1. A questão: não sabemos ao certo quem são e quantos são os membros da IECLB
Há, na IECLB, incertezas e contradições quanto ao entendimento de quem é membro da IECLB. Assim, diferentes comunidades aplicam critérios diferentes quando se trata de definir quem são seus membros. Algumas aplicam critérios rigorosos e, com eles, podem inclusive declarar pessoas como excluídas da comunidade, se estas não preencherem os requisitos estabelecidos pela Comunidade. O critério de discernimento freqüentemente é a fidelidade (ou não) na contribuição financeira para com a Comunidade. Ou, então, a participação ativa (ou não) na vida da Comunidade. Os graus de participação requerida também diferem entre diferentes comunidades. Não tem havido até o presente momento uma orientação da Direção da IECLB no tocante a esse assunto, orientação essa que naturalmente deve ser baseada em critérios bíblico-teológicos e em observância dos documentos normativos da IECLB.
Essa incerteza quanto aos critérios de definição quanto a quem é membros da IECLB têm grandes conseqüências na vida da Comunidade e, também, na compilação dos dados estatísticos da IECLB. Em não poucas comunidades ainda se faz a contagem por “família” ou, então, por membro contribuinte. Assim também se organizam muitas vezes os fichários das comunidades. Assim, a IECLB sequer sabe ao certo quantos membros tem. Além disso, muitas vezes a compilação dos dados estatísticos é efetuada sem o devido cuidado, pois se registram muitos casos de grande variação na membresia de um ano para outro, tanto para mais quanto para menos. Os últimos dados estatísticos disponíveis à IECLB, relativos a 2005, parecem indicar um certo descréscimo no número de membros. Esse dado é real? Não sabemos com certeza. E deveríamos saber melhor.
De outra parte, o censo do ano 2000 no país revelou que se declararam como de “confissão luterana” no país 1,062 milhões de pessoas, aproximadamente 100.000 a mais do que a soma da membresia oficial das igrejas (consideradas a IECLB, a IELB e as chamadas comunidades “livres” do sul do país). Esse dado revela haver um número significativo de pessoas que se consideram “luteranas”, embora não estejam arroladas como membros de comunidades das igrejas luteranas.
2. Quem é membro da IECLB?
Devemos examinar o que dizem as Escrituras, as Confissões e os documentos normativos da IECLB a respeito de quem é membro da IECLB?
Comecemos por nossos documentos normativos e vejamos depois se eles são condizentes com as Escrituras e com nossas Confissões.
A. Quem é membro da IECLB segundo seus documentos normativos.
O Regimento Interno da IECLB tem sua seção III (Arts. 10 a 18) dedicada aos membros. Fundamental é o Art. 10, que define claramente quem são os membros da IECLB:
“São membros da Comunidade as pessoas batizadas conforme a ordem de Jesus Cristo, reconhecidas as bases confessionais da IECLB.”
A partir dessa definição destacamos:
1)Fundamental é que as condições de membresia são apenas duas: o batismo de acordo com a ordem de Jesus Cristo, ou seja, com água e em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, e o reconhecimento das bases confessionais da IECLB. O estabelecimento de condições adicionais para membresia contraria os documentos normativos da IECLB.
2) A IECLB não tem um “cadastro central” de membros. Os membros da IECLB são a soma dos membros de cada uma de suas comunidades. Inversamente, a IECLB não tem membros que não estejam arrolados em uma de suas comunidades, embora seguramente haja Brasil afora pessoas que se entendam como sendo “da IECLB”, sem porém estarem arroladas como membros em qualquer comunidade e sem que possamos saber quem elas são. Trata-se de uma desafio à evangelização.
3) Em relação à Comunidade os documentos normativos da IECLB são igualmente claros: “A Comunidade congrega os membros da Igreja em torno de um centro comum de culto, pregação e celebração dos sacramentos.” (Const. Art. 8o, parágrafo único; cf. também RI Art. 2o) Ela “é a menor unidade orgânica e a base de trabalho da IECLB” (Const. Art. 8o; cf. também RI Art. 2o, inciso II).
4) A filiação como membro se dá via-de-regra, mas não necessariamente, na área de residência do membro abrangida geograficamente pela Comunidade. Contudo, particularmente nas cidades maiores e metrópoles a escolha da Comunidade de filiação como/pelo membro pode se dar por outros critérios ou razões (relacionamentos, mudança de local de residência, estilo de trabalho da Comunidade etc.). Os documentos normativos estabelecem um critério geográfico determinado apenas para os sínodos (Const. Art. 15 e RI Art. 28). Esses sim são claramente delimitados em sentido de extensão geográfica. Quanto ás comunidades há variações possíveis, embora todas elas estejam abrangidas por um sínodo.
5) Quanto ao batismo, essencial para quem é membro, o guia para vida comunitária intitulado “Nossa Fé – Nossa Vida” ainda esclarece que os membros o são em virtude do batismo administrado ou reconhecido pela IECLB. Ou seja, a IECLB, para além dos batismos por ela mesmo efetuados, em uma de suas comunidades, reconhece o batismo de outras igrejas, sempre que tiver sido ministrado com água e em nome do Trino Deus, recusando, por conseguinte, qualquer prática de rebatismo. Precisamente aí residiu o contencioso com o movimento carismático no debate interno recente na IECLB.
6) Pessoas oriundas de outras igrejas são, então, admitidas, conforme “Nossa Fé – Nossa Vida”, pelo reconhecimento de seu batismo e “mediante profissão de fé, após ter recebido a necessária instrução sobre a doutrina e vida comunitária da IECLB”. Fica desta forma resguardada também a segunda condição de membresia, o reconhecimento das bases confessionais, naturalmente assumidas numa profissão de fé pessoal.
7) O RI ainda estabelece que “a admissão de menores de quatorze (14) anos deverá ser requerida pelo responsável por sua educação” (Art. 13).Via-de-regra isso se dá conjuntamente com a solicitação do batismo para filhos e filhas. No batismo então efetuado, as pessoas responsáveis (pai, mãe, padrinho, madrinha, além da própria comunidade) assumem o compromisso da educação evangélica. Mas as pessoas batizadas, também crianças, passam a ser efetivamente “membros” da Comunidade.
8) Assim todos os membros admitidos à Comunidade por seu Presbitério (através do batismo ou mediante profissão de fé) devem nela ser inscritos como tal (RI Art. 15). Portanto, a Comunidade deve manter um cadastro de seus membros. A partir dos quatorze anos, idade em que em muitas comunidades ocorre a confirmação, os membros o são por vontade própria e deveriam ser arrolados como tais, inclusive para efeitos de contribuição financeira, mesmo que esta venha a ser mais de cunho simbólico pela não existência efetiva de rendimentos.
9) A Comunidade, junto com pais, mães, padrinhos e madrinhas, tem uma responsabilidade contínua de instrução na fé para com as pessoas que tenha batizado ou admitido na Igreja. Contudo, embora a Igreja deva se empenhar com afinco e seriedade pela educação cristã contínua, não se pode entender o conhecimento detalhado da fé cristã de confissão luterana como pré-condição para a membresia na IECLB, mas sim um conhecimento básico da fé, a ser complementado pela educação continuada que se estende por todas as etapas da vida.
10) Por isso, os documentos normativos falam de “reconhecimento das bases confessionais da IECLB”, ou seja, não poderia ser aceito como membro quem, conscientemente, rejeita as bases confessionais da IECLB; portanto, não as reconhecendo. Inversamente: não se estabelecem para a condição de membro na IECLB critérios quantitativos, como, por exemplo, um “profundo” conhecimento das Escrituras e da doutrina luterana, uma piedade particularmente “acentuada”, uma contribuição financeira “generosa” ou exigências semelhantes. Exigências desse tipo descambam fatalmente para legalismos e práticas de exclusão, ambos característicos antievangélicos.
3. Mas, e os membros “afastados”?
É uma realidade lamentável o fato de que grande número de membros da IECLB, uma significativa maioria até, encontra-se em boa medida à margem da vida comunitária na IECLB, participando apenas em ocasiões especiais (ofícios, Semana Santa, Páscoa, Natal). Em id dessa realidade, algumas comunidades têm efetuado uma “limpa de arquivos”, como se diz numa expressão muito infeliz. Por trás dessa postura estão as seguintes perguntas: a participação ativa na comunidade não deve ser entendida como condição de membresia? Ou, então: a recusa em contribuir financeiramente para a comunidade não acarretaria a exclusão do membro?
O artigo 16 do Regimento Interno da IECLB reza:
RI Art. 16: “Em obediência aos mandamentos de Deus e na confiança de sua promessa, os membros são chamados a:
I – participar do Culto na Comunidade e atender ao convite para a Santa Ceia;
II – conduzir a sua vida de acordo com a responsabilidade que têm os membros da Igreja de Jesus Cristo perante Deus, o seu próximo e a sociedade;
III – cuidar para que seus filhos sejam batizados, educados na fé cristã e confirmados;
IV – zelar para que os cônjuges recebam a bênção matrimonial;
V – zelar para que os mortos sejam sepultados segundo os preceitos eclesiásticos;
VI – contribuir financeiramente para a manutenção da Comunidade e dos demais órgãos e instâncias do Sínodo e da IECLB.”
Esse artigo tem sido interpretado equivocadamente como dando à Comunidade um catálogo de condições, pelas quais ela poderia julgar se alguém ainda é membro da IECLB ou não. No entanto, o artigo não estipula condições de membresia, o que contrariaria o artigo 10 acima mencionado, mas descreve o alvo da ação da Comunidade. Ou seja: a ação da Comunidade deveria objetivar a que os membros possam viver sua fé e sua membresia na forma descrita. Dito de outra forma, o artigo é uma descrição da responsabilidade da Comunidade em “chamar” seus membros, perseverantemente, à vivência comunitária da fé. Isto faz parte da responsabilidade evangelizadora e catequética da Comunidade.
Isso fica comprovado também se recorrermos à Constituição da IECLB. O seu Art. 11 reza:
Constituição Art. 11: “Em obediência ao Senhor da Igreja, a Comunidade tem as seguintes incumbências:
I – realizar a pura pregação da palavra de Deus e a reta administração dos sacramentos;
II – zelar para que o testemunho do Evangelho seja dado em conformidade com a confissão da IECLB, em doutrina, vida e ordem eclesiásticas;
III – dedicar-se à assistência espiritual e à ação diaconal;
IV – exercer trabalho evangelizador, catequético e missionário;
V – animar cada um de seus membros a servir ao próximo, no âmbito familiar, comunitário, profissional e público;
VI – assistir as novas gerações, em especial quanto ao ensino e à formação evangélico-luterana dos batizados;
VII – incentivar e promover a participação de todos os batizados na vida e ação comunitárias.”
(Os destaques foram aqui introduzidos para clareza da argumentação.)
Fica claro, pois, que promover a participação dos membros na vida da Comunidade deve ser uma das tarefas permanentes primordiais de cada Comunidade. Dito de forma clara: se temos muitos membros pouco ativos nas comunidades, isso constitui um chamamento permanente à responsabilidade evangelizadora e catequética da Comunidade, não a uma medida administrativa de exclusão. Tratando-se de atribuições da Comunidade, esta deve perguntar-se a si mesma quanto aos resultados e à eficácia dessa sua responsabilidade evangelizadora e catequética.
4. E se o membro deixar de contribuir financeiramente?
Uma das formas de participação do membro na vida da Comunidade (e, assim, da Igreja) é a contribuição financeira. É, pois, preocupante quando membros, que estão em condições de contribuir, não o façam. Mas também aí, o chamamento é em primeiro lugar à própria Comunidade, no sentido de perguntar-se pelas razões que levam pessoas a não contribuirem, quando podem fazê-lo, e de buscar alternativas de motivação à contribuição financeira como expressão da gratidão dos membros a Deus. No programa “Fé, Gratidão e Compromisso” a IECLB busca permanentemente motivar a contribuição dos membros, em termos de dedicação, dons e dádivas.
No entanto, os documentos normativos não dão sustentação à exclusão de membros por não contribuírem financeiramente. Eles são claros quanto às conseqüências para quem não contribui financeiramente: “É condição para o exercício do voto e de elegibilidade a regularidade de sua situação como contribuinte.” (RI Art. 14, parágrafo único) Ou seja: o membro não contribuinte perde o direito de votar e de ser eleito, mas não sua condição de membro.
5. Quando alguém deixa de ser membro da IECLB?
Abstraindo da hipótese óbvia de óbito, alguém deixa de ser membro da IECLB logicamente se não desejar mais sê-lo. Isso poderá ocorrer quando o membro pedir seu desligamento como membro da Comunidade em que estava inscrito. Também poderá ocorrer quando tiver se afiliado a outra igreja, portanto deixando de reconhecer as bases confessionais da IECLB.
A exclusão também poderá ocorrer por decisão do Presbitério da Comunidade (RI Art. 15), mas, naturalmente, observada a determinação normativa acerca dos critérios. O Presbitério não terá autonomia para colocar novas exigências, mas deve seguir o estabelecido nos documentos normativos da IECLB. Ou seja: a exclusão por iniciativa do Presbitério se dará, normalmente, por comprovado não-reconhecimento das bases confessionais da IECLB. Ressalva-se ainda que neste caso o membro a ser excluído deve ter tido “prévia oportunidade de ampla defesa e contraditório” (RI Art. 15, § 3o). Quem tenha sido excluído como membro ou não tenha sido admitido como tal tem ainda o direito de “recorrer sucessivamente às instâncias constituídas, sendo a última o Conselho Sinodal” (RI Art. 15, § 2o).
“Nossa Fé – Nossa Vida” estabelece ainda que membros poderão ser exortados, suspensos ou excluídos quando causarem escândalo, conflitos ou divisão no seio da Comunidade e forem recalcitrantes a todas as iniciativas de conciliação e correção. Observe-se, porém, que esse dispositivo, como caso extremo, está relacionado no contexto da “disciplina fraternal”, cujo objetivo é “restabelecer e manter a união”. Se, ainda assim, houver a “suspensão parcial ou total” da condição de membro, este poderá recorrer às instâncias diretivas da Igreja.
Em suma: a exclusão de membros da IECLB é uma medida restringida e regulamentada, aplicando-se apenas em casos extremos. Normalmente, prevalecem a responsabilidade da Comunidade em animar o membro à participação na vida comunitária e o recurso à disciplina fraternal para preservação da unidade. Observe-se, por exemplo, que em toda controvérsia havida recentemente com o Movimento Carismático, ainda que tenha havido um claro dissenso doutrinário com as bases confessionais da IECLB, ainda assim a IECLB não promoveu a exclusão de nenhum membro sequer. As saídas foram todas por decisão e iniciativa das próprias pessoas integrantes do Movimento Carismático.
B. Que diz a Escritura?
A posição descrita dos documentos normativos da IECLB tem sustentação bíblica e confessional? Vejamos primeiramente o aspecto bíblico.
Em Mateus 18.20 temos uma breve descrição do que é Comunidade: “Onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome” [isto é, no nome de Jesus], ali estou no meio deles.” Esta comunidade, reunida em torno de Jesus, é Igreja em sentido pleno. Como os evangelhos nos mostram, o chamado de Jesus ao discipulado é radical, acarretando às pessoas que aceitam o desafio de segui-lo muitas renúncias, sim, a dedicação de suas vidas. Mas o chamado de Jesus não se constitui numa imposição legalista; é sempre convite, sempre desafio. E como convite e desafio, sempre também arraigado no próprio amor de Jesus, através de quem temos salvação e bem-aventurança.
Quanto às condições de vida em comunidade, a Bíblia sabe ser bem realista: há, juntos, “joio e trigo”. A tentação dos discípulos era fazer a separação, mas Jesus adverte: ao se pretender arrancar o joio, pode-se tirar o trigo junto. Logo, joio e trigo deverão crescer juntos até a colheita. Aí, por ordem do próprio Senhor, será feita a separação. Não antes. (Mateus 13.24-29) Em Lucas 15 temos as parábolas, ainda mais incisivas, que mostram o comportamento misericordioso do próprio Deus. O pastor vai atrás da ovelha perdida (até mesmo deixando para trás as ovelhas que estavam em seu rebanho). A mulher que perde uma moeda procura-a, até encontrá-la. O pai aguarda o filho pródigo que saiu de casa, para dilapidar os bens herdados, e, quando este regressa, prepara-lhe uma festa para escândalo de seu irmão mais velho, que sempre permanecera fiel e responsável.
O apóstolo Paulo, igualmente, conhecia a precariedade da vida comunitária. Na Comunidade de Corinto, por exemplo, havia graves problemas: divisão entre grupos, alguns se sentindo superiores a outros; dissensos doutrinários, por exemplo no tocante à ressurreição que alguns negavam; conduta ética reprovável, como relações sexuais incestuosas; discriminação social entre livres e escravos quando da comunhão de mesa (Santa Ceia); atritos no tocante à piedade e ao culto, o entusiasmo e a vanglória ferindo a boa ordem e a comunhão fraternal. Ainda assim, Paulo chama seus membros, todos eles, de “santificados em Cristo Jesus, chamados para ser santos” (I Coríntios 1.2) e busca reconciliar seus membros, exortando-os, mas acolhendo-os e reconhecendo-os fraternalmente como parte do corpo de Cristo.
Assim também a Comunidade não pratica a exclusão, mas busca incansavelmente seus membros afastados e se regozija quando se reincorporam ativamente na vida da Comunidade.
C. Que dizem nossos escritos confessionais?
Na Confissão de Augsburgo, no artigo VII, a Igreja é descrita como “a congregação de todos os crentes, entre os quais é pregado puramente o evangelho e os santos sacramentos são administrados de acordo com o evangelho” (ou, na versão latina, “a congregação dos santos, na qual o evangelho é pregado de maneira pura e os sacramentos são administrados corretamente”). Fica claro, porém, que a santidade não é uma qualidade moral dos membros da Igreja; ao contrário, eles “são justificados gratuitamente, por causa de Cristo, mediante a fé, quando crêem que são recebidos na graça e que seus pecados são remitidos [anulados] por causa de Cristo, o qual, através de sua morte, faz satisfação pelos nossos pecados” (artigo IV). Por isso, o artigo VIII, voltando ao tema “Igreja”, reconhece que na Igreja, entre os santos e verdadeiramente crentes, há “nesta vida, muitos hipócritas e maus”, o que, porém, não invalida a eficácia dos sacramentos, ainda que administrados por maus.
Lutero expôs essa mesma concepção de forma ainda mais radical ao reconhecer que mesmo as pessoas que crêem não deixam de ser pecadoras, e por isso são “simultaneamente justas e pecadoras”. Ou então: são de fato pecadoras, mas na esperança e na graça de Deus passaram a ser justas. Ou, em relação à Igreja, Lutero pôde empregar a figura de um hospital: nela há muitos doentes, mas eles estão sendo eficazmente tratados pela palavra e pelos sacramentos. Um hospital contrariaria sua própria finalidade se excluísse de seu meio as pessoas enfermas, pretendo ficar apenas com as sãs. O juízo, pois, permanece sempre exclusivamente nas mãos de Deus. A Igreja pode exercer tão-somente uma disciplina provisória, visando à restauração e à preservação da unidade. Todo seu empenho consistirá, porém, em testemunhar o Evangelho, pelo qual Lutero reconheceu magistralmente o seguinte, no Catecismo Menor, na explicação ao terceiro artigo do Credo Apostólico:
“Creio que por minha própria razão ou força não posso crer em Jesus Cristo, meu Senhor, nem vir a ele. Mas o Espírito Santo me chamou pelo Evangelho, iluminou com seus dons, santificou e conservou na verdadeira fé. Assim como chama, congrega, ilumina e santifica toda a cristandade na terra, e em Jesus Cristo a conserva na fé verdadeira e única. Nesta cristandade perdoa a mim e a todos os crentes diária e abundantemente todos os pecados e, no dia derradeiro, me ressuscitará a mim e a todos os mortos e, em Cristo, me dará a mim e a todos os crentes a vida eterna. Isto é certissimamente verdade.”
Assim, a Igreja está sempre chamada a proclamar a boa nova do Evangelho, da justificação pela graça de Deus, e desta forma a constituir e fortalecer a Comunidade, conclamando e exortando seus membros a atuarem ativamente na comunidade e com fidelidade também em suas vidas pessoais e na sociedade. Desta forma abrangente, a IECLB acolhe como seus membros aquelas pessoas que são batizadas e reconhecem as bases confessionais da Igreja, sem impor outras condições que viriam a atribular as suas consciências e a criar duas categorias de pessoas cristãs, umas superiores e outras inferiores – o que seria uma negação do ser igreja e do próprio amor de Deus.
6. As estatísticas na IECLB
A cada ano a IECLB recebe (ou deveria receber) das Comunidades uma planilha com dados estatísticos. Toda organização – e a igreja não é exceção – precisa ter dados corretos acerca de sua realidade, para seu planejamento, estabelecimento de metas e programas. Assim, as estatísticas são um instrumento administrativo importante na vida da igreja. Por trás de tudo, também há uma pergunta elementar: quantos membros somos? E outra: estamos crescendo ou, talvez, decrescendo? Dados estatísticos são, portanto, um elemento importante do auto-conhecimento da Igreja e um instrumento valioso para a sua participação na missão de Deus.
Infelizmente, um exame ainda que superficial das planilhas estatísticas comprovam que muitas delas devem ter sido elaboradas às pressas, em todo caso sem o devido cuidado. Isso para não mencionar o regular número de comunidades que sequer enviam a planilha com os dados estatísticos. No tocante ao número de membros, podem se perceber muitos números obviamente arredondados, que permanecem os mesmos de ano a ano. Em muitos outros casos há, comparativamente com o ano anterior, um acentuado decréscimo ou, em alguns casos, um forte aumento no número de membros, levando à inevitável conclusão de que muitos números não são reais.
Estas orientações pastorais quanto a quem é membro da IECLB têm muitas implicações para o ser igreja e para a correta atuação pastoral, bem como para o desenvolvimento da vida comunitária. Mas elas também visam proporcionar critérios claros para a determinação de quem são os membros da Comunidade e, portanto, da IECLB, ainda que situações específicas podem suscitar dúvidas que poderiam ser esclarecidas de caso a caso (por exemplo, quando pessoas não são mais localizáveis). Casos de dúvidas não deveriam, porém, ser transformados em regra geral.
Em resumo, o critério fundamental é simples: são membros da Comunidade (e, através dela, da IECLB) todas as pessoas batizadas (portanto inclusive as crianças batizadas), reconhecidas as bases confessionais da IECLB. Espera-se, portanto, das Comunidades que façam e mantenham cuidadosamente atualizado um cadastro de seus membros, conforme as orientações aqui emanadas, sem excluir os afastados, as crianças, os “eméritos” ou outra categoria similar.
Porto Alegre, tempo de Páscoa de 2007.
Walter Altmann
Pastor Presidente
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Observação: As presentes orientações, aqui revisadas e levemente ampliadas, foram apresentadas ao Conselho da Igreja, em sua reunião de 30-31/03/2007, tendo este decidido:
1) receber a carta pastoral emitida pela Presidência acerca do ser membro da IECLB e recomendar seu estudo nas comunidades e nos sínodos;
2) determinar que as comunidades preencham criteriosamente a planilha anual de dados estatísticos, observando as orientações constantes na carta pastoral da Presidência;
3) solicitar aos sínodos que acompanhem atentamente o processo de confecção e envio das planilhas com dados estatísticos pelas comunidades de sua área de abrangência;
4) convidar a Secretaria Geral a receber encaminhamento de casos concretos e situações específicas que possam gerar dúvidas quanto a quem é membro.