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Tema: Coluna social – promoção de fraternidade ou projeção egoísta?

Explicação do tema:

Elegante, charmosa, bonita e inteligente, ela se prepara para as férias na orla marítima.

Frases como esta encontramos na maioria dos jornais. A coluna social vende. Uma sociedade impregnada do espírito de competição individualista necessita de um espaço para projetar os colunáveis. Também nas rádios e nos clubes se promove esse espírito (p. ex.: Baile das Debutantes). Às vezes, até mesmo, ofícios da Igreja são desvirtuados neste sentido. O que define a seleção desta elite é o poderio econômico e todos os valores que condizem com ele, como consumismo, ostentação, luxo, vaidade.

Ocorre uma nítida separação entre os que merecem ser notados e os que devem ser esquecidos. Neste sentido, a coluna social tem a função ideológica de encobrir o conflito de classe na sociedade.

Ignorando a fraternidade, a solidariedade, o serviço abnegado e promovendo futilidades, a coluna social desenvolve uma educação negativa, contrária ao espírito do Evangelho.

Texto para a prédica: Gálatas 3.28

Autor: Silvio Meincke

l – O controle da imprensa livre

1. O controle dos meios de comunicação de massa

Para compreender a função da coluna social nos jornais, devemos perguntar pelo lugar social que os meios de comunicação de massa (MCM) ocupam na sociedade. Com isso, a nossa temática torna-se vasta, razão pela qual podemos, aqui, abordá-la apenas de forma resumida.

A liberdade de imprensa pode ser vista como parâmetro para a organização democrática de uma sociedade. O grau de liberdade conquistado pela imprensa define até que ponto uma sociedade é democrática, aberta, pluralista.

Nos regimes autoritários, sejam eles do Leste ou do Oeste, da esquerda ou da direita, a tendência é limitar a liberdade de imprensa através da intervenção direta do Estado. Os regimes inspirados no modelo soviético estatizam os MCM, os controlam e fazem deles instrumentos do Estado ou do Partido. As ditaduras de direita, ainda que não estatizem as empresas jornalísticas, nelas intervêm pelo controle, pela censura ou interditando-as. Esse controle geralmente é justificado como uma emergência passageira, já que todos os regimes querem demonstrar as suas intenções democráticas, e seria difícil acreditar nisso com a intervenção da imprensa.

Todavia, nas sociedades capitalistas, assim chamadas democráticas e livres, estando os MCM nas mãos da iniciativa privada, geralmente constituída em grandes empresas, sua linha de ação fica sujeita aos interesses do capital. O interesse do capital é, sobretudo, a sua própria multiplicação através da produção, do consumo e do lucro. Aliás, o termo sociedade livre quer designar exatamente uma organização social em que haja liberdade de investimento, de lucro e de multi-plicação do capital. É à liberdade do capital e não das pessoas que os capitalistas se referem com a expressão sociedade livre. Se o interesse do capital é a sua própria multiplicação – e as empresas jornalísticas constituem empresas capitalistas – essa realidade não permite uma informação realmente livre, imparcial, que incluísse a denúncia e a dissidência. Tal informação livre poderia vir em prejuízo da lógica capitalista, cuja máxima é a multiplicação do capital investido.

Além de serem, elas mesmas, grandes empresas capitalistas, as empresas jornalísticas dependem do grande capital das outras empresas, cujos interesses representam e de cujos anúncios vivem. Desta forma, a tão cara liberdade de imprensa passa a significar, para os donos dos meios de comunicação de massa, nada mais nada menos do que a liberdade da própria empresa de faturar, lucrar, crescer e multiplicar o seu capital. A imprensa livre enquadra-se nesta ideologia nos seus aspectos econômicos, sociais e culturais. Em consequência, cuida de veicular os valores dessa ideologia. O problema se acentua, tendo em vista que os veículos da comunicação de massa – jornal, rádio, televisão – estão, executando a imprensa alternativa e nanica, em mãos de empresas e redes de empresas realmente eficientes, verdadeiras indústrias de comunicação, com negócios entre os mais rentáveis, com altos faturamentos, alicerçados na publicidade das grandes empresas. No eixo Rio-São Paulo, em torno de 70% do faturamento dos grandes jornais provém dos anúncios de empresas multinacionais. 

Naturalmente, a linha editorial, as opiniões emitidas e as notícias não só não devem chocar, como de-vem agradar esses anunciantes. Assim sendo, é a ideologia da livre multiplicação do capital que define o que é liberdade de imprensa, imparcialidade jornalística, objetividade de informação e direito de ser bem informado. A informação assim determinada constitui-se em doutrinação que se faz por todos os meios, tais como a propaganda comercial, o entretenimento, as histórias em quadrinhos, aparentemente inocentes, os editoriais, a seleção das notícias, mantendo a população submissa, acomodada ao status quo que a classe dominante tem interesse em perpetuar. Considerando – como a lógica ensina e a história demonstra – que o Estado capitalista representa e defende os interesses da classe detentora do capital, conclui-se que os MCM representam um eficaz instrumento de controle, que o Estado usa, por via indireta, sem que precise estatizar. Instrumento de persuasão, mais sutil, mas não menos eficiente do que a repressão nua e crua, ambos, repressão direta e controle indireto, constituem-se em domínio do Estado sobre o povo.

Tanto a estatização da imprensa como a sua submissão aos interesses do poder econômico da iniciativa privada ferem a verdadeira liberdade de imprensa, um dos princípios básicos das sociedades democráticas, com consequências graves para os interesses das classes populares e para respeito dos direitos humanos.

A coluna social insere-se neste quadro todo como uma das árvores do mato, como uma das peças do mecanismo e, por isso mesmo, não deve ser vista isoladamente. Talvez ela seja a face mais exposta e mais atrevida da venalidade do jornal ao capital; como toda prostituta, no entanto, procura disfarçar e, até mesmo, tenta passar por nobre e pura dama.

Sempre houve as tentativas de criar veículos da imprensa alternativa, popular, geralmente de periferia, frágil, provisória, de vida curta devido a sua própria origem e natureza. Esta, sintomaticamente, não apresenta colunas sociais. Deve-se frisar que não pertencem a esta categoria, só por serem pequenos, os jornais das nossas cidades do interior, seja por serem determinados pelas camadas capitalistas locais, seja por pertencerem a grandes redes supra-municipais. Estes pequenos jornais, aliás, geralmente, levam a extremos ridículos as badalações dos colunistas sociais.

2. A coluna social

A coluna social está a serviço do capital, não da pessoa. A serviço da classe detentora do capital, com seus valores de projeção social, através da ostentação, do consumo e do lucro.

A coluna social discrimina entre os que merecem destaque dentro desses interesses e os que merecem ser esquecidos. Merecem destaque os que podem participar de eventos sociais requintados, os que podem trajar dentro dos padrões da alta moda, os que podem receber com mesa esbanjadora.
A coluna social cultua o mito do sucesso através do esforço, do trabalho, da dedicação ou, então, através da sorte. Insinua ou pressupõe uma sociedade harmónica, homogênea, sem divisões, com chances iguais para todos. Assim mascara as reais causas da diferença entre os notáveis e os esquecidos. As reais causas estão na divisão da sociedade entre os que trabalham e os que vivem da compra, a baixo preço, do trabalho alheio.

A coluna social tenta ocultar a tão óbvia realidade de que os que realmente trabalham não podem participar das altas rodas sociais. É justamente a exploração do trabalho alheio que faz a fortuna dos que frequentam a coluna social. Quem paga o luxo dos mais bem vestidos é o que é obrigado a vender barato a sua força de trabalho. Quem paga os casacos de pele são os operários mal pagos do marido.
A coluna social cultua as soluções, o sucesso, a vitória, a salvação individualistas e não comunitárias.
A coluna social não promove a libertação, nem dos notáveis, presos a falsos valores, nem dos excluídos.

A coluna social promove a hipocrisia da aparência exterior e da bajulação de quem tudo faz para merecer uma menção no jornal.

A coluna social serve ao capital que precisa multiplicar-se pelo lucro e que necessita de notáveis que puxam a venda dos seus produtos.

A coluna social procura legitimar o sistema com o exemplo de pessoas bem sucedidas, de vida rosada e feliz, dos que venceram, dando a entender que todos têm as mesmas chances, desde que queiram e não se cansem de perseguir o sucesso.

A coluna social ignora o empenho de pessoas que realmente se dedicam às soluções comunitárias dos oprimidos.

A coluna social introjeta os valores nos humilhados, desviando-os dos valores da fraternidade e do bem comum. O desejo, provocado nos que se sentem excluídos e humilhados, de usufruírem dos mesmos privilégios, frustra-os e dá-lhes a sensação de serem inferiores, incapazes e não merecedores. Pela introjeção de valores falsos, perpetua a alienação.

A coluna social é a mais típica faceta da imprensa controlada pela classe dominante e pelo seu capital. A classe dominante procura usar todos os setores da vida humana, como a política, a escola, a religião, a cultura, para perpetuar a alienação, os privilégios, o sistema.

A coluna social coopta os líderes populares, bajulando-os, provocando neles o desejo de inclusão e oferecendo-a.

Abaixo, um exemplo do que podemos ler em inúmeras colunas sociais:

S.C., recebendo as mais representativas personalidades da nossa 'society' para um rico jantar em sua bela residência. Hostess perfeita, causou encanto em todos com a sua classe e o seu charme. Entre as muitas presenças alinhadas, destacamos V.N. e J.A., a primeira de preto, a cor elegante da estação, e a segunda com traje jovial de bordados em relevo. Do Rio, desfilando belíssimo traje da coleção famosa do costureiro F.P., a encantadora A.M., amiga da anfitriã. J.B., recém-desembarcada de Paris, esteve linda no traje branco com decote pronuncia¬do.

II – Considerações exegéticas

1. Gálatas 3.1-14 – Pela lei, a maldição – pela fé, a bênção.

Paulo está profundamente indignado e decepcionado com os gálatas. Depois que, pela fé, receberam o Espírito, experimentaram a verdade(2) e conheceram maravilhas(5), agora, recaem sob a maldição da lei, como se um feiticeiro demoníaco os tivesse fascinado(l). Não se pode querer a vida por dois caminhos excludentes, o da fé e o da lei. Ambos se excluem mutuamente. Os insensatos gálatas começaram pelo Espírito e, agora, voltam à carne(3).

Ser filho de Abraão, de alta importância para os judeus, se é pela fé na promessa(7). A fé na promessa foi imputada como justiça a Abraão(6). Assim, ter parte na promessa independe do mérito das obras, da cicuncisão ou da pertença a essa ou aquela etnia. Se lei e obras separavam judeus e gentios, a fé em Cristo levanta todas as barreiras entre os povos, pois a salvação vem para todos e a fé rompe o legalismo judaico(14).

2. Gálatas 3.15-25 – A lei tem apenas função de aio

Se a lei pudesse vivificar, a justiça teria vindo pela lei(21). No entanto, a lei apenas serve de aio(24), por causa das transgressões(19), até que venha a fé(23). Vinda a fé, o aio se torna desnecessário(25).

3. Gálatas 3.26-47– A fé dá a todos participação igual na herança.

a) 3.26-29 – Pelo batismo todos somos um em Cristo. Pela fé, o Espírito de Cristo age em nós. O crente passa a ter parte no corpo de Cristo, porque Cristo age nele. Assim se torna filho de Deus. Portanto, caem as diferenças de nacionalidade, sexo e status. Todos, entre si, por meio de Cristo, tornam-se um.
A fé é marcada pelo batismo, que significa revestimento de Cristo. Toda a vida passa a ser determinada por Cristo, como se o batizado morresse no velho homem e ressurgisse em Cristo (Romanos 6.3). Assim, a lei não mais tem poder sobre o que crê e recebeu o batismo.

Em Cristo e pela fé existe uma única descendência de Abraão. Os que recebem a sua justiça (aceitação, importância, status) pela fé, de graça e não por conquista, são unidos numa unidade no corpo de Cristo. Pelo batismo morrem com Cristo e ressuscitam como novo povo de Deus. Entre eles não haverá graus de justiça e de qualidade conquistados, que pudessem levar a diferenças de importância. Todos são herdeiros, por igual, da herança da promessa feita a Abraão.

b) 3.28 – Em Cristo, todos os balizados constituem o único descendente de Abraão, a quem pertence a promessa(16). Caem, assim, todas as diferenças de nacionalidade (o grego representa, aqui, o gentio, em geral: Rm 1.16), de sexo (na lei. só o homem era circuncidado e assim incluído na herança da promessa), de status (a inclusão não se dá por conquista, mas por graça e fé).

Ill – Indicações para a prédica

1. Ler exemplos de notas da coluna social.

– Fazer uma análise das notas, com base nas suas características, acima arroladas.

– Tentar fazer com que a comunidade sinta o impacto de tais notas sobre o sentimento dos incluídos (lisonja, orgulho, superioridade) e dos excluídos (humilhação, frustração).

2. Leitura do texto.

– Explicação da mensagem de Paulo com base na exegese acima.

3. Relacionar a mensagem do texto com os valores da coluna social, expressão típica de uma imprensa a serviço da classe dominante de uma sociedade capitalista e consumista, interessada na perpetuação da divisão em privilegiados e marginalizados.

– Onde as pessoas não experimentam a libertação em Cristo permanecem escravas das velhas leis com as suas discriminações.

– Os cristãos reúnem a comunidade dos balizados que, com Cristo morreram, para as velhas relações humanas que dividem as pessoas por graus de importância conquistada, e ressuscitaram para as relações novas de fraternidades de filhos de Deus.

– O motivo central da discriminação, que é a conquista do status diante de Deus e dos homens, está destruído na sua raiz, porque Deus valoriza por graça.

– Os crentes participam, pela fé, da herança da promessa, não pela etnia, pelas realizações ou por serem homens ou mulheres. Já não há distinção.

– Se a comunidade dos balizados vive essa nova realidade diante de Deus e entre si, deve lutar para que a fraternidade e a comunhão de pessoas iguais determine também as relações cotidianas da vida política, cultural e social.

– Na comunidade dos crentes, longe da ideia de discriminar e excluir, justamente os membros menos nobres recebem maior cuidado (1 Coríntios 12.12-26).

– Qual o feiticeiro demoníaco que fascina os cristãos de nossos dias para recaírem sob a escravidão das velhas leis que fazem diferença, que discriminam, que exploram a vaidade, que alienam, que fazem passar de largo pela herança, que dividem irmãos entre notáveis e ignorados? Certamente o demónio do capital que se multiplica pela exploração do trabalho e pelo lucro do consumo; que, por isto, quer perpetuar a divisão entre trabalhadores e compradores de trabalho barato, além de projetar na imprensa os puxadores do consumo, os bem sucedidos do sistema, com os quais o quer justificar.

– O homem continuará sendo homem e a mulher continuará sendo mulher, cada um com as suas características e os seus dons. Judeus e gregos continuarão sendo judeus e gregos, cada um com a sua história e a sua cultura. Não se trata de igualar o que, por natureza, é diferente. Isso seria aspiração de ditador que não suporta diferenças e diversidades por ele incontroláveis; que quisesse todos em fardas iguais e em passos cadenciados. Trata-se, isto sim, de eliminar as diferenças que são frutos do pecado da discriminação e que oprimem e excluem.

IV – Subsídios litúrgicos

1. Confissão dos pecados: Perdoa-nos, Senhor, por não resistirmos com maior decisão ao fascínio de velhos demónios que nos querem conquistar, como a coluna social, com suas vaidades, seu consumismo, seus mitos e suas máscaras. Nós que fomos libertados pelo teu Evangelho, recaímos sob o jugo da escravidão do mundo do capital, e nem percebemos as suas armadilhas. Perdoa-nos, Senhor, chama-nos à razão, liberta-nos renovadamente e tem piedade de nós!

2. Oração de coleta: Agradecemos-te, Senhor, que nos liberta de todos os meandros das leis do capital que nos querem conduzir à escravidão. Faze-nos conhecer, novamente, as maravilhas da tua libertação e protege-nos de todas as recaídas à servidão. Dá-nos a conhecer a fraternidade que brota da tua graça e fortalece-nos na comunhão de filhos de Deus libertos. Amém.

3. Sugestão de leitura bíblica: 1 Coríntios 12.12-26.

4. Assuntos para a oração final: Em favor de todos os iludidos que procuram a vida na ostentação. Em favor dos excluídos e marginalizados para que experimentem a aceitação e se sintam herdeiros da promessa. Em favor dos que trabalham na imprensa para que encontrem forças na promoção da comunhão e do bem comum e elevem os valores comunitários. Pelo fortalecimento dos que se empenham nos meios de comunicação alternativos. Pelo fortalecimento dos movimentos populares para que consigam romper as barreiras discriminatórias.

V – Bibliografia

– BRING, R. Der Brief des Paulus an die Galater. Berlin und Hamburg, 1968.
– GARCIA, N.J. O que é propaganda.Ideológica. Coleção Primeiros Passos, 1982.
– GUARESCHI, P.A. Comunicação e Poder. Vozes, 1983.