Prédica: Mateus 9.9-13,18-26
Leituras: Oséias 5.15-6.6; Romanos 4.13-25
Autor: Ana Isa dos Reis
Data LitĂşrgica: 4Âş Domingo apĂłs Pentecostes
Data da Pregação: 08/06/2008
Proclamar Libertação – Volume: XXXII
1 Introdução
O presente conjunto de textos está dentro do chamado Tempo Comum, que se estende do fim do ciclo pascal (terminado no domingo de Pentecostes) atĂ© o inĂcio do Advento, somando 28 a 30 semanas. Esse tempo apĂłs Pentecostes, diz James White, “sinaliza o longo Ănterim da igreja da nova aliança atĂ© a vinda de Cristo em glĂłria”. Os textos bĂblicos lembram a continuação das obras salvĂficas de Deus e chamam as pessoas a ser seguidoras de Jesus Cristo por meio de suas palavras e ações.
Os trĂŞs textos chamam a atenção para a prática correta da vontade de Deus. O simples cumprimento da lei nĂŁo implica “fazer” a vontade de Deus. A ortopráxis Ă© uma chamada para que as pessoas se relacionem com Deus em fĂ© e serviço, em que as ações sejam realizadas por amor a Deus e ao prĂłximo que sofre. A fĂ© em Deus que AbraĂŁo demonstrou (Rm 4.13-25) Ă© que lhe foi imputada por justiça, e essa fĂŞ-lo deixar tudo o que tinha e seguir o chamado de Deus. O texto do profeta OsĂ©ias (Os 5.15-6.6) lembra que as pessoas ofereciam a Deus os sacrifĂcios como uma forma rigorosa de cumprir a lei, mas que estava dissociada da vida cotidiana e da fĂ© que leva ao serviço solidário. No Evangelho de Mateus, Jesus radicaliza a lei, chamando as pessoas para viver essa radicalidade no serviço e no amor a Deus e ao prĂłximo. A misericĂłrdia Ă© o tema que perpassa esses textos. Ela nĂŁo Ă© algo abstrato. Quer fazer-se concreta no dia-a-dia pessoal, comunitário e religioso.
2 Exegese
2.1 – Fonte
O texto de Mateus 9.9-13,18-26 tem como fonte o Evangelho de Marcos.
2.2 – Estrutura do Evangelho de Mateus e da perĂcope
* Mt 1.1-4.11 – narrativas iniciais e preparação
* Mt 4.12-18.35 – a atuação de Jesus na Galiléia
Os dez milagres: os sinais do reino: 8.1-9.38
9.9 – A chamada de Mateus
9.10-13 – Jesus e a comensalidade com os pecadores criticada pelos fariseus
9.18-26 – poder de Jesus para curar enfermidades e levantar os mortos
* Mt 19.1-20.34 – a caminho de Jerusalém
* Mt 21.1-25.46 – a atuação de Jesus em Jerusalém
* Mt 26.1-28.20 – paixão, morte e ressurreição de Jesus
2.3 – Observações exegĂ©ticas acerca dos versĂculos da perĂcope
V. 9 – Chamado de Mateus, que em Marcos Ă© denominado Levi (Mc 2.14). O texto fala que Mateus Ă© um homem que trabalhava na coletoria de impostos. Havia naquela Ă©poca tributos diretos e indiretos. A cobrança dos impostos na Palestina era feita pelo sistema de arrendamento. O ImpĂ©rio Romano e os governos locais terceirizavam essa atividade, arrendando-a por um ou mais anos a pessoas que pagassem antecipadamente o valor mais alto pelo conjunto de tributos e taxas que seriam cobrados em determinada regiĂŁo ou cidade. Assim, esses arrendatários – cujo termo grego Ă© architelĂ´nai – sĂŁo pessoas ricas, que firmavam contratos arriscados e que tentavam tirar, durante o perĂodo da coleta, alĂ©m do capital investido, tambĂ©m o seu lucro, usando, muitas vezes, artimanhas e trapaças. PorĂ©m os coletores de impostos, mencionados pelos evangelhos, cujo termo grego Ă© telĂ´nai, sĂŁo pessoas comuns, contratadas pelos empresários para o serviço de frente nas coletorias. Eram pessoas assalariadas, sentadas nos postos fiscais, que muitas vezes nĂŁo conseguiam nenhum outro emprego e que, por toda rejeição e instabilidade, podiam facilmente ser corrompidas. Por tudo isso, o coletor de impostos constava na lista das profissões desprezadas, juntamente com cuidadores de porcos, curtidores de couro, vendedores de alho, barqueiros, carreteiros, servidores de mesa, serventes, enfim todos trabalhos mal remunerados, executados por pessoas pobres. O cobrador de impostos Mateus certamente já tinha ouvido falar de Jesus e de seus milagres, posto que morava na mesma cidade. Quem sabe, Mateus atĂ© já havia pensado em seguir Jesus.
V. 10 – O versĂculo menciona uma janta que acontece em uma casa. Marcos menciona que a casa era de Levi; Mateus omite o nome do dono da casa. NĂŁo vejo a questĂŁo da propriedade da casa como a mais importante. No entanto, seja de quem for essa casa, Ă© uma casa que recebeu Jesus e seus discĂpulos, alĂ©m de muitos publicanos e pecadores. Esses pecadores (amartoloi) eram mais um grupo de pessoas marcado especialmente pela desqualificação religiosa, manchados, na avaliação dos entendidos da lei divina, pelo pecado. Essas pessoas pecadoras eram praticantes de infrações notĂłrias da lei e que, muitas vezes, se dedicavam a profissões desonestas e ligadas a trapaças. O texto diz que Jesus, seus discĂpulos, publicanos e pecadores estavam Ă mesa. No grego, a palavra Ă© hanakeimĂ©nou, que quer dizer reclinar-se, costume dos antigos de reclinar-se sobre uma espĂ©cie de divĂŁ durante as refeições.
V. 11 – Os fariseus sĂŁo um dos principais grupos religiosos dos judeus. Eles seguiam rigorosamente a lei de MoisĂ©s, as tradições e os costumes dos antepassados. Esse grupo seguia tĂŁo Ă risca a lei, que fazia clara distinção entre justos e pecadores. Os fariseus já haviam entrado em confronto com Jesus em outros momentos. Aqui, vendo Jesus comer com publicanos e pecadores, eles questionam os discĂpulos, perguntando por que Jesus afronta a lei, juntando-se para comer com pessoas consideradas indignas.
V. 12 – Quem responde Ă pergunta dos fariseus Ă© o prĂłprio Jesus. Ele usou um provĂ©rbio bem conhecido da Ă©poca; ninguĂ©m deixaria de entender seu sentido. Os sĂŁos seriam as pessoas justas ou, como dizem alguns intĂ©rpretes, aquelas que se consideram justas, como os fariseus. E os doentes seriam as pessoas publicanas e pecadoras, que, na definição bĂblica, abrangem a raça humana inteira. O mĂ©dico vai ao encontro das pessoas doentes, que o acolhem porque precisam dele. Jesus considera-se um mĂ©dico que vai ao encontro das pessoas e tambĂ©m as acolhe.
V. 13 – A frase “ide, porém, e aprendei o que significa” era bastante usada pelos rabinos quando queriam frisar algum preceito seu. No caso, Jesus lembra-os do texto do profeta Oséias, que chama a atenção para que a vontade de Deus seja feita e não apenas um ritual. Deus quer que as pessoas tenham atos misericordiosos e confiem nele e não em cerimônias religiosas desprovidas de sentido e que nada têm a ver com a prática misericordiosa diária.
V. 18 – O chefe da sinagoga é um oficial da sinagoga. Mateus não menciona o nome; Marcos diz que era Jairo. Parece que o autor de Mateus já declarava a filha do chefe como morta e por isso omite alguns detalhes, como o anúncio da morte dessa jovem, que aparece nas passagens paralelas. Marcos menciona que a menina tinha 12 anos, dado também omitido por Mateus.
V. 19 e 20 – Jesus tinha o poder de curar a distância, o que fez algumas vezes, mas geralmente acompanhava as pessoas que o convidavam para sua casa ou lugar onde estava a pessoa que precisava de ajuda, mostrando compaixĂŁo e interesse por seus problemas. No caminho atĂ© a casa do chefe da sinagoga, Jesus realiza uma outra cura. Uma mulher sofria 12 anos com um tipo de hemorragia. A doença era considerada conseqĂĽĂŞncia do pecado, maldição e castigo de Deus. Por isso carregar o fardo da doença era a forma de saldar a dĂvida contraĂda junto a Deus por alguma culpa. Essa mulher, que sofria com hemorragia, alĂ©m de estar empobrecida (como fala Marcos), carregava o fardo da impureza permanente. Segundo a lei de LevĂticos 15.19-31, ela nĂŁo sĂł era considerada impura, como tambĂ©m contaminadora de todas as pessoas com as quais entrasse em contato. Devido Ă vergonha e ao medo, ela se aproximou por trás de Jesus, tocando apenas na orla de sua veste, sem querer ser notada. Ela sabia que, se fosse descoberta nessas condições, tocando um homem, seria considerada uma criminosa porque tornaria aquele homem impuro. Seu gesto discreto implica claramente o risco
V. 21 e 22 – O versĂculo 21 ilustra a fĂ© da mulher e a reputação de Jesus. Certamente ela tinha ouvido falar de Jesus e de seus milagres. A fĂ© dessa mulher em Jesus era tamanha, que acreditava que apenas tocá-lo seria o suficiente para sua cura. Mais surpresa ela ficou com a reação de Jesus, coisa que ela nĂŁo esperava, pois nem sequer queria ser notada. Jesus manifestou publicamente a aceitação do gesto dessa mulher, o reconhecimento da luta, a legitimação da causa dessa mulher. Jesus aceitou o toque que o tornou impuro e dividiu com a mulher o fardo da impureza que há tanto tempo ela sofrera. Jesus chama-a de “filha”, devolvendo a ela a cidadania do povo de Deus, que lhe havia sido tirada pela “constituição” desse povo. Jesus tambĂ©m lhe deseja a paz, voto que quer dizer bem-estar, saĂşde, felicidade, o shalom. Essa mulher curada voltará para o meio da famĂlia e da sociedade como alguĂ©m que tem fĂ©, alguĂ©m que foi alcançado pelo amor de Deus atravĂ©s do agir compassivo de Jesus.
V. 23 e 24 – Continuando o caminho, Jesus chega Ă casa do chefe da sinagoga. Os lamentos pela morte da menina já haviam começado. É provável que, no caso da menina da perĂcope, Jesus tenha encontrado um grupo que incluĂa cantores voluntários e assalariados, carpideiras comuns que tinham a função de chorar pela pessoa morta e alguns vizinhos curiosos. Jesus sempre foi solidário com as pessoas sofredoras, mas nunca concordou com ostentação. Por isso ordenou que todas aquelas pessoas se retirassem. Essas pessoas riram de Jesus por causa da afirmação de que a menina estava dormindo. No grego, o verbo está na forma intensiva, para mostrar o desprezo e a zombaria que aquelas pessoas demonstraram por Jesus. Eram lamentadores profissionais, que tinham visto muitos casos de morte e conheciam bem seus indĂcios, e a jovem certamente os apresentava. A questĂŁo se a jovem estava realmente morta ou nĂŁo Ă© bastante discutida entre os exegetas. Alguns acham que a jovem estava em um estado de coma; outros, que ela realmente estava morta e que Jesus usou a expressĂŁo “mas dorme” para indicar que, naquele caso, a morte nĂŁo tinha maiores conseqĂĽĂŞncias do que o sono, pois a jovem logo despertaria para a vida.
V. 25 e 26 – Jesus toma a menina pela mĂŁo. Isso significa que ele tocou um cadáver e, conseqĂĽentemente, tornou-se impuro conforme a lei judaica. Ao tocá-la, Jesus transmite vida e resgata a menina como criatura digna, criada Ă imagem e semelhança de Deus. E a menina reage, levantando-se. A perĂcope termina falando que a fama de Jesus foi espalhada por todo o lugar.
3 Meditação
Sentar junto Ă mesa e comer Ă© um dos atos mais básicos para iniciar e manter relações humanas. A comunhĂŁo de mesa pode ser entendida como comunhĂŁo de vida. Ali, pessoas compartilham comida e bebida, mas tambĂ©m sonhos, alegrias e tristezas, perdĂŁo e fraternidade. A comensalidade cria simpatia, responsabilidade e reciprocidade entre as pessoas. Jesus exercita a comensalidade, a comunhĂŁo de vida, com pessoas que, segundo as leis religiosas e sociais, feriam os princĂpios elementares e morais de uma sociedade considerada sadia. Jesus senta-se Ă mesa com pequenos agricultores endividados, trabalhadores rurais sem terra, diaristas desocupados, trabalhadores desempregados, escravos fugitivos, doentes, coletores de impostos, portadores de deficiĂŞncias, adĂşlteros, prostitutas, agiotas, vendedores de alho, cuidadores de porcos, pastores de ovelhas que invadiam terras alheias. Ao sentar-se justamente com as pessoas excluĂdas, Jesus rompe o cĂrculo de marginalidade e reintegra-as ao convĂvio diário. Jesus nĂŁo nega a condição de pecadoras das pessoas com quem compartilha a mesa. Quanto mais pecadoras, tanto mais essas pessoas precisam de Deus e de sua ajuda. Jesus, como mĂ©dico, acolhe as pessoas, oferece a proximidade fraterna e conciliadora em nome de Deus.
As refeições comunitárias de Jesus, nas quais acontecia a partilha de bens materiais e espirituais com as pessoas pobres e desprezadas, apontam para uma inversĂŁo dos valores vigentes na sociedade. Toda vez que acontecia uma refeição, uma comensalidade, havia uma denĂşncia contra um sistema que expõe tantas pessoas Ă fome e Ă marginalidade e um anĂşncio de uma nova forma de viver e conviver a partir dos princĂpios do reino de Deus.
A solidariedade de Jesus com as pessoas excluĂdas tambĂ©m o levou a olhar para as pessoas doentes e sofredoras. Jesus foi tĂŁo radical, a ponto de assumir o estado de impureza das pessoas doentes e mortas, tocando-as e deixando-se tocar. Ao curar, Jesus denuncia o total descaso e abandono a que as pessoas doentes estavam expostas. Essa prática de Jesus levou as primeiras comunidades cristĂŁs a investir na área da saĂşde. As pessoas curadas puderam experimentar a inclusĂŁo na sociedade e uma mudança de valores em sua vida a partir do momento em que passaram a crer em Jesus, passando a segui-lo e servi-lo.
Nas mesas da atualidade, onde nĂłs, como obreiras e obreiros, nos reclinamos para comer? Quantas vezes, para assegurar nosso emprego e, quem sabe, atĂ© nosso prestĂgio, assentamo-nos na roda dos sĂŁos, daqueles que nĂŁo precisam de mĂ©dico? E como comunidade, quantas vezes nĂŁo enxotamos aqueles que consideramos impuros, indignos, doentes e pecadores do meio da gente? A postura radical de Jesus deixa-nos, muitas vezes, incomodados porque ele se deixa encontrar e vai ao encontro dos frágeis e excluĂdos. NĂŁo se limita a prestar um auxĂlio (assistencialismo), mas age com-paixĂŁo das pessoas, seja partilhando com elas a mesa, o toque, a impureza, a cura, o reviver, o perdĂŁo.
Hoje, quando nos sentamos Ă mesa e praticamos a comensalidade, nĂŁo podemos esquecer que há muitas pessoas que nĂŁo tĂŞm comida, que estĂŁo Ă margem de uma sociedade que cria excluĂdos e se mantĂ©m atravĂ©s deles. A comensalidade e as curas praticadas por Jesus tinham em seu horizonte a tarefa profĂ©tica de denunciar os abusos e anunciar o reino de Deus, chamando pessoas a exercitar sua responsabilidade cristĂŁ de ser sal e luz do mundo. Essa responsabilidade deve ser assumida desde o dia de nosso Batismo.
Como pessoas batizadas, seguidoras de Jesus Cristo, somos chamados a ser discĂpulos que exercitam entre si e com as pessoas excluĂdas a aceitação mĂştua, a dignidade, a partilha, a comunhĂŁo, a terapia, o restabelecimento do corpo, enfim a misericĂłrdia.
No culto, a Ceia do Senhor é um dos momentos de prática da misericórdia. Todas as pessoas são convidadas a participar – sadias e doentes, cegas, surdas, coxas, pobres, pecadoras. A graça de Deus envolve todas, toca todas e convida, através da fé, a experimentar nova vida, em serviço e amor. Dessa Ceia surgem outras ceias no espaço da casa, onde acontecem o partilhar do pão, a inclusão, a cura, o toque terapêutico, o consolo e a aceitação mútuos, o respeito e a misericórdia.
4 Imagens para a prédica
Convido para olhar os movimentos desse texto. Há um caminhar que vai ao encontro, que ousa ficar junto, que se deixa encontrar, que segue a caminho, que novamente se deixa encontrar e promove o chamado ao seguimento.
Atentemos: Jesus caminha ao encontro de Mateus, senta-se para comer junto com pessoas excluĂdas, deixa-se encontrar pelo pai da menina que morreu, segue junto em solidariedade, deixa-se encontrar pela mulher que sofria com hemorragia e chama ao seguimento.
A partir desses movimentos, tendo em vista o exercĂcio da misericĂłrdia, uma imagem para a prĂ©dica pode ser a de um caminhar com os braços abertos.
O caminhar denota o ato de Jesus de ir ao encontro das pessoas e tambĂ©m de deixar-se encontrar. No encontro com as pessoas, a postura de Jesus foi a de ter os braços abertos para acolher as pessoas excluĂdas e sofredoras.
Adaptei a estĂłria dos carinhos quentes para a seguinte versĂŁo:
A estória da caminhada de braços abertos
Era uma vez, há muito tempo, uma comunidade em que as pessoas eram muito felizes.
Naquela comunidade, havia a prática de que, quando nascia uma criança, todas as pessoas iam ao encontro dela e de sua famĂlia e a abraçavam. Todas as pessoas recebiam essa caminhada de braços abertos, fossem elas pobres ou ricas, de uma ou de outra parte da comunidade. Receber a visita e ir ao encontro fazia as pessoas sentirem-se aconchegadas, cheias de carinho. A prática da caminhada de braços abertos nĂŁo acontecia sĂł quando uma criança nascia. Acontecia sempre, como uma prática de misericĂłrdia entre as pessoas. Ao se encontrarem, as pessoas paravam para conversar, para comer juntas, para pedir ajuda e para a receber.
As pessoas viviam caminhando ao encontro umas das outras com os braços sempre abertos para acolher sem constrangimento. E isso era feito de graça. Por isso todos eram felizes e cheios de carinhos na maior parte do tempo.
Um dia, uma bruxa má ficou braba, porque as pessoas, sendo felizes, não compravam
as poções e os ungĂĽentos que ela vendia. Por ser muito esperta, a bruxa inventou um plano malvado. Certa manhĂŁ, ela chegou Ă casa de uma famĂlia e cochichou:
– Olhe, veja essa gente toda caminhando de braços abertos ao encontro umas das outras. Se continuar assim, ninguém mais vai ter sola debaixo dos pés e nem braços fortes.
– Quer dizer, entĂŁo, que os pĂ©s se desgastam e os braços se enfraquecem quando a gente vai ao encontro e se abraça assim? – perguntou uma das pessoas da famĂlia.
E a bruxa respondeu:
– Pode-se atĂ© perder os pĂ©s e caĂrem os braços, ainda mais quando se abraçam pessoas de má fama, doentes e pecadoras.
Dizendo isso, a bruxa foi embora, montada na vassoura, gargalhando muito.
A famĂlia ficou preocupada e começou a reparar em cada vez que as pessoas se encontravam e se abraçavam, pois temia ficar sem os pĂ©s e os braços. EntĂŁo, essa famĂlia começou a queixar-se Ă s outras famĂlias e a dizer o que a bruxa havia dito e que era melhor se prevenir. Aos poucos, as pessoas perceberam e passaram a nĂŁo mais ir ao encontro umas das outras com os braços abertos, pois entenderam que era perigoso. Todos ficaram cada vez mais mesquinhos.
As pessoas do lugar começaram a sentir-se menos acarinhadas e incluĂdas, e algumas chegaram a morrer pela falta de encontros de braços abertos.
A situação ficou muito grave até que uma pessoa especial chegou ao lugar. Ela nunca tinha ouvido falar na bruxa e não se preocupava em perder os pés e os braços. Ela simplesmente ia ao encontro das pessoas com seus braços abertos, mesmo quando não era pedida sua presença. As pessoas do lugar desaprovavam sua atitude, porque essa pessoa dava às crianças a idéia de que elas poderiam continuar indo ao encontro e deixando-se encontrar, abraçando todas as pessoas sem problemas, porque nada iria acontecer a seus pés e a seus braços.
As crianças gostavam muito da Pessoa Especial, porque se sentiam bem em sua presença e passaram a caminhar até ela, a ficar junto dela e a abraçá-la muito. Fazendo assim, também se encontravam e se abraçavam, sem fazer distinção, acolhendo e incluindo todos na mesma mesa em que comiam juntas e sonhavam juntas.
Os adultos ficaram muito preocupados e decidiram impor uma lei para proteger as crianças. A lei dizia que era crime caminhar e ficar junto com as pessoas sem uma licença e que era crime abraçar pessoas consideradas impuras, doentes, pecadoras.
A Pessoa Especial, no entanto, continuou caminhando ao encontro das pessoas, deixando-se encontrar, abraçando todas as pessoas e chamando-as a exercitar a misericórdia. Essa Pessoa Especial tem um nome: Jesus.
5 SubsĂdios litĂşrgicos
Recepção: uma equipe deve estar à porta, recebendo as pessoas que chegam para a celebração.
ConfissĂŁo de pecados:Â
Misericordioso Deus, chegamos Ă tua presença em humildade, confessando-te que somos pessoas pecadoras. Em nosso agir diário, temos sido como fariseus que esquecem que o cumprimento de tua vontade acontece atravĂ©s de gestos misericordiosos com nosso prĂłximo. Confessamos que temos excluĂdo pessoas porque elas nĂŁo se enquadram dentro dos padrões que uma sociedade podre criou. Confessamos que nĂŁo vamos ao encontro de nossos irmĂŁos e irmĂŁs, tampouco nos deixamos encontrar por eles. Fechamo-nos em nĂłs mesmos e esquecemos nossa responsabilidade como pessoas batizadas: a de ser sal, luz, fermento e justiça. Ă“ Deus, há ainda tantos pecados que pesam em nĂłs como comunidade. Tantas vezes fechamos nossas portas aos marginalizados que essa sociedade faz, esquecemos da comensalidade praticada por Jesus, de suas curas, de seu toque em pessoas consideradas impuras. AtĂ© essas ações de Jesus, muitas vezes, tentamos encobrir. Por tudo isso, Deus de amor e misericĂłrdia, pedimos teu perdĂŁo.Â
Anúncio da graça:
“Deus estava em Cristo, reconciliando consigo o mundo, não imputando aos seres humanos as suas transgressões, e nos confiou a palavra da reconciliação.” A esse Deus misericordioso rendamos graças cantando:
C – Louvemos todos juntos o nome do Senhor.
Oração do dia:
Misericordioso Deus, tu que sempre te deixaste encontrar pelo teu povo e vieste atĂ© nĂłs em Jesus Cristo, nĂłs te pedimos por tua presença em nossa vida para que nossas ações sejam misericordiosas, que buscam a presença do irmĂŁo e da irmĂŁ. Por Jesus Cristo, nosso Senhor e Salvador, que contigo e com o EspĂrito Santo vive e reina hoje e sempre. AmĂ©m.
Oração geral da igreja:
L – Pelas bênçãos recebidas diariamente:
C – Graças, Senhor.
L – Pela presença de Deus em nossa vida:
C – Graças, Senhor.
L – Pela dádiva e unidade da fé:
C – Graças, Senhor.
L – Por todas as pessoas que servem solidariamente:
C – Graças, Senhor.
L – Por todas as formas de inclusão social e religiosa:
C– Graças, Senhor.
L – Para que as nossas ações se orientem na misericórdia divina:
C – Ajuda-nos, Senhor.
L – Para que exercitemos nossa responsabilidade batismal:
C – Ajuda-nos, Senhor.
L – Para que incluamos integralmente nosso próximo na vida social e religiosa:
C – Ajuda-nos, Senhor.
L – Para que denunciemos toda forma de exclusão e anunciemos o reino de Deus:
C – Ajuda-nos, Senhor.
L – Por mesas cheias de gente, partilhando pão, curas e sonhos:
C – Compromete-nos, Senhor.
L – Para que nosso mundo, nosso paĂs e nossa sociedade ouçam o evangelho de Jesus Cristo:
C – Compromete-nos, Senhor.
L – Por tudo isso, nós oramos. Em nome de Jesus Cristo.
C – Amém.
Oração eucarĂstica:
Graças te damos, Ăł Deus eterno, por sempre teres estado junto com teu povo e teres vindo atĂ© nĂłs em Jesus Cristo. Damos-te graças, misericordioso Deus, pela dádiva maior, que Ă© teu Filho Jesus Cristo, o qual se tornou um de nĂłs e viveu como ser humano. AtravĂ©s de seu jeito de viver, pregar e agir, nĂłs aprendemos a te servir naqueles que sĂŁo os mais desprezados e prejudicados da sociedade. Jesus zelou por reintegrar as pessoas excluĂdas ao convĂvio social e religioso. Por suas ações misericordiosas, Jesus foi condenado, morto e sepultado. Mas ele ressuscitou e vive contigo e com o EspĂrito Santo. Celebramos a Ceia conforme a ordem do prĂłprio Jesus. Muitas foram as vezes em que Jesus se reuniu com seus discĂpulos e outras pessoas para cear. Mas, na Ăşltima vez que jantou com sua comunidade de discĂpulos, na noite em que foi traĂdo, Jesus tomou o pĂŁo e, tendo dado graças, partiu-o e disse: “Isto Ă© o meu corpo, que Ă© dado por vĂłs; fazei isto em memĂłria de mim”. De modo semelhante, depois de haver ceado, tomou tambĂ©m o cálice e disse: “Este cálice Ă© a nova aliança no meu sangue; fazei isto todas as vezes que o beberdes, em memĂłria de mim”. Envia, Senhor, teu EspĂrito Santo, o EspĂrito de nosso Senhor e de sua ressurreição, para que, partilhando o pĂŁo da vida e o cálice da salvação, nos tornemos, em Cristo, um sĂł corpo, que cumpre tua vontade atravĂ©s de gestos misericordiosos. Lembra-te de todas as pessoas que já nos antecederam e reĂşne-nos todos em teu reino, junto Ă mesa do banquete que nos tens prometido. Louvamos-te, trino Deus, cantando:
C – Por Cristo, com Cristo e em Cristo, sejam a ti, Pai Todo-Poderoso, na unidade do EspĂrito Santo, toda a honra e toda a glĂłria, agora e para sempre. AmĂ©m, amĂ©m, amĂ©m.
SugestĂŁo de hinos:
HPD Vol. 2 – 401 (Salvação); HPD Vol. 2 – 318 (Vem, EspĂrito de Deus); OPC 248 (Convite ao compromisso); OPC 124 (Neste pĂŁo da terra prometida); OPC 80 (Arde a voz em meu peito); OPC 60 (Migrante).
Bibliografia
GAEDE NETO, Rodolfo. A diaconia de Jesus: uma contribuição para a fundamentação teológica da diaconia na América Latina. São Leopoldo: Sinodal/CEBI; São Paulo: Paulus Editora, 2001.
CHAMPLIN, R. N. O Novo Testamento interpretado versĂculo por versĂculo. SĂŁo Paulo: Milenium, 1986.
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