PLURALISMO RELIGIOSO COMO DESAFIO AO ECUMENISMO NA AMÉRICA LATINA1
Trajetória ecumênica no século XX
Como é sabido, o moderno movimento ecumênico2 nasceu no mundo anglicano e protestante, a partir do final do século XIX, particularmente na pastoral universitária em países europeus. Partia da consciência de que a divisão na família cristã afetava a própria credibilidade do testemunho cristão, centrado em “um só Cristo”. Já ao longo do século XX houve um estupendo desenvolvimento na compreensão e na prática do ecumenismo. Basicamente, podemos constatar que esse movimento contou com três vertentes: a missionária, a diaconal e a doutrinal.
A princípio tratou-se da cooperação entre diversas Igrejas cristãs no campo da missão, entendida essa no sentido de “levar o Evangelho a toda a criatura”, “até os confins da terra”. Na Conferência Internacional de Missão de Edimburgo (1910) – muitas vezes assinalada como data magna da origem do ecumenismo -, seus organizadores pensaram poder excluir a América Latina de suas considerações, porque esta já estaria inteiramente cristianizada, isto é, de confessionalidade católico-romana. Embora se possa exaltara sensibilidade ecumênica dessas Igrejas anglicanas e protestantes para com a Igreja católica romana já então, pode-se também constatar a limitação de seu conceito de missão, como se essa pudesse alguma vez estar já completa e encerrada3. Em todo caso, criou-se aí, o Conselho Missionário Internacional que funcionou até 1961, quando se fusionou com o Conselho Mundial de Igrejas (CMI), em sua III Assembléia Geral, em Nova Délhi (Índia).4
Em segundo lugar, mencione-se o Movimento de Vida e Ação que realizou sua primeira conferência em Estocolmo (Suécia), em 1925. Esse movimento foi considerado uma expressão do “cristianismo prático”. Ou seja, tratava-se da visão de que era indispensável a união dos cristãos para enfrentar os desafios que se colocavam diante da Igrejas no âmbito social e moral. De fato, o movimento ecumênico veio a desenvolver um importante papel na busca da paz, no apoio a refugiados da Segunda Guerra Mundial e, posteriormente, em questões relativas à Igreja na sociedade, como, por exemplo, no combate ao racismo e na defesa dos direitos humanos, área particularmente importante na América Latina quando das ditaduras militares.
Em terceiro lugar, registre-se o Movimento Fé e Constituição (Faith and Order) que realizou sua primeira conferência em Lausanne (Suíça), em 1927. Esse movimento esteve voltado para questões doutrinais e de ordem eclesiástica. Cedo se integrou ao CMI, criado em 1948, em Amsterdã (Holanda)5. A Igreja católica romana participa oficialmente de Fé e Constituição, embora até hoje não tenha se afiliado ao CMI. Como é sabido, o marco decisivo para a afirmação oficial do ecumenismo no seio da Igreja católica é o Vaticano II (1962-1965), por meio do Decreto sobre o ecumenismo (Unitatis redintegratio)6. O atual pontífice, papa João Paulo II, tem afirmado reiteradamente que o ecumenismo não é algo opcional, mas faz parte da essência da Igreja, assim, por exemplo na encíclica Ut unum sint.
O pluralismo religioso na América Latina
Se considerarmos os três pilares do movimento ecumênico no século XX – o missional, o diaconal e o doutrinal -, é significativo constatar-se que na América Latina tem havido uma trajetória ecumênica que priorizou nitidamente os dois primeiros, deixando para segundo plano o doutrina7. Embora não se deva esquecer a cooperação ecumênica no terreno da ação social, como, por exemplo, no tocante à questão agrária8, concentramo-nos aqui na questão específica da análise do cenário religioso latino-americano.
Observemos, primeiro, a evolução do conceito de missão. Como vimos, em Edimburgo as Igrejas anglicana e protestantes se debatiam com o problema de como “levar Cristo a todas as nações”, com credibilidade, e reconheciam a falta de unidade cristã como obstáculo a essa tarefa missionária. Destituídos de qualquer espírito proselitista e sectário, também haviam excluído de sua atenção a América Latina, por esta já ser considerada cristianizada (como, de resto, se consideravam cristianizadas a Europa e a América do Norte). Em contraste, a Conferência Mundial de Missão e Evangelização da Cidade do México (1963) afirmou a “missão em seis Continentes”, realçando portanto que a missão é tarefa permanente para qualquer Igreja, em todos os contextos. Já ao final do século XX, a Conferência Mundial de Missão e Evangelização realizada em Salvador (Bahia, 1996) reuniu-se no intuito de compreender e celebrar o Evangelho em “diferentes culturas”. Há aí uma nítida evolução de um conceito unidirecional e uniformizador de missão em direção a uma compreensão dialogal e de respeito à diversidade das expressões culturais da fé cristã9.
De fato, há hoje na América Latina, longe de constituir um Continente homogêneo do ponto de vista religioso – ou seja, católico-romano -, uma crescente consciência de nossa pluralidade étnica e cultural. Uma de suas facetas é também o crescente pluralismo religioso, que representa um desafio especial ao ecumenismo e à missão. Não deixa de haver certa ambigüidade nesse reconhecimento do pluralismo religioso. Pois, de um lado, o século XX pode ser caracterizado como o século do ecumenismo, isto é, dos esforços para superar as divisões ocasionadas por divergências confessionais e por conflitos eclesiásticos ao longo da história. Por outro, porém, a América Latina se converte hoje em um continente plural, no sentido étnico, cultural e religioso. Se essa diversidade deve ser descoberta cada vez mais como riqueza, e não como problema, também é certo que o pluralismo religioso pode assumir um rosto de intensa rivalidade, competição e proselitismo, quando não de discursos difamatórios e práticas agressivas mútuas. Seria esse o resultado contraditório de um século de ingentes esforços pela unidade? Que perspectivas podemos ter para o futuro? Ao fazermos essas perguntas, damo-nos conta de que a compreensão correta – diria até mesmo ousada – do fenômeno religioso na América Latina hoje e de suas perspectivas constitui em si mesma uma das tarefas ecumênicas mais urgentes e decisivas. O crescimento de alguns movimentos pentecostais, particularmente neopentecostais, chega a ser assombroso. Sua expressão de fé é abraçada com fervor por verdadeiras multidões. Por outro lado, observa-se um processo cada vez menos silencioso e de grande profundidade, de redescoberta de expressões religiosas indígenas e afro, antes vivenciadas de forma oculta, quando não na clandestinidade social.
As razões para tal evolução são, por certo, múltiplas: elas provêm desde a ausência de certeza para com o amanhã, passam pelo vazio de uma catequese cristã pouco mais do que formal e da expressão de uma fé cristã apenas repetitiva e rotineira, até o sofrimento causado pela exclusão social – particularmente aguda no campo da saúde. A mudança de adesão religiosa de uma fé sentida como tradicional e vazia para uma das muitas muito novas expressões de fé religiosa vem invariavelmente acompanhada da sensação da experiência do novo ou da redescoberta de valores até agora reprimidos. Isso não apenas proporciona a sensação de valorização enquanto pessoa10 e participante ativa das celebrações cúlticas11, como também constitui formas concretas de relacionamento comunitário fraterno em meio ao anonimato das metrópoles ou na vulnerabilidade psicossocial em meio às migrações.
Há que se mencionar também, por certo, a memória histórica que aflora em tempos de maior tolerância religiosa. Não se deve esquecer que a própria fé cristã foi trazida e este Continente por meios não da simples proclamação do Evangelho e da persuasão, mas sim por meios coercitivos e portanto nada respeitosos aos valores religiosos tradicionais indígenas e das populações negras escravizadas. É bem verdade que nessa história nem tudo foi coerção, tendo havido também missão solidária com populações indígenas e com os empobrecidos em geral. No entanto, é notório que predominou, ainda assim, a aliança entre trono e altar no âmbito do catolicismo, bem como a vinculação de missões protestantes a modelos externos de modernidade e individualismo. Não é coincidência, pois, o fato de haver hoje, num ambiente de mais mobilidade social e cultural, e também um notável ressurgimento de tradicionais expressões religiosas indígenas e afro na América Latina e no Caribe. Trata-se de uma questão de reafirmação de uma identidade por tanto tempo sufocada. De outra parte, também a adesão acentuada de comunidades indígenas a Igrejas evangélicas, sobretudo pentecostais, nos últimos anos, fenômeno constatável em toda América Latina, deve ser creditada em boa parte ao fato de que essas Igrejas lhes possibilitam uma firmação comunitária em meio a condições de vida deterioradas na sociedade, e não apenas a práticas proselitistas e porventura duvidosas de parte de Igrejas evangélicas e pentecostais.
Não se pretende com essa observação diminuir de algum modo a crítica que se possa ou se deva fazer a práticas religiosas ditas evangélicas que com freqüência violentam os valores culturais e sociais de populações indígenas e afro12. Afirma-se, isso sim, que as comunidades indígenas e afro latino-americanas e caribenhas já não se deixam mais simplesmente tutelar por forças externas, mas fazem mais e mais uso de sua própria faculdade de decisão também no que respeita à sua opção e prática religiosa. E o fazem de maneira pluralista: quer assumindo de maneira intencional a religiosidade católica, via de regra em sua forma popular, quer optando pela alternativa evangélica, freqüentemente numa das variantes pentencostais, quer ainda recuperando a religiosidade de seus ancestrais.
Dentre as razões para o surgimento e crescimento de novos movimentos religiosos – em regular número de casos também de proveniência da espiritualidade oriental – mencione-se ainda o ‘cansaço espiritual’ com a racionalidade moderna ocidental, não escapando nem mesmo a frieza do chamado fim das utopias terrenas. Acresça-se a isso toda uma mística da chegada ao fim não apenas de um século, mas de um milênio. Há mil anos, às vésperas do fim do primeiro milênio pós-Cristo, também houve um crescimento espetacular das expectativas apocalípticas13 …
Não há dúvida que o cenário é também propício para o surgimento de expressões religiosas baseadas na credulidade fácil, com líderes muitas vezes inescrupulosos que se aproveitam da ânsia de sentido e eternidade para obter um ganho fácil. Isso pode chegar até à extorsão e ao charlatanismo, em particular na promessa de curas divinas, mas inclui formas mais sutis como a propagação, no meio evangélico, de uma teologia da prosperidade que promete aos crentes ( e contribuintes – dizimistas!) toda sorte de bênçãos, até mesmo milagrosas compensações financeiras capazes de deixar para trás todas as agruras atuais. Seria totalmente simplista, porém, querer atribuir o crescimento das novas expressões religiosas ao oportunismo de líderes corruptos e, pior, à ignorância das populações, Há muito antes, a dedicação incansável de inúmeros líderes religiosos populares, que se reencontraram como sujeitos sociais, a descoberta de um sentido de vida e de fé, a transformação de um estilo de vida do caos do abandono para uma direção disciplinada, além de uma melhora – geralmente sensível, ainda que limitada – da qualidade de vida individual, familiar e no seio da comunidade de fé. Essa experiência encontra-se na base do fervor da nova religiosidade.
O desafio ecumênico
Nada faz supor que essa tendência ao pluralismo religioso possa reverter-se nos próximos anos. Ao contrário, tudo leva a crer que ela ainda se intensificará. Para dizer de maneira clara: O Continente será, no futuro, menos católico, mais pentecostal, com espaços significativos para a religiosidade indígena e africana, e com uma incidência real, ainda que modesta, do protestantismo histórico.
Seja inserida aqui uma observação acerca da tipologia empregada. Até certo ponto ela é problemática. Isso porque a diversidade é tão grande que, a rigor, não pode ser reduzida a três ou quatro expressões tipificadas, sem perder importantes especificidades. Por exemplo: onde fica a necessária distinção entre pentecostalismo e neopentecostalismo? Ou: onde se classificaria o Anglicanismo, que se entende como católico e, simultaneamente, protestante? Ademais, um tipo de espiritualidade e movimento característico para determinada confissão religiosa, pode ser encontrado também no interior das demais. Por exemplo, a experiência pentecostal está crescentemente presente nas Igrejas do protestantismo histórico e também no catolicismo, no fenômeno de renovação carismática. Significativamente, temos outro dentro de nós mesmos. De outra parte, grande número de pentecostais entende-se como um movimento no interior do protestantismo e não deseja ser excluído dele pela análise de terceiros, particularmente de outros protestantes. De maneira semelhante, também há uma memória católica no protestantismo. É, por exemplo, sabido que os Reformadores não pretendiam criar novas Igrejas, mas sim a renovação evangélica da fé católica. Inversamente, também é inegável Ter havido uma irrupção do evangélico no âmbito do catolicismo, perceptivelmente no Vaticano II e no movimento eclesial de base. No pentecostalismo, por sua vez, pode-se encontrar uma crescente abertura para o ecumenismo, ainda que muitos – a maioria, por certo – prefiram acreditar no crescimento por divisão , como um de seus representantes me disse certa vez com considerável candura.
No entanto, a tipologia também é necessária, pelo menos por duas razões. Uma tem a ver com os efeitos históricos de um movimento, muitas vezes não coincidentes com as intenções de seus protagonistas originais. Lutero, por exemplo, pretendeu renovar a Igreja una pela Palavra: ainda assim, por contingência histórica, surgiu o luteranismo. De certo modo, seu êxito produziu um efeito histórico que se estendeu para além de suas próprias intenções. Semelhantemente, poder-se-ia dizer que a expansão do pentecostalismo rompe as fronteiras do protestantismo e adquire um direito a identidade própria. A Segunda razão para a tipologia aqui empregada é pragmática, de cunho pedagógico: intenta captar a natureza e característica essencial de movimentos diversificados. Nesse sentido é empregada a tipologia, com plena consciência de sua limitação e precariedade, como também do fato de haver intercomunicação e influência mútua entre as diversas expressões.
Não há dúvida que o cenário é, para as Igrejas tradicionais, em muitos sentidos, ameaçados. O protestantismo histórico, sufocado entre a grande Igreja católica e o fenomenal crescimento pentecostal, confronta-se com um radical questionamento de sua identidade, quando não se vê forçado a lutar até mesmo por sua sobrevivência. Ao ver-se ameaçado. Há exceções – é verdade – , nas quais o protestantismo histórico soube pôr-se em sintonia com os anelos mais profundos do povo e de suas lutas. Contudo, essas exceções parecem confirmar a regra. Não se pode esconder que o protestantismo histórico, que teve seu crescimento no passado, dá sinais inequívocos de estar perdido ou de Ter deixado passar despercebido o novo palpitar dos tempos. Ao ver-se ameaçado, a tentação maior do protestantismo parece consistir na capitulação, isto é, na tentativa de imitar o pentecostalismo (assim em décadas passadas chegou a invejar a renovação eclesial na Igreja católica), com a adoção de sua espiritualidade e de sua forma de pregação e culto. Essa tentativa, ademais de poder estar destinada ao fracasso, pela incapacidade de fazê-lo tão bem como as igrejas pentecostais, representa uma verdadeira renúncia à contribuição ecumênica específica que cabe às Igrejas protestantes dar: o recurso permanente e rigoroso aos critérios bíblicos indispensáveis em toda prática eclesial: a referência constante à cruz de Cristo como perspectiva evangélica diante de entusiasmos muitas vezes ilusórios e efêmeros: a abertura para renovar-se a partir das experiências e práticas de outras Igrejas. de outro lado, o mais doloroso para o protestantismo, ao debater-se com sua própria identidade e sobrevivência, será seguramente definir sua tarefa missionária num sentido nitidamente ecumênico, antepondo a integridade evangélica à compulsão para o crescimento denominacional.
É compreensível que a Igreja católica sinta-se particularmente atingida e ameaçada pela intensa mobilidade religiosa. Já que ela tem sido, de forma oficial ou inoficial, não apenas uma expressão religiosa entre outras, mas a religião dos povos latino-americanos. Ainda hoje a esmagadora maioria do povo latino-americano professa a fé católica, ainda que muitas pessoas pouco a pratiquem14. É verdade que a chegada do protestantismo histórico à América Latina, especialmente na Segunda metade do século XIX e primeira metade do século XX, também representou um choque para a Igreja católica, em particular quando atraía as camadas mais instruídas ( ou mesmo elitistas) da sociedade. Mas esse desafio não é nada comparável com a atual onda pentecostal, que arranca da fé católica, para dizê-lo assim, amplas parcelas do povo. Até mesmo, em relação à religiosidade indígena e afro emergente, poderia talvez haver a expectativa de que esta fosse sincreticamente assimilável pela Igreja católica. O mesmo não poderia ocorrer, contudo, com o pentecostalismo, por sua freqüente militância e polêmica anticatólica e antiidolátricas. Confrontada com esse inusitado pluralismo religioso, a tentação da Igreja católica poderia consistir em anelar pela volta dos velhos tempos da unidade com o Estado ou, pelo menos, de privilégios sociais garantidos pelo poder público15. Ou, em escala menor, a tentação consistiria em voltar à velha disciplina, uma compreensão monolítica, fundamentalmente hierárquica e ortodoxa da fé católica.
Todavia, a contribuição ecumênica mais significativa que só o catolicismo poderá proporcionar consiste em seu sentido de universalidade e de unidade no sacramento. Isso só será factível, porém, se na atual conjuntura essa contribuição for acoplada a sinais inequívocos – que certamente virão acompanhados de sentimento de dor pelas perdas ocorridas – de reconhecimento da legitimidade de opções religiosas diferentes no continente latino-americano. Ademais, não há como esquecer que para as demais Igrejas foi sumamente significativa a renovação experimentada pelo catolicismo em décadas passadas no amplo movimento das comunidades de base que unem a experiência de fé e a espiritualidade com uma prática comunitária e social significativa.
Nesse contexto, é oportuno observar o impacto extraordinário que causou no mundo protestante e pentecostal a publicação, em setembro de 2000, da Declaração Dominus Jesus, da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé e assinada por seu Prefeito, cardeal Joseph Ratzinger, com a expressa anuência papal. Esse documento enfoca fundamentalmente a questão do diálogo inter-religioso – que não é o objeto prioritário de análise neste artigo – e visa estabelecer o marco doutrinal para esse diálogo. Ele o faz de maneira muito restritiva, visando combater o indiferentismo e o relativismo. Seu ponto de partida é uma perspectiva missional e a ênfase recai sobre a unicidade e a universalidade não apenas da salvação em Cristo, mas também da Igreja. Apenas16 a Igreja católica romana é considerada Igreja em sentido pleno, não podendo as demais comunidades eclesiais ser consideradas Igrejas irmãs , pois a Igreja Católica romana é a Mãe das Igrejas. Independente das divergências de Interpretação existentes no interior do próprio catolicismo, particularmente quanto às afirmações do Concílio Vaticano II, e do fato que o documento visava mais ao âmbito interno da Igreja católica, pretendendo (re)estabelecer a unidade no tocante ao diálogo inter-religioso, a Declaração teve ampla repercussão na imprensa secular e foi recebida no mundo protestante com profunda consternação e desapontamento. A declaração pareceu desconsiderar décadas de avanços no diálogo ecumênico17, para retroceder a um estágio anterior ao Vaticano II. Ainda assim, as vozes mais ponderadas no mundo protestante18 tentaram reenfatizar como irrenunciável o compromisso ecumênico a partir do mandato bíblico e também admitiram haver no âmbito evangélico posturas semelhantes (ou, até ainda mais radicais ) que, analogamente à Dominus Iesus, são com ela coincidentes em tomar como ponto de partida o mandato missional e enfatizar a unidade e a universalidade da salvação em cristo, para posteriormente derivar daí conclusões eclesiológicas, pelas quais também a Igreja Católica chega a ser classificada como Igreja Falsa , ou mesmo como Idolatria.19
Se observarmos as Igrejas de corte pentecostal, até agora grandes beneficiárias do crescente pluralismo religioso, cuja mobilidade lhes tem proporcionado intenso crescimento, encontramos indícios de que também elas começam a sentir os efeitos negativos da dura concorrência religiosa. O pluralismo religioso já não lhes é apenas oportunidade, mas também ameaça. Por isso mesmo, desponta no mundo evangélico conservador, mais e mais, o tema da unidade e da cooperação. Além disso, há nos novos movimentos religiosos, com freqüência, uma dificuldade de Segunda geração, isto é, como prosseguir quando a atração da novidade já passou e as situações se apresentam de modo mais complexo do que o entusiasmo da primeira hora fazia supor. No entanto, esses mesmos fatos também poderão auxiliar para sublinhar a contribuição positiva mais significativa que as Igrejas pentecostais estão dando e seguramente continuarão a dar: ser expressão da pentecostalidade20, isto é, da liberdade e do dinamismo do Espírito em uma época de intensa busca espiritual e mobilidade social. De outro lado, a tentação do pentecostalismo parece consistir em agudizar o confronto religioso, por meio de uma exacerbação cada vez mais intensa da concorrência, uma perigosa contradição total com o mandato bíblico em favor da unidade. Ainda que de modo geral olhem com suspeita a palavra ecumênico, o passo ecumênico necessário para os pentecostais – ainda que também doloroso – consiste em reconhecer como irmão em Cristo primeiro os protestantes históricos (que lhe são mais próximos), a seguir os católicos, precisamente porque, pela liberdade do Espírito, a pentecostalidade é muito mais ampla do que as respectivas expressões confessionais pentecostais.
De outra parte, mencionemos uma vez mais o notável fenômeno da reemergência da religiosidade afro e indígena. Em parte ele é fruto da tomada de consciência ocorrida por volta de 1992, reforçada, no caso brasileiro, em 2000, quando dos 500 anos da chegada expansionista e invasora de europeus a estas terras, portadores de uma cultura e de uma religião que consideravam superior e que podiam não só difundir, como também impor aos povos destas terras ou aos povo para cá trazidos à força como escravos. Apesar de toda opressão, essa religiosidade originária, por séculos sufocada, como o foram seus povos, continuou existindo, muitas vezes na clandestinidade, e recorrendo a formas religiosas sincréticas, para resistir e sobreviver. Agora reemerge com identidade própria no novo quadro de pluralismo, afirmando-se diante e muitas vezes contra o Cristianismo, percebido com razão como parte integrante da cultura dominante e, portanto, co-responsável por suas agruras e sofrimentos. Por certo trata-se de um desafio de grande magnitude para o Cristianismo, ocasião para arrependimento e novo agir.
O fenômeno chama a atenção para a irredutibilidade do outro e para o fato de que Cristo se encontra no outro, em particular no marginalizado (cf. Mt 25,31-46). Deus não se deixa limitar pelas fronteiras da cristandade; seu Espírito atua onde quer. Para o catolicismo, a necessária revisão da postura tradicional de superioridade em relação à religiosidade indígena e afro parece dar-se na medida em que, tendo um forte sentido de unidade institucional, admite a incorporação e mesmo a assimilação sincrética paulatina de concepções e práticas religiosas diversas, sob a unidade hierárquica ou sacramental. O protestantismo, por sua vez, é muito mais centrado na fidelidade doutrinal, e resiste a apostar na assimilação sincrética. Mesmo assim, poderia lembrar que a reta doutrina é expressão confessional da realidade do amor de Deus, e não sua substituição por uma fórmula mágica. Além disso, o protestantismo bem poderia assumir a partir de suas bases confessionais e bíblicas uma postura de respeito pleno e um sentido de radical legitimidade para expressões religiosas diferentes, empenhando-se pelo encontro e diálogo acerca da vivência da fé e da afirmação da vida, em meio às múltiplas exclusões sociais e culturais. Essa possibilidade de diálogo, em lugar da confrontação e da violência cultural, lamentavelmente, ainda se encontra longe do horizonte conceptual e vivencial de grande número de comunidades cristãs, sejam elas católicas ou evangélicas21.
Permanece a tarefa ecumênica: que fazer?
Há por toda a América Latina muitas experiências e iniciativas ecumênicas bastante elementares que podem ser intensificadas muito mais: as semanas de oração pela unidade, grupos de estudos bíblicos, seminários ecumênicos, cursos de formação para agentes pastorais, cooperação em questões de desenvolvimento, saúde, educação, paz, defesa dos direitos humanos, justiça e preservação da natureza. Muito mais poderia fazer-se ecumenicamente na produção de cartilhas ecumênicas22 para o conhecimento mútuo sem preconceitos e de outros materiais catequéticos, para o ensino religioso ecumênico, na manifestação pública das Igrejas em assuntos de relevância social, política e econômica. É uma experiência comum que adeptos de diferentes expressões religiosas podem encontrar-se e cooperar significativamente diante de necessidades e desafios bem concretos: a luta pela terra de camponeses e indígenas, o cuidado da natureza, o estabelecimento de uma paz com justiça, a defesa da dignidade da vida. Particularmente significativa é a cooperação nas comunidades de base, como ficou atestado mais uma vez no X Encontro Inter-Eclesial de Comunidades de Base em Ilhéus (BA), em julho de 2000.
No campo institucional, organismos como o Conselho Mundial de Igrejas (CMI), o Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM), o Conselho Latino-Americano de Igrejas (CLAI) e o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC), para mencionar apenas alguns dos principais organismos ecumênicos, poderiam aprofundar seus contatos fraternos. Para otimizar as potencialidades positivas e prevenir os casos de tensão, poderiam ser estabelecidos canais permanentes de consulta em assuntos de interesse mútuo ou em questões de divergência. Um exemplo: tanto a Igreja católica como os conselhos ecumênicos em que participam decisivamente Igrejas protestantes e algumas pentecostais deram uma contribuição extremamente importante nos processos de paz na América Central. Contudo, poderiam tê-lo feito em maior cooperação mútua, o que também se faz indispensável nos processos atuais de seguimento, na área de educação para a paz e a justiça.
A necessidade do diálogo e da cooperação também se faz sentir em um marco mais amplo de relação entre confissões cristãs e movimentos de expressão religiosa indígena e afro. Enquanto estes buscam recuperar ou afirmar sua própria identidade nos aspectos étnicos e culturais – o que inclui o religioso -, as Igrejas, por via de regra, olham esses movimentos com grande suspeita e múltiplos preconceitos. É freqüente o emprego de termos como superstição, feitiçaria e idolatria. De outro lado, a recuperação da identidade indígena e afro vem compreensivelmente acompanhada pela reação aguda contra a violência provocada pela invasão branca neste Continente ao longo dos últimos quinhentos anos. Assim, o risco de uma confrontação religiosa aguda não é de nenhum modo desprezível. Uma confrontação desse tipo certamente envolveria e afetaria gravemente as camadas populares dos povos latino-americanos. Arrisco-me a fazer essa observação, ainda em plena consciência de que possa estar refletindo a preocupação brancadiante do legítimo clamor indígena e afro contra a opressão de séculos. Por isso, a observação só terá consistência na medida em que for acompanhada de sinais claros e eficazes da parte cristã de responsabilidade pela história de opressão étnica e cultural.
Como quer que seja, o desafio ecumênico se estende para além da relação entre Igrejas cristãs, abarcando as expressões religiosas num sentido amplo. A base comum para o encontro e o diálogo necessários, num Continente tão sofrido como o latino-americano e caribenho, encontra-se. A meu ver, na afirmação da vida e de sua dignidade. Não se trata, por certo, de advogar em favor de um sincretismo que a tudo nivele, mas de defender a necessidade do respeito pleno à diferença e à liberdade de opção, como serviço de afirmação da vida. Contudo, essa visão ainda é muito minoritária na prática das Igrejas. Um passo nessa direção poderia residir na tomada de consciência de que o religioso tem a ver com profundas e decisivas convicções pessoais e suas manifestações comunitária. Uma fé não pode impor-se por nenhum meio coercitivo; deve ser assumida e desenvolver-se em liberdade.
Recordemos, por fim, que a pobreza e a injustiça social, acentuadas nos últimos tempo pelo projetos econômicos neoliberais, com suas conseqüências de exclusão, constituem desafios à prática efetiva da solidariedade cristã. E esta não pode fazer-se realidade de maneira dividida, sem grave perda de eficácia e credibilidade. O mesmo vale para a continuidade dos processos de paz em diversos países latino-americanos. Nossas sociedades continuam injustas e violentas em muitos aspectos. A construção de uma sociedade justa e sem exclusões constitui o desafio fundamental à cidadania e à sua participação política. Está claro: quando as comunidades cristãs se inserem, por sua fé e esperança, nesse processo, os poderosos continuam sentindo a fé como provocação e tentam sufocá-la ou pervertê-la. Entretanto, precisamente por essa reação aberta das forças da não-vida pode-se perceber a continuidade efetiva da esperança e, não por último, da vitória da fé, ainda que sempre ameaçadas no transcurso da história.
Mesmo de um ponto de vista mais social, não parece caber a menor dúvida de que há nesse cenário um eminente desafio ecumênico, de cooperação, entre diferentes expressões religiosas. Pois, em determinados sentidos, o pluralismo religioso não deixa de corresponder à evolução atual da sociedade – uma espécie de espelho, no qual o mercado religioso reflete o mercado econômico globalizado. Assim, a pluralidade e a diversidade religiosa também padecem do que se poderia chamar de um vício de coerência, pois cada uma de suas expressões se propõem a ser uma força integradora do conjunto das dimensões da vida, proporcionando uma fé e um sentido, dando orientação e esperança, capacitando para a prática da solidariedade e da justiça. Para não recair em práticas de belicosidade mútua, quando não em novas formas de guerra santa ou então competição total de todos contra todos, só há uma saída bíblica e teologicamente responsável: a cooperação ecumênica.
Nessa situação, nem o combate mútuo nem a reclusão confessional no interior de cada Igreja são opções teológicas e eclesiais legítimas. Apenas o esforço ecumênico com vistas ao futuro o é. Além de ser a única opção que faz jus ao mandato bíblico, apenas ela proporcionará a contribuição das Igrejas em favor do testemunho evangélico, o chamado à fé, à paz, à justiça e à unidade de nossos povos. Temos muito que aprender com o Apóstolo (cf. 1Cor 12,12-27): somos, em Cristo, um só corpo, embora muitos membros, em diversidade. E nenhum desses membros precisa desprezar a si mesmo ou tem o direito de desprezar os demais. Ao contrário, os mais fracos e necessitados são os mais importantes no corpo e os que recebem mais cuidado e atenção. Ainda que diversos mas mutuamente relacionados, somos membros do corpo uno de Jesus Cristo. Separando-nos dos irmãos e das irmãs, separamo-nos também dele. Reconciliados com ele, também nos voltamos em paz e justiça a nossos irmãos e irmãs.
Walter Altmann
1Retomo, nesta contribuição, algumas reflexões já contidas em publicações anteriores, como, por exemplo, em: El otro dentro nuestro: retos del pluralismo religioso en America Latina. Signos de Vida. Segunda época, Quito, 5:14-17, set. 1997.
2 Abordamos o ecumenismo, aqui, num sentido mais estrito, enquanto relação entre “Igrejas cristãs”, já que o diálogo inter-religioso é objeto de outra apreciação neste volume. Contudo, não se deve esquecer que, em última análise, o termo “ecumene” – em referência a “toda a terra habitada” – implica universalidade, abrangendo a humanidade inteira e a própria criação.
3 Não foi, portanto, sem razão que um grupo de missionários protestantes na América Latina resolveu, em resposta, realizar em 1916 o Congresso do Panamá, igualmente centrado na missão. Trata-se do primeiro encontro continental de protestantes na América Latina, logo do nascedouro do movimento ecumênico neste Continente.
4 É oportuno mencionar que em 1919, como fruto das alterações geopolíticas resultantes da Primeira Guerra Mundial e da constituição de uma nação turca moderna, centrada na tradição muçulmana, o Patriarcado de Constantinopla (Igreja ortodoxa) sugeriu criar uma “liga de Igrejas”, um paralelo à constituição política da Liga das Nações. Contudo, a participação mais organizada das Igrejas ortodoxas no movimento ecumênico só se concretizou em 1961 em Nova Délhi, quando de seu ingresso no CMI.
5 A eclosão da Segunda Guerra Mundial, em 1939, adiou a planejada criação do CMI para o período pós-guerra.
6 Nítidas considerações ecumênicas também estiveram presentes nos debates e nas formulações das constituições dogmáticas acerca da Igreja, da Liturgia, da Igreja no Mundo Moderno e, sobretudo, da Divina Revelação (Dei Verbum).
7 Uma exceção relativa tem sido, no Brasil, o diálogo nacional católico-luterano (CNBB e IECLB) desde os anos 70. Em alguns outros países (por exemplo, Chile e Bolívia) tem havido entre a Igreja católica, Igrejas anglicanas e Igrejas do protestantismo histórico um acordo ecumênico de reconhecimento mútuo do batismo. Tem sido crescente, em bom número de países latino-americanos, a participação ecumênica na Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos. Trata-se, neste caso, bem como na difusão do movimento de leitura e estudos bíblicos, de uma área limítrofe entre o que aqui se designa como cooperação “prática” e “doutrinal”.
8 Naturalmente, a América Latina também ém um Continente que continua caracterizado, como foi ao longo dos cinco séculos de sua história desde a conquista ibérica, por aguda concentração de renda, discriminação de mulheres, violência contra a natureza, terríveis injustiças estruturais e dramática exclusão social. Tudo isso obviamente constitui um extraordinário desafio ao espírito e ao empreendimento ecumênicos, um desafio ao empenho em favor de “justiça, paz e integridade da criação”, como se formulou em torno da conferência ecumênica de Seul (1992).
9 Mutatis mutandis, esse reconhecimento também abre perspectivas criativas para o diálogo inter-religioso.
10 Por exemplo, as pessoas podem acolher-se calorosamente, umas às outras, como “irmãs” e “irmãos”.
11 Pela oração, pelos gritos, pelo êxtase, pelo pranto.
12 Muitas igrejas evangélicas têm um discurso altamente agressivo para com as religiosidades indígena ou afro, consideradas idolátricas e expressões demoníacas. Esse discurso contém em si, não se deve esquecer, o germe de possíveis eclosões de violência física.
13 Contudo, passadas as comemorações relacionadas à chegada do ano 2000, já se pode verificar uma sensível redução nessas visões especulativas. Já não estamos às vésperas de um fim de milênio, mas no início de um novo e longo período de mil anos…
14 Em muitas regiões estima-se que a participação dominical dos fiéis em cultos evangélicos não é inferior ao da participação na missa católica.
15Diversos países latino-americanos debatem-se, por um lado, com a renovação do ensino religioso de cunho confessional católico em escolas públicas, e por outro, com a introdução de uma legislação que estabeleça a igualdade religiosa diante da lei, uma ampla reivindicação no mundo evangélico. No Chile, por exemplo, estabeleceu-se em 1999 tal lei, depois de longo período de discussões e mobilizações entre as Igrejas, bem como marchas e contra-marchas no Congresso. Processo semelhante está em curso na Argentina.
16 A Declaração se reporta repetidamente à Constituição dogmática sobre a Igreja ( Lumen gentium), do Vaticano II, em particular a seu artigo 8. Como é sabido, nesse artigo é afirmado que a Igreja de Cristo subsiste ( subsistit in) na Igreja Católica. A formulação foi escolhida pelo concílio em substituição à versão original que identificava (est) pura e simplesmente a Igreja de Cristo com a Igreja Católica. A Declaração não apenas interpreta o subsistit in como est , mas também introduz a palavra só, inexistente no texto conciliar: A Igreja de Cristo {…} continua a existir plenamente só na igreja católica (artigo 16,destaque meu). É bem verdade que a partícula só aparece no Decreto sobre o ecumenismo (Unitatis reditegratio ), do Vaticano ll , mas relacionada à plenitude dos meios de salvação ( artigo 3 ) .
17 Por exemplo, em 31 de outubro de 1999 foi assinada oficialmente pelo Vaticano e pela Federação Luterana Mundial (flm), em Augsburgo ( Alemanha ) uma declaração conjunta católico-luterana sobre a doutrina da justificação-sabiamente o artigo central da discórdia na Reforma em que se afirma haver no tocante à doutrina da da justificação um consenso em verdades básicas, à luz do qual as diferenças remanescentes na terminologia , na articulação teológica e na enfase da compreensão da justificação (artigo 40),razão pela qual a doutrinas das igrejas apresentada nesta Declaração não é atingida pelas condenações do Concílio de Trento nem as condenações contidas nos escritos confessionais luteranos […] atingem a doutrina da igreja católica romana exposta nesta Declaração ( artigo 41 )
18Assim na Declaração do conselho Latino – Americano de Igrejas – CLAI ( Rápidas, n.324, p. 2. Oct. 2000 ). (cf. também as pp. 14 e 15 ).
19 Enquanto a Igreja Metodista do Brasil resolveu, em face da Declaração, entrar em processo de revisão de suas relações oficias com a Igreja Católica romana, embora reafirmando o compromisso ecumênico,o diálogo católico – luterano no Brasil entre a CNBB e a IECLB ( Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil ) deve prosseguir . Em declaração oficial assinada pelo bispo católico dom Ivo Lorscheiter e pelo pastor Gottfried Brakemeier (ex- Presidente da FLM ) , afirmou-se que, embora haja risco de a Dominus Iesus fechar portas que haviam sido abertas por esforço ecumênico nas décadas passadas […] seria trágico se a caminhada ecumênica rumo a maior unidade sofresse interrupção ou prejuízo. Lembrou-se também dos sinais visíveis da caminhada ecumênica no Brasil (semana de oração pela unidade dos cristãos, a Campanha da Fraternidade Ecumênica 2000 e a cooperação em assuntos sociais), para asseverar: O mundo plural de hoje necessita de exemplos de unidade na diversidade e na vivência fraternal do diferente.
20 Expressão e argumento do teólogo pentecostal Bernardo Campos, em seu livro De la Reforma protestante a la pentecostalidad de la Iglesia (Quito, CLAI, 1997, 112 p.). Faz-se aí uma distinção entre pentecostalidade como movimento oriundo da livre ação do Espírito e pentecostalismo, manifestação confessional e institucional de Igrejas centradas na ação do Espírito.
21 Observe-se uma vez mais que na recente Declaração da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, Dominus Iesus, longe de uma abertura sincrética à diversidade religiosa, há uma intensa reafirmação da exclusividade da fé cristã e da Igreja católica romana. Nesse particular, a Declaração é coincidente com as visões teológicas da correntes mais conservadoras no protestantismo e, mesmo, no pentecostalismo.
22 No Brasil, o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC) e o Conselho Latino-Americano de Igrejas (CLAI) publicaram em conjunto uma cartilha ecumênica (Diversidade e comunhão: um convite ao ecumenismo. São Leopoldo/São Paulo, 1998).