Prédica: 1 João 4.16b-21
Autor: Gottfried Brakemeier
Data Litúrgica: 1º. Domingo após Trindade
Data da Pregação: 08/06/1980
Proclamar Libertação – Volume: V
DEUS É AMOR!
I – Perguntas
A afirmação Deus é amor é uma das mais conhecidas do Novo Testamento. Ela tem força consoladora e vem de encontro a profundos anseios humanos. Mas também introduz num verdadeiro labirinto de perguntas:
1. O mundo clama por mais amor. A delinquência juvenil, os tantos matrimónios em ruína e o deprimente aspecto das favelas nas nossas cidades são apenas algumas das realidades que denunciam o pavoroso saldo negativo com respeito ao amor. Há, porventura, onde a desproporção entre procura e oferta fosse mais calamitosa? O mundo clama por amor, quanto a isto não existe dúvida. Mas, significa isto que ele também esteja clamando por Deus? A esperança das pessoas, se é que ainda existe, se dirige a nós, homens e mulheres. Ela se dirige a pais, cônjuges, filhos, patrões, políticos, cristãos – não necessariamente a Deus. Que, pois, importa o Deus, do qual o nosso texto diz que é amor? Não importa mais o amor dos homens do que o amor de Deus?
2. Além disso, perguntamos pela verdade do que aqui é dito. Se Deus é amor, como pode permitir tanto sofrimento, tanta injustiça, tanta violência? As vítimas de cruel exploração econômica, os torturados, assassinados, os que morrem de câncer, os doentes mentais, eles parecem desmentir a existência do Deus que é amor. Onde está ele, no múltiplo sofrer e morrer das pessoas? Para muitos, Deus mais se assemelha a um destino inexorável, a um poder arbitrário, ou então a uma absoluta incógnita, sobre a qual nada se pode dizer. Como crer no Deus que é amor, neste mundo violento e brutal?
3. Uma outra pergunta resulta de algo paradoxal: Ninguém é contra o amor. Em princípio, todos são a favor. Mas, por que então não existe mais amor? Se as pessoas concordam, porque não fazem? Amor é uma palavra muito falada. Praticamente não existe termo mais inflacionado, badalado, desgastado. É fácil falar em amor, porque todo o mundo sabe que dele precisamos, porque provoca reações emocionais e alimenta sonhos de um mundo melhor. Mas, com este falar conflita a nessa notória incapacidade de amar, ou pelo menos a nossa fraqueza. Por que existe tão pouco amor entre as criaturas do Deus que é amor?
4. E uma última observação. As pessoas concordam com a necessidade do amor. Verdade, porém, é que este consenso existe apenas em termos gerais. As opiniões se dividem na mediria em que se pergunta pela concretização, ou seja, pela prática do amor. Exemplos: O amor dos pais exige o castigo dos filhos? O amor da esposa exige a sujeição ao marido? O que o amor exige com respeito às nossas posses? O amor do cristão exige antes a assistência ao necessitado ou o esforço pela transformação das estruturas e pela eliminação das causas do sofrimento? Nestes assuntos, as discussões esquentam. O que o amor deve fazer em face da pobreza e violência que nos cerca? Como o amor deve encarnar-se na pedagogia, política, economia? O que ele significa no relacionamento com pessoas de credo, raça, idade ou cultura diferentes? Em síntese: como se manifesta Deus que é amor, e o que ele exige na nossa sociedade dividida, conflituosa, pluralista?
Pregar o Deus que é amor não é fácil. E o texto proposto de modo algum fala em evidências simples, constatáveis e de rápida assimilação. Quer me parecer que, como pregadores, faremos bem em compartilhar um pouco aquele impacto sentido por M. Lutero ao se defrontar com este texto. Ele confessou: Estas palavras, para mim, são altas demais. Provavelmente para nós também o sejam. De qualquer maneira, elas encerram um milagre que é preciso descobrir, para recebermos respostas às nossas perguntas e para vivermos estas respostas no dia-a-dia. Vejamos, pois, o texto mais de perto.
II – Tradução
V. 16b: Deus é amor, e aquele que permanece no amor permanece em Deus, e Deus nele.
V. 17: Nisto o amor, em nós, chegou a seu alvo: que temos bom ânimo no dia do juízo. Pois, assim como ele é, assim somos também nós neste mundo.
V. 18: No amor não existe medo, antes o amor completo lança fora o medo. Pois o medo tem o castigo diante dos olhos; aquele que teme não está completo no amor.
V. 19: Nós amamos, porque Ele nos amou primeiro.
V. 20: Se alguém disser: Amo a Deus, mas odiar a seu irmão, é mentiroso. Pois quem não amar a seu irmão a quem vê, não pode amar a Deus a quem não vê.
V. 21: E é este o mandamento que temos da parte dele, que ame lambem a seu irmão quem ama a Deus.
III — Observações exegéticas
O trecho se compõe de três unidades temáticas:
1. V. 16b: Deus é identificado com amor(cf. 4.8). O versículo fala da realidade, dentro da qual deve permanecer quem pretende permanecerem Deus.
2. V. 17,18: No amor não há lugar para o medo. Ele conduz, muito antes, à 'PARRËSIA, termo que podemos traduzir por intrepidez, bom ânimo, coragem.
3. V. 19-21: Amor a Deus e amor ao irmão são inseparáveis, o que corresponde ao mandamento de Deus.
Cada uma destas unidades necessita de consideração particular.
V. 16b: Deus é amor. Para a compreensão exata desta definição de Deus, é preciso ver o todo da carta e, especialmente, os versículos imediatamente precedentes. O autor de 1 Jo (se é o mesmo do Evangelho de João, é questão controvertida, apesar das grandes semelhanças entre estes dois importantes documentos do NT) polemiza contra pessoas que negam ter Jesus Cristo vindo em carne, e que desrespeitam o mandamento do amor (cf. 2.22; 3.1 Os; 4.2 etc).Poder-se-ia dizer que o primeiro erro apontado pelo autor de 1 Jo é de natureza dogmática: Os hereges que, aliás, também se consideram cristãos (cf. 2.19), negam a encarnação, fazem uma diferença entre o homem Jesus e o Cristo espiritual, não aceitam a verdadeira humanidade do Filho de Deus. Em outros termos, eles defendem uma cristologia docetista. O seu segundo erro é de natureza ética: O conhecimento de Deus lhes é mais importante do que a observação dos mandamentos de Deus, cujo principal é o mandamento do amor (2.4). Não há dúvida, porém, de que ambos os erros estão estreitamente correlacionados. Pois, negando a encarnação do Filho de Deus, os hereges, na verdade, negam o amor de Deus. E, negando o amor de Deus, naturalmente também se vêem dispensados do amor aos irmãos. É justamente no conhecimento de Deus que os hereges fracassam e, por isso, também fracassam no comportamento.
Quem é Deus? Deus é amor! Em que se fundamenta esta afirmação? Não numa ideia ou teoria filosófica. Não em análises científicas, em contemplação mística ou em experiências feitas com este mundo. Também naquela época o mundo era cruel, enigmático, pouco transparente para o Deus que é amor. A afirmação se fundamenta exclusivamente no envio do Filho de Deus como salvador a este mundo (4.14). Deus deu o seu Filho Unigênito (cf. Jo 3.16), revelando-se desta maneira como sendo amor. Logo, o fato de que Deus é amor não é evidência acessível a todo o mundo, não é coisa natural. Tal fato se reconhece apenas em Jesus Cristo.
E o que significa isso? Pode-se inverter a frase e dizer amor é Deus? Aquele amor que nós fazemos, esse amor é Deus? Neste caso, nós iríamos fazer Deus. Já esta consequência, entretanto, mostra que devemos ter cuidado. 1 Jo não reduz Deus ao ato de pessoas se amarem entre si. O autor da carta não substitui a palavra Deus pela palavra amor. Ele fala, muito antes, do amor de Deus (4.9), do amor que procede de Deus (4.7), do amor que o Pai nos deu (3.1). Deus não é produto de ação humana. Ele é a fonte do amor. Certamente ninguém jamais viu a Deus (cf. Jo 1.18; 1 Jo 4.20). Mas os cristãos viram Jesus Cristo (1 Jo 1.1 ss; 4.14) e nele viram o amor de Deus. Sim, eles viram que o ser de Deus é amor, que ele, para nós, não quer ser outra coisa do que amor. Nenhum ser humano, por mais que ame, é amor. Nós temos amor ou realizamos amor, mas não somos amor (Jüngel). Deus, porém, é amor.
Por essa razão, não se trata de nós apenas praticarmos o amor. É preciso crer no amor que Deus nos tem. Crer no amor de Deus que é mais forte do que morte e vida (cf. Rm 8.38), e também mais forte do que nós e os fracos sinais de amor produzidos por nós. Não o nosso amor, mas sim a nossa fé vence o mundo (1 Jo 5.4), fé esta que se apega ao amor de Deus. Permanecer neste amor significa, por isso, permanecer nessa fé, nessa esfera do poder do amor divino. Significa deixar-se determinar pelo amor que Deus nos tem. Esse permanecer é o fundamento de um novo ser, como amados de Deus (4.1 etc.) e o fundamento de uma nova práxis. Pois o crer implica um fazer.
Vv. 17s: Uma das primeiras consequências práticas do permanecer no amor é a expulsão do medo. Nisto o amor de Deus chega a seu alvo, torna-se completo, perfeito. O autor de 1 Jo tem em vista o medo do castigo divino no dia do juízo final. Se Deus é amor para conosco e se firmarmos pé neste amor, não há o que temer da parte de Deus. Podemos enfrentar o dia do juízo, muito antes, com bom ânimo, intrépidos. O sentido do 17b não é bem claro. Na atual forma, parece dizer que o bom ânimo dos cristãos no dia do juízo se justifica, porque o Cristo celeste é o exemplo dos crentes no amor. Se ele, porém, é exemplo do amor, como teriam medo de castigo os que lhe seguem os rastos? Seja como for, claro é que o amor lança fora o medo. Quem ainda tiver medo de Deus, não está completo no amor.
Naturalmente, a eliminação do medo não significa a eliminação do respeito a Deus. Na verdade, não existe amor que não respeitasse o outro. Neste sentido, tanto o AT como o NT podem falar do temor a Deus (cf. Pv 1.7; 8.13; Is 33.6: Rm 3.18; 2 Co 7.1 etc.) e neste sentido também M. Lutero fez iniciar as explicações dos dez mandamentos no catecismo menor com as palavras: Devemos temer e amar a Deus… No amor não existe medo. Mas o amor respeita, não confunde eu com tu, não fere a autoridade nem os direitos do outro. O cristão não precisa ter medo de Deus. O amor lança fora o medo. Da mesma forma, porém, ele lança fora o desrespeito.
Os vv. 17s têm em vista o medo em relação ao dia do juízo final, portanto, o medo diante de Deus. Mas nós dificilmente vamos errar, se afirmamos que o amor de Deus lança fora também o medo que temos diante de homens. Pois, se Deus nos ama, de quem deveríamos ter medo (cf. SI 27.1 etc.)? E o apóstolo Paulo diz: Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito. (Rm 8.28) O amor de Deus liberta do medo, e quem por sua vez ama a Deus, recebe aquela PARRËSIA, da qual fala o v. 17, não só no juízo final, mas também no juízo dos homens.
Toda dimensão da afirmação destes versículos se nos revela, quando nos conscientizamos de que normalmente o medo lança fora o amor. O nosso medo, medo do futuro, de doença, medo de perder status, padrão de vida, reputação etc., enfim, o medo da morte, é um dos maiores impedimentos e inimigos do amor. Por isto a pergunta é: Quem lança fora quem? Quem é mais forte: o amor ou o medo? O texto diz: o amor de Deus lança fora o medo.
Vv. 19-21. Exatamente por esta razão existe a possibilidade de nós amarmos. Nós amamos (indicativo!), porque ele nos amou primeiro (v. 19). Nosso amor é fraco demais para expulsar o medo. O amor de Deus, porém, é forte. Por isso mesmo podemos amar o próprio Deus e os irmãos.
Assim como no Evangelho de João, também aqui é falado no amor aos irmãos, não no amor ao próximo. Irmãos são os membros da comunidade. Deles se espera amor de uns para com os outros. Significa isto introversão comunitária? Não! Em 3.17, o irmão é praticamente idêntico ao necessitado. Quer dizer, o próximo aí se torna irmão e o irmão se torna próximo. O amor aos irmãos (membros da mesma comunidade, grupo, irmãos na fé) sem dúvida é importante. Nele fracassaram os hereges combatidos em 1 Jo. Eles se separaram da comunidade (2. 19), quebraram a comunhão. Mas, o amor aos irmãos não pode passar de largo pelos que têm necessidades e precisam do amor atuante. Amor ao irmão necessariamente será extensivo ao próximo.
Os vv. 20 e 21 enfatizam que o amor a Deus requer o amor ao irmão. É mentiroso quem alega amar a Deus, mas não ama a seu irmão. Amor deve ser aprovado na concreticidade, nas pessoas de carne e osso ao nosso lado. Naturalmente, de longe também se ama, como diz uma música do nosso folclore, mas, quem só amar de longe, ou seja a Deus, o irmão distante, uma ideia de povo, uma abstração do ser humano, põe a descoberto a sua incapacidade de amar. É relativamente fácil amar as coisas e as pessoas que não se vêem. Elas não incomodam, elas são conforme as imaginamos. O autor de 1 Jo agride aqui os sonhadores que fogem do amor concreto para um amor abstrato, que só conseguem amar a imagem de um Deus cômodo e, eventualmente, pessoas distantes, idealizadas, e por isso igualmente cômodas. Todo amor tem sua prova de fogo no relacionamento com o irmão, o próximo, esse ser imperfeito, problemático, diferente de mim e às vezes antipático. É o teste de autenticidade do nosso amor, inclusive do amor a Deus. Isso de modo algum significa que o amor ao próximo distante seja menos importante; assim como o amor a Deus não é menos importante que o amor ao irmão. Também não significa que amor cristão seja um assunto puramente particular de duas pessoas. Amor cristão é assunto pessoal e comunitário. E cabe-lhe procurar a eficiência. Ainda assim, a prova de fogo do amor acontece na convivência direta com os irmãos.
Ao Deus que é amor corresponde o mandamento que Jesus destacou como sendo o principal: o duplo mandamento do amor (cf. Mt 22.34ss). Que nós amemos a ele, Deus, e aos irmãos, é a vontade divina. Mas ela não é cumprida mediante esforço próprio do homem. Ninguém sabe amar, a não ser que, de qualquer forma, tenha experimentado amor. Por isso, o mandamento do amor não quer mobilizar as nossas próprias energias éticas, mas quer impelir-nos a buscar as forças para amar, naquele Deus que é amor para conosco.
IV – Pensamentos quanto à prédica
A prédica poderá seguir a estrutura do texto, seguindo a sequência das três unidades temáticas acima destacadas: (1.) A realidade do amor de Deus, respectivamente do Deus que é amor, no qual estamos e somos chamados a permanecer; (2.) a expulsão do medo pelo amor; e (3.) a possibilidade e o compromisso de também nós amarmos. Eis alguns pensamentos adicionais para cada uma dessas unidades:
1. A dificuldade de crer no Deus que é amor recebe impressionante ilustração por um episódio que teria acontecido na Espanha, séculos atrás. Um judeu, com esposa e filhos, assim se conta, viu-se forçado a fugir da fúria dos inquisidores cristãos, que somente deixavam a alternativa: conversão à fé cristã ou morte. Conseguiu um pequeno barco, com o qual em noite escura procurou alcançar uma pequena ilha deserta no Mar Mediterrâneo. Mas sobreveio uma tempestade. Um raio atingiu a esposa e a matou. Os filhos foram arremessados pelas ondas ao mar. Exausto e sozinho, o judeu alcançou a ilha, sem mais nada possuir. Levantou, então, os braços em oração a Deus, dizendo: Deus de Israel! Eu fugi para não ser impedido de servir-te e de cumprir os teus mandamentos. Mas tu fizeste tudo para destruir a minha fé. Por ventura, acreditas que me podes desviar do meu caminho? Deus dos meus pais! Não o conseguirás! Podes tirar de mim o que de mais caro tenho neste mundo. Podes golpear-me até a morte – eu continuarei crendo em ti. Eu vou te amar, todavia.
Provavelmente os ouvintes da nossa prédica (com inclusão do pregador) terão feito experiências semelhantes às daquele judeu: os golpes que sofremos e as crueldades que acontecem (lamentavelmente, também através de cristãos), ameaçam matar a fé e contradizer o Deus que é amor. Mas a fé é teimosa. Ela se agarra à promessa do Evangelho, e neste ponto o cristão tem vantagem: sua fé não se resume a pura teimosia. Ela contempla Jesus e o seu amor pelo mundo. Nele está o amor que convence e que venceu sofrimento, cruz e morte.
Desde a morte e ressurreição de Jesus, não mais existe pessoa que não fosse amada, pois ele a ama. Os desprezados pela sociedade, os que enfrentam a solidão da morte, os maltratados, os ignorantes, os pobres, os culpados, os marginalizados, ele os ama. Ele ama também a nós que sofremos sob não sei que problemas, sob complexos, angústias, medo. Deus é amor. Cremos isto? Todavia? Tal fé, sem dúvida, é risco. Mas sem este risco não existe vitória que vence o mundo (5.4) nem vida verdadeira.
Esta fé, aliás, não só motiva para o amor e nos dará forças para superar golpes, mas também nos abrirá os olhos para o amor que, a despeito de tudo, existe neste mundo e que é reflexo do amor de Deus: o amor da mãe, talvez, de amigos, de pessoas desconhecidas, da esposa, do marido etc. Seríamos ingratos, se não víssemos este amor, sem o qual o mundo já há tempo teria perecido. É bem verdade, o amor entre nós é deficiente, há aguda falta dele. Mas ele existe. Não é ele um sinal do Deus que é amor, luz nas trevas, raio de esperança? A fé saberá valorizar estes sinais, agradecer por eles e pedir que se tornem mais frequentes, mais fortes, renovadores e transformadores.
2. Vivemos numa época em que o medo está crescendo. Recessão econômica, esgotamento dos recursos naturais da Terra, poluição e até mesmo o fantasma de uma guerra nuclear amedrontam as pessoas, obscurecendo-lhes o futuro. Nas nossas comunidades e, particularmente, em cada pessoa ainda outras coisas provocam medo, como por exemplo: catástrofes ecológicas, adversidades climáticas que destroem as colheitas, repressão política, desemprego, envelhecer ou adoecer, fracasso individual etc. Será possível superar todo este medo, lançá-lo fora, desfazê-lo? Ou será inevitável que ele vá se acumulando e explodindo em terrível violência? Amor reduz o medo, acaba com ele. Se houvesse mais amor nas nossas comunidades, nos nossos lares, na sociedade e no mundo, podemos imaginar as, consequências? O texto desafia o nosso medo e conclama a uma vivência em que este medo não mais tem vez.
3. O terceiro passo da prédica poderia consistir em refletir sobre como seria uma tal vivência. Como se concretiza o amor? Talvez seja bom enfatizar mais uma vez que o nosso amor não é capaz de substituir o amor de Deus. Também não se pode dizer que amor a Deus e amor ao próximo sejam idênticos, como se no amor ao irmão já estivesse incluído o amor a Deus. Não! O nosso amor a Deus evidenciar-se-á no louvor, na gratidão e na obediência, cabíveis unicamente a Deus. E o amor de Deus (não o amor de homens) permanecerá sendo o nosso consolo e a nossa força na vida e na morte. Não há nada neste mundo que possa substituir o amor de Deus.
Não menos importante, porém, é que o amor a Deus, necessariamente, se faz acompanhar do amor aos irmãos. O presente texto, neste 1o Domingo após Trindade, tem como texto colateral Lc 16.19-31: a parábola do homem rico e de Lázaro. A justaposição destes dois textos naturalmente não é acaso. O homem rico não sabe que Deus é amor. É a ausência total de amor que perfaz a tragédia desta parábola. Nessa ausência reside a des-graça de Lázaro na primeira parte da parábola e a des-graça do homem rico na segunda. O que o homem rico deveria ter feito?
O que é preciso fazer hoje, em cumprimento ao mandamento do amor? Permanece verdade que o amor deve ser comprovado concretamente no relacionamento direto com as pessoas ao nosso redor (cf. 1 Co 13). Mas o amor não pode desprezar os recursos científicos e políticos, na procura por soluções para o irmão necessitado. Amor exige o engajamento sócio-político. Eis um desafio muito grande para os cristãos.
Uma meditação não pode formular a prédica, ela só pode fornecer subsídios. Cabe ao pregador verificar o que pode aproveitar dos mesmos.
V – Bibliografia
– BALZ, H. Die Katholischen Briefe. In: Das Neue Testament Deutsch. Vol. 10. Göttingen, 1973.
– BULTMANN, R. Die drei Johannesbriefe. In: Kritisch-exegetischer Kommentar über das Neue Testament. Vol. 15, Göttingen, 1967.
– DOERNE, M. Die Finsternis vergeht. Göttingen, 1963.
– HOLZE, H./RIESS,R. Meditação sobre l Jo 4.16b-21. In: Predigtstudien. Vol. 2/2. Stuttgart e Berlin, 1974.
– JÜNGEL, E. Gott als Geheimnis der Welt. Tübingen, 1977.
– MESTERS, C. A experiência de Deus nos patriarcas, nos sábios, nos profetas e no apóstolo João. In: Experimentar Deus Hoje. Petrópolis, 1974.
– TRAUB, H. Meditação sobre l Jo 4.16b-21. In: Herr, tue meine Lippen auf. Vol. 2. Wuppertal-Barmen. 1959.
– ZAHRNT, H. Gott kann nicht sterben. München, 1970.