui se transformam os dois discípulos e Maria Madalena, assim como posteriormente todos os outros personagens desse capítulo, também os do agregado capítulo 21.
A unidade sobre o túmulo é patrimônio evangélico de absoluta antiguidade. Isso é assim, pois os quatro evangelhos o compartilham, cada qual com sua respectiva ênfase, mas com idêntica estrutura. Onde há mais variações é na transmissão das aparições do Ressuscitado, devido muito à multiplicidade dessas aparições e das pessoas envolvidas, como também às ênfases teológicas de cada evangelista. Hoje nos ocupará, pois, a peculiaridade joanina da aparição diante de Maria Madalena.
2. Exegese
V. 1-2 – A indicação temporal evidencia que se trata de material antiquíssimo, pois o desenvolvimento litúrgico posterior falou do terceiro (cf. o credo em 1Co
15.3-4). Ou seja, aqui existe memória histórica autêntica.
João é seletivo. Enquanto que nos sinóticos se mencionam várias mulheres, João concentra a atenção exclusivamente sobre Maria Madalena. Ao ver o túmulo aberto, deduz que alguém levou o Senhor e comunica isso a Pedro e a outro discípulo (mesmo que aqui emprega o plural: … e não sabemos…; seguramente sinal de que a fonte original do relato falava de várias pessoas, como nos sinóticos). O texto deixa abertas várias possibilidades: traslado real, roubo do cadáver por inimigos, roubo por ladrões. O saque de túmulos era tão comum, que havia disposições penais sobre esse delito. O imperador Cláudio (41-54 d. C.) decretou a pena capital para quem destruía túmulos, removia cadáveres ou removia o lacre.
Os vaivéns que se produzem a partir dessa primeira notícia repercutem tanto no encontro do Ressuscitado com Maria Madalena como nos demais. São, pois, dados preparatórios.
Depois desse primeiro informe de Maria Madalena, o texto insere o relato da chegada dos dois discípulos ao túmulo, a constatação da existência dos lençóis (evidentemente vazios) e o sudário bem enrolado, a fé do discípulo amado, uma breve reflexão teológica e a retirada de ambos (Lucas 24.12 também informa sobre a inspeção do túmulo por parte de Pedro e a existência dos lençóis; e no v. 24 menciona alguns dos nossos). Na exegese, discute-se sobre a relação entre ambos os relatos: o dos dois discípulos e o de Maria Madalena. Deixemos para outra oportunidade essa discussão e a unidade sobre os dois discípulos e passemos diretamente ao v. 11, onde João continua com Maria Madalena.
V. 11-18 – Os versículos 11b-14a apresentam a revelação dos anjos, paralela ao relato sinótico. Os versículos 14b-18(+19) contêm a revelação de Cristo, cujo paralelo sinótico se encontra em Mateus 28.9-10.
Em João, as aparições do anjo e de Jesus encontram- se em certa tensão. Há quem veja aqui duas tradições separadas; outros, que a revelação de Cristo é a tradição original, correspondendo o v. 17 ao próprio evangelista; e que a revelação do anjo é uma adição de um redator ou uma elaboração do evangelista para reforçar o testemunho “mudo” dos lençóis do sudário mediante o recurso das figuras celestiais (v. 5-7). Também há quem pense que existem três relatos inter-relacionados: a visita ao túmulo por várias mulheres (v. 1-2 e 11-13); a visita por vários discípulos (v. 9-10); a aparição do Ressuscitado a Maria Madalena (v. 14-18). Todas as reconstruções são muito complexas e, em última instância, hipotéticas, e o que mais tem a interessar a quem tem a missão de pregar o texto é a forma final que tem o relato, pois os fragmentos anteriores e também seus sentidos acabam sumidos no discurso final, que projeta seu sentido teológico e querigmático próprio, que não equivale à simples soma dos sentidos parciais dos elementos originais.
V. 11 – O relato mostra Maria chorando fora do túmulo, desconcertada pelo desaparecimento do morto, tal como ela mesma formula no v. 13. Ou seja, talvez não tanto pela morte do Mestre. Querer render um último ato de honra a um falecido, seja uma visita ou a unção, e não o contrário, realmente era uma tragédia. Pois até os ladrões de túmulo costumam deixar ali o cadáver, pois esse não os interessa, a não ser seus pertences. Para a cultura da época, qualquer tipo de profanação de túmulos e cadáveres era um ato horripilante.
Maria não entrou no túmulo, mas apenas se inclinou para olhar para dentro da cova. Essa demora em entrar deve ser vista por trás do relato global, no qual os dois discípulos entram no sepulcro logo após o amado crê.
V. 12 – Os anjos representam a irrupção do mundo de Deus (e em alguns textos do AT representam a Deus mesmo), reforçando-se essa referência mediante a cor branca das vestimentas. Seu número ajusta-se à necessidade de duas (ou mais) testemunhas para que o testemunho seja válido, tal como estabelece Deuteronômio 17.8;19.15 e como é retomado várias vezes no NT (p. ex. 2 Co 13.1). As figuras cooperam com o testemunho anterior dos lençóis e do sudário, indicando que Deus esteve atuando aqui, e não ladrões de túmulos.
V. 13 – Diferentemente dos relatos sinóticos, onde os anjos proclamam a ressurreição e elaboram mandatos, em João os anjos cumprem outra função. O discípulo amado chegou a crer sem ver e sem anúncio, e como Maria verá o Ressuscitado mesmo, o relato não exige que os anjos sejam intérpretes da ressurreição. Pronunciam uma suave reprovação à mulher desesperada, sumida na especulação com o ladrão de túmulos ou um traslado desconhecido. Remetem assim implicitamente ao que virá e querem ajudar Maria Madalena a formular seu problema. Aqui o relato se liga com a pergunta inicial dos anjos nos sinóticos.
V. 14 – Aqui está preso o estopim para a “explosão” posterior do texto. Jesus está aí, ressuscitado, vivo; mas Maria não o reconhece. Alguns exegetas deram rédeas soltas às suas especulações sobre essa informação, falando dos olhos cheios de lágrimas que impediram ver com claridade; ou da posição orientada a partir do sol: como a boca do sepulcro dava para o oriente, Maria, ao dar a volta no sepulcro, olhava a partir da saída do sol, ficando como que deslumbrada; ou também lançando mão do recurso do corpo transfigurado, que era difícil de reconhecer, como no caso dos discípulos de Emaús em Lucas 24.16-31; ou em confusão com um espírito em Lucas 24.37. Agregue-se o dado no final extenso de Marcos 16.12 e no reconhecimento em João 21. Como o texto mesmo não se perde em nenhuma dessas possibilidades, mas que constrói sua mensagem do reconhecimento do Ressuscitado a partir do momento em que esse chama Maria, podemos deixar de lado essas divagações.
V. 15 – João trabalha brilhantemente o motivo do não-reconhecimento, apresentando uma dupla pergunta formulada por Jesus, cuja primeira parte é igual à pergunta dos anjos. Essa pergunta é muito mais do que retórica, como veremos na reflexão homilética. É uma nova exigência para Maria que formule seu problema.
Maria continua em sua confusão, pensando que estava frente ao jardineiro, e não lhe ocorre coisa melhor do que pensar que esse podia ser o que havia trasladado o corpo. O que Maria propõe é por demais impraticável: Para onde ela quer levar sozinha o corpo?
Mas não deve preocupar ao público leitor essa inviabilidade da proposta da mulher enlutada. É figura de um desespero crescente que leva a propostas como essa; e ela está encaixada na técnica joanina dos mal-entendidos: a compreensão dos que creem forma-se a partir de um mal-entendido.
Ao mesmo tempo, em meio a todo o enredo de desespero e confusão, o texto começa a fornecer um dado valiosíssimo que mostra por onde se produzirá a solução: Maria diz kúrios ao que considera que é o jardineiro. Em seu sentido não-religioso, aplicava-se a um proprietário, dono; a uma pessoa que tinha autoridade sobre outras pessoas; e também podia ser designação muito respeitosa, como nosso você, senhor. No uso religioso, era designação e título pessoal para Deus e Jesus Cristo. Mas, em todo caso, o título lhe parecia por certo algo “grande”, embora não de todo impossível, a um trabalhador que cuidava jardins. Além do mais, esse não se ocuparia com túmulos, mas somente com o jardim em si. Ou seja, Maria produz maior confusão com sua pergunta.
V. 16 – Aqui “explode” o texto: Jesus chama Maria por seu nome. Esse gesto não está isento de ternura. Retoma, por sua vez, o dito em João 10.3: As ovelhas ouvem a sua voz, ele chama pelo nome as suas próprias ovelhas.
Maria, voltando-se de novo para ele (deduzindo-se disso que Maria voltou a olhar para dentro do túmulo), responde com seu reconhecimento como seu mestre. O emprego do termo transliterado do arameu rabbouni, uma forma peculiar de rabbi, mestre meu ou meu mestre, demonstra que Maria lhe atribui sua profunda reverência, fazendo-o, por sua vez, num tom familiar e menos formal. Esse termo arameu é outro dado a mais que evidencia que estamos diante de material antiquíssimo. Isso também é corroborado pelo termo em si, no idioma que seja. Um “retoque” ou, pior ainda, uma história forjada haveria empregado algum título muito mais sublime, teologicamente “mais puro e perfeito” que o familiar e popular rabbouni.
V. 17 – À primeira vista, a resposta de Jesus desconcerta. Tem-se procurado compreendê-la a partir de uma possível origem arameia por trás do termo grego áptou, no sentido de apegar-se a alguém e também seguir. Existe aqui algum desenvolvimento textual a partir do transmitido por Mateus 28.9, onde as mulheres abraçaram os pés do Ressuscitado e o adoraram? É possível. A clássica formulação da Vulgata Noli me tangere serviu como título a uns quantos quadros com essa cena.
Algumas pessoas introduziram aqui especulações sobre um estado intermediário de Jesus entre a ressurreição e a glorificação “definitiva”, apresentada em Lucas 24 e em Atos 1 sob a figura da ascensão. Como seria isso? Por acaso um estado intermediário entre o “corporal”, o “espiritual”, o “terrenal”, se bem ressuscitado, mas visível, palpável, audível etc. e o “celestial”, já invisível, “totalmente” glorificado, ubíquo? Pergunto, têm sentido essas especulações sobre a natureza, composição ou configuração do corpo do Ressuscitado? Certamente pode resultar mais fecundo ver na dupla ordem de Jesus (não retê-lo/tocá-lo ou o que fosse, e o anúncio a seus irmãos) a indicação de que Maria agora deve ir urgentemente dar testemunho e, por sua vez, que a relação entre o Senhor e Mestre e seus irmãos e irmãs se modificou. Mais além das dificuldades para o conceito de ressurreição e glorificação que requer a referência à subida ao Pai (tema que por razões de espaço não podemos considerar aqui), é importante destacar que o Ressuscitado coloca um acento duplo, e com isso especial, sobre a pertença ao Pai e a Deus. Meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus não remete a dois tipos de relação diferentes entre si, mas sublinha enfaticamente que meu Pai e Deus é vosso Pai e Deus.
V. 18 – Esse final é impressionante. A mulher enlutada, logo barbaramente confundida, depois agraciada com a aparição e a apelação pessoal, volta crente entusiasmada, converte-se na primeira anunciadora pública do Ressuscitado.
É altamente significativo que João não fale de uma reação incrédula e negativa dos discípulos que recebem o anúncio, como aparece em Lucas 24.11.
Apesar de que a lista das primeiras testemunhas do Ressuscitado, representada em 1 Coríntios 15.5-7, não mencione Maria Madalena, nenhuma omissão do mundo poderá apagar jamais o ato de que a primeira pessoa que anunciou, proclamou, pregou o Ressuscitado foi a mulher Maria Madalena. E isso apesar das disposições da época contra o testemunho de mulheres. Ou talvez precisamente por elas.
3. Reflexão homilética
Ensina a boa regra homilética que, para a elaboração de uma prédica, deve- se escolher e trabalhar um só entre os diversos focos ou núcleos teológicos do texto. Geralmente surge a tentação de pregar sobre tudo ou pelo menos sobre os aspectos relevantes, mas esses sempre costumam ser definitivamente muitos, destruindo-se assim mutuamente uma prédica que, por pretender oferecer muito ou tudo, finalmente não diz nada.
Entre os diversos núcleos que podem ser trabalhados a partir desse texto destacamos tão-somente dois, deixando a critério de quem deve pregar a seleção final: a transformação de Maria Madalena e seu testemunho como mulher.
3.1 – Com respeito a seu testemunho como mulher, deverá partir-se da pesada carga religioso-cultural do contexto, que impedia que as mulheres pudessem dar testemunho nos julgamentos e tribunais, porque eram consideradas mentirosas (com uma “justificação” trazida dos cabelos, remetida ao ato de que Sara negara ter rido diante da promessa de descendência – como se Abraão fora melhor, mentindo de maneira muito mais vergonhosa sobre a identidade de seu cônjuge, fazendo passar Sara no Egito por sua irmã).
Nesse contexto cultural, é surpreendente, insólito e inédito que se tenha conservado tanto na transmissão oral da primeira etapa da igreja como na que fora posto por escrito nos evangelhos: o ato de que o Ressuscitado apareceu em primeiro lugar a uma mulher e que essa mulher o anunciara a outras pessoas. Esse fato é uma prova muito convincente de que o duplo testemunho formado pelo de Maria Madalena ou de sua fixação literária não é algo forjado, pois a qual discípulo ou a qual evangelista teria ocorrido inventar uma história de tal calibre com uma mulher como testemunha feminina de semelhante categoria? Teria sido muito fácil desautorizar tal testemunho “inaceitável” quanto à sua portadora – salvo que o mesmo se baseara na realidade histórica.
A partir desse núcleo implícito no texto pode-se trabalhar questões de valorização de gênero em geral e da situação das mulheres em geral. A seleção dos itens a elaborar fica sujeita à capacidade de quem deve pregar sobre esse texto.
Não se pode esquecer que algum tempo depois a igreja não soube manter a atitude contracultural que Jesus e as primeiras comunidades cristãs haviam sabido construir com tanta coragem cívica, religiosa e teológica. Tempos depois recaíram de novo em esquemas patriarcais, assim como também voltaram ao clássico esquema sacerdotal e seu aparato sacrificial e ao conceito de templo como espaço especialmente sagrado, esquecendo que já não eram mais necessários os sacrifícios e que o verdadeiro templo, como espaço no qual vive Deus, é o corpo da pessoa crente e a comunidade como um todo.
3.2 – A transformação de Maria Madalena produz-se em várias etapas, que podem servir de paradigma para nossas próprias transformações. Maria Madalena chega cheia de dor ao túmulo. A dor pela morte é aumentada (quase desviada, teríamos que dizer) pela ausência do morto. Maria anda por tentativas quase cegas, faz perguntas que (aparentemente) desviam do objetivo fundamental do texto, sofre com mal-entendidos (usados habilmente pelo evangelista como recursos narrativos e teológicos) e recém “desperta” a partir do momento em que o Mestre a chama por seu nome. Nesse instante, ela o reconhece, reconhece o que está acontecendo, conhece a novidade absoluta, e ao receber o mandato do rabbouni, transforma-se na primeira pessoa que dá testemunho do Ressuscitado.
De grande importância são as perguntas que Maria deve responder. Por que tantas voltas? Por que os anjos e logo Jesus não se dão a conhecer na entrada? Acaso não sabem por que chora a mulher? Acaso se trata de perguntas retóricas? De maneira nenhuma. Claro que sabem por que chora. Assim como Deus sabe onde estava Adão em Gênesis 3.9 e o que aconteceu com Abel em Gênesis 4.9. E o Ressuscitado sabe muito bem a quem Maria busca. Mas ela deve formular seu problema. Isso é o que Deus quis dela: que responda contando sua dor, que formule sua preocupação, que manifeste seu pedido. O desafio de descrever um problema é por certo uma oferta terapêutica. Mesmo que Maria esteja apontando numa direção “equivocada”, como já sabe quem lê o texto, sua resposta é importantíssima, pois expressa sua busca.
E logo está a apelação direta mediante o uso por Jesus do nome da pessoa sofrida. Aí se produz o reconhecimento, “imperfeito” ainda, se se quer, mas decisivo.
Da curiosa ordem de “não retê-lo” (ou, mais raro ainda, “não tocá-lo”) também pode derivar-se um elemento singular teológico. O evangelista indica que, a partir de agora, o encontro e o contato com o Mestre ressuscitado realizam-se na fé através da Palavra e no Espírito. Fica concluído o ciclo “terrenal” do ministério de Jesus, desenvolvido na terra de Israel, e agora sua projeção, que podemos chamar de universal, incluindo aqui a dimensão que Jesus indica com subir ao Pai e com a referência à comunidade ampliada.
Uma prédica dedicada a esse foco pode trabalhar, então, nossos desesperos, buscas e situações problemáticas, desdobrar as possibilidades do encontro com o Ressuscitado através da fé, sua Palavra e no Espírito, vividos todos em comunidade, e apontar para nossa transformação para dar testemunho do Ressuscitado com nossas vidas e palavras.
O anúncio do Ressuscitado deve incluir sempre o anúncio da possibilidade de nossa própria ressurreição, a diária e a escatológica, assinalando como a história de nossa vida pode cruzar-se com o Ressuscitado e levar até ele.
4. Subsídios litúrgicos
Se for a opção pelo tema da transformação de Maria Madalena, pode-se pensar no seguinte subsídio: pendurar pedaços de tecido desde cinza ou marrom escuro (não preto), passando por cores mais claras, até chegar a algumas cores vivas e fortes: vermelho, azul, amarelo, verde, para simbolizar a transformação a partir da dor até a certeza da vida. Os pedaços de tecidos devem ir da esquerda para a direita, para que possam ser “lidos” como uma linha de escrita. Para cada passo da prédica, deve ser mostrada a respectiva cor simbólica.
Proclamar libertação é uma coleção que existe desde 1976 como fruto do testemunho e da colaboração ecumênica. Cada volume traz estudos e reflexões sobre passagens bíblicas. O trabalho exegético, a meditação e os subsídios litúrgicos são auxílios para a preparação do culto, de estudos bíblicos e de outras celebrações. Publicado pela Editora Sinodal, com apoio da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB).