Prédica: Filipenses 2.5-11
Leituras: Deuteronômio 32.36-39 e João 12.12-19
Autor: Werner Brunken
Data Litúrgica: Domingo da Paixão (Ramos)
Data da Pregação: 12/04/1992
Proclamar Libertação – Volume: XXVII
1. Considerações gerais
Auxílios homiléticos sobre o presente texto encontramos nos volumes V e XI do Proclamar Libertação. É bom ler os referidos textos para ajudar na reflexão.
2. Contexto
Nos versículos que antecedem, Paulo exorta os cristãos ao amor fraternal e à humildade: pensar a mesma coisa, ter o mesmo amor, ser unido de alma, ter o mesmo sentimento. Não fazer nada por partidarismo, ou vanglória, mas por humildade. Cada um deve considerar o outro superior a si mesmo. Ter em vista o que é dos outros. Estas exortações são profundas e só podem ser exercitadas quando as pessoas pensarem como Cristo pensou. Deste pensar de Cristo trata Filipenses 2.5-11. E nos versículos seguintes Paulo, baseado no que Deus em Cristo fez pelas suas criaturas, exorta a buscar a salvação com temor e tremor. É seu desejo que as pessoas se tornem irrepreensíveis e sinceras.
Na verdade, Fl 2.5-11 forma uma unidade com os vv. 1-4 e vv. 12-18. Assim podem ser feitas três pregações ou estudos.
3. Comentários exegéticos
3.1. Temos nos vv. 6-11 um hino cristológico, que Paulo aproveitou da tradição cristã para descrever o caminho de Cristo desde a sua pré-existência, passando por este mundo e terminando na exaltação eterna. Em outros textos Paulo usa pai te deste hino: o qual foi entregue por causa das nossas transgressões, e ressuscitou por causa da nossa justificação (Rm 4.25).
3.2. A tradução do texto não oferece problemas. A Edição Revista e Atualizada, de Almeida, pode ser considerada boa para a compreensão do texto.
3.3. O hino cristológico apresenta duas partes: nos vv. 6-8 Jesus é o sujeito, enquanto nos vv. 9-11 Deus age.
3.4. As palavras de Paulo em 2 Co 8.9 podem ser usadas para boa compreensão do presente texto: Pois conheceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, se fez pobre por amor de vós, para que pela sua pobreza vos tornásseis ricos''
V. 5 — As palavras deste versículo unem o texto anterior ao hino cristológico. A palavra sentimento aparece duas vezes no v. 2: pensar a mesma coisa, ter o mesmo sentimento. E a expressão Cristo Jesus tem sua ligação com o hino. Ter o mesmo sentimento significa em Jesus o modelo a ser imitado? Ou ter o mesmo sentimento em Cristo Jesus aponta para a relação do cristão com a obra de Cristo? Pela interpretação de Paulo em outros textos (Rm 3.24; 6.11; 8.1), onde ele usa a formulação em Cristo Jesus, ter o mesmo sentimento é viver da obra que Deus em Cristo realizou pela humanidade. Em Cristo somos novas criaturas (2 Co 5.17). A salvação de Cristo por nós determina todo o agir cristão. A orientação para a vida é dada em Cristo Jesus.
Vv. 6-8 — Aqui notamos como Cristo pertence à esfera de Deus, mas também à esfera humana. Há inclusive um conjunto de palavras que expressa esta diferença: forma de Deus — forma de servo; igual a Deus — semelhança de homens — figura humana. Temos nestas formulações a prova da divindade de Jesus. A pré-existência de Jesus expressa seu ser igual a Deus. Podemos ver aqui uma semelhança com João 1.1-2: No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Este Deus = Jesus não julgou como usurpação expressa a unidade entre Ele e o Pai (João 10.30: Eu e o Pai somos um). Este Deus não teria razão para descer de sua glória. Pois, se pensamos nos demais deuses adorados pela humanidade — estes jamais descem de seu trono/pedestal. Mas, o Deus da Bíblia não permaneceu distante — Ele veio a este mundo morar em Jesus de Nazaré.
Deus se esvaziou em Jesus Cristo. Ele desceu até nós. As formulações do texto expressam esta profundeza, à qual Deus desceu. Não existe deus que possa ser comparado com o Pai de Jesus Cristo. Do seu conforto, da sua segurança eterna, Deus veio ao mundo em Jesus para habitar entre nós.
Só o estar entre nós não seria o suficiente para nos influenciar. Ele se humilhou, tornou-se obediente até à morte, e morte de cruz. Todo o caminho de sofrimento descrito nos evangelhos mostra este Jesus obediente até à morte na cruz. Ele assumiu as nossas dores e culpas. Ele sofreu por nós para nos libertar. Um novo relacionamento surge entre Ele e nós e vice-versa. Não precisamos mais buscar Deus no infinito. Ele está entre nós em Jesus Cristo. Ele assumiu o peso da nossa culpa. Ele nos lavou com seu precioso sangue.
Vv. 9-11 — Este Jesus que assumiu a forma humana não permaneceu na morte. Se antes Jesus mesmo foi o sujeito, agora Deus entra em ação, exaltando-o pela ressurreição, dando-lhe o nome acima de todos os nomes. Torna-se o único nome capaz de salvar. Diante deste Jesus Cristo, que agora tem todo o poder sobre o céu e a terra, todos precisam ajoelhar-se e confessar que Ele é o Senhor. Ele tornou-se o juiz supremo. A exaltação de Cristo não representa simplesmente a volta à situação anterior, mas agora Ele é o Senhor. Isto está expresso no nome que está acima de todo nome e dobre todo joelho nos céus, na terra e debaixo da terra. Jesus Cristo tem o poder sobre todo o universo. Ninguém escapa de passar por Ele. E tudo acontece para a glória de Deus Pai.
O hino cristológico expressa a salvação em Cristo e o seu poder universal.
4. Meditação
4.1. É difícil imaginar alguém que deixou a sua segurança pessoal (dinheiro, casa, carro, bom emprego, poder) para se tornar semelhante a pessoas que não vivem tal situação. O que vemos é pessoas procurando se proteger sempre mais, contratando sempre mais guardas de segurança e construindo fortalezas mais fortificadas ao seu redor. Isto resolve? Certamente que não! A experiência nos mostra a fragilidade que está por detrás desta segurança. Quando escrevo esta meditação ainda me soa nos ouvidos o maior assalto ao Banco do Brasil, em Belém do Pará. 3,6 bilhões de cruzeiros foram roubados apesar dos seguranças, alarmes e portas trancadas. Ou: quantas pessoas apesar de sua segurança foram sequestradas? Apesar de todas as experiências ninguém quer abandonar esta sua segurança.
4.2. O texto bíblico nos mostra um caminho totalmente diferente. Deus em Jesus deixa a segurança máxima para se esvaziar e tornar-se pessoa humana exposta a todos os perigos desta vida. Jesus não tem segurança nenhuma. Não tem onde reclinar sua cabeça. Se dá totalmente por todos que não têm segurança nesta vida. Se dá até à morte na cruz.
No texto do Evangelho (Lc 22.24-53) é descrito este caminho sofredor, que não procura poder e honra, mas que quer servir. Este servir tem como consequência a cruz. Jesus foi até esta última consequência. Tudo ele fez em benefício de toda a humanidade. Perdoando e reconciliando as pessoas com o Pai, Jesus se tornou o Salvador.
4.3. Na fraqueza Jesus se tornou forte. Ele foi exaltado. Tornou-se o Senhor sobre todos os senhores. Diante deste Senhor todo joelho se dobrará nos céus, na terra e debaixo da terra. O texto de leitura do AT (Dt 32.36-39) nos mostra este Deus, que desafia todos os outros deuses. Deuses que só se aproveitam das pessoas, as exploram. Deuses que permanecem em seus tronos longe do sofrimento das criaturas e da criação. Diante de todos estes deuses se apresenta o Deus único. Este Deus, que se tornando pobre, humilde e sofredor, trouxe nova esperança para tudo e todos. Pois Ele, venceu em Jesus Cristo a escuridão deste mundo. Ele desmascarou as falsas seguranças, os falsos deuses. Somente diante de Jesus, que agora assumiu todo o poder, podemos existir dobrando nossos joelhos. Confessamos que Jesus Cristo é Senhor, para a glória de Deus Pai.
4.4. Esta obra de Deus em Jesus Cristo tem consequências para o nosso viver e agir. Em primeiro lugar é aceitar o seu perdão e renovação de vida. É colocá-lo acima de tudo e todos. Em segundo lugar é ter o mesmo sentimento em Jesus Cristo. Isto significa agir como ele agiu; viver como Ele viveu. Significa tornar-se livre das falsas seguranças, engajando-se por todas as pessoas que sofram diante dos falsos poderes. Significa não medir esforços para testemunhar este Deus em Cristo, vivendo como servos prontos a servir com seus dons no dia a dia, seja individualmente ou como grupo. Significa viver-conforme as palavras de exortação descritas nos vv. 1-4.
Tudo isto não para enaltecer a nós e termos poder. Mas tudo para que o senhorio de Jesus Cristo possa ser implantado neste mundo e Deus seja glorificado.
4.5. O presente texto é indicado para o Domingo de Ramos. São os últimos dias antes da prisão, do julgamento e da crucificação de Jesus. São dias de angústia, de sofrimento, nos quais Jesus assumiu definitivamente o lado dos fracos e marginalizados. São dias nos quais refletimos sobre a nossa situação nesta vida. Sentimo-nos auto-suficientes como pessoas que não necessitam de um Salvador? No meio de toda fraqueza e decepção somos desafiados a buscar em Jesus Cristo nova orientação, novas forças e nova esperança para poder vencer. Só nEle todos podem encontrar um novo sentido para a vida.
5. Esquema para a prédica
Sugiro usar o que foi desenvolvido na meditação:
1) Quem é capaz de deixar a sua segurança pessoal?
2) Cristo trilhou o caminho da pobreza, do desprezo, do esvaziar-se. Ele se deu pela humanidade ata à morte na cruz.
3) Na fraqueza Jesus se tomou o Salvador. Tornou-se o Senhor. Seu nome está acima de todos os nomes. Ninguém pode competir com este Senhor. Diante dEle todo joelho se dobrará nos céus, na terra e debaixo da terra.
4) Convém viver a partir de Jesus o mesmo sentimento. Isto é: viver da obra que Jesus realizou. A partir Dele podemos ser servos. A partir dEle podemos deixar a nossa segurança, a fim de levar segurança aos que não têm. Nesta nova maneira de ser os falsos poderes são desmascarados. A partir Dele podemos viver o amor fraternal, a humildade. A partir dEle não precisamos mais fazer nada por partidarismo ou vanglória (vv. 1-4).
6. Subsídios litúrgicos
1. Intróito: Jesus Cristo não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos (Mt 20.28).
2. Confissão dos pecados: Senhor, nosso Deus! O caminho sofredor de Jesus Cristo nos envergonha. Pois Ele se esvaziou por nós. Tudo fez para nos servir, e nós não correspondemos a este servir. Fugimos das responsabilidades. Perdoa-nos pelo sangue de Jesus e prepara-nos para servir. Tem piedade de nós, Senhor.
3. Absolvição: O apóstolo Paulo diz em 2 Co 8.9: Pois conheceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, se fez pobre por amor de vós, para que pela sua pobreza vos tornásseis ricos.
4. Leitura: Lucas 22.24-34 — palavra do Senhor.
5. Oração de coleta: Agrademos-Te, Senhor, por podermos estar reunidos em Teu nome neste dia. Quantas vezes queremos ser grandes e importantes, colocando-nos acima dos outros. Ensina-nos por Tua palavra o verdadeiro servir, vivido por Teu filho Jesus Cristo. Amém.
6. Leitura: Deuteronômio 32.36-39.
7. Oração final: Eterno Deus! Tu vieste a este mundo assumindo em Jesus Cristo toda a miséria que existe entre nós. Tu viveste em Jesus Cristo toda a pobreza, desprezo, perseguição até à morte na cruz. Tudo fizeste por nós. Por isso, somos-Te gratos, enaltecemos o Teu nome, buscamos unicamente a Ti e diante de Ti dobra mós os nossos joelhos. Anima-nos a vivermos um pouco deste Teu servir em nossa vida, a fim de ajudarmos os Teus pequeninos sofredores, que clamam por compreensão, aceitação, ajuda; que clamam por oportunidade de uma vida digna. Tudo U agradecemos e pedimos em nome de Jesus Cristo, nosso Senhor e Salvador. Amém
8. Sugestão de hino: 50, 177, 174 (HPD).
7. Bibliografia
BAKKEN, N. Filipenses 2.5-11. In: Proclamar Libertação. Vol. XI, São Leopoldo, 1985.
GREIVE, W. Filipenses 2.5-11. In: Neue Calwer Predigthilfen. Zweiter Jahrgang A, Stuttgart, 1979.
HERMS, E. Filipenses 2.1-13. In: GöttingerPredigt-Meditationen. 1. Vierteljahresheft 1986, Göttingen, 1986.
VOLKMANN, M. Filipenses 2.5-11. In: Proclamar Libertação. Vol. V, São Leopoldo, 1979.