Proclamar Libertação – Volume 42
Prédica: Romanos 1.1-7
Leituras: Isaías 1.1-7 e Lucas 2.1-7
Autoria: Geraldo Graf
Data Litúrgica: 4º Domingo de Advento (Noite de Natal)
Data da Pregação: 24/12/2017
1. Introdução
Neste ano, o 4º Domingo de Advento coincide com a Véspera de Natal. Em várias comunidades, o culto matutino não será realizado em virtude da programação natalina à noite. Sugerimos o texto de Romanos 1.1-7 onde, neste dia, o foco for a celebração do nascimento de Jesus.
2. Quanto ao texto: Eis que vos trago uma boa nova!
Tanto a introdução como a conclusão de Romanos não deixa dúvidas de que se trata de uma carta (epístola). Há dois mil anos, não se usavam envelopes. Por isso remetente e destinatário eram identificados no topo da carta, logo no início da mesma. Era o estilo da época. Além disso, era usual apresentar um escopo (uma síntese) do assunto a ser tratado. Hoje, os e-mails seguem este modelo: quem envia – para quem – assunto. No término da carta (Rm 16), aparecem, como de costume, as admoestações e as saudações finais.
Paulo usou esse modelo e desenvolveu a introdução em sete versículos, fazendo uma autoapresentação e comunicando, resumidamente, o motivo principal de sua carta, que seria o fio vermelho de toda a epístola.
Paulo escreveu essa carta aos cristãos em Roma. A comunidade era composta por cristãos provenientes dos mais diversos lugares e origens. A capital do Império Romano atraía pessoas de todas as partes, vindas voluntariamente ou forçadas (escravos reféns de guerras). Havia cristãos de origem judaica, de tradição religiosa greco-romana e de muitos outros credos e povos. A tradição religiosa original ainda estava muito arraigada nas pessoas. Essa diversidade provocava algumas tensões e conflitos na comunidade de Roma.
Através da carta, Paulo transmitiu uma doutrina ampla, fundamental e sistemática da fé cristã e procurou promover a união dos cristãos romanos sob o senhorio do único e verdadeiro Salvador: Jesus Cristo. Paulo se intitulou “servo” (doulos = escravo). Diferentemente dos escravos em Roma, que não tinham liberdade, Paulo se declarou servo de Jesus Cristo. Verdadeiros servos de Jesus Cristo são aqueles que se submetem voluntariamente e servem por amor. A liberdade em Cristo (Gl 5.1) nos motiva a servir o Senhor no próximo em obediência e fé.
Paulo também se declarou “apóstolo”, mensageiro de Deus. No Novo Testamento, é anunciado que o Espírito Santo concede dons espirituais. Um deles é o dom de ser apóstolo (1Co 12.28s). Paulo foi chamado e enviado para dizer às pessoas como elas poderiam se tornar cristãs, para anunciar o Evangelho de Deus. Paulo não pregou a si mesmo, mas atendeu ao mandato que vem do alto. Ele não escreveu somente para os romanos, mas sua mensagem vale para os cristãos de todos os tempos e lugares. Também para todos e todas que se reúnem nesta Véspera de Natal, em 2017.
Dois aspectos são ressaltados por Paulo acerca do Evangelho: a) Ele já fora profetizado anteriormente (Antigo Testamento); b) É o Evangelho que anuncia Jesus Cristo, o Filho de Deus, nascido da descendência de Davi. Tudo isso é comprovado pela ressurreição de Jesus, que dá credibilidade à mensagem da Salvação. Paulo também apontou para a obediência e a fé (obediência para crer e obediência através da fé). Obediência significa dar ouvidos à palavra de Deus, aceitar e crer, viver ativamente, segundo ela.
3. Quanto ao conteúdo: Jesus é Senhor!
Todo o conteúdo da Carta aos Romanos gira em torno do Evangelho de Jesus Cristo, o Filho de Deus. Ele é apresentado na introdução e é o fio vermelho de toda a carta. Sobre a importância desse Evangelho, Martim Lutero escreveu na sua Introdução à Carta aos Romanos: Sem dúvida, esta Epístola é a parte principal do Novo Testamento e o Evangelho mais genuíno. Vale a pena e merece não só ser decorada pelos cristãos, palavra por palavra, mas que os mesmos também se alimentem dela como pão diário da alma. Ela jamais será totalmente esgotada na leitura e na contemplação. Quanto mais consultada e estudada tanto mais preciosa e saborosa será.
Assim escreveu Paulo: Aos cristãos em Roma, vocês são amados por Deus. Vocês são santificados. Eu desejo que na vida diária vocês experimentem a paz do Pai celestial. Eu lhes anuncio o Evangelho de Jesus Cristo, o único e verdadeiro Senhor. Desde que ele ressuscitou dos mortos, ele tem a soberania sobre todas as coisas.
Para ampliar o raio de sua influência, governantes enviam emissários aos povos. Semelhantemente, Paulo foi um enviado pessoal do rei Jesus. E foi ousado no seu testemunho. Roma era a capital do império. Lá era governante o homem mais poderoso da época, o Imperador. Entre seus títulos constavam: “filho dos deuses” e “senhor” (Kyrios). Seu nascimento fora anunciado como “boa-nova” (evangelho). Na sua pessoa, ele concentrou todo o poder do império e exigia submissão e fidelidade de todos os governados.
Contrariando tudo isso, o apóstolo enviou uma carta aos cristãos que viviam na capital desse imperador, e já na introdução da mesma, ele acentuou que Jesus é o verdadeiro e único Senhor. Paulo lembra que Jesus, o Filho de Deus, é humanamente um descendente de Davi, portanto pertencente a uma casa real, que já existia há mil anos, muito antes da fundação de Roma. Muito mais do que a genealogia real de Jesus, decisiva é a constatação de sua ressurreição dentre os mortos, que mostra um poder acima do poder de todos os tiranos e ditadores. Esses têm o poder de tirar a vida, mas não de criar nova vida.
Fazendo a ligação com o Antigo Testamento, Paulo lembra que há muito tempo os profetas já haviam anunciado que Deus enviaria um Messias para libertar seu povo e que ele reinaria com justiça. Durante muitos anos, o povo alimentou essa esperança de que um dia Deus enviaria alguém para eliminar a violência e a injustiça e para estabelecer um reino de paz. Paulo afirma: Esta promessa já se cumpriu! Deus é fiel e cumpre suas promessas. O Messias prometido já veio. É Jesus, nosso Senhor, o ressuscitado. Ele me enviou para anunciá-lo a todas as pessoas e reunir aqueles que lhe dão ouvido e nele creem. Essa é a mensagem do Evangelho, essa é a Boa-Nova. Ela aponta para o Salvador e para as transformações que acontecerão no mundo. O Evangelho revela que, com sua vinda, o Filho de Deus se tornou gente, viveu e morreu pela humanidade. A morte pareceu um sinal de fraqueza e de derrota. Porém, na ressurreição de Jesus, Deus revelou que, de fato, ele é seu Filho amado e Senhor. E ele enviou o Espírito Santo para incluir as pessoas nessa nova vida em união com Cristo.
O verdadeiro Senhor (Kyrios) do mundo não é o imperador romano ou qualquer outro governante ou poder econômico. Senhor é este totalmente outro, que exerce o poder de forma totalmente diferente. Seu poder se manifesta no fato dele conquistar e transformar os corações das pessoas, superando pecado, morte e mal.
Este é o Evangelho que Paulo anuncia na Carta aos Romanos: o poder da vida, da solidariedade e da liberdade a partir da ressurreição de Cristo. Esse poder está agindo e nada nem ninguém pode impedi-lo. Os cristãos são aqueles que se deixam cativar e conduzir por esse Senhor e se colocam a seu serviço no mundo. Compreende-se o signifi cado do Natal a partir da ressurreição de Jesus. O convite está lançado!
4. Quanto à mensagem: Natal é Deus conosco
Véspera de Natal: muitas luzes, enfeites, presentes, chocolates, ceia, família reunida. Qual é o significado de tudo isso? A resposta nós iremos saber somente quando as lanternas estiverem novamente guardadas, chocolates e biscoitos consumidos, presentes desembrulhados, visitantes tiverem ido embora. O que sobrar, esse será o significado que nós damos ao Natal. O apóstolo Paulo nos envia uma carta e nos anuncia o verdadeiro e único Evangelho: Deus vem a nós por meio de seu Filho Jesus Cristo. É essa mensagem que quer nos acompanhar depois das festividades do Natal e fazer morada em nossa vida.
O texto de Romanos 1.1-7 não nos conta a história clássica do Natal com presépio, menino Jesus, José e Maria, pastores, magos e anjos. Porém, em sua mensagem, ele é o mais genuíno Evangelho, que nos fala da vinda de Jesus Cristo, do menino que nasceu na manjedoura de Belém, descendente da casa de Davi, que foi crucificado e que ressuscitou na manhã da Páscoa. De acordo com o apóstolo Paulo, Natal se explica e se compreende a partir da Páscoa, a partir da ressurreição. Paulo não conta uma história de Natal, como estamos acostumados, mas testemunha aquilo que o Natal quer desencadear em nossa vida. O seu testemunho é este: Deus veio a nós na criança de Belém. Deus veio a nós no crucificado. Deus está conosco no ressuscitado. É Natal! Em Cristo, Deus está conosco. Essa é a mensagem que Paulo anunciou aos cristãos da comunidade em Roma. Essa é a mensagem que ele anuncia a cada pessoa reunida na Véspera do Natal, para que, além dos presentes e das festividades, permaneçam a aceitação do genuíno Evangelho, a acolhida da graça de Deus, a obediência em fé à sua Palavra, a confi ança na sua presença e no seu cuidado, a disposição para servir, anunciar e vivenciar esse Evangelho.
Esta é a Boa-Nova: Deus vem a nós através do Filho, na criança deitada na manjedoura, na prática do amor através de Jesus, entre os mais sofridos e desamparados, no sacrifício da cruz e na vitoriosa manhã da Páscoa. Quem ouve Jesus, ouve o Pai (Jo 12.44-45). E não existe poder deste mundo que consiga “fazer sombra” ao senhorio de Jesus Cristo. Esse é o legítimo Evangelho do Natal!
Qual é a nossa missão? Paulo escreve sua carta para despertar em nós a confiança, a fé em Deus. Por isso sua carta é Evangelho para ser lido e proclamado no Natal. Para crermos! Se confi armos em Deus, na sua presença em nossa vida através de Cristo, então seremos verdadeiramente livres. Livres para servir!
Essa obediência na fé e pela fé nos permite seguir os passos da criança de Belém, do homem de Nazaré. Quem se coloca a serviço de Jesus Cristo não se conforma em deixar tudo como está, não se conforma com a violência e o terror que grassam no mundo; quem carrega a criança de Belém no coração luta contra toda forma de fome e indiferença social; quem vive unido com Cristo responsabilizase pelos desalojados, despatriados e refugiados; quem confia na presença de Deus através do ressuscitado deixa de pensar somente em si e abre o coração para as pessoas que estão à sua volta.
Foi exatamente isso que Deus fez conosco. Ele veio a nós, pecadores, através do Filho e nos resgatou, dando-nos graça e apostolado por amor do seu nome (v. 5). O Evangelho do Natal nos envia a anunciar e vivenciar essa Boa-Nova. Natal é o Evangelho que nos anuncia: Deus está conosco!
5. Conclusão
“Eu, (…), filho/a de Deus, pastor/a (ministro/a) de vocês, me alegro em poder falar a vocês da grande alegria que Deus nos prometeu desde os tempos antigos, para vocês e para mim, para nossos pais e para nossos antepassados. Eu me alegro em poder falar a vocês de Jesus Cristo, nosso Salvador, que nasceu para ser luz no meio de nossa escuridão. No ar que respiramos, Deus está presente! Em cada momento. E me causa grande alegria poder anunciar esse Evangelho a vocês, meus irmãos e minhas irmãs, vocês que são os amados de Deus, chamados para serem santos aqui em (…). Graça seja a vocês e paz de Deus, nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo. Amém.
Sugestão: Na Véspera de Natal, muitas comunidades fazem uma programação com teatro de Natal. Onde isso acontece, a mensagem costuma ser mais breve. Sugestão é pedir que alguém adentre o recinto trazendo uma carta de Paulo, o texto bíblico (pode ser em forma de pergaminho). Esse pode ser lido por uma liderança da comunidade. A mensagem (pregação) pode ser feita em diálogo com a comunidade.
Bibliografia
JANSSEN, Martina. Predigt zu Römer 1:1-7. Disponível em: . Göttinger Predigten im Internet, 2009.
LOHSE, Eduard. Das Präskript des Römerbriefes als theologisches Programm.
In: TROWITZCH, M. (Hrgb.). Paulus, Apostel Jesu Christi. Tübingen: FSG Klein, 1998. p. 65-78.
LUTHER, Martin. Die Epistel St. Pauli an die Römer. In: Luthers Epistel-Auslegung. Stuttgart: Verlag der Evangelischen Bücherstiftung, 1866. p. 69-73.
Proclamar libertação é uma coleção que existe desde 1976 como fruto do testemunho e da colaboração ecumênica. Cada volume traz estudos e reflexões sobre passagens bíblicas. O trabalho exegético, a meditação e os subsídios litúrgicos são auxílios para a preparação do culto, de estudos bíblicos e de outras celebrações. Publicado pela Editora Sinodal, com apoio da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB).