Prédica: João 10.11-18
Leituras: Atos 4.23-33(34-35) e 1 João 3.1-2
Autor: Cláudio Molz
Data Litúrgica: 4° Domingo da Páscoa
Data da Pregação: 14/05/2000
Proclamar Libertação – Volume: XXV
Tema: Páscoa
Delimitação e texto
Contra a sugestão da comissão litúrgica da época, Volkmann já pleiteou, em 1984, pela forma atual e por não terminar a perícope com o v. 16. Concordo com os seus argumentos (p. 310-11). Ele sugere também substituir mercenário (Jo 10.12s. — Almeida) por empregado, porque mercenário é um termo pouco conhecido. Creio que o termo mercenário se usava bastante entre nós, especialmente em referência a um ambiente bélico, quando soldados de uma nacionalidade se dispunham a fazer a guerra dentro de movimentos de libertação em outros países. A insinuação era de que esse empenho mercenário desvirtuava a verdadeira expressão das forças nacionais. Também se usa no futebol, quando um ou vários jogadores se deixam comprar para ensejar e forjar falsamente um resultado conveniente. Nesse sentido o uso é apropriado, porque a falta de fidelidade e autenticidade é uma das preocupações de Jesus, ao falar dos cuidados de que as ovelhas necessitam. Na Bíblia na linguagem de hoje, a Sociedade Bíblica do Brasil optou pelo termo empregado.
Apesar de todos os argumentos em favor da ideia de que há uma desordem no nosso texto e, de resto, em todo o evangelho, se pode dizer que há no cap. 10 também uma continuidade em relação ao cap. 9. A aceitação de Jesus pela fé é uma questão aberta em ambos os capítulos. Os judeus em ambos têm dificuldade de recebê-lo e identificá-lo. Em 9.22,34 o cego é expulso da sinagoga. Em 10.1-18 se contrapõe a isso a atitude de Jesus. Ele é o bom pastor. Das suas mãos ninguém poderá arrebatar as ovelhas. Jesus não expulsa, não põe a perder, não permite a dispersão dos que lhe são confiados. Sua meta é que haja um único rebanho (10.16).
Na verdade, os vv. 11-18 fazem parte de um trecho maior que quero considerar brevemente. Os intérpretes são mais ou menos coesos em afirmai que a parábola dos vv. 1-5, a parábola do pastor das ovelhas, é a base para as passagens seguintes. O v. 6 constata que há dificuldade de entender a parábola.
Os vv. 7-8 retornam uma parte da parábola e se concentram na porta. Encerram uma afirmação cristológica, dizendo que Jesus é a porta das ovelhas. Os vv. 9-10 repetem essa afirmação cristológica: Eu sou a porta das ovelhas. Mas enquanto na primeira afirmação se acentua a diferença entre Jesus e os que vieram antes dele, que são chamados de ladrões e salteadores, na segunda se acentua a finalidade de ambos. Os ladrões vieram para roubar, matar e destruir. Jesus veio para trazer vida: Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância. Essa vida em abundância é o dom principal que Jesus proporciona aos seus. Trata-se de uma relação profunda e permanente com o criador da vida, tal como é definida nos vv. 27-30: a vida eterna é isenta de ameaças de destruição e livre dos perigos de ser mal encaminhada, porque Jesus se interpõe como garante. Ele é idêntico ao Pai em poder criador e protetor de vida. Os vv. 11-18 são dedicados ao pastor.
Os vv. 19-21 acentuam que há uma forte disputa sobre a identidade de Jesus. Os vv. 22-26 parecem relacionar essa dificuldade de saber quem é verdadeiramente Jesus com o templo, porque localizam a polêmica cronologicamente junto à festa da dedicação do templo. Na época em que Jesus viveu, essa localização fazia sentido, mas quando se redige o evangelho, em torno do ano de 90 d.C., o templo já está destruído. A purificação do templo, que João narra em 2.13-21, serve para ressaltar que Jesus irá ressuscitar. Quer dizer: aquele que contesta o templo e é contestado pelos que se baseiam no templo, continua vivo e atuando na fé da comunidade do discípulo amado, enquanto que a base de sustentação dos seus contestadores ruiu e já não existe. Os que se aferram ao passado e não conseguem reformular a sua fé frente à novidade que Deus lhes envia em Jesus são julgados por sua cegueira (9.39). Aos que se abrem para crer nele é prometida a salvação: Eu não vim para julgar o mundo, e sim, para salvá-lo. (12.47.)
A comunidade do bom pastor
Ultimamente os exegetas se esforçaram bastante para descobrir sob a superfície do texto bíblico uma realidade sociológica, política ou ideológica, para a qual algumas insinuações do texto dão margem. É uma tarefa difícil e arriscada, porque as evidências precisam ser completadas com outras informações que não existem ou que só existem em contextos bem diferentes. A reconstituição da história a partir dos evangelhos, de qualquer modo, é parcialmente possível. Para os perigos metodológicos nessa tarefa adverte, p. ex., Brown (p. 16-19).
O mesmo Brown (p. 176-7) identifica seis grupos que estariam conforman¬do os diversos personagens e participantes do cenário do Evangelho de João:
I. O mundo. II. Os judeus. III. Os adeptos de João Batista. IV. Os criptocristãos. V. Os cristãos judeus. VI. Cristãos das igrejas apostólicas. Os grupos l a III não acreditaram em Jesus. Os grupos IV a VI afirmam que crêem em Jesus.
Ainda que Deus tenha amado o mundo a ponto de dar o seu Filho por ele (3.16), o mundo está submetido a Satanás, o príncipe do mundo. E a comunidade precisa considerar-se estranha ao mundo, não pertencente a ele.
Os judeus achavam que estavam servindo a Deus ao expulsar a comunidade de João das suas sinagogas. Com isso se tornaram filhos do diabo.
Para os adeptos de João Batista havia alguma esperança, desde que a importância de João Batista diminua e a de Jesus cresça.
Os criptocristãos temiam ser expulsos da sinagoga. Por isso não professavam a sua fé abertamente. A comunidade de João lhes lembra que eles preferem o louvor dos seres humanos à glória de Deus.
Os cristãos judeus tinham dificuldade com a eucaristia e a divindade de Jesus que os escandalizava.
Os cristãos das igrejas apostólicas já tinham uma cristologia mais próxima da que professava a comunidade de João, mas havia diferenças. Não aceitavam, p. ex., a preexistência antes da criação. Também não acompanhavam as afirmações sobre o consolador ou o Espírito que ensina e guia à verdade. Alguma resistência às incipientes estruturas da Igreja também se pode pressupor.
No nosso texto, ainda que com declarada incerteza, Brown suspeita que atrás das referências em Jo 10.12 sobre os mercenários se devam supor representantes de igrejas de cristãos judeus (p. 81-82). Os mercenários que não protegem as ovelhas contra os lobos são pastores de ovelhas. No Evangelho de João a palavra ovelha costuma ser usada para designar o cristão e não para o judeu. Por isso dificilmente poderia ser uma crítica aos fariseus, mas sim a certas igrejas. Mas essas igrejas estariam no perigo de ser levadas de volta ao judaísmo, por não terem aceito a tese de João de que o cristianismo superou a sua matriz judaica. Supõe-se que a preexistência de Jesus junto a Deus, antes da criação do mundo e antes de Abraão ter nascido, como também a presença real do corpo e do sangue de Jesus na eucaristia, fossem os principais motivos para essa não-aceitação.
Outra referência a cristãos não idênticos com a comunidade joanina estaria em Jo 10.16. As ovelhas do outro aprisco seriam cristãos das igrejas apostólicas, com os quais a comunidade se sente muito ligada, mas com algumas diferenças. A oração pela unidade que Jesus faz em Jo 17.20-21 se referiria a esses cristãos, cuja fé em Jesus surgiu através dos apóstolos, como lá se diz. Nessa oração Jesus tematiza a unidade como em Jo 10.16, só que em Jo 10 a unidade se dá pelo falo de Jesus vir a ser o único pastor de todos. Já em Jo 17 se parte da unidade entre o Pai e Jesus que vem desde a preexistência de Jesus e é obra do amor do Pai: me amaste antes da fundação do mundo (Jo 17.24).
Delineada assim a comunidade de João, podemos partir para a análise detalhada dos vv. 11-18.
O bom pastor
Primeira unidade, vv. 10.11-13: quem é Jesus? — Jesus e o Pai são um
A característica do pastor c realçada pela comparação com o mercenário. O mercenário é uma pessoa contratada para cuidar do que não é seu. É um assalariado. O acento nessa ideia de o que é seu, o que é meu, os que são meus, os que me foram dados, os que me pertencem, etc., é muito claro. As pessoas, os chamados discípulos, não optam por Jesus. O Pai os vai entregando a Jesus. A sua adesão a Jesus é obra do Pai.
Enquanto o mercenário enseja ao lobo dispersar, arrebatar, tirar as ovelhas de Deus, o bom pastor se empenha para mantê-las ligadas a Deus, a quem todas elas pertenceram, pertencem e devem continuar pertencendo. Jesus não permite que alguma delas se perca. Apesar de ver chegar o perigo, o mercenário as abandona. Esse abandono deixa o campo livre para a destruição das ovelhas.
A principal característica do pastor verdadeiro é que ele cuida das suas ovelhas. O cuidado inclui o total empenho por elas, a ponto de arriscar e entregar a sua vida.
Há uma profunda sintonia entre as ovelhas e o seu pastor. O pastor chama as ovelhas. Elas ouvem e o reconhecem pela voz. Esse mútuo conhecimento é tão íntimo como é íntima a relação entre Jesus e o Pai. Poderíamos dizer que se conta com uma profunda reciprocidade no nível horizontal, entre pastor e ovelhas, e no nível vertical, entre Deus e Jesus.
O v. 16 insinua que há um ruído nessa sintonia. Mas a esperança de que essa imperfeição seja prontamente superada é expressa de forma clara. Nisso é preciso trabalhar ainda. É uma tarefa para o futuro. Mas uma coisa fica já de antemão assentada: a condução cabe a Jesus e não a alguém outro. Por isso, a tradução de Almeida não é suficiente, ao dizer: a mim me convém conduzi-las. Não se trata apenas de uma questão de conveniência. Deve-se dizer: e é necessário que eu conduza também a essas. Sub-repticiamente se afirma, portanto, que há cristãos que, é verdade, assim se denominam, mas não estão seguindo apenas ao bom pastor, Jesus. Confundem às vezes a sua voz ou deixam de identificá-la. Ou talvez estejam imaginando que uma certa unidade seja mais importante que a clareza da identificação com Jesus. Aqui se diz que chegará o dia em que a unidade se dará, mas em Jesus, o pastor que é tão bom que dá a sua vida.
O amor do Pai por Jesus se relaciona com essa doação da vida. Mas quanto à doação da vida, se define que não são instâncias humanas ou outras que lhe tiram a vida. Jesus se mantém dono da situação, também na hora da morte. Os poderosos, sejam quais forem, não se apoderam dele, nem nessa hora extrema. O poder de Jesus permanece intato, mesmo durante a sua morte. A ressurreição de Jesus, portanto, não precisa ser operada de fora, por Deus, o Pai, como se houvesse uma dissociação entre ambos, operada pela morte. O próprio Jesus é que mantém a ressurreição dentro das suas potencialidades. A sua unidade com o Pai não sofre solução de continuidade, como diz Jo 10.30: Eu e o Pai somos um.
Coerentemente, no Evangelho de João, Jesus não ora o Salmo 22 na hora da crucificação. Não lemos sobre a oração da angústia sangrenta do Getsêmani, mas sim sobre um respeito profundo, semelhante a uma adoração, por parte dos soldados (Jo 18.6). Também depois da tortura, no encontro com Pilatos, Jesus é caracterizado como um rei que não perde a sua dignidade. O seu alvo é testemunhar a verdade. Pela verdade se identificam os seus seguidores, pois o reconhecem pela voz (Jo 18.37). Além disso, fala do autor e outorgante da autoridade humana: Deus (Jo 19.11). Essa soberania é um atributo do bom pastor e lhe é própria desde antes da criação do mundo. O bom pastor Jesus não precisa primeiro receber autoridade, poder ou vida, para então entregá-la, como todas as outras autoridades. Ele já é detentor de tudo, porque o amor do Pai já lhe concedeu tudo isso no princípio, bereshit, a primeira palavra do Gênesis, ou en arché, a primeira palavra do Evangelho de João, isto é, antes da criação do mundo.
Portanto: a morte não é capaz de separar Jesus e o Pai. Para sublinhar essa convicção, o Evangelho de João afirma que Jesus também foi capaz de se auto-ressuscitar (Jo 10.18). Fazem parte dele as potencialidades divinas de criar, manter e recriar a vida, até mesmo a própria. E isso justamente não para estabelecer uma herética segunda divindade, contrária ao primeiro mandamento: Não terás outros deuses além de mim, mas para enaltecer a unidade divina. Deus não se subdivide. Em Jesus ele está plenamente presente e atuante. Não há oposição, divergência ou separação.
Um só rebanho
Segunda unidade, vv. 10.14-18: onde estão as ovelhas? — Jesus as reunirá todas
Ao repassar o mesmo texto de Jo 10.11-18, nos deparamos com afirmações que vão definindo o que devemos entender por Igreja. Eclesiológicos seriam os fatos que caracterizam ou comunicam o que seja a Igreja; eclesiogênicos seriam os fatos que geram ou facilitam fenômenos que denominamos Igreja.
A bondade de Jesus convida. Conhecemos os relatos de Lucas no livro dos Atos dos Apóstolos sobre a primeira comunidade em Jerusalém. O que atraía as pessoas para associar-se à Igreja era a bondade nas doações, a solidariedade social, a harmonia entre os seus membros, a autenticidade e a simplicidade das relações (At 4.47; compare o texto da leitura indicada, At 4.23-35!).
1) Jesus deve ter se baseado em Ezequiel 34 para delinear uma nova proposta de atuação do que hoje chamamos de Igreja (v. Rodríguez, p. 37-39)
Ezequiel criticava: Ai dos pastores de Israel que se apascentam a si Não apascentarão os pastores as ovelhas? Comeis a gordura, vestis-vos da lã e degolais o cevado; mas não apascentais as ovelhas. A fraca não fortalecestes, a doente não curastes, a quebrada não ligastes, a desgarrada não tornastes a trazer e a perdida não buscastes; mas dominais sobre elas com rigor e dureza. (Ez 34.3-4.)
Há uma flagrante violação da liderança israelita. Ela se locupleta, se sacia, mas não cumpre a sua função de serviço e liderança. Abandona o povo na sua fraqueza e debilidade, e isso desapiedadamente, porque além de não cumprir com o que seria o seu dever, a liderança exige com rigor o cumprimento da lei por parte do povo. O povo, portanto, já não é vítima de um inimigo de fora, mas a própria liderança o massacra.
Deus põe fim a esse tipo de liderança. Esse fim não se aplicaria hoje apenas a falsas lideranças na Igreja, em organismos eclesiásticos ou religiosos, mas a lideranças em todos os níveis da sociedade. Porei termo ao seu pastoreio. (Ez 34.10.)
A morte de Jesus é o sinal do fim dessa liderança. A doação da sua vida define a excelência da qualidade de sua proposta e atuação. ' 'Eu mesmo procurarei as minhas ovelhas, e as buscarei. (…) Tirá-las-ei dos povos, e as congregarei dos diversos países e as introduzirei na sua terra. Apascentá-las-ei de bons pastos (…); apascentá-las-ei com justiça. (Ez 34.11-16.)
2) Podemos ver, portanto, que Jesus propõe uma renovação total da liderança. Mas esse é apenas um dos aspectos da questão na Igreja. A outra se refere à aluação do próprio povo.
Quanto a vós outras, ó ovelhas minhas, assim diz o Senhor Deus: Eis que julgarei entre ovelhas e ovelhas, entre carneiros e bodes. Acaso não vos basta a boa pastagem? Haveis de pisar aos pés o resto do vosso pasto? E não vos basta o terdes bebido as águas claras? Haveis de turvar o resto com os vossos pés? (…) Visto que com o lado e com o ombro dais empurrões, e com os chifres impelis as fracas até as espalhardes fora, eu livrarei as minhas ovelhas (…) Suscitarei para elas um só pastor, e ele as apascentará (…) Farei aliança de paz, e acabarei com as bestas-feras da terra (…) As árvores do campo darão o seu fruto, e a terra dará a sua novidade, e estarão seguras na sua terra; e saberão que eu sou o Senhor (. ) Vós, pois, ó ovelhas minhas, ovelhas do meu pastor; homens sois, mas eu MUI o vosso Deus, diz o SENHOR Deus. (Ez 34.17-31.) Ao dizer: Eu sou o bom pastor, Jesus se aproxima do que diz o SENHOR: Eu sou o vosso Deus. E ao dizer: As ovelhas conhecem a minha voz, se aproxima do que disse o SENHOR: Saberão, porém, que eu, o SENHOR seu Deus, estou com elas e que elas são o meu povo, a casa de Israel. (Ez 34.30.)
Em Ezequiel se supõe que o libertador fosse um descendente da família davídica. Jesus se enquadra nessa esperança e a supera em muito. E sobre a casa de Davi, e sobre os habitantes de Jerusalém, derramarei o espírito de graça e de súplicas; olharão para mim, a quem traspassaram; pranteá-lo-ão como quem pranteia por um unigênito (…) Desperta, ó espada, contra o meu pastor e contra o homem que é o meu companheiro, diz o SENHOR dos exércitos; fere o pastor, e as ovelhas ficarão dispersas; mas volverei a minha mão para os pequeninos. (Lc 12.10; 13.7.) O poder de dispersão que a morte do pastor causa é revertido. O traspassado (Jo 19.34-37) consegue manter a sua oração: Não perdi nenhum dos que me deste. (Jo 18.9.) Jesus congrega e mantém unida a sua Igreja. E é o amor do Pai que lhe faculta isso.
A intimidade entre Jesus e Deus tem, necessariamente, uma correspondente nas relações que se estabelecem entre o próprio povo. A qualidade de tratamento que Deus propicia não pode perverter-se. A unidade entre Jesus e o Pai não pode ser abandonada no convívio das pessoas que participam da Igreja. O rebanho reflete a mesma ética do pastor. A voz do pastor não apenas conduz os passos relacionados com o avanço geral rumo ao futuro, mas também os passos de aproximação ou de afastamento, de respeito ou de apoio mútuos entre as ovelhas durante o trajeto.
As lideranças judaicas interrogaram e tentaram dificultar ao máximo a autenticidade do cego de nascença (Jo 9). Apesar disso, o seu testemunho foi dado com coragem e veracidade. Esse é o convite que se faz a nós também. Jesus nos dá a visão para a verdade. Não são outros, mesmo bispos, presidentes de sínodos, países ou grandes empresas, que nos podem perturbar essa visão ou impor-nos a sua. O bom pastor é um só e o rebanho é um só.
Essa unidade nos abre chances para a universalidade. Podemos ser flexíveis, porque sabemos com certeza o que vale. Podemos dialogar com franqueza e sem medo, porque a unidade verdadeira só um pode conceder. Podemos confiar nos passos dos companheiros de caminhada, já que todos ouvimos e podemos reconhecer a voz de quem nos guia.
Sugestão para a prédica
Volkmann (p. 315) sugere o seguinte esquema para a prédica:
1. Os anseios do nosso tempo e as falsas ofertas.
2. A oferta real: Jesus é o bom pastor.
3. Porque se doa em favor dos seus (vv. 11-13).
4. Porque cria relação de reciprocidade (vv. 14-18).
5. Porque dá segurança (vv. 27-30).
Gostaria de acrescentar a essa boa proposta a ideia de que se deva falar sobretudo das ofertas religiosas que nos alcançam a cada dia. A religião não é propugnada apenas por aqueles que se dizem religiosos. Os nossos líderes políticos, p. ex., adotam com grande facilidade o tom e o vocabulário religiosos. Os seus pontos de partida e os seus objetivos são perpassados por uni linguajar que exige fé e confiança. Em especial isso se evidencia nas eleições, quando as plataformas muitas vezes deixam de ser realistas, mas se transformam em assunto de fé, como se fossem alcançar a implantação do reino de Deus. Mas estamos fartos de saber que na hora do sacrifício os mercenários são abundantes e a autenticidade é rara.
As falsas ofertas não vêm apenas de fora da Igreja. Há também perigos e ameaças dentro dela. Jesus nos convoca a ser um rebanho autenticamente seu. Não há como reivindicar mudanças no mundo, sem a disposição a uma sincera autocrítica. Há traição de objetivos entre nós, há falta de autenticidade? Há liderança apenas para ser líder, para ser visto, para aparecer? A liderança da Igreja dá algo, ou só exige que se dê?
Bibliografia
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BROWN, Raymond Edward. A comunidade do discípulo amado. São Paulo : Paulinas, 1984. (Orig.: The community of the beloved disciple, 1979.) 216 p.
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HEIDLER, Johannes. 2. Sonntag nach Ostern, Misericórdias Domini, Johannes 10,11-16. In: Evangelische Predigtmeditationen. 1990/1991. v. l, p. 138-141.
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Proclamar Libertação 25
Editora Sinodal e Escola Superior de Teologia