Semear esperança pela solidariedade
Pastor Silvio Schneider, secretário executivo da Fundação Luterana de Diaconia*
Arnaldo Jabor, em recente crônica intitulada O Brasil e o mundo podem fazer mal à sua saúde desabafa:
Minha profissão é ver o mal do mundo… Repugna-me ver sorrisos luminosos de celebridades bregas, passo de ganso de manequim, mulher pensando feito homem, caçando namorados semanais, horroriza-me sermos um bando de patetas de consumo, como crianças brincando num shopping, enquanto os homens-bomba explodem no Oriente e Ocidente… não agüento mais cadáveres na Faixa de Gaza e em Ramos, ônibus em fogo no Jacarezinho e trens sangrando em Madri…
…não agüento mais… chuvas em São Paulo e desabamentos no Rio, gente afogada na 9 de Julho, enquanto a Igreja Universal constrói templos de mármore com dinheiro dos pobres e destrói a religião negra da Bahia, enquanto formigueiros de fiéis bárbaros do Islã rezam com os rabos para cima, não agüento mais ver xiitas sangrando, dançando e batendo na cabeça no tão esperado século 21, enquanto Bush reza na Casa Branca e o Dick Cheney, sujo de petróleo, fala em democracia no Iraque… não agüento mais ver que a pior violência é o acostumamento com a violência, pois o mal se banaliza e o bem vira um luxo burguês…
… não agüento… cariocas de porre falando de política, festas de celebridades com cascata de camarão, evangélicos intocados pela lei, novas forças-tarefa, Lula com outro boné, políticos se defendendo de roubalheira falando em honra ilibada, conselhos de notáveis para estudar problemas sem solução, dá-me repulsa e lágrimas ver mulheres-bomba tirando foto com os filhinhos antes de explodir e subir aos céus dos imbecis, odeio Sharon e Arafat, a cara de sábia estupidez dos aiatolás, o efeito estufa, o derretimento das calotas polares, casamento gay, pedofilia perdoada na igreja, Chávez e seus referendos, Maluf negando, Pitta negando, o Sombra negando, …enquanto juízes corruptos reclamam do controle do Judiciário e o papa rezando contra a violência sem querer morrer jamais…
…não agüento mais… cúpulas do G7, lamentando a miséria para nada, e tenho medo que o Kerry, que tem uma cara duvidosa de ponto de interrogação, com aquele queixo de caju, perca a eleição, entregando o mundo à gangue do Mal… E tenho medo, acima de tudo, de que as pessoas não agüentem mais a democracia e joguem o País de vez no buraco…
Haja esperança!!!
Qual, afinal, é a razão de nossa esperança? Que significado ou peso tem, por exemplo, as palavras do apóstolo Paulo em Romanos 12.2a: E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente? Rm 12.2a
Que visão de mundo, que percepção de sociedade e que propostas de ação temos nós para contrapor no sentido de fazer uma diferença para melhor na vida de pessoas e comunidades neste mundo criado e amado por Deus?
O próprio Jesus nos dá um importante indicativo: Quem quiser ser importante, que sirva os outros, e quem quiser ser o primeiro, que seja o escravo de todos. Porque também o Filho de Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida para salvar muita gente.(Marcos 10, 44s). O sentido pleno do serviço, da diaconia de Jesus se expressa sobretudo em seu sofrimento e morte vicários pela humanidade. (Filipenses 2.5-11).
A diaconia de Jesus está construída sobre a ressignificação do conceito servir à mesa. Ressignificação, porque esta expressão possuía, no mundo que Jesus conheceu, um sentido negativo. Tendo a sua origem na língua e cultura gregas, o termo diaconia estava relacionado com o universo das pessoas não-cidadãs, não-livres, não-dignas, do mundo da periferia (escravos, escravas, servos e servas, mulheres e até crianças). Por isso, o cidadão grego jamais poderia assumir o papel de um servo e realizar um serviço em favor de alguém. Isto feriria sua dignidade e sua liberdade. Dizia: como posso ser feliz, servindo alguém?
Do universo das pessoas indignas (por causa da servidão), Jesus colhe essa palavra e a adota para com ela expressar o sentido de sua missão, como o enviado de Deus a este mundo. Jesus diz: Qual é maior: quem está à mesa, ou quem serve (à mesa)? Porventura não é quem está à mesa (se deixando servir)? Pois, no meio de vós, eu sou como quem serve (à mesa) (Lucas 22.27).
Colocando-se no lugar das pessoas excluídas da cidadania, da liberdade, da dignidade e da felicidade, Jesus mostra para que ele veio. Naturalmente, ele não veio para ser mais uma pessoa não-cidadã, não-livre e infeliz.
Jesus veio para revelar a solidariedade de Deus para com essas pessoas e mudar sua realidade. Por isso, a Diaconia que se quer fundamentar em Jesus, aprende desse serviço de Jesus. Representa para a Igreja o esforço de construir mesas:
a) mesas, como espaços abertos, para os quais as pessoas são convidadas sem prévia seleção; ou mesas que superam a barreira da velha lista dos iguais;
b) mesas, como espaços de partilha do pão, para que todas as pessoas possam comer e se fartar (banquetes da vida);
c) mesas em que as pessoas se encontram com suas diferenças. Aí todos e todas estão na mesma condição de convidados e convidadas do mesmo anfitrião, cabendo-lhes aceitarem-se e respeitarem-se mutuamente como irmãs e irmãos; superado o fundamentalismo e a inveja entre irmãos, poderá haver cooperação na causa comum da solidariedade;
d) enfim, Mesas como espaços de reconciliação nos níveis social, econômico, político, cultural e religioso; como lugar de testemunho do projeto de Deus de reconciliação dos seres humanos divididos (interpretação dada pelo pastor Dr. Rodolfo Gaede Neto, professor da EST/IECLB, em palestra proferida na Consulta Luterana Latinoamericana sobre Diaconia, Florianópolis, setembro de 2002).
Diaconia é central quando se trata do que significa ser Igreja. Como elemento central do Evangelho, diaconia não é opção, mas parte essencial do discipulado. A diaconia alcança todas as pessoas criadas à imagem de Deus. Todos/as os/as cristãos/ãs são chamados/as através do batismo a viverem diaconia naquilo que fazem e na maneira como vivem o seu dia-a-dia no mundo. Esta é a primeira e mais importante expressão de diaconia.
Outras expressões mais organizadas de diaconia acontecem em nível comunitário, assim como através daqueles/as que são especificamente vocacionados para o ministério diaconal. Formas mais especializadas de trabalho diaconal são organizadas para levar a cabo aquilo que indivíduos ou comunidades não conseguem fazer sozinhos.
Por causa da missão integral de Deus, diaconia está profundamente relacionada com querigma (proclamação da palavra) e koinonia (partilhar à mesa). A diaconia é o testemunho através da ação. A partilha mútua inerente à comunhão da igreja pode transformar as relações de poder injustas que estão presentes na sociedade e são desafios ao trabalho diaconal, tais como “os ricos doadores” e “os pobres receptores”. Na diaconia, tanto os/as que são servidos/as como os/as que servem são transformados.
O propósito da diaconia jamais deve ser o proselitismo. Se e quando isso acontece, há perda de credibilidade e da dimensão de serviço incondicional. Se a Igreja não cresce, talvez seja mais apropriado rever os métodos de missão e de proclamação do Evangelho.
A Igreja é parte da sociedade civil, co-responsável pelo seu fortalecimento e visa à promoção do desenvolvimento sustentável de nosso planeta, o que no meio ecumênico é dito com a expressão Integridade da Criação. A Federação Luterana Mundial define desenvolvimento sustentável como um processo de mudanças através das quais se realizam as necessidades e os direitos humanos básicos de indivíduos e comunidades na sociedade, e que, simultaneamente, protegem as necessidades e os direitos humanos básicos (econômicos, sociais, culturais e ambientais) de outras comunidades e de gerações futuras.
Desenvolvimento sustentável se baseia na primazia das pessoas e da natureza no processo de desenvolvimento, que assegure e fortaleça a vida para hoje e para as gerações futuras.
O Conselho da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB) criou a Fundação Luterana de Diaconia, herdeira de 34 anos de experiência com o Serviço de Projetos de Desenvolvimento, com o objetivo de fortalecer a consciência e a vocação de serviço da Igreja através da metodologia de apoio a projetos sociais. A Fundação é uma entidade com personalidade jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, e é definida como organização de sociedade civil de direito público. A Fundação quer ser muito mais do que uma mera instância coletora e para repassar recursos financeiros nacionais e internacionais. Quer atuar em parceria com comunidades e proporcionar o compartilhar de saberes e experiências na área de desenvolvimento sustentável.
Um projeto é uma intervenção planejada no tempo e no espaço, em uma determinada comunidade, visando fazer uma diferença para melhor na vida das pessoas que nela vivem.
O Programa Básico da Fundação Luterana de Diaconia é:
• promover diálogo e reflexão sobre diaconia e desenvolvimento sustentável;
• articular parcerias de cooperação;
• coordenar iniciativas que respondam a necessidades emergentes;
• assegurar administração transparente de projetos (PMA);
• captar recursos humanos e financeiros necessários para a realização de sua missão.
Sua missão é apoiar e acompanhar programas e projetos de grupos organizados da sociedade civil que promovam qualidade de vida, cidadania e justiça social.
A FLD realiza sua missão dando prioridade a programas e projetos que promovam a igualdade de gênero e o combate ao racismo e à violência, nas seguintes áreas:
• Geração de emprego e renda;
• Educação popular;
• Ecologia e meio ambiente;
• Agricultura;
• Saúde comunitária.
Diferentemente dos anos 80, quando a ênfase residia nos protestos sociais que clamavam pela abertura política e construção de uma democracia política formal no país e constatava-se o surgimento de importantes organizações sociais no campo e na cidade, a atualidade se caracteriza por um processo de esvaziamento dos movimentos e por uma diminuição da capacidade de articulação política e enfrentamento através do protesto social nas ruas. São diversos os fatores que contribuíram para isto, entre os quais somente citamos alguns: a diminuição do peso político do movimento sindical, aumento de desemprego e de violência urbana, e a ascensão das políticas econômicas neoliberais. É importante é ressaltar que surgiram novos atores sociais que passaram a ocupar espaços.
As Organizações Não Governamentais, por sua vez, passam a ocupar um espaço que antes era terreno de ação ou do movimento sindical ou das organizações de caridade, na maioria ligadas a comunidades eclesiais. Temas, como geração de renda e emprego, somente a partir da metade dos anos 90 entram fortemente na agenda dos movimentos e organizações sociais brasileiras.
A Fundação Luterana de Diaconia – sucessora do Serviço de Projetos da IECLB – vem desenvolvendo a experiência de apoiar estes grupos através de seu Fundo de Pequenos e Médios Projetos desde 1989. É interessante perceber o quanto mudanças no contexto brasileiro interferiram ou impactaram na forma de apoio da FLD. Se até os anos 90 a tendência era o apoio a grandes projetos, isso vai se modificando a partir do final deste período. Atualmente, a FLD tem 132 projetos em andamento, na maioria, de pequeno a médio porte, em todo o território nacional.
As áreas temáticas desenvolvidas pelos pequenos ou médios projetos que vem sendo apoiados concentram-se nas áreas da FLD, e os projetos estão plenamente inseridos no centro da questão social brasileira. A soma das cinco áreas de apoio consideradas prioritárias (agricultura, educação, geração de renda, saúde e meio ambiente) concentra mais de 80% dos pequenos e médios projetos apoiados ao longo dos últimos 10 anos. Neste ponto, valem algumas considerações:
a. Em geral os projetos apoiados não estão associados somente a um tema. Esta é uma classificação formal. Na prática um projeto cadastrado como de agricultura, por exemplo, pode também estar relacionado com saúde (produção de ervas medicinais), com geração de renda (agroindústria, por exemplo) ou com meio ambiente (produção agro-ecológica);
b. Alguns títulos, por serem genéricos, são pouco claros sobre o que realmente está sendo apoiado nos projetos. Por agricultura deve entender-se o apoio à agricultura familiar, produção agro-ecológica ou assentamentos de reforma agrária. No tema educação estão cadastrados todos projetos referentes a organizações que trabalham com crianças e adolescentes. Saúde refere-se aos projetos de saúde comunitária, apoio ao combate da AIDS ou farmácias comunitárias caseiras. Os projetos de meio ambiente são aqueles que trabalham com proteção ou educação ambiental, bem como com as comunidades dos povos indígenas.
Outro ponto que está relacionado com o aumento da importância dos pequenos e médios projetos na conjuntura nacional, são os temas que vêm obtendo crescimento no número de apoios. Não é gratuito o significativo número de projetos em geração de renda e emprego (há vários cadastrados em agricultura que também são projetos com esta característica) e em apoio a grupos que trabalham com crianças e adolescentes. Este crescimento é reflexo do persistente quadro de desigualdade social que há no país, agravado pelo aumento do desemprego e da violência urbana.
Pelos temas também se pode fazer uma leitura política da conjuntura e da importância dos pequenos projetos. As organizações sociais que trabalham nesta perspectiva vão ganhando cada vez mais visibilidade, embora isto muitas vezes seja mais uma conseqüência do processo de exclusão do que resultado de estratégias de implantação de projetos.
Os projetos na área ambiental, por exemplo, estão cada vez mais assumindo a gestão do manejo de áreas de preservação ambiental (inclusive em áreas privadas), além do constante e tradicional trabalho de educação ambiental e a articulação política em torno de denúncias de destruição ou do não cumprimento de acordos de preservação da natureza.
Projetos vinculados à proteção de crianças e adolescentes, por sua vez, operaram grandes transformações em seus enfoques pedagógicos e políticos. O surgimento de uma moderna legislação em torno da infância e adolescência, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), colaborou na articulação de políticas alternativas que priorizam o reforço da auto-estima, a retomada de laços familiares e a integração de crianças e adolescentes com outras esferas sociais. As políticas de institucionalização destas vítimas através de orfanatos, casas de correção ou pupileiras tornaram-se obsoletas.
A busca de alternativas ao desemprego em sua maioria ainda se concentra no mercado informal ou em atividades clandestinas. Contudo, nos últimos anos começam a surgir cooperativas de trabalho, grupos associados de produção ou pequenos empreendimentos sociais vinculados à geração de renda. Vão de forma organizada tratando de ocupar mais espaço como formas de resistência ao desemprego e exclusão social e também, o que é muito importante, buscando formas alternativas de se relacionarem enquanto produtores de mercadorias ou prestadores de serviço. É crescente a consciência entre os associados destes grupos que não basta gerar uma renda para si e suas famílias. Há novas relações sociais para serem construídas.
Os projetos de agricultura, sobretudo os de agricultura ecológica, vem instigando a formulação de uma nova relação com a terra. Nos últimos 10 a 15 anos cresceu a consciência da necessidade (e da possibilidade) de mudança no modelo de produção agrícola baseado no latifúndio, monocultura, uso intenso de agrotóxicos e comercialização orientada para a exportação. A FLD supervisiona e monitora o Consórcio Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor (Capa), programa de apoio à agricultura familiar que completou 25 anos em 2003, e que hoje vem ampliando o seu serviço a comunidades quilombolas e indígenas e de pesadores artesanais. Os núcleos do Capa, por sua vez, também gerenciam pequenos fundos de microcréditos rotativos.
Em resumo, as organizações que desenvolvem pequenos projetos estão mudando suas formas de trabalho e relação com a população. De um caráter mais reivindicativo, orientado para responsabilizar o Estado pela implantação de políticas sociais, vem transformando-se em organizações propositivas e, principalmente, gestoras de demandas da população nos micro-espaços em que conseguem estabelecer o seu raio de ação.
Estas questões, levantadas a partir das áreas temáticas apoiadas, evidentemente não têm força para operar mudanças macro-estruturais. Contudo são fundamentais para o desenvolvimento dos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais na sociedade brasileira. Além disso, vão demonstrando na prática, ao menos em pequenas escalas, que há alternativas ao processo de exclusão.
A experiência da Fundação Luterana de Diaconia não é uma experiência isolada. No Brasil há diversas iniciativas de apoio a grupos através de projetos de pequeno ou médio porte.
Diversos municípios ou governos estaduais buscam a criação de bancos populares, para financiarem experiências coletivas ou individuais de geração de renda através de pequenos empreendimentos ou prestação de serviços. O governo federal também ensaia alguns passos nessa direção, sobretudo através do chamado micro-crédito (Pronaf). As experiências colhidas pelas Ongs nesta área têm contribuído bastante para a formulação de políticas e práticas governamentais.
Também há iniciativas oficiais relacionadas ao campo da ação social. O governo federal desenvolve o programa Fome Zero, que – com todas as críticas e limitações expressas desde o seu início – não deixa de apontar para um dos maiores flagelos que afeta considerável parte do povo brasileiro. Conselhos locais ou regionais de cultura ou de proteção aos direitos de crianças e adolescentes também canalizam recursos para organizações sociais através de pequenos projetos.
Diversas universidades, muitas vezes em conjunto com outras instituições, vêm articulando incubadoras de economia popular com o objetivo de construir conhecimento e experiência com alguns grupos que desenvolvem projetos neste entorno. As empresas privadas não estão omissas neste processo. Há grupos empresariais, sobretudo através da estratégia de criação de fundações (algumas vezes de forma direta), fomentando iniciativas no campo social através de projetos. Faz parte do passado a época em que simplesmente destinavam alguns recursos às tradicionais iniciativas assistencialistas.
As centrais sindicais, através de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Fat) vêm disputando recursos entre si, com Prefeituras e com o sistema nacional de serviços (Sesi, Senac, Senai). Uma importante parte destes recursos, que são consideráveis, tem como objetivo instaurar processos para aprendizagem de trabalhadores através de projetos em educação.
Cabe também destacar a articulação dos Fundos de Pequenos Projetos (FPP’s). Trata-se de diversas organizações com larga experiência no apoio a pequenos ou médios projetos de grupos ou movimentos sociais (Participam da articulação dos FPP’s organizações como CESE, Cáritas, FASE, CERIS, Fundação Luterana de Diaconia, Instituto Marista de Solidariedade, ELO, Ongs responsáveis pelo Fundo de Mini Projetos da Região Sul e outras). Desde metade dos anos 90 esta articulação, em diálogo com agências de financiamento e outras parcerias, vem elaborando reflexões sobre diversos temas, dos quais se destaca a importância dos fundos de pequenos projetos no contexto brasileiro.
É claro que todas estas iniciativas são desiguais e se movem em contradições. Trata-se de visões de mundo diferentes, volumes de recursos desiguais e objetivos políticos que não se movem na mesma direção. Há uma grande heterogeneidade.
Torna-se difícil verificar impactos a partir de pequenos projetos sociais. Em grande medida, estes têm um alcance limitado, mas também importante: conseguem aumentar a auto-estima dos membros das comunidades, minorar o sofrimento e auxiliar na sobrevivência de uma parte significativa da população onde se desenvolvem.
Pesquisa desenvolvida em 2002 pelo Centro de Estudos Religiosos sobre Igreja e Sociedade (Ceris) demonstra que 75% dos pequenos projetos de geração de renda são bem sucedidos – um índice excelente – sendo que, além da geração de renda para o grupo/associação, constata-se o aumento da auto-estima dos seus integrantes e a valorização das mulheres.
Também seria possível pensar em duas conseqüências positivas que nesta escala de projetos se consegue vislumbrar.
Pequenos projetos são um interessante formato de apoio para a democratização na implantação de ações sociais. Por seu volume de recursos e pequena estrutura fixa são constantemente estimulados a se articularem em redes, parcerias ou associações. Como necessitam efetuar trocas (de recursos, conhecimento ou trabalho) necessitam ter uma estrutura aberta e flexível o suficiente para aceitarem compartilhar decisões.
Por fim, pequenos projetos desenvolvem-se num ambiente com menores possibilidades de gerarem corrupção. Sabemos que esta questão não é somente um problema localizado nas esferas do Estado ou nos governos. Há casos de corrupção em organizações da sociedade civil e, em geral, se manifestam naquelas cuja estrutura de funcionamento e raio de ação já atingiu dimensões em que necessitou uma centralização administrativa muito forte e passou por um processo de burocratização.
Concluindo, restaria dizer que há o desafio de se promover pesquisas e elaborar instrumentos de avaliação do impacto dos pequenos projetos na realidade brasileira ou, ao menos, da região em que se desenvolvem. A FLD e a Cese estarão fazendo isso com apoio de PPM a partir de julho deste ano. Porém, talvez de forma subjetiva, os protagonistas de pequenos projetos conseguem perceber a importância do trabalho que desenvolvem. Há total convicção por parte de qualquer educador popular, agente de saúde ou animador de trabalhos comunitários sobre o valor de seus esforços. Há que traduzir esta convicção em instrumentos de avaliação.
*Palestra proferida na Assembléia do Sínodo Sudeste da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), Campinas (SP), 15.05.2004