Prédica: Atos 2.1-21
Leituras: Joel 2.28-29 e João 20.19-23
Autor: Verner Hoefelmann
Data Litúrgica: Domingo de Pentecostes
Data da Pregação: 19/05/2002
Proclamar Libertação – Volume: XXVII
Tema: Pentecostes
1. Pano de fundo do texto: o Pentecostes judaico e o Espírito Santo
A vinda do Espírito Santo aos primeiros discípulos aconteceu durante uma festa judaica. Junto com Páscoa e Tabernáculos, Pentecostes era uma das três grandes festas de peregrinação do povo judeu ao santuário central de Jerusalém (Dt 16.1-17). Israelitas maiores de doze anos e prosélitos convertidos ao judaísmo deviam participar delas com regularidade. Judeus da diáspora procuravam participar ao menos de uma festa por ano, ou, em casos de longas distâncias, de uma durante a vida. Isso talvez explique a lista de nomes em At 2.9-11: pode ser uma alusão a peregrinos, que estão em Jerusalém para cumprir seus deveres religiosos. Mulheres e escravos, embora pudessem participar (Lc 2.41), estavam dispensados dessa obrigação, sinal claro de sua posição inferior na sociedade.
Pentecostes (pentekosioi = cinqüenta) era também denominada de festa das primícias, pois celebrava o início da colheita do trigo, ou festa das semanas, pois se realizava sete semanas após o sábado pascal (Êx 23.16; 34.22; Lv 23.16; Dt 16.10). Ao ofertar em Pentecostes as primícias da colheita como ação de graças, o israelita expressava uma parte essencial de seu credo. Deus não apenas concede vida, mas também a sustenta com as dádivas da criação. Por influência de círculos sacerdotais e farisaicos, um segundo significado, historizante, foi agregado à festa: comemorava-se nela a aliança de Deus com o seu povo no monte Sinai, ou seja, a dádiva da lei. Pentecostes, portanto, ajudava a manter unidos dois componentes essenciais da fé israelita: para manter-se livre da escravidão e caminhar com firmeza rumo à terra da promessa, o ser humano necessita do pão que Deus concede e da palavra que procede de sua boca (Dt 8.3).
À exceção, talvez, dos essênios de Qumran, a fé israelita não vinculava o Espírito Santo com Pentecostes. Uma voz corrente no judaísmo e na literatura rabínica dizia: no tempo dos patriarcas, todos os piedosos e justos possuíam o Espírito de Deus. Desde a adoração do bezerro de ouro, no entanto, Deus limitou a dádiva do Espírito a pessoas escolhidas e em posição de liderança, como os juízes, reis, profetas e sumos sacerdotes. Com a morte dos últimos profetas, o Espírito apagou por completo por causa do pecado de Israel. Restava somente a esperança profética para os tempos escatológicos. Quando viesse o rei messiânico, ele seria novamente o portador do Espírito (Is 11.2; 42.1; 61.1), e Deus o derramaria sobre todo o seu povo (Ez 36.27; 37.14; 39.29; Jl 2.28-32).
O Novo Testamento prolonga essas duas linhas da esperança pós-exílica. Por um lado, a comunidade cristã reconhece em Jesus aquele rei messiânico animado pelo Espírito de Deus. O Espírito participa de sua concepção, que marca o início de um novo tempo (Lc 1.35). Designa-o como rei messiânico por ocasião de seu batismo e convoca-o à missão para a qual Deus o destinou (Lc 3.21-22). Assiste-o no combate contra o maligno (Lc 4.1-11). Habilita-o para que possa cumprir seu programa de evangelizar os pobres e libertar os cativos (Lc 4.18-21). Toda a atividade de Jesus realiza-se sob o signo do Espírito de Deus, por cujo poder expulsa demônios, cura doentes e alquebrados, ressuscita mortos e perdoa pecados. O Espírito repousa sobre ele como um dom permanente e não transitório, como no caso do primeiro rei de Israel (1 Sm 16.14). E, no final de seu ministério, Jesus pede que os discípulos permaneçam em Jerusalém, para que sejam igualmente revestidos com o poder do Espírito (Lc 24.49). É a segunda parte da esperança profética. Mas isso já é assunto do nosso texto.
2. Informações sobre o texto: o Pentecostes cristão em Jerusalém
Lucas estabelece um paralelismo estreito entre o início do ministério público de Jesus no batismo e o do grupo de discípulos em Pentecostes: ambos iniciam com a manifestação visível do Espírito (Lc 3.22 e At 2.3), cumprem uma promessa (Lc 4.18 e At 2.17ss), resultam numa proclamação profética (Lc 4.18-20 e At 2.14ss), concluem um período de preparação e inauguram caminhos para a proclamação pública e sem fronteiras do Evangelho. Tanto Jesus como a comunidade cristã nascem e são animados pela ação do Espírito Santo.
O texto provavelmente é fruto de composição literária, que combina experiências diversas com o Espírito vividas nas primeiras comunidades. Percebe-se isso de muitas maneiras. Quanto ao espaço: o v. 2 refere-se a discípulos reunidos numa casa. O v. 5 refere-se a uma multidão que presenciou o evento, que obviamente não podia reunir-se em tal lugar. Quanto ao fenômeno extraordinário acontecido em Pentecostes: o v. 4 diz que os discípulos foram capacitados a falar em línguas diferentes. O v. 11 parece atribuir o caráter extraordinário à audição, ou seja, ao fato de cada qual ouvir a proclamação em sua língua materna. Os vv. 12 e 13 dão a impressão de que o extraordinário foi uma explosão de glossolalia, ou seja, uma manifestação extática, não-articulada, distinta de qualquer linguagem humana, que suscitou a suspeita de embriaguês. Por fim, também a informação do v. 5 surpreende: se os presentes são judeus da diáspora residentes em Jerusalém, supõe-se que falem aramaico e que não necessitem de fenômenos extraordinários para entender a proclamação.
De qualquer forma, o que une as diferentes tradições é que em Pentecostes houve um fenômeno extraordinário de linguagem, que animou e habilitou os discípulos a proclamarem as maravilhas de Deus. Ao menos duas tradições são perceptíveis. Uma delas diz que em Pentecostes houve um fenômeno de glossolalia: o Espírito Santo invadiu a comunidade, inspirando nela uma alegria carismática, como se conhece também em outros textos (At 10.46; 1 Co 14). A outra diz que em Pentecostes irrompeu o fenômeno do profetismo, inaugurando um tempo de testemunho e missão. Ambas reaparecem em textos como At 19.6. Lucas, como Paulo em 1 Co 14, dá preferência à segunda, pois é através dela que a comunidade torna-se presença ativa no mundo e cumpre seu mandato (At 1.8).
Os vv. 1-4 descrevem o derramamento do Espírito Santo sobre o pequeno grupo de discípulos em Jerusalém. Cumpre-se assim a promessa dos profetas e de Jesus. Encerra-se o período da espera e da preparação dos discípulos. Abre-se uma nova época da história salvífica, na qual o Espírito será a fonte do dinamismo da Igreja e do seu testemunho. O Espírito manifesta-se inicialmente como um fenômeno audível: um som como de um vento impetuoso preenche toda a casa. Espírito e vento têm muita coisa em comum, a começar pelo nome (pneuma): criam movimento, renovam ambientes mofados, são vistos pelos efeitos que provocam. Em seguida, o fenômeno torna-se visível: línguas ou linguagens como de fogo vão se repartindo sobre os discípulos a partir de um núcleo originário comum. O fogo aquece e purifica. A linguagem cria comunicação. Conseqüência imediata é que os discípulos passam a falar em outras línguas conforme a concessão do Espírito.
Os símbolos aí utilizados provêm das teofanias do Antigo Testamento, em especial a do Sinai (p. ex., Êx 19.16-18; Dt 4.12-13). A relação fica ainda mais clara quando se considera a tradição rabínica sobre esse evento, como a de um comentário sobre Êx 20.18: “Note-se que não é dito ‘o trovão’, mas ‘os trovões’. Por isso, Rabi Johanan disse que a voz de Deus, apenas pronunciada, dividiu-se em setenta vozes, em setenta línguas, para que todas as nações pudessem compreender. Quando cada nação entendeu a voz na própria língua, a sua alma desfaleceu, salvo Israel, que a ouviu mas não ficou perturbado”. Como se vê nessa tradição, as setenta línguas simbolizam as setenta nações elencadas em Gn 10, indicando que a revelação de Deus no Sinai teve abrangência universal. O texto de Atos retoma, portanto, a linguagem do Sinai, mas para assinalar que Pentecostes inaugura uma nova aliança entre Deus e seu povo. Essa aliança é colocada sobre novas bases. Não mais a lei a fundamenta, mas a presença e a ação de Deus mediante o seu Espírito. Através dele, Deus irá imprimir a lei na consciência do ser humano e transformá-lo a partir de dentro, como haviam sonhado os antigos profetas (Jr 31.31-34; Ez 36.25-28).
Nos vv. 5-13, muda o cenário, e as testemunhas do evento passam a ser judeus da diáspora. Quer se trate de peregrinos, como corresponde melhor às circunstâncias da festa, quer sejam judeus que se radicaram na cidade para esperar o Messias, o certo é que eles representam simbolicamente as nações do mundo e se tornam testemunhas da nova época que inicia. A lista de povos, regiões e províncias representadas aponta para o significado universal do evento de Pentecostes, como aquela tradição do Sinai, e ao mesmo tempo para a vastidão do campo de trabalho que espera pelos discípulos.
Qual o efeito da manifestação do Espírito? Os discípulos anunciam as grandezas de Deus, e as pessoas entendem a proclamação em sua língua materna. Não se trata, portanto, de um falar extático e inarticulado, e sim de um fenômeno profético de fala inteligível. O Espírito desencadeia o testemunho do Evangelho pelo mundo, faz a abertura para a missão e busca o entendimento universal. Difícil não fazer a relação com Gn 11.1-9, pois Pentecostes é o antitipo de Babel. Em Babel, os seres humanos orgulhosamente tentaram subir ao céu para alcançar a Deus, sendo por isso dispersos e confundidas as suas linguagens. Em Pentecostes, verifica-se o contrário: Deus mesmo desce à terra e alcança o ser humano através do Espírito Santo, reúne os diferentes grupos humanos, comunica-se com eles respeitando as características culturais, das quais a língua é expressão, e promove entre eles a reconciliação.
O evento provoca entre os presentes uma dupla reação: alguns abrem-se para a manifestação do Espírito, mostrando, com sua pergunta, que estão prontos para ouvir uma nova palavra (v. 12). Outros a rejeitam com superficialidade (v. 13).
Os vv. 14-21 contêm a parte introdutória do discurso de Pedro, que explica o que acaba de acontecer. Convém ao menos ter em vista como o discurso continua. Israel rejeitou a Jesus, o enviado de Deus ( vv. 22-23). Deus ressuscitou a Jesus (vv. 24-32). Jesus, exaltado por Deus, enviou o Espírito (vv. 32-35). Por isso, Israel deve converter-se e reconhecer Jesus como Senhor e Cristo (vv. 36-40).
Como porta-voz dos discípulos, Pedro dá, pela primeira vez, testemunho do Evangelho “em Jerusalém” (At 1.8). O exórdio chama a atenção para a importância do que vai ser dito (v. 14). O que os zombeteiros dizem não faz o mínimo sentido, pois são apenas nove horas e a refeição matinal ainda nem começou (v. 15). O que aconteceu em realidade é que Deus cumpriu a promessa do profeta Joel, derramando sobre os discípulos o Espírito Santo (vv. 15-21).
A citação de Joel é baseada na versão grega do AT, a Septuaginta. Nela, o autor introduz algumas modificações sutis; no v. 17, em lugar de depois disso, o texto diz nos últimos dias, dando ao evento de Pentecostes um caráter claramente escatológico. O derramamento do Espírito torna-se assim um sinal de que a comunidade vive nos últimos tempos ou na era messiânica, inaugurada por Jesus. No v. 18, o texto acrescenta e profetizarão, sinal de que vê principalmente neste fenômeno o cumprimento da profecia de Joel. Visões e sonhos são igualmente manifestações proféticas (Nm 6.12). Os vv. 19-20 não parecem ter muita relação com o evento, mas o v. 21 é aplicado a Jesus, de modo que aquele que traz salvação não é mais Javé, mas Jesus, que Deus constituiu como Senhor.
A grande novidade refere-se àqueles a quem o evento de Pentecostes interessa: o dom do Espírito não está mais reservado apenas para reis, sacerdotes e profetas, mas para todo o povo de Deus (toda carne), independente de gênero (filhos e filhas), idade (jovens e velhos) ou condição social (servos e servas). O sonho de Moisés tornou-se realidade: “Oxalá todo o povo do Senhor fosse profeta, que o Senhor lhes desse o seu Espírito” (Nm 11.29). Todos os membros do povo de Deus, sem exclusões ou privilégios, estão habilitados para a condição de profetas. No novo povo de Deus, não há canais privilegiados, monopólios ou zonas de reserva, pois a capacidade de entender, viver e comunicar a Palavra de Deus é dada a todos. Se o livro de Atos passa a descrever, a partir de agora, como o Evangelho foi rompendo fronteiras e criando comunidades desde Jerusalém até “os confins da terra”, com certeza isso se deve à dinâmica e ao poder do Espírito, que renova e anima o coração de todo aquele que crê.
3. Meditação a caminho da prédica: Pentecostes hoje
a) Não apagueis o Espírito (1 Ts 5.19)
A situação de nossas comunidades tem preocupado muitas pessoas. Há sinais de estagnação e letargia em muitos lugares. Constata-se que faltam alegria e convicção na vida de fé. Nossos cultos são pouco acolhedores e excessivamente cerebrais. Talentos preciosos permanecem enterrados e não se convertem em benefício para outros. Faltam testemunho pessoal e vivência do discipulado. Faltam vigor missionário e empenho pela transformação do meio que nos circunda. Nossas comunidades em geral não crescem, nem em quantidade de membros tampouco na qualidade de seu testemunho. Como explicar essa situação? Pentecostes propõe-nos a pergunta se não há aí um déficit na compreensão e na experiência do que seja a ação de Deus por meio de seu Espírito Santo.
A comemoração judaica de Pentecostes fornece um contexto muito apropriado para a reflexão sobre o tema, pois coloca o Espírito Santo em meio às dádivas essenciais que os seres humanos e as comunidades necessitam para viver. A festa lembrava duas dessas dádivas. Para viver, o ser humano precisa de pão, pois é dali que extrai a energia necessária para manter o vigor físico. Pedir e agradecer pelo pão de cada dia significa reconhecer que, a despeito de todo esforço e trabalho, o essencial do pão que nos sustenta procede de Deus. Nós plantamos e regamos, mas é ele quem faz crescer (1 Co 3.6). A festa lembrava igualmente que o ser humano necessita da Palavra de Deus. É nela que o ser humano encontra um sentido e uma direção para sua vida. Ela é lâmpada para os nossos pés e luz para os nossos caminhos (Sl 119.105). Essa Palavra encontra-se prefigurada no Antigo Testamento e foi conduzida à plenitude em Jesus Cristo. Ele é a Palavra em pessoa. Ele conhece o Pai como ninguém e o revelou aos seres humanos (Mt 11.27). Agradecer pela dádiva da Palavra de Deus significa reconhecer que nossa própria palavra é por demais ambígua, confusa e contraditória, para que possa nortear o rumo de nossas vidas.
A comemoração cristã de Pentecostes trouxe à tona uma terceira dádiva essencial. Pão e Palavra de Deus não são suficientes. Para viver, o ser humano necessita ainda da dádiva do Espírito Santo. Por isso, a recomendação do apóstolo: não apagueis o Espírito. A necessidade do Espírito decorre de uma experiência humana fundamental: mesmo sabendo que a “lei é santa e que o mandamento é santo, justo e bom” (Rm 7.12), o ser humano descobre-se na condição de não fazer o bem que prefere, mas o mal que não quer (Rm 7.19). Por isso, Deus prometeu e nos concede o seu Espírito. O Espírito Santo é a dádiva divina que nos permite discernir a Palavra de Deus, ajuda-nos a assimilar os benefícios da obra de Cristo e nos habilita a viver a partir dessa realidade. Nas palavras do apóstolo: “Se vive em vocês o Espírito de Deus, que ressuscitou Jesus, então aquele que ressuscitou Jesus Cristo dará também vida aos seus corpos mortais, pela presença de seu Espírito, que vive em vocês” (Rm 8.11).
b) Não desprezeis as profecias (1 Ts 5.20)
Outra grande novidade do Pentecostes cristão é que, em consonância com a promessa dos profetas e de Jesus, Deus realiza seu propósito de transformar todas as pessoas em instrumentos de sua ação no mundo. Dificilmente podemos aquilatar a importância do que isso significa. Ação de Deus no mundo não se restringe mais necessariamente ao que dizem ou fazem os reis, sacerdotes, profetas ou sábios. Talvez Deus nem esteja mais ali, como mostra a história do Natal. Ao olhar para sua condição, Maria enaltece a Deus, que derrubou de seus tronos os poderosos e engrandeceu os humildes. Ao chegar ao palácio de Herodes, os magos descobrem que o Messias não havia nascido ali, mas numa estrebaria em Belém. Assim também Paulo constata que Deus escolheu os humildes e fracos para envergonhar os sábios e poderosos, para que ninguém se orgulhe em sua presença. Homens e mulheres, jovens e velhos, servos e servas – todos podem ser transformados em instrumentos do Espírito de Deus no mundo. Existe uma tal consciência e experiência em nossas comunidades? Não continuamos concentrando em pequenos círculos aquilo que Deus tornou acessível a todas as pessoas?
Ao manifestar-se aos discípulos em Jerusalém, o Espírito habilitou-os e animou-os para o testemunho profético do Evangelho. Essa é sua principal obra, como se pode acompanhar ao longo do livro de Atos. Por isso, a recomendação do apóstolo: não desprezeis as profecias. Algo do que isso significa pode-se notar no exemplo de Pedro. Durante a semana santa, nós o vemos fazendo promessas sem fundamento, fugindo na hora da prisão de Jesus, negando-o diante de criados, trancando-se em casa com medo das autoridades. Após a experiência de Pentecostes, ele toma a frente para proclamar publicamente o Evangelho do crucificado e ressurreto, testemunhando diante de tribunais que não pode deixar de falar das coisas que viu e ouviu. Assim age o Espírito Santo: destrava a língua daquele que crê, para que possa testemunhar aquilo que viu e ouviu, ao mesmo tem em que gera fé naquele que acolhe o anúncio da Palavra (At 2.38). Quem quiser maior concreticidade sobre o conteúdo desse anúncio profético, considere o restante da pregação de Pedro ou o programa para o qual o Espírito habilitou a Jesus (Lc 4.18-21).
c) Provai todas as coisas, retende o que é bom (1 Ts 5.21)
Assistimos em nosso meio a uma explosão de manifestações religiosas atribuídas ao Espírito Santo. Movimentos pentecostais, carismáticos ou de avivamento instalam-se em várias igrejas, prometendo a sua renovação. Eles respondem, sem dúvida, a justos anseios de que a fé seja mais do que adesão a fórmulas estáticas ou a ritos solenes e soturnos. Para tornar-se alegre e dinâmica, ela precisa transformar-se em experiência pessoal e vivencial, e isso não se transmite ou adquire por herança. Mesmo assim, nosso texto nos orienta a olhar para tais manifestações com sobriedade. Vários outros espíritos disputam espaço em nosso mundo, sejam eles espíritos imundos (Mc 1.23), humanos (1 Co 2.11) ou mundanos (1 Co 2.12). É por isso que o Espírito Santo, entre suas dádivas, concede o dom de discernir os espíritos (1 Co 12.10) e o apóstolo recomenda provar todas as coisas para reter apenas o que é bom.
O Espírito Santo que atua hoje não pode ser outro do que aquele que atuou em Jesus de Nazaré. Uma de suas funções é lembrar a comunidade de tudo o que Jesus disse e fez (Jo 14.26). Esse é o critério que permite discernir, entre os muitos fenômenos que acontecem ao nosso redor, a manifestação do Espírito Santo. Falar em línguas estranhas pode ser uma de suas expressões legítimas, desde que colocada em seu devido lugar (1 Co 12.10,30). Movimentar é necessário, desde que isso, por si só, não seja visto como garantia de qualidade. Chamar à decisão é preciso, desde que isso não nos leve a querer antecipar o juízo de Deus. Nosso texto, à sua maneira, afiança o que o apóstolo Paulo vai explicitar em 1 Co 14: o dom da profecia, prometido a toda a comunidade, é superior a qualquer manifestação extática da fé. É através dele que Deus coloca seu povo diante de sua Palavra, chama-o à fé e exige que tome decisões que decidirão seu presente e seu futuro. É através dele que o Espírito Santo desperta a fé, suscita a esperança e capacita para o amor, estes três, jamais um sem o outro.
“Santo Espírito, Santo Espírito, desce sobre nós.
Santo Espírito, Santo Espírito, não nos deixes a sós.
Temos leis e tradições, discutimos mil questões, programamos mil ações.
Mas agimos sem amor, nossa fé não tem vigor, somos mornos, sem ardor.
Frio é nosso coração, fria é nossa comunhão, não amamos nosso irmão.
Teu Espírito, Jesus, venha a ser a nossa luz, bússola que nos conduz
A levar paz ao irmão, a partir com ele o pão e viver o teu perdão,
A buscar justiça e amor, a seguir com fé e ardor em teu reino, ó Salvador.”
(L. Weingärtner)
4. Subsídios litúrgicos
Hinos: Hinos do Povo de Deus: 76, 101,196; O Povo Canta: 206.
Intróito: Eu lhes darei um coração novo e porei em vocês um espírito novo. Tirarei de vocês o coração de pedra, desobediente, e lhes darei um coração bondoso, obediente. Porei o meu Espírito dentro de vocês e farei que obedeçam as minhas leis e cumpram todos os mandamentos que lhes dei (Ez 36.25-27).
Confissão de pecados: Senhor, nós te agradecemos que cumpriste tua promessa de enviar a nós o teu Espírito. Através dele, podemos chegar a ti com inteira confiança, para confessar-te que não somos dignos de ser chamados de teus filhos e filhas. Nossa fé é fraca, nosso amor é falho, nosso testemunho não tem vigor, nossa vida não tem alegrias e pouco reflete do infinito amor que tens demonstrado para conosco. Renova conosco a tua comunhão, fortalece-nos com o poder de teu Espírito Santo e orienta-nos com tua Palavra, para que saibamos prosseguir nosso caminho em fidelidade para contigo. Amém.
Palavra de graça: Agora já não há nenhuma condenação para os que estão unidos com Cristo Jesus. Porque a lei do Espírito de Deus, que nos trouxe vida por causa da união com Cristo Jesus, livrou-me da lei do pecado e da morte (Rm 8.1-2).
Oração de coleta: Amado Deus, tu que por meio de teu Espírito nos permites experimentar a tua graça e tua misericórdia, ilumina nosso coração e nossa mente para que possamos discernir tua palavra orientadora em meio a tantas vozes e espíritos que nos querem convencer. Por Cristo Jesus, amém.
5. Bibliografia
COMBLIN, José. Atos dos Apóstolos. Petrópolis : Vozes, 1987.
FABRIS, Rinaldo. Os Atos dos Apóstolos. São Paulo : Loyola, 1991.
MESTERS, Carlos, OROFINO, Francisco. Pé no chão, sonho no coração : Círculos Bíblicos dos Atos do Apóstolos. São Leopoldo : Contexto, 2001.
ROLLOF, Jürgen. Hechos de los Apóstoles. Madrid : Cristiandad, 1984.
STOTT, John R. W. A mensagem de Atos. São Paulo : ABU, 1994.
Proclamar Libertação 27
Editora Sinodal e Escola Superior de Teologia