Proclamar Libertação – Volume 35
Prédica: Romanos 13.11-14
Leituras: Isaías 2.1-5 e Mateus 24.36-44
Autor: Odair Braun
Data Litúrgica: 1º Domingo do Advento
Data da Pregação: 28/11/2010
1. Introdução
A noite está findando, fulgente o dia vem. Erguei a voz, louvando a estrela de Belém, compôs Jochen Klepper – Hinos do Povo de Deus I, nº 3. Estamos no início do Advento, um período entendido como tempo especial de reflexão e preparação. Um tempo que se mostra como oportunidade de colocar a vida à luz da palavra de Deus. Por isso cantamos na continuidade do hino: No escuro, em agonia, quem teve de chorar, verá com alegria: a luz lhe há de brilhar. Advento é um tempo para nos aninharmos diante de Deus, permitindo que ele fale conosco. As leituras indicadas para esse domingo conduzem para essa atitude.
O profeta Isaías e seu povo viviam numa época de violência e guerra. Sua terra era ameaçada. Morte, assassinato e emboscadas eram parte integrante do dia-a-dia dos caminhos de Israel. Observando atentamente os cinco primeiros capítulos de Isaías, vemos a descrição de parte dessa violência e anúncio do juízo. Essa observação principalmente mostrará que, em meio a tal descrição, encontramos o texto de Isaías 2.1-5, em que o profeta recebe por meio de uma visão a vontade e a determinação de Deus. Por isso Isaías 2.1-5 expõe palavras de encorajamento e motivação para uma realidade de violência e de dificuldades. Nas palavras de Klepper: Deus faz a luz brilhar.
Em Mateus 24.36-44 estão reunidas palavras de Jesus sobre o fim dos tempos, as tribulações, o juízo final, os critérios que conduzirão à vida ou à morte e a necessidade de estarmos preparados. No seu ensino, Jesus não deixa dúvidas de que a história da humanidade está nas mãos de Deus. Por isso ordena: vigiai, porque não sabeis em que dia vem o vosso Senhor.
Já em Romanos 13.11-14 (não se deveria deixar de usar os versículos anteriores, ou seja, Rm 13.8-10), podemos observar um comovente chamado de Paulo para pôr os pés no chão e decidir-se a viver sob a luz de Deus. Essa é uma decisão que precisa ser tomada por cada qual em algum momento de sua caminhada. Em Romanos 13.8-10, vemos um forte chamado para o amor. Essa atitude afasta do mal e coloca perto de Deus. Advento é o tempo em que somos lembrados de modo incisivo dessa realidade. Advento é, portanto, o tempo de preparação, ou, nas palavras do hino de Klepper: Embora habite em treva, Deus faz a luz brilhar. No juízo, a alma eleva em vez de a aniquilar.
2. Exegese
A passagem de Romanos 13.11-14 pode ser descrita de modo simples: A escuridão é causada pelo pecado. A solução vem com a alvorada, com o amanhecer, ou seja, quando nos colocamos sob a luz de Deus. Assim sendo, é uma passagem que incentiva e admoesta para viver na luz de Deus.
A passagem em estudo encontra-se num contexto de chamado (Rm 13.8-10) para o amor ao próximo, como forma de cumprir a lei de Deus. Para tal, o
apóstolo Paulo aponta para uma ética pessoal, convocando a cristandade a uma prática de engajamento e pleno compromisso. O contexto do capítulo 13 de Romanos sinaliza para o compromisso da cristandade frente ao mundo. Nesse compromisso devem prevalecer o amor, a doação e a solidariedade. Assim sendo, os versículos 13 e 14 chamam especial atenção para o tempo de despertar e pôr-se em ação. Também é oportuno observar que, na passagem em questão, Paulo não se demonstra preocupado com previsões apocalípticas, tal como podemos muitas vezes observar ser pregado e anunciado em alguns ambientes.
A realidade com a qual o cristão se defronta é clara:
Noite X Dia
Sono X Vigília
Obra das trevas X Revestidos da luz
Orgias e dissimulações X Andar dignamente.
Nesse confronto se desenvolve a ideia central do texto, chamando-nos para despertar. No caso, a necessidade de despertar simboliza o descaso e a alienação frente à realidade que nos envolve. O convite para andar dignamente é o chamado para ter postura de vida transparente e sem nada que precise ser ocultado. Nesse confronto, revestir-se de Jesus Cristo é a chave para a resistência frente ao pecado.
Podemos afirmar que, na passagem em análise, Paulo define os cristãos como pessoas que devem conhecer a realidade na qual estão inseridos, ou seja,
devem conhecer o tempo. Ao conhecer a realidade, também se faz necessário dar sinal concreto frente ao contexto visto. Assim sendo, essa passagem aponta para o encontro de Deus conosco e com o mundo. Nesse encontro, decide-se a continuidade, para o qual devemos ter posição clara e imperativa.
Romanos 13.11-14 visa, portanto, incentivar para que julguemos nossa situação e nossa atuação frente ao mundo à luz da chegada de Cristo. Ou seja, Paulo
convida para analisar a maneira pela qual estamos vivendo e definindo as prioridades. Essa passagem pressupõe que cada cristão saiba dizer NÃO às coisas e aos comportamentos que se contrapõem aos ensinamentos de Deus. Por isso Paulo fala da necessidade de lutar com as armas da luz. Nesse sentido, a passagem do evangelho ensina que não sabemos o momento escolhido por Deus para intervir e transformar radicalmente a realidade que nos envolve. Assim sendo, fica o convite para estar permanentemente vigilante (Mt 34.36-44). Estar vigilante permitirá a transformação preconizada pelo profeta Isaías, que nos enche os olhos com sua descrição em Isaías 2.1-5, ou seja, de que as armas de guerra serão transformadas em instrumentos de trabalho. Sejamos vigilantes para que possamos concretizar aquilo que o profeta Isaías afirma, ou seja, “vamos caminhar na luz que o Senhor nos dá” (Is 2.5).
3. Meditação
No hino de Klepper (HPD I – Hino 3) cantamos: Ainda há de tocar-vos da noite a escuridão. Mas tendes a guiar-vos a estrela do perdão. Por ela iluminados, as trevas enfrentais, seguindo, confiados, o brilho que avistais. Aqui se encontra, em nosso ponto de vista, o resumo das passagens desse domingo. Um novo Ano da Igreja começa. Esse começo é marcado pela celebração do Advento, sinal de confiança e esperança, apesar de muitas serem as dificuldades que se colocam diante de nós.
O profeta Isaías acreditava e pregava com vigor e extrema confiança. Mesmo em meio às dificuldades, ele pregava que todos precisavam crer e confiar em Deus. Nesse sentido, a passagem de Romanos 13.11-14 fala do amanhecer que se aproxima, indicando a renovação que vem com a luz da manhã de um novo dia. Assim sendo, Advento não é mera lembrança, mas Advento pode ser alegre esperança de ampla transformação. Advento deve ser alegre esperança, pois a promessa de Deus é acabar com a escuridão, com o sofrimento, com a violência e a guerra, assim como anunciado pelo profeta Isaías.
A passagem do evangelho desse domingo aponta para o fato de que, ainda hoje, muitos vivem de modo autossuficiente, ou seja, fazendo de conta de que de Deus não precisam, não lhe concedendo lugar, voz e vez no transcorrer da caminhada. A passagem alerta para – e Advento é tempo oportuno para tal – ficarmos alertas para não ser surpreendidos. Consequentemente, a comunidade cristã precisa estar atenta e vigilante. Parece-nos que aqui cada qual, em seu contexto, poderia apontar fatos que exemplificam a falta de vigilância da parte dos cristãos. Igualmente interessante é, na continuidade, poder junto com a comunidade olhar para sinais da luz de Deus manifestando-se em seu dia-a-dia, visando tirar desafios concretos para a ação comunitária.
Nesse sentido, ousamos indicar um exemplo. Em Curitiba, há um programa mantido pela Secretaria Municipal de Abastecimento, chamado Câmbio Ver- de. Em resumo, visa trocar lixo reciclável por hortifrutigranjeiros. No mês de março de 2010, esse programa recolheu 354 mil quilos de lixo reciclável. Cada
4 quilos de lixo reciclado é trocado por 1 quilo de hortifrutigranjeiros, que são adquiridos diretamente dos produtores, fazendo com que recebam um valor mais justo. A iniciativa é simples. Contudo, o resultado final é significativo:
a) Melhora o valor recebido pelos produtores dos hortifrutigranjeiros;
b) Melhora a condição alimentar dos que fazem uso desse programa;
c) Retira dos lixões, das ruas e dos rios grande quantidade de lixo, melhorando a qualidade de vida de todos e aliviando o meio ambiente;
d) Trata-se de uma forma de incentivar a cidadania.
Esse é um exemplo simples. Mas demonstra claramente como sinais de esperança são produzidos em nosso meio. Advento é também um tempo especial de perceber a realidade em que nos encontramos, visando buscar e adotar medidas simples que geram impacto transformador. Ou seja, Advento é também um tempo para despertar para uma vida responsável.
4. Imagens para a prédica
A pregação desse domingo poderia ser desenvolvida em torno de dois pontos centrais:
a) Deus vem ao nosso meio: o que fazer diante dessa realidade?
b) Revestir-se de Jesus Cristo! O que isso significa?
A pregação poderia focar que, no primeiro Domingo de Advento, acendemos uma das velas da Coroa de Advento. Essa vela demonstra que a luz de Deus
veio, vem e continuará vindo. Essa primeira vela acessa demonstra que a noite, que as trevas e a escuridão terão fim, porque Deus está a caminho.
Uma vela brilha. Ainda há bastante escuridão. E por isso as passagens desse domingo convidam: Acordemos! Despertemos! Sejamos vigilantes! Deixemos
as trevas de lado. Coloquemo-nos inteiramente sob a luz de Deus.
A realidade de violência, morte e medo chegará ao fim quando todos os povos e nações atenderem ao convite, ao chamado de Deus, o qual Isaías expõe no
versículo 5: “Venham, descendentes de Jacó, vamos caminhar na luz que o Deus eterno nos dá”. E por que, afinal, caminhar na luz que o Deus Eterno nos dá? Para ser o sal da humanidade – aquilo que dá gosto e sabor ao mundo. Visando concretizar essa realidade, Paulo, na passagem de Romanos 13.11-14, conclama para que estejamos despertos afim de ser vigilantes, conforme advertido por Jesus.
Em Jesus Cristo a visão revelada por Deus ao profeta Isaías se torna realidade. A visão exposta por Isaías queria mostrar que Deus tem capacidade e o desejo de transformar povos e nações. Este desejo se torna real na atuação libertadora de Jesus. Assim como Isaías, também Jesus viveu em meio a muita violência.
Mas ele não se deixou contagiar pela mesma. Ele atuou no sentido de eliminar a violência. Ele atuou concretamente para integrar pessoas excluídas, ou seja, cegos, surdos, mudos, prostitutas, ladrões, na sociedade, ou seja, queria transformar uma realidade de guerra e morte em vida plena e abundante. Afirmamos acima que a passagem de Romanos se encontra inserida num contexto de convite para o exercício do amor ao próximo, exercício esse que visa alcançar as pessoas menos favorecidas, assim como aquelas que vagueiam em busca de sentido e orientação.
Isaías 2.3 diz: “Vamos ao Templo do Deus de Israel. Ele nos ensina”. Jesus nos convida: “Fiquem vigilantes, pois o Filho do homem chegará” (v. 44). E
Paulo adverte: “Está na hora de acordarem, pois o momento de sermos salvos está mais perto agora do que quando começamos a crer” (v. 11). Portar-se dessa maneira concretizará aquilo que Isaías 2.4 revela: a guerra é eliminada. As armas da guerra serão transformadas em instrumentos de paz e de produção de alimentos. Ao invés de serem usadas para a destruição, serão usadas para fomentar a vida.
Isso é Advento.
Há 2.700 anos, o profeta Isaías colocou uma seta indicativa de um novo caminho a ser trilhado pelo povo de Deus. Essa seta continua valendo para nós hoje.
Jesus convocou-nos para constantemente estar alertas, despertos e vigilantes, afim de não ser pegos de surpresa. Paulo admoesta para colocar-nos a serviço de Deus. Deixemo-nos iluminar pelas palavras do profeta e pelos ensinamentos de Jesus Cristo, para que concretamente estejamos acendendo pequenas luzes que, com o passar do tempo, irão brilhar muito, lançando luz sobre as trevas que hoje se colocam sobre nós. Se assim for, podemos altivamente cantar com Klepper: A noite está findando, fulgente o dia vem. Erguei a voz, louvando a estrela de Belém.
5. Subsídios litúrgicos
Saudação: Zacarias 9.9 ou Salmo 37.5-6
Hino: Caso possível, o grupo de canto ou coral, ou mesmo um cantor individual, poderiam preparar o Hino do HPD I – Hino 03.
Kyrie:
a) Pedimos por aqueles que enfrentam dificuldades com a depressão, com a falta de perspectiva, com a falta de trabalho;
b) Pedimos por aqueles que não conseguem perceber em sua vida a luz de Deus;
c) Pedimos por todos aqueles que sofrem por causa de enfermidades, por luto e por vícios;
d) Pedimos pelas situações de injustiça que, em muitos lugares e situações, ainda são muito fortes e presentes.
Oração:
Deus amado! Vem para o nosso dia-a-dia. Vem para o meio do nosso sofrimento e falta de perspectiva, que, muitas vezes, é forte a nossa volta. Vem para o
meio da realidade de escuridão que, às vezes, se abate sobre nós. Vem e ascende em nosso meio sinais de luz. Vem e toma morada em nosso coração, em nossa vida e em nossas comunidades. Amém.
Bênção:
Abençoe-te o Deus criador e doador da vida. Abençoe-te o Filho, Jesus Cristo, que por meio de sua morte nos perdoa e renova. Abençoe-te o Espírito
Santo, que te conforta e sustenta na caminhada. Assim te abençoe o Trino Deus.
Amém.
Bibliografia
KUSS, Otto. Carta a Los Romanos. Barcelona: Editora Herder, 1976.
Proclamar libertação é uma coleção que existe desde 1976 como fruto do testemunho e da colaboração ecumênica. Cada volume traz estudos e reflexões sobre passagens bíblicas. O trabalho exegético, a meditação e os subsídios litúrgicos são auxílios para a preparação do culto, de estudos bíblicos e de outras celebrações. Publicado pela Editora Sinodal, com apoio da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB).