Prédica:1 Coríntios 4.1-5
Autor: Rolf Dübbers
Data Litúrgica: 3º Domingo de Advento
Data da Pregação: 16/12/1979
Proclamar Libertação – Volume: IV
I — Tradução
(Texto grego: The Greek New Testament, 1966, Stuttgart)
V. l: Qualquer um nos avalie a nós assim: Somos subordinados (remadores) de Cristo e administradores (ecônomos) de mistérios de Deus (dos segredos divinos).
V.2: Ora, seja dito de passagem, o que se exige dos administradores é que cada qual se mostre fiel.
V.3: Parece-me, porém, insignificante um julgamento sobre mim da parte de vós, ou da parte de um tribunal humano. Até nem mesmo me julgo.
V.4 De nada, realmente, me sinto culpado, mas nem por isso me tornei um justificado. Pois, quem me julga é o Senhor.
V.5: Sendo assim, não pronunciai julgamento algum antes do tempo, até que o Senhor venha (antes do tempo da vinda do Senhor)! Ele, então, trará da escuridão à luz as coisas ocultas e revelará os desígnios (metas, resoluções)dos corações. E então o louvor (elogio) será dado a cada um, da parte de Deus.
II – Anotações sobre três fatos
1. Paulo em Corinto
Parece-me um fato maravilhoso: O que tendo começado desde a Galileia (At 10,37) tornou-se, talvez 25 anos mais tarde(?), já realidade e presença na cidade grega de Corinto: A mensagem universal de Deus na pessoa de Jesus de Nazaré aos homens! Portador dessa mensagem foi o hebreu Paulo (2 Co 11,22); por profissão, modesto fabricante de tendas (At 18,3), mas também formado em teologia hebraica (At 22,3). O jovem Paulo foi inimigo terrível dessa mensagem (At 26,9ss), mas foi convertido pelo Cristo Jesus Ressuscitado e constituído subordinado, testemunha e portador universal da mesma (At 26,16ss). Na sua primeira passagem por Corinto, Paulo permaneceu um ano e seis meses naquela cidade, sustentando-se por trabalho manual próprio e ensinando a palavra de Deus (At 18,1ss). O pregador não deve ignorar o que ouvimos em At 18 sobre Paulo em Corinto. E mais: Deve, acho eu, à sua comunidade algumas informações sobre Paulo, este remador do comandante Cristo Jesus, tão mal compreendido e difamado até hoje.
2. A Igreja de Deus em Corinto
Chegada e permanência de Paulo em Corinto não ficaram sem resultado. O próprio Paulo descreve no capítulo da nossa perícope a sua atuação assim: Com efeito, ainda que tivésseis dez mil pedagogos (preceptores, tutores) em Cristo, não teríeis muitos pais, pois fui eu quem pelo evangelho vos gerou em Jesus Cristo (v. 15). Nasceu nessa cidade, mediante a obediência por fé (Rm 1,5) na pregação de Paulo, uma nova congregação. Formou-se, em meio à sociedade coríntia uma nova sociedade, chamada por Paulo de igreja de Deus (1,1). Características principais dessa nova sociedade foram, entre outros, a fé em Deus nosso Pai e a invocação do nome de nosso Senhor Jesus Cristo, o Filho do Pai, como também a comunhão com este Filho, nosso Senhor. Pertence à mensagem de Paulo a certeza de que Deus, o Criador, por ser fiel, chama a criatura humana a essa comunhão salutar e santificante para que os homens tenham e consigam assim as nobres metas de sabedoria e justiça e santificação e redenção (1,30).
Da correspondência que houve entre Paulo e a igreja de Deus em Corinto chegaram até nós cópias de duas cartas do apóstolo, canonizadas pela cristandade antiga na certeza de serem indispensáveis para que a causa de Deus em e por Jesus Cristo não perdesse a sua identidade e integridade durante a caminhada de igrejas de Deus sobre a terra até que o Senhor viesse.
3. A cidade de Corinto
Falando da cidade de Corinto, gostaria de escrever Cidade com letra maiúscula, não para dar relevo a qualquer grandeza moral e cultural dela, mas para constatar o seu papel importante. Era ela o centro comercial da Grécia antiga, banhada por dois mares e provida de dois portos, um oriental e outro ocidental. Corinto não era província mas metrópole, capital da província romana da Acaia e sede de um procônsul romano. Profundos eram nela os contrastes entre fortes (ricos, sábios) e fracos (pobres, incultos) Proverbial era a corrupção de Corinto. Corintiar dizia-se para caracterizar vida dissoluta. A cidade era um mercado de inúmeras possibilidades religiosas. Não faltava sequer a prostituição em nome de deuses e deusas. Praticava-se o culto de Vênus Afrodite. Mil jovens sacerdotisas ficavam, em nome da deusa do prazer, à disposição dos turistas, marinheiros, comerciantes etc., e estes levaram a doença de Corinto ao mundo inteiro de então. Ser chamada de moça de Corinto dispensava em todo o império romano de mais outras explicações. Estrabão, um escritor grego, falecido uns 20 anos após Cristo, escreveu: A viagem a Corinto não é recomendável a qualquer um! Mas Paulo foi a Corinto, não como turista ou adorador de Vênus. Aliás: o poeta alemão Friedrich Schiller lamenta na sua obra Os Deuses da Grécia o ocaso e o fim do culto prestado a Vênus! Ignorava ele o conteúdo desse culto?
Paulo entrou nessa cidade como remador da causa de Deus em Cristo. Ofereceu a nova mensagem, primeiro aos visitantes da sinagoga (havia uma só nessa grande cidade?). Passou depois, por causa da oposição da parte de judeus, para a casa de um certo Tício Justo, homem temente a Deus. E, como já mencionamos, a pregação paulina levou cidadãos coríntios a um novo nascimento pelo evangelho. Paulo se tornou pai espiritual de uma nova família coríntia. – Mas, nessa família surgiram contendas (1,11).
III — Considerações sobre as contendas na igreja de Deus em Corinto e a posição tomada por Paulo
Não se sabe quanto tempo passou entre a primeira estada de Paulo em Corinto e a redação e entrega da nossa carta (e da perícope) aos cristãos coríntios. O certo é que a nova sociedade cristã em Corinto não permaneceu simplesmente, digamos, como uma congregação paulina. Vieram outros preceptores em Cristo a cidade e à comunidade gerada por Paulo pelo evangelho (4,15) Paulo menciona Apoio e Cefas (1,12). Mais tarde ouvimos de Barnabé, dos demais apóstolos e dos irmãos do Senhor (9,5s) Da estada de Apoio em Corinto escreve At 19,1. Estiveram também em Corinto Pedro, os demais apóstolos, os irmãos de Jesus(Mc 3,31ss)e Barnabé? Não sabemos. Certo é que vieram à comunidade paulina em Corinto indivíduos ou grupos de adeptos de outros apóstolos, ganhando também adeptos. A igreja de Deus em Corinto não se conservou, pois, comunidade fundada e administrada por Paulo. A posição de Paulo foi única quanto ao surgimento da primeira comunidade cristã na metrópole de Corinto. Mas não permaneceu única quanto ao seu desenvolvimento. Mais ainda: A atuação de Paulo não ficou incontestada. Houve julgamentos. Surgiram indivíduos e grupos com mestres e apóstolos preferidos (1,12). Até havia quem dizia: Eu sou de Cristo!. O que obviamente queria dizer: Para mim não existe necessidade alguma de ter como intermediário um apóstolo.
Paulo está preocupado por causa dessas contendas, divisões e posições. De suma importância para a cristandade foi e continua sendo para sempre a posição tomada nessa situação por Paulo: Que jamais seja dado a um apóstolo o que pertence unicamente a Jesus Cristo, a saber: o comando supremo na embarcação cristã! Mas que também não seja desprezado o que foi e permanece uma ordem estabelecida pelo próprio comandante do navio: a) constituição do apostolado, o ministério de remadores e de administradores!
Paulo luta contra dois desvios: A preferência de um apóstolo como se houvesse o apóstolo que seria a inteligência central da igreja de Deus, o allround-apóstolo – eis um desvio! E o outro desvio: a rejeição total de todo e qualquer apóstolo. Igrejas de Deus não podem nascer nem crescer sem a atividade de subordinados de Cristo e de administradores de mistérios de Deus (4,1). Uma igreja de Deus não se desenvolve unicamente por Paulo, ou por Pedro, ou por Apoio, ou por outro qualquer subordinado solitário. A posição de Paulo não exclui nem despreza a necessidade do ministério apostólico. Mas Paulo não defende uma teologia paulina contra uma teologia petrina. À confissão da cristandade pertence a seguinte convicção: … sois edificados sobre o fundamento dos apóstolos (plural!!)… há um só Senhor… um só Deus e Pai de todos..! (Efésios). Convém notar que essa confissão e convicção não continuam:., e há um só apóstolo!
Mas esse outro desvio, a exclusão de todo e qualquer apóstolo pela declaração bastante orgulhosa de que Eu sou de Cristo!, não é menos grave. Pois com tal declaração a cristandade de qualquer época e lugar se separaria dos apóstolos, perderia assim a sua base e acabaria em qualquer sociedade religiosa, sem critérios certos e históricos quanto à revelação de Deus em Cristo Jesus, testemunhada pelos apóstolos escolhidos. A posição assumida por Paulo corresponde a fatos históricos. Houve e continua havendo um plural apostólico (Mc 3,13ss; 1 Co 15,5ss).
Ai de uma igreja de Deus que adora um apóstolo, e despreza outro! Que cada um leve a sério o plural em 1 Co 4,1! Mas ai também de uma cristandade desligada do ministério apostólico único constituído pelo próprio Cristo antes de partir! As grandes promessas evangélicas como Eu estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos, ou Quem vos ouve, a mim me ouve; e, quem vos rejeita, a mim me rejeita jamais podem nem devem ser usadas por uma cristandade que se esquece da autoridade histórica única do colégio apostólico formado por Jesus Cristo. As afirmações e advertências do Senhor da cristandade são claras: Assim como o Pai me enviou, eu também vos envio. E quem vos rejeita, a mim me rejeita; e quem me rejeita a mim, rejeita aquele que me enviou! Nunca, em qualquer lugar ou época, uma igreja de Deus em Cristo pode prescindir da comunhão constante e atenta com o ministério apostólico, presente nos documentos do Novo Testamento. E nunca deve dar preferência a um apóstolo só. À base da cristandade pertence o plural de subordinados de Cristo e de administradores dos mistérios de Deus. Este plural foi também confirmado e reconhecido pela cristandade antiga, quando canonizou os quatro relatórios evangélicos.
IV — Exegese meditativa
De início, algumas considerações. Não seria mais conveniente distinguir e separar os dois trabalhos: Exegese, primeiro, e depois meditação? Concordo que devemos distinguir. Exegese pesquisa o texto quanto á sua origem, ao seu passado tão distante, ao seu ambiente de então, aos motivos de suas certezas e perguntas, de suas afirmações e admoestações. Sendo assim, o exegeta se deve locomover, de boa vontade, ao passado, lendo, ouvindo, pesquisando com sincera atenção com todos os meios acessíveis. É uma dádiva do nosso Criador que podemos fazer essas viagens mentais ao passado. Mas que experiência maravilhosa: Não é o próprio texto pesquisado que nos impele, precisamente no trabalho exegético, a meditar? Um texto como a nossa perícope, corri seus contextos, permite a um pregador evangélico ficar desinteressado, neutro, indiferente?
Sem falar da nossa obrigação profissional de pregar a partir do nosso texto a uma igreja de Deus e uma congregação dominical de hoje, que sem dúvida poderão esperar de nós mais do que algumas informações históricas sobre um documento do passado, seria anormal se o nosso esforço exegético não nos obrigasse, querendo ou não, a meditações, isto é: a sair de uma indiferença pesquisadora e a assumir posições e decisões. É o próprio texto que se dirige a mim, perguntando e exigindo respostas. Distingamos, sim, exegese e meditação! Mas não nos permitamos proibir ao texto que ele questione o nosso próprio presente, o nosso ambiente pessoal, eclesial e geral. É uma dádiva do céu se Deus não nos permite ficarmos neutros, frios. Pois neste caso, a nossa pregação não seria uma mensagem para os nossos dias, e, sim, uma simples preleção histórica.
Voltemos à nossa perícope. Impressiona-me a consciência profissional de Paulo: Somos remadores na embarcação do comandante Jesus Cristo! Somos administradores de mistérios de Deus!
E por causa do contexto no qual foi pronunciada esta sentença (4,1), há mais outra coisa que me impressiona. Na igreja de Deus em Corinto ardiam as contendas entre adeptos de grandes e simpáticos remadores e administradores, e de outros, considerados mais fracos e pouco hábeis. Ou houve também discussões entre os próprios remadores e administradores? Certamente houve os que lamentavam: Ó, se tivéssemos mais Apoios, e menos Paulos! Certamente também houve os que declaravam: Por que esta multidão de subordinados e administradores? Temos e somos de Cristo! Basta!
Na história da cristandade mudaram os nomes. Mas as lamentações permaneceram: Se tivéssemos mestres melhores! As preferências também continuam: Este teólogo, sim! Mas aquele outro nunca! E o orgulho também ficou: Esses primitivos apóstolos tão ultrapassados como aquele simplório pescador Simão Pedro! Em tudo isto, nós no protestantismo, pecamos muito, ofendendo, além desses nossos corajosos irmãos mais antigos, o próprio Cristo e seu Pai, os quais escolheram esses homens para serem e permanecerem uma bênção para a humanidade. É um vício protestante não suportar as sóbrias vozes dos legítimos subordinados de Cristo e administradores dos mistérios de Deus, e rodear-se de mestres que não conhecem nem reconhecem a base apostólica da igreja de Deus em Cristo (2Tm 4).
Eu disse que há mais outra coisa que me impressiona em Paulo (traduzido: o pequeno). Ei-la: Apesar de ser evidentemente o pai espiritual da nova família cristã em Corinto, ele não declarou: Qualquer um nos avalie a nós assim: Primeiro, eu é que sou o subordinado principal de Cristo e o administrador mais culto dos mistérios de Deus; depois, os outros! Quanta confusão e prejuízo houve na caminhada da cristandade através dos séculos até os nossos dias por causa das contendas entre primeiros e outros! Paulo não entrou nessa contenda com julgamentos. Somos, disse, e não, eu sou! Convém levarmos hoje a sério as posições tomadas por Paulo e as suas exigências: Exijam de nós fidelidade de acordo com os nossos dons! Acabem com esses julgamentos apressados sobre os que vos servem! Temam o julgamento infalível do Senhor! Almejem o seu elogio no Dia Eterno! Este Paulo – que grande Pequeno foi!
Mas falta ainda meditar o assunto principal que ultrapassa as contendas de então e de hoje, dentro da cristandade tão dividida. É o assunto existencial da igreja cristã. É a consciência profissional apostólica, formulada por Paulo assim: Somos remadores da embarcação salvadora de Cristo e administradores dos mistérios divinos! Uma consciência profissional como esta não permite neutralidade, nem então, nem hoje. O assunto é por demais importante, desde que se sinta o peso de termos como Cristo, Deus, mistérios de Deus, vinda do Senhor, julgamento do Senhor.
A igreja de Deus em Corinto sentiu, talvez, o peso; estava, talvez, a par do conteúdo de tais termos e afirmações. Mas, e nós mesmos? E o nosso ambiente eclesial dominical e geral dentro e fora da comunidade? – Cristo Jesus? Já mencionamos como Paulo compreendeu a pessoa do Nazareno (1,30). Mistérios de Deus? Mistério era um termo técnico da religiosidade antiga. Foi muito usado por Paulo (21 vezes). Na pregação de Jesus aparece só uma vez nos sinóticos, em Mt no singular, em Mc e Lc no plural. Jesus fala dos mistérios do reino (governo, império) de Deus (dos céus). Sem medo de errar podemos afirmar que o conceito abreviado, de Paulo, corresponde ao mais extenso, dos sinóticos. Em todo caso, trata-se de ações e reações de Deus (dos céus) em face dos procedimentos humanos. Administrando os mistérios de Deus, Paulo anuncia os pensamentos e caminhos do Todo-poderoso. A constituição de administradores dos mistérios de Deus significaria então graça e advertência divinas: Deus, o Criador, não quer que o homem, sua criatura, ignore os planos divinos. Deus quer homens informados, naturalmente para o bem deles. É impossível incluir num sermão dominical toda a riqueza, todas as facetas do termo mistério usado por Paulo nos documentos que levam o nome do apóstolo. Mas me parece certo que o cerne dos mistérios de Deus, na compreensão profunda de Paulo, é o próprio Jesus Cristo. Porém, que Jesus Cristo?
O Crucificado? Sim! Mas também o Ressuscitado! E o Vindouro! E mais, muito mais ainda: Também o Jesus nascido de mulher, o Jesus em crescimento, o Jesus tornando-se adulto! E nesta altura devemos incluir o testemunho de outros administradores dos mistérios de Deus e dizer: Também o Jesus que ensina, prega, cura, pergunta, responde, tem fome, chora, é tentado, perdoa, julga: também o Jesus hóspede em muitas casas, o Jesus presente nas bodas em Cana, mas presente também num cemitério; também o Jesus que sofre e ora noites inteiras, o Jesus cansado e sedento. E mais ainda: Também o Jesus que ficou solteiro, mas sem ter humilhado mulher alguma. Sim, também o Jesus solteiro que testemunhou quanta é a doçura da natureza e da companhia de uma mulher, mas ficou solteiro e deixou uma família sua, formada por ele. É a primeira congregação cristã do mundo, a mãe comum da cristandade, na cidade de Jerusalém, obra de Jesus que se tornou uma inesgotável bênção universal.
Então, a essência dos mistérios de Deus não é um livro fechado, nem um dogma incompreensível, nem uma ética inatingível, nem um objeto misterioso. O cerne dos mistérios de Deus é uma pessoa bem pessoal, aberta sempre para Deus, mas também para o mundo, o mundo dos pecadores e dos justos, dos grandes e dos pequenos A embarcação de Deus com seu comandante Jesus não está fechada para ninguém.
Estou convencido de que devemos ao nosso ambiente a pregação clara, compreensível, humilde sem orgulho, dos mistérios de Deus que abrangem indivíduos e povos, judeus e árabes, “capitalistas'' e comunistas. A cristandade jamais se deve esquecer de proclamar que pertence ao centro de sua fé em Deus um homem histórico: Jesus, o Nazareno. E dele somos subordinados, confessa Paulo, para se cumprirem os mistérios de Deus. Pertence à nossa tarefa levar os homens, e sejam os mais perdidos, a um encontro com seu Libertador Jesus.
Seria mais fácil se houvesse somente administradores legítimos e subordinados verdadeiros. Mas assim não aconteceu, não acontece e não acontecerá até que o Senhor venha. Como já a cristandade primitiva, também nós necessitamos de muito espírito de discernimento para não cairmos nas mãos de homens (ou mulheres) que ostentam a mesma consciência profissional apostólica, sem serem enviados (Ap 2,2)! Pertence aos mistérios de Deus o fato de que, apesar do poder divino, existe também o mistério da iniquidade. Por isso escreveu Paulo com muita sobriedade: Não julgueis antes do tempo! Cuidado com louvores e condenações apressadas! (4,5). Meta mais sublime não existe do que receber o elogio divino. Em todo caso, são contextos valiosos para a nossa perícope as parábolas sinóticas.
V — Sugestões para a pregação
Pode-se partir do ambiente da igreja de Corinto e salientar esse milagre: Aquilo que nasceu e cresceu pelo trabalho de Jesus alcançou a metrópole de Corinto pelo ministério de um subordinado fiel de Jesus. Pode-se acrescentar que também a nossa IECLB em suas muitas comunidades locais não poderá ter outra meta mais nobre do que esta: Ser e viver uma igreja de Deus, crescer e agir como um povo de Deus em Cristo. A meu ver, um contexto evangélico para a nossa perícope poderia ser uma parábola: talvez Mt 13,24-30.9-12. Uma observação: Admiro a sabedoria e sobriedade da cristandade antiga por ter colocado os quatro evangelhos antes das epístolas, apesar de as epístolas serem em geral de origem anterior. A cristandade antiga compreendeu que o que os evangelhos testemunham e relatam é anterior às epístolas e constitui sua base.
O pregador deve à comunidade uma resposta para uma pergunta importante: Como pode nascer e crescer hoje uma igreja de Deus, uma família do céu na terra, e isto para o bem da terra?
Na resposta devemos constatar que Cristo Jesus, o enviado de Deus, constituiu subordinados seus e administradores dos mistérios de Deus. Da atenção que prestamos ao testemunho deles, presentes no Novo Testamento, depende o nosso novo nascimento como família de Deus. Pertence aos mistérios de Deus a grande liberdade que o Criador Divino concedeu à sua criatura humana, e os dons que nos são confiados: o maravilhoso corpo, masculino e feminino, a mente com seus planos, a vasta natureza à nossa disposição, o convívio humano. Deus quer a atividade humana. Mas cuidado: O doador divino exige prestação de contas, o que, aliás, dá sentido aos nossos esforços. Pertence também aos mistérios de Deus a sua incrível paciência conosco que Jesus, o enviado de Deus como crucificado, revelou, concedendo ao pecador arrependido nova esperança para um novo começo. Sendo Jesus Cristo, o crucificado e ressuscitado e o vindouro, a alma dos mistérios de Deus, ninguém tem motivo para desesperar nem para ser leviano! A nobre meta de Deus em Cristo e por Cristo para todos os homens é que sejam sábios, justos, santos e resgatados de todo o mal, recebedores felizes de elogios divinos.
Sugestão de uma estruturação
1. O que Paulo, pela assistência divina, conseguiu em Corinto e o que nós almejamos aqui e agora: nascimento e crescimento de igrejas de Deus (1 Co 1,1; 4,15).
2. O que é indispensável para tal nascimento e crescimento: a atuação de subordinados de Cristo e de administradores dos mistérios de Deus (4,1-2). Esta atuação nada pode conseguir sem a obediência por fé dos ouvintes (Rm 1,5).
3. O que prejudica e até bloqueia nascimento e crescimento de igrejas de Deus: Julgamentos apressados, sejam louvores, sejam condenações, sejam críticas negativas quanto aos subordinados e administradores do Evangelho. – Ter um pregador predileto. Reduzir o trabalho, as mensagens dos administradores a certos elementos de sua pregação e desprezar subordinados competentes por considerar outro subordinado mais competente. Nós nos prejudicamos se reduzimos Paulo a Rm 3,28 e deixamos de ouvir Tiago! – Pretender ser cristão sem levar a sério a base apostólica da cristandade!
4. O que nos torna igreja agradável a Deus e útil ao nosso ambiente: Confiança e reverência para com o Deus vivo, Pai de Jesus, e Pai misericordioso e imparcial como também juiz infalível (4,5) – A invocação do nome do Senhor Jesus, seja adorando, seja louvando, seja orando por nós ou por outros, seja suplicando, seja agradecendo (1,1). – Não ficar parado passivamente na preciosa comunhão sacramental com o Senhor, mediante o Santo Batismo e a Santa Ceia. – Aprofundar, concretizar essa comunhão pela atenção sincera e constante para com os subordinados e administradores do Evangelho de Deus em Cristo, para podermos em todas as situações e relações, agir, pelo vigor desta comunhão com o Cristo Vivo, como sábios, justos, santos e resgatados.